Estadão faz 150 anos e mira investimentos em formatos e conteúdos para ampliar sua presença no País

Com a saúde financeira fortalecida, jornal prepara projetos para levar informação profissional, independente e de credibilidade a mais setores da sociedade

Foto do author Renata Cafardo

Um jornal que nasceu republicano, abolicionista e quando a imensa maioria da população brasileira era analfabeta, em 1875, já se criou olhando para o futuro. Suas bases foram estabelecidas na defesa da democracia, das liberdades, de uma imprensa independente – essenciais para o desenvolvimento do País. Os mesmos propósitos que levaram o Estadão até os seus 150 anos, completados neste sábado, 4, fazem dele uma instituição duradoura e pronta para os desafios atuais.

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Em meio à transformação tecnológica e informacional que atinge a mídia no mundo inteiro, o jornal enxerga oportunidades para ampliar ainda mais sua presença na sociedade. Em 2025 e nos próximos anos, o Estadão vai intensificar o investimento em conteúdos digitais, com novos formatos e propostas, para levar jornalismo de qualidade a um número maior de pessoas. Mas sem perder a essência do veículo de mais credibilidade do País.

Vai estar cada vez mais nas diversas plataformas de internet, como Instagram, Tik Tok, YouTube, com produções alinhadas à linguagem de cada uma delas. A estrutura para conteúdos em imagens será reforçada. Um exemplo são os colunistas do Estadão que passarão a também fazer análises em vídeo, diversificando o formato das opiniões que ajudam os usuários a refletir sobre os fatos mais relevantes do País.

Em meio à transformação tecnológica, redação do Estadão trabalha com dados e métricas para entender o interesse do usuário Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Para aumentar os pontos de contato entre o jornal e a sociedade, estão programados também cerca de dez eventos a mais do que foram feitos em 2024, levando discussões presenciais, com especialistas e temas importantes para o País, a outras cidades e a mais gente.

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O CEO do Estadão, Erick Bretas, explica que os novos investimentos são todos ancorados no DNA do Estadão. “A reputação do Estadão vem da sua independência editorial, e disso a gente não vai abrir mão. De fazer a cobertura que precisa ser feita, independente, com reportagem bem apurada, pesos e contrapesos, plural”, afirma. “É o que faz com que o Estadão seja percebido como um veículo muito confiável, uma referência, uma bússola.”

Ele acredita que a crise de desinformação vivida pela sociedade moderna já dá sinais de oscilação, indicando uma revalorização da imprensa profissional e das fontes confiáveis. “As pessoas podem estar começando a tomar consciência de que o que elas recebem nas redes sociais ou nos aplicativos de mensagens não é necessariamente informação, muitas vezes é desinformação. E nessas horas elas entendem que precisam buscar de volta a informação”, afirma.

Um exemplo foi o que ocorreu na véspera do primeiro turno das eleições municipais em São Paulo, quando o candidato Pablo Marçal (PRTB) divulgou nas redes sociais um laudo médico falso sobre seu oponente Guilherme Boulos (PSOL). Foi a imprensa profissional que conseguiu rapidamente desmontar a farsa - o assunto então perdeu força nas plataformas digitais.

Apesar da situação ainda preocupante, impulsionada pela polarização, o relatório Digital News 2024 mostrou que pela primeira vez parou de crescer o público que se informa a partir das redes sociais no mundo.

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A pesquisa anual feita pelo Instituto Reuters, que analisa o consumo de notícias online em 47 países, vinha indicando um aumento nesse índice desde 2018. Mas atualmente 29% das pessoas dizem se informar pelas plataformas, ante 30% em 2023.

“Quem está muito radicalizado talvez ainda continue buscando apenas coisas que confirmem suas expectativas e crenças”, diz Bretas. Porém, avalia o CEO, o resultado da pesquisa pode ser um sinal de que permanece a compreensão de que a imprensa defende a liberdade para tomar boas decisões com as melhores informações possíveis.

Jornal vai investir em mais conteúdos em vídeo no próximo ano Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Independência financeira para fazer jornalismo profissional

Bretas assumiu o cargo em julho de 2024, com a missão de alavancar ainda mais a transformação digital que o Estadão vem realizando desde 2017. Com 27 anos de experiência, o executivo liderou o time que criou a Globoplay, na Globo.

Francisco de Mesquita Neto deixou o cargo de diretor-presidente do Grupo Estado e se tornou o novo presidente do Conselho de Administração. O movimento, segundo Mesquita, tem ajudado o Estadão - uma das dez empresas mais antigas do País em atividade - a se manter um “player ainda mais relevante do ponto de vista de negócio”, e a garantir a perpetuação do jornalismo de qualidade.

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Em maio, a S/A O Estado de S. Paulo finalizou a captação de R$ 142,5 milhões, através da emissão de duas séries de debêntures, uma pública e uma privada, com novas entradas previstas para os próximos anos. Em 2023, houve ainda uma capitalização feita pelos acionistas da família Mesquita, controladora da empresa.

“Você só consegue fazer jornalismo isento, imparcial, se você tem uma empresa financeiramente independente. Conseguimos isso nesses 150 anos e estamos bem fortalecidos agora, numa situação saudável tanto patrimonial, quanto financeira, com capacidade de investir em novas tecnologias, adaptações de cultura e marca”, diz Mesquita.

Para garantir a sustentabilidade da empresa no ambiente digital, o Estadão trabalha com robustos subsídios de dados e métricas que permitem que o jornal entenda os interesses do usuário – o que não era possível há alguns anos quando havia hegemonia do veículo impresso.

O diretor de Redação do Estadão, Leonardo Mendes Jr., explica que são analisados constantemente dados de pageviews (quantidade de visualizações de cada conteúdo), de buscas no Google ou em redes sociais, e ainda do número de novos leitores que passam a assinar o jornal por causa de determinado material.

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“A gente enxerga claramente o alcance daquilo que está produzindo e sabe que determinados conteúdos ou áreas vão conversar mais com um público que talvez apareça uma vez só no ano, mas que pode acabar se tornando assinante”, diz.

Segundo ele, a intenção em 2025 é intensificar esse caminho e investir mais em conteúdos que ajudem os usuários a tomar decisões - seja as ligadas à economia, educação ou saúde, ou mesmo a escolha de um carro ou do melhor panetone para o Natal.

E ainda produzir mais materiais direcionados às diferentes plataformas digitais, com linguagem própria das redes, mas sem abrir mão do rigor do Estadão em divulgar informações. “O objetivo é chegar a um público que a gente não chegaria pela expectativa de a pessoa vir até aqui. Não está no universo dos mais jovens, por exemplo, fazer um movimento de ir até um site de notícias se informar”, afirma.

Ele ressalta, no entanto, que o Estadão não deixará de noticiar as discussões importantes para o País, mesmo que elas resultem em poucos pageviews ou assinaturas. “E também não podemos cair na armadilha de ficar só olhando para dados, fazer mais do mesmo, porque sabemos que é um sucesso de audiência, porque se não a gente não vai trazer novidades, não vai trazer o furo.”

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Erick Bretas, CEO do Estadão: 'A reputação do Estadão vem da sua independência editorial, e disso a gente não vai abrir mão' Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Para garantir a qualidade do produto, o Estadão também estabeleceu um trabalho de governança, liderado pelo diretor David Friedlander, que define e acompanha a aplicação das normas do jornalismo profissional nas reportagens. “Os costumes e os comportamentos vão mudando, a produção digital é descentralizada, mas a gente tem que garantir a qualidade, o critério e a imparcialidade do Estadão em qualquer tempo. A rapidez não pode atropelar os princípios do bom jornalismo”, diz ele.

Entre as normas seguidas por toda a redação estão a de que o outro lado sempre deve ser ouvido e destacado de forma justa em matérias de denúncia, que não se faça acusações baseadas em apurações de outros veículos e que haja uma checagem minuciosa em qualquer material. A visibilidade para a defesa dos acusados precisa estar presente em todas as plataformas, das matérias no impresso às chamadas nas redes sociais.

Enquanto o digital cresce, o Estadão impresso se estabelece como um produto premium. “A curadoria faz a diferença, é um tratamento muito cuidadoso, que seleciona bem as matérias no meio de toda essa espuma, conhece o leitor do jornal e sabe o que é importante para ele”, diz Friedlander, que também é responsável pela edição em papel.

Um jornal feito à luz de velas

Os primeiros 2 mil exemplares de a Província de São Paulo, como era chamado o Estadão logo em que foi criado, em 1875, foram impressos à luz de velas, em máquinas movidas à força humana – com homens livres e remunerados, mesmo em um País ainda escravocrata. A proclamação da República, em 1889, foi comemorada com vivas na capa, quando o jornal mudou seu nome para “O Estado de S. Paulo”.

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Foi nesses anos iniciais que o então repórter Euclides da Cunha partiu para a cobertura da Guerra de Canudos, em 1897, e forjou o clássico Os Sertões nas páginas do Estadão. Nas primeiras décadas do século passado, a família Mesquita teve ainda papel fundamental na Revolução Constitucionalista de 1932 e na fundação da Universidade de São Paulo (USP), em 1934.

Entre as incontáveis coberturas e reportagens especiais que marcaram a história do País nesses 150 anos há desde as expedições de Cândido Rondon, noticiada por telegramas em 1913, passando pela da Guerra Fria, queda do muro de Berlim, manifestações de 2013 no Brasil, e chegando aos atentados à democracia do 8 de Janeiro.

Marcam ainda a trajetória de sucesso do jornal as grandes investigações e furos jornalísticos, como do Rota 66, com a confissão inédita do coronel Erasmo Dias, a entrevista com o caseiro Francenildo dos Santos, que derrubou o ex-ministro Antonio Palocci, o vazamento do Enem, que anulou a prova em 2009, os Atos Secretos do Senado e a lista do ministro Edson Fachin, colocando o alto escalão político do País sob investigação na Operação Lava Jato. Entre as revelações mais recentes que impactaram a política nacional estão o Orçamento Secreto e o caso das joias, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

A essência do Estadão não é antiga, é universal, e por isso ela permanece mesmo em tempos de transformação digital, diz o diretor de Jornalismo do Estadão, Eurípedes Alcântara. “Pode haver uma material parecido com o nosso, mas aqui passou por um processo de garantir que é uma matéria do Estadão. E o que é o Estadão? É um jornal de um século e meio que sempre fez a coisa certa, nunca embarcou em canoa furada, ditadura, escravidão. E por isso chegou até aqui.”

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Para os próximos anos, ele defende a monetização dos conteúdos jornalísticos em plataformas digitais, algo discutido mundialmente, e procedimentos oficiais que possam dar uma chancela aos materiais produzidos pela imprensa profissional, como uma marca d’água, que está sendo testada no exterior.

“Essa chancela é o que nos diferencia de um blogueiro qualquer, que não tem nada a perder quando publica algo falso. O Estadão tem 150 anos de credibilidade a perder, isso é muito importante”, afirma Alcântara. “Muito do que nos trouxe até aqui é o que vai nos levar adiante.”

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