A repentina morte de Pixinguinha por um ataque cardíaco, em 17 de fevereiro de 1973, dentro da sacristia de uma igreja em Ipanema, pegou o país de surpresa. Pixinguinha chegou com uma hora de antecedência à igreja Nossa Senhora da Paz onde participaria de um batismo. Ele seria padrinho pela primeira vez na vida. Porém, pouco antes de começar a cerimônia, o artista começou a passar mal.
A reportagem do Estadão de 18 de fevereiro de 1973 relatou os últimos momentos de vida do músico que tinha 75 anos, “providenciaram uma cadeira e alguém foi buscar um copo de água, que Pixinguinha não chegou a tomar. Quando o médico (…) chegou, já o encontrou morto”.
Após a morte de um dos maiores e originais músicos do País aos 75 anos, toda a imprensa se mobilizou para contar a história desse gênio.
Além de cobrir o enterro, o Estadão foi até o ‘escritório de Pixinguinha’, o bar Uisqueria Gouvea, no centro do Rio de Janeiro. Lá estavam os amigos realizando homenagem ao músico. No horário que Pixinguinha costumava sair do bar, lá pelas 14 horas, eles fizeram um brinde ao som de ‘Carinhoso’ e ‘chorando foram andando até a porta, obedecendo ao mesmo ritual de todos os dias quando Pixinguinha se despedia para ir embora’, relatou o Estadão na edição de 20 de fevereiro.
Escritório do Pixinguinha
O bar, que teve seu primeiro endereço na Travessa do Ouvidor, era central na vida de Pixinguinha. Ele começou a frequentá-lo em 1953 e ia frequentemente, de segunda a sexta, no mesmo horário. O músico costumava chegar entre às 10 horas e saia às 14 horas. Lá, além de encontrar amigos, Pixinguinha trabalhava compondo músicas e exercia o cargo de presidente de honra do time “Gouvea Copo e Bar”.
Foi do bar do Gouvea que, em 1968, uma comissão de deputados fluminenses foi buscá-lo para para acompanhá-lo à Assembleia Legislativa onde foi homenageado com uma sessão especial pelos seus 70 anos.
Pixinguinha frequentou o bar até o dia anterior de sua morte, ‘o mestre esteve aqui na sexta-feira, uma dia antes de morrer, e contou que estava fazendo uma música para Elizeth Cardoso gravar. Para ele, os melhores interpretes de suas músicas eram Elizeth e Orlando Silva’, declarou ao Jornal da Tarde o professor de violão e amigo do músico, Waldemar Aureliano.
Cadeira cativa
Por causa da frequência, o músico ganhou cadeira cativa no bar. Daquele dia em diante só ele podia ocupar aquele espaço. Isso aconteceu em 1963, quando completou 10 anos de casa. Também recebeu em homenagem uma placa de ouro, fixada na parede ao lado da mesa, lembrando o evento. Naquela mesa, Pixinguinha dividia com muitos amigos, alguns bem conhecidos, como Di Cavalcanti, Elizeth Cardoso e Dilermando Reis.
No dia seguinte à sua morte a cadeira cativa se tornou perpétua. Foi colocado uma tarja preta na sua cadeira e cinco rosas vermelhas em seu copo, que tinha seu nome impresso. Também na parede foi colocada a bandeira do time do bar.
Desse dia em diante, naquela cadeira ninguém mais se sentou e mais nada foi posto sobre a mesa.
Mudança de endereço
Depois de funcionar por mais de 30 anos na Travessa do Ouvidor, uma viela no centro do Rio de Janeiro, o bar se mudou logo depois da morte de Pixinguinha, em agosto de 1975. Ele foi para para a sobreloja na Galeria dos Empregados do Comércio localizada na Avenida Rio Branco, também no centro da cidade. A mesa, a cadeira, o copo, o chapéu e a placa de prata foram juntos para o novo endereço.
Leilão
O Acervo Estadão entrou em contato com a administração da Galeria dos Empregados do Comércio e não conseguiu a informação de quando foi fechado. Mas da mesa há uma pista de seu paradeiro. No dia seguinte à morte de Pixinguinha, quando os jornalistas foram ao bar, Guilherme Coelho Filho, o dono do Gouvea, foi questionado qual seria o destino dos objetos.
Segundo publicado no Diário de Notícias de 20 de fevereiro, ele colocaria em leilão ou doaria para um museu: ‘se mais tarde aparecer qualquer negócio que me obrigue a vender o bar, colocarei em leilão todos esses objetos usados por Pixinguinha, e o apurado será entregue em benefício do asilo dos velinhos. Caso contrário, poderá ir para um museu’.
Segundo indica, a primeira opção do Coelho filho se concretizou. Em um anúncio do Jornal do Commercio, de 31 de agosto de 1977, a valiosa mesa aparece perdida entre os 192 itens de um leilão de “Conteúdo de Orfanato” como a “Mesa do Bar Gouveia (Pixinguinha)”.
Estátua
Daí em diante, o destino dos objetos de Pixinguinha que o relacionavam ao bar é um mistério. Dessa relação, até o momento, só ficou uma homenagem erguida em 1996, no dia em que o músico completaria 99 anos.
Na Travessa do Ouvidor, onde fora a primeira sede do bar, foi inaugurada uma estátua do músico, como também um painel na parede onde era localizado o bar retratando uma cena com vários músicos que o frequentavam.
A homenagem foi uma iniciativa da Associação dos Amigos da Travessa do Ouvidor (ATO) e a obra em bronze foi feita pelo escultor Otto Dumovich.
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