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O BC culpa o governo

Em geral diplomáticos e muito discretos ao falar das contas do governo, diretores do Banco Central (BC) foram de uma franqueza incomum – e quase contundente – ao apresentar ontem o Relatório Trimestral de Inflação, um panorama econômico nacional e internacional. Não havia como escapar. Quase todas as projeções para este e para o próximo ano pioraram e era indispensável enfrentar o assunto e mostrar a natureza dos problemas. Pelas novas estimativas, a economia brasileira encolherá 2,7% neste ano e 2,2% nos 12 meses até o segundo trimestre de 2016. A edição anterior do relatório indicava para este ano uma contração de 1,1%. A inflação estimada para 2015 passou de 9% para 9,5%. A intenção de alcançar a meta de 4,5% até o fim do próximo ano foi reafirmada, mas esse resultado, segundo o próprio documento, muito dificilmente será atingido. Pelos novos cálculos, a inflação anual ainda estará em 4,7% no segundo trimestre de 2017 e cairá para 4% no terceiro. Há pouco espaço para eufemismos quando se apresentam números como esses.

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Por Redação

Encarregado de falar à imprensa, o diretor de Política Econômica do BC, Luiz Awazu Pereira, teve de lembrar o rebaixamento do Brasil ao grau especulativo, na classificação da Standard & Poor’s, e um dos principais motivos alegados pela agência: as mudanças nas metas fiscais e a apresentação de uma proposta de orçamento com déficit primário de R$ 30,5 bilhões. A revisão das metas, comentou Awazu, foi além das expectativas do mercado, afetou a percepção de risco e impulsionou a valorização do dólar – um dos principais assuntos do noticiário econômico nos últimos dias.

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O presidente do BC, Alexandre Tombini, conseguiu chegar perto dos eufemismos, mas, ainda assim, foi bastante explícito ao falar em ajustes processados “em velocidade inferior” à inicialmente estimada. Essa lentidão tem resultado em maiores prêmios de risco e maior depreciação do real, com efeitos positivos nas contas externas e negativos na inflação. Pelo menos num ponto o esforço diplomático triunfou. A lentidão dos ajustes, disse o presidente do BC, vem “reduzindo a revisão para baixo das expectativas de inflação”.

Depois de reconhecer os problemas agravados pelos tropeços na gestão das contas públicas, Tombini tentou passar ao mercado algumas mensagens tranquilizantes. O BC, disse ele, manterá os juros básicos em 14,25% por tempo suficientemente prolongado para levar a inflação à meta. Em outras palavras: a aposta em juros mais altos, neste momento, é uma questão do mercado. Ninguém deve interpretar esses movimentos, acrescentou, como indicação das próximas decisões de política monetária. Além disso, o BC e o Tesouro têm instrumentos para retirar a volatilidade e a ansiedade dos mercados. Mas se absteve de entrar na parte mais interessante – a descrição de como as duas instituições cooperam para produzir esses bons efeitos.

Awazu apresentou o relatório pela última vez porque em breve assumirá, em Basileia, na Suíça, uma vice-presidência do Banco de Compensações Internacionais, também conhecido, como lembrou Tombini, pelo apelido de banco central dos bancos centrais. O novo diretor de Política Econômica será Altamir Lopes, veterano no BC e também nos contatos com a imprensa.

Awazu reafirmou a importância da arrumação das contas públicas para o combate à inflação. É indispensável, acentuou, cumprir as novas medidas fiscais apresentadas pelo Executivo. A referência à melhora das contas como essencial à política anti-inflacionária tem sido constante nos documentos do BC. Mas também tem sido frequente a aposta na evolução favorável das finanças do governo. Não houve sinal, até agora, de avanço nessa direção. Tem havido, sim, muitos tropeços, muita trapalhada e muito recuo no tratamento do assunto. O caso mais notável pode ter sido o envio de um projeto orçamentário com déficit. Que tenha sido o último escorregão ninguém pode dizer. Não há a mínima razão para se apostar nisso.

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