Um clássico da literatura gestado nas páginas do jornal. Ao enviar Euclides da Cunha (1866-1909) como repórter para cobrir a Guerra de Canudos no sertão da Bahia, em 1897, além de informar aos seus leitores os acontecimentos do conflito enquanto aconteciam, o Estadão contribuiria para a perpetuação daquele momento histórico do País no futuro livro Os Sertões, que o escritor lançaria em 1902.
Passagens que se tornariam célebres na clássica e fundamental obra da língua portuguesa tiveram sua primeira versão publicada no jornal antes de serem lapidadas em texto literário. “Assim, o sertanejo é um forte”, publicou Euclides na capa do Estadão em 19 de janeiro de 1898, sob o título Excerto de um livro inédito, pouco mais de três meses após o fim dos conflitos em Canudos. Em Os Sertões, lançado quatro anos depois, a frase se imortalizaria no épico com um aposto: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.
A cobertura de Euclides da Cunha sobre a Guerra de Canudos se estenderia por dois meses. Ele viajou para o sertão da Bahia com intenção de escrever um livro sobre o levante liderado por Antônio Conselheiro (1830-1897). Segundo nota publicada em 30 de julho de 1897, ele não só enviaria “correspondências do theatro das operações” como tomaria notas e faria estudos “para escrever um trabalho de fôlego sobre Canudos e Antônio Conselheiro”.
Antes de seguir para a região do conflito, passou 23 dias em Salvador esperando autorização do Exército. Na capital baiana, escreveu a maioria das cartas, publicadas no Estadão como “Diário de uma Expedição”. Avistou Canudos em 10 de setembro de 1897 e de lá saiu em 3 de outubro, dois dias antes do fim da guerra, por causa de um acesso de febre. Ao contrário das cartas, enviadas em intervalos maiores e com análises da situação, os telegramas eram quase diários e traziam informações pontuais com as principais notícias do dia.
No período em que cobriu o levante, Euclides enfrentou um verdadeiro rito de passagem que o deixou impactado: se quando deixou São Paulo estava seguro da natureza monarquista da rebelião em Canudos, o escritor (republicano convicto) é obrigado a reformular seu julgamento, forçado pelas contingências.
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