O Código Eleitoral de 1932, instituído por decreto por Getúlio Vargas em 24 de fevereiro daquele ano, é reconhecido como um avanço para a democratização do voto no Brasil. Foi o primeiro código eleitoral do País e , por meio dele, o direito ao voto foi estendido às mulheres, a Justiça Eleitoral foi criada, o sistema de votação proporcional e o voto secreto foram adotados. No entanto, mesmo com as mudanças implementadas pelo código, o caminho para uma democracia inclusiva não estava assegurado.
Sua sanção aconteceu num contexto de instabilidade política, onde grupos disputavam por influência e poder dentro de um regime ainda em formação. O governo, que tocava adiante avanços como os contidos no próprio Código de 1932, era autoritário e apesar de ter chegado ao poder por meio da Revolução de 1930 - um movimento com ideais reformista e democratizadores - passava a cada vez mais poderes ao Executivo. Tanto é que, em julho do mesmo ano, a Revolução Constitucionalista se levantou em São Paulo demandando uma nova Assembleia Constituinte, eleições e o fim do governo provisório.
Navegar pelos jornais desse período através do Acervo Estadão ajudam a entender o cenário em que o decreto foi instaurado. As matérias do período mostram, por exemplo, como se organizaram as mobilizações pelo voto secreto e pelo voto feminino, pautas existentes desde os primeiros anos da República, mas que começam a se estruturar com mais força na década de 1920.
Em 1922, uma década antes do código eleitoral ser decretado, dois fatos dialogam com esse processo, a criação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino - que encampa a luta pelo sufrágio das mulheres - e a Revolta dos 18 do Forte, o primeiro levante tenentista, movimento que tinha entre suas bandeiras o fim do voto aberto.
No Estadão de 05 de janeiro de 1932 é possível ver a pressão da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino para que código garantisse o voto às mulheres de forma mais ampla que as analisadas no anteprojeto de alistamento eleitoral. > Estadão - 05/01/1932
Em comunicação enviada à Getúlio Vargas, e demais autoridades , a organização argumentava que o artigo referente ao voto feminino deveria ser redigido assim: “É eleitor, sem distincção de sexo, todo o cidadão que tenha economia própria, de 21 annos ou emancipado, nos termos da lei civil e que não incorrendo em nenhuma das prohibições do artigo 11, se achar alistado no registro civil nacional”
Na redação final do código, o 2º Artigo, que garante esse direto, diz:" (...) Art. 2º E' eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na fórma deste Codigo (...)"
Mas, não só a luta pelo direito ao voto mobilizava a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. A organização se fez presente em outras frentes reformadoras durante o governo provisório, como nas negociação com o Ministério do Trabalho criado logo após a revolução. Uma notícia de 09 de agosto de 1931 contava que o grupo havia enviado uma comissão ao Ministério para expor algumas demandas, entre elas: “que a applicação de pagamentos estivesse de accôrdo com o trabalho realizado e não com o sexo do trabalhador.”> Estadão - 09/8/1931
Outra demanda, era para que se desenvolvessem meios para: “custear a ausencia da mulher operaria e empregada de comercio no seu trabalho, sem perda de vencimentos durante o ultimo mez de gestação e primeiro subsequente (...)”
O texto segue contando que a Federação também solicitou que a futura legislação do trabalho “não permitisse a demissão da mulher que trabalha, pelo facto de casar-se”, podendo “competir a ella resolver o assumpto, uma vez que a mãe de filhos pequenos, que trabalha, o faz para ganhar-lhes o pão.”
Voto secreto e mulheres vão às urnas. A primeira eleição em que o voto feminino foi exercido em âmbito nacional aconteceu em 03 de maio de 1933. No mesmo pleito, o voto secreto foi adotado, também, pela primeira vez. A votação elegeu os membros da Assembleia Constituinte, o colegiado responsável pela redação da Constituição de 1934.
Dois dias após a eleição, em editorial de 05 de maio de 1933, o Estadão comemorava a adoção do voto secreto no País: “A affluencia de eleitores às urnas e a ordem em que o pleito correu demonstram perfeitamente que uma das necessidades vitaes da república era uma lei que garantisse a moralidade das eleições. A prova está feita. Tem ahi os eleitores justificação plena da campanha em que, durante longos annos, nos empenhámos afim de conseguir, para o Brasil, essa coisa elementar em todas as democracias, que é a verdade da representação. A experiência da outros povos e a observação do que se passava em nossa terra convenceram-nos de que o único processo eleitoral condições de alcançar esse objectivo era do d0 voto secreto (...)”
A presença feminina na votação foi outro tema abordado pelo noticiário que acompanhou o movimento dos eleitores nas seções. A presença de eleitoras na seção do bairro carioca do Méier foi destaca numa nota de 04 de maio de 1933: “ (…) A votação feminina muito grande, notadamente no Meyer, que se considerava esta tarde como o quartel general do eleitorado feminino. Alli as mulheres formavam numero apreciável entre a massa dos votantes (...)”
A primeira mulher constituinte foi eleita na votação de 1933, a médica paulista Carlota Pereira de Queiroz.
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