Imprevisível, impetuoso, incontrolável, rebelde, magnetizante, monumental, ímpar; a lenda do cinema, Marlon Brando [3/4/1924 - 1/7/20004], foi também uma incógnita para a Hollywood que produzia astros e estrelas enquadrados sob medida para agradar ao público e faturar alto nas bilheterias.
Dias após Brando receber seu primeiro Oscar de Melhor Ator em 1955, por Sindicato dos Ladrões (1954) de Elia Kazan, o Estadão publicou uma entrevista com o jovem ator em meteórica ascensão. Enquanto a entrevistadora buscava um vislumbre do astro, nem mesmo ele parecia conhecer seu enigma. ”Não sei o que se passa comigo”, declarou logo no início.
“(…) É possível que todos me achem esquisito pelo fato de eu fazer o que bem entendo(...) É possível, porém, que eu esteja apenas fazendo o que todos gostariam de fazer, mas não podem, ou não fazem por medo ou por outras razões. Durante toda a minha vida tenho feito o que desejo fazer e tenho dito o que quero dizer. Por que não? Que adianta fingir?(...) Quando sou Brando, digo o que penso...” Na mesma entrevista, o artista também falou sobre a relação com o público o respeito com seus fãs e sua fama ser anti-social e um temperamental difícil.
Na época, ele já era apontado como o melhor intérprete dramático de sua geração, havia participado de produções como Uma Rua Chamada Pecado (1951), Viva Zapata! (1952), O Selvagem (1953) e Júlio César (1953), em todas teve sua talentosa atuação exaltada. Saído do famoso Actors Studio de Nova York, Brando mergulhou no método de atuação de Stanislavski para levar à telas um estilo cênico eletrizante que fascinava público e crítica.
Brando e o Oscar recusado
Foi indicado oito vezes ao Oscar, ganhou duas. O segundo prêmio veio em 1973, por sua interpretação no clássico de Francis Ford Coppola, O Poderoso Chefão (1972) . O ator boicotou a cerimônia e declinou o Oscar de Melhor Ator. Mandou em seu lugar a ativista pelo direitos dos povos nativo americanos, Sacheen Littlefeather, que usou o tempo reservado ao que deveria ser o discurso de agradecimento de Brando para falar de sua causa.
Último Tango
Censurado no Brasil desde o seu lançamento no exterior em 1972, o filme ‘O Último Tango em Paris’ chegou às telas brasileiras no final de 1979, quando o País vivia o período de abertura da ditadura militar e a censura afrouxava os seus critérios de liberação de obras antes consideradas subversivas ou imorais.
Estrelado por Marlon Brando e Maria Schneider e dirigido por Bernardo Bertolucci, o filme causou furor desde as suas primeiras exibições nos Estados Unidos e Europa, em 1972, e a estreia comercial, no ano seguinte. motivo eram as cenas de sexo entre o casal protagonista, que entrariam para a história do cinema. Anos depois, o filme voltaria a chocar com a revelação de Bertolucci que Maria Schneider não sabia previamente dos detalhes da cena e foi estuprada por Brando para dar mais realidade ao filme.
Na véspera da estreia brasileira, o crítico Rubens Ewald Filho analisou o filme, o impacto da sua proibição e do tempo decorrido que fez com que já não fosse mais tão chocante quanto antes. Sob o título ‘Um mito, verdadeira obra de arte’, Rubens escreveu:
“Sete anos depois, o que o espectador brasileiro vai assistir não é um mero filme, mas um mito. E não haverá maneira de, diante de tamanha expectativa, se evitar o desapontamento. Não, “O Último Tango em Paris” não é um filme erótico, Ao contrário, não havia motivo para ele não ter sido liberado antes, já que mesmo suas duas famosas cenas de sexo: a sodomia com a manteiga e flagelação do personagem masculino com uma massagem na próstata, são na verdade cenas de violência, de sado-masoquismo (e devem, sem dúvida ter influenciado “O Porteiro da Noite”) (...)
(...) Muito mais chocante do que as cenas de sexo é o desnudamento psicológico dos protagonistas. ‘O Último Tango’ traz indiscutivelmente a melhor interpretação da carreira de Marlon Brando, na época com 48 anos. Sua entrega ao filme é total...”
Apocalipse Now
Mais uma vez dirigido por Francis Ford Coppola, o astro incorpora a insanidade da Guerra do Vietnã em um dos seus memoráveis personagens, o enlouquecido Coronel Kurtz no clássico Apocalipse Now, lançado em 1979, e considerado a sua última grande atuação no cinema.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.