Piadas e defesas emotivas da contratação de parentes marcaram o início das discussões contra o nepotismo em cargos públicos há duas décadas. Normas de conduta que hoje regem contratações dentro das regras de impessoalidade e moralidade no serviço público eram tratadas com chacota pelos parlamentares, quando uma das primeiras propostas de supressão do nepotismo chegou ao Congresso durante a discussão da Reforma do Judiciário em 2000.Leia também:>Improbidade: Bolsonaro defendeu nepotismo quando era deputado
O texto da reforma, de autoria da deputada Zulaiê Cobra (na época PSDB-SP), continha um dispositivo que proibia a nomeação para cargos em comissão de cônjuges, companheiros ou parentes até 3º grau de membros dos três poderes da União, Estados e municípios, de detentores de mandato eletivo e de ocupantes de cargos políticos.> Estadão- 9/2/2000
O artigo gerou acalorado debate no Legislativo, como mostrou a cobertura do Estadão. Enquanto a relatora defendia sua aprovação declarando não se tratar de uma questão “jurídica ou legal, mas de moral” e aproveitava paradenunciar como colegas contrários tratavam a proposta como piada, e perguntavam jocosamente “ex-cunhado é parente ou não é, deputada?”; deputados defendiam a contratação por consanguinidade.> Estadão - 16/3/2000
O deputado Themístocles Sampaio (PMDB- PI), com trêsfilhos e um neto na folha da Câmara, chegou a afirmar abertamente “sou pelo nepotismo”, “empregarei os meus parentes enquanto puder. Se eu puder amparar minha família toda, eu a ampararei”.Após adiar sua votação, o então presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB- SP) tratava o artigo, como derrotado e propunha alternativa mais palatável aos deputados, como um nepotismo com restrições “um ou dois parentes”.
Parentes não são monstros - Em 15 de março de 2000, a emenda constitucional contra empregar familiares foi derrubada em votação na Câmara. Apesar de obter 286 votos favoráveis e 153 contra, faltaram 22 votos para alcançar os os 3/5 dos votos, o número mínimo necessário à sua manutenção. Como mostrou matéria do Estadão a derrubada do artigo foi celebrada pelos parlamentares, com direito ao discurso inusitado de Gerson Peres (PPB-PA), deputado autor do destaque que derrubou e emenda; “Parentes são criaturas humanas e indefesas, e não estes monstros que estão querendo pintar”. Um mês antes da votação o deputado já havia defendido a indicação de parentes para cargos públicos: “é função de um pai ajudar os filhos. Ai do pai que não os ajude! Se fosse assim, era melhor que os filhos não tivessem nem nascido”, chegou a dizer. Na época, Peres empregava duas filhas em seu gabinete. Segundo levantamento extra-oficial da Secretaria Geral da Mesa da Câmara de 2000, cerca de 60% dos parlamentares mantinham parentes como funcionários.