A edição do Ato Institucional-5 (AI-5) marcou, em 13 de dezembro de 1968, o início da censura sistemática à imprensa no Brasil, que só acabaria dez anos depois. Houve pressão, ameaças e atentados contra o Estadão desde o golpe militar de 31 de março de 1964, mas os censores não frequentavam a redação nesse período. A repressão começou quando a Câmara negou a licença para o governo processar o deputado Márcio Moreira Alves (1936-2009).

Na véspera do anúncio do AI-5, o chefe da Polícia Federal em São Paulo, general Sílvio Correia de Andrade, telefonou para a redação para saber a manchete do dia seguinte. “Câmara nega; prontidão”, informou o editor-chefe Oliveiros S. Ferreira (1929-2017). O general deu-se por satisfeito, mas o jornal foi apreendido ao chegar às bancas, na madrugada seguinte.
O general liberou o noticiário, mas não gostou do editorial Instituições em Frangalhos, no qual o diretor do jornal, Julio de Mesquita Filho (1892-1969), o Doutor Julinho, criticava o presidente Costa e Silva. “Das palavras ultimamente pronunciadas pelo sr. presidente da República, infere-se não ser o seu estado de espírito aquele que até há pouco sistematicamente definia a confiança que depositava em si e na sua gestão. O otimismo, de resto inconsistente, que transpirava de todas as suas atitudes, acabou por ceder lugar a uma inquietação crescente, na qual são evidentes os sinais de que admite S. Exa. que as coisas venham a piorar - não porque elas se tenham em si mesmas deteriorado, mas em consequência dos erros praticados por S. Exa.”
Foi o último editorial do Doutor Julinho. Ele deixou de escrever na seção Notas e Informações, na página 3, em protesto contra a censura. Sua resistência custou caro. “O preço que pagamos foi, em primeiro lugar, a vida de meu pai”, disse o jornalista Ruy Mesquita (1925-2013), em março de 2004, referindo-se à morte de Julio de Mesquita Filho. Ele caiu doente quando parou de escrever o editorial e morreu em julho de 1969, sete meses após a edição do AI-5.
O episódio foi contado por José Maria Mayrink (1938-2020) no livro Mordaça no Estadão e ainda inspirou o filme Estranhos na Noite, dirigido por Camilo Tavares, filho do jornalista Flávio Tavares, ex-editorialista do Estadão banido pelo regime militar.