THE NEW YORK TIMES - Quando a Rússia lançou sua invasão à Ucrânia, em 24 de fevereiro, sua estratégia se caracterizou por um rápido avanço de tanques e ataques de helicóptero em regiões mais profundas do país — duas abordagens que finalmente fracassaram e custaram a Moscou um número incalculável de mortes.
Agora, com um objetivo mais estreito, com foco principal no leste ucraniano, a nova campanha militar que a Rússia afirmou ter iniciado na terça-feira será muito mais metódica, de acordo com autoridades da Ucrânia e dos Estados Unidos.
Em vez de realizar ataques-relâmpago a partir de suas linhas de frente, as forças russas — que definiram um semicírculo que se estende de oeste a leste, da cidade de Izium até Sievierodonetsk — fortificaram sua artilharia e enviaram pequenos destacamentos de tropas para realizar operações atrás das linhas ucranianas. Muitos soldados ucranianos estacionados nessa região, conhecida como Donbas, estão entrincheirados em fortificações instaladas por lá há quase uma década.
Conhecidos nos círculos militares como “operações definidoras”, esses ataques menores da Rússia são com frequência precursores de movimentações maiores de tropas — ou servem como distração de outros fronts. Há vários dias, os russos têm acionado cerca de 11 grupos de batalhões táticos a mais no Donbas, elevando o número dessas unidades na região para cerca de 75, de acordo com autoridades do Pentágono. Cada grupo possui aproximadamente mil soldados.
Em Horlivka, uma cidade ocupada por separatistas apoiados pela Rússia, um morador afirmou na terça-feira que, depois de uma semana de calmaria, o lado russo começou a disparar fogo pesado de artilharia, o que ocorreu juntamente com movimentações de tropas e de aviões russos sobrevoando a região.
Houve ataques por toda a Ucrânia nos dias recentes, sinalizando uma nova escalada. Em Kharkiv, por exemplo, a artilharia russa castigou uma área residencial bombardeada com frequência na terça-feira, matando pelo menos três pessoas. O bombardeio letal ocorre na esteira de dois dias de intensos ataques de foguetes e artilharia contra partes da cidade que raramente eram atingidas no mês passado.
Outras cidades, como Zaporizhzhia, Lviv e Kiev, a capital, foram atingidas por mísseis de cruzeiro e fogo de artilharia enquanto as forças russas preparavam tropas terrestres para sua investida no Donbas, uma região industrial no leste ucraniano do tamanho do Estado americano de New Hampshire.
Um morador de Kramatorsk — uma das maiores cidades do Donbas ainda sob controle ucraniano, que provavelmente será um dos principais alvos da Rússia na ofensiva — montou guarda a partir de uma posição estratégica e viu a linha de frente ao noroeste de sua cidade irromper em fogo de artilharia concentrado.
“As forças russas começaram a batalha pelo Donbas, que estavam preparando havia muito tempo”, afirmou o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, num vídeo transmitido na noite da segunda-feira. “Uma parte muito significativa do Exército russo está concentrada agora nessa ofensiva.”
Menos decisiva
Ambos os lados têm travado um conflito no Donbas ao longo dos oito anos recentes, no qual forças do governo ucraniano combatem separatistas apoiados pela Rússia. A batalha seguinte, em terreno amplo e aberto, terá um aspecto significativamente diferente da guerra urbana travada em torno de Kiev, na qual o Exército russo tentou tomar a capital sem sucesso.
“Comparada com as primeiras semanas da guerra, essa próxima ofensiva é muito menos decisiva do que pode parecer”, afirmou Michael Kofman, diretos de estudos de Rússia do CNA, um instituto de pesquisa em Arlington, Virgínia. “Não importa o que aconteça no Donbas, os custos tendem a ser tão elevados que o Exército russo se tornará uma força exaurida.”
Enquanto os militares russos fazem incursões atrás das linhas ucranianas e posicionam forças no norte do Donbas, o combate no sul — em torno da cidade de Mariupol — tornou-se um sítio total, com os defensores da Ucrânia cercados e mal se aguentando. Milhares de civis foram feridos ou mortos em um mês de batalha, de acordo com autoridades ucranianas.
Capturar Mariupol é parte crucial da campanha russa no leste da Ucrânia. A queda da cidade permitiria à Rússia completar a ligação terrestre entre o território russo e a Crimeia ocupada. Também permitiria às tropas russas retomar as forças e avançar para o norte, para atacar posições ucranianas ao redor da cidade de Zaporizhzhia.
Isso poderia possibilitar aos russos aumentar a pressão sobre as tropas ucranianas a partir do norte e do sul, tensionando linhas de abastecimento e outros recursos.
As forças ucranianas responderam na mesma moeda à escalada russa, disparando sua própria artilharia — uma mistura de obuses, morteiros e foguetes não guiados — para impedir e adiar qualquer ataque maior.
Mas apesar dos envios e dos compromissos reiterados dos Estados Unidos e de outros países da Otan, as autoridades ucranianas continuam a expressar profundas preocupações a respeito de seu estoque de munição e dúvidas a respeito de seu armamento ser suficiente para impedir o avanço das forças russas.
O Exército ucraniano “repeliu 7 ataques do inimigo, destruiu 10 tanques, 18 blindados, 8 veículos, 1 sistema de artilharia e 1 morteiro inimigo”, afirmou em um comunicado, na terça-feira, o Ministério da Defesa ucraniano.
Não foi possível verificar essas informações independentemente. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
*GIBBONS-NEFF É CHEFE DA SUCURSAL EM CABUL; SCHWIRTZ É REPÓRTER
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