Ditadura militar censurou notícias sobre epidemia de meningite em 1974


Censura proibiu divulgar número de casos, mortes e a demora na chegada da vacina

Por Edmundo Leite
Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

Ocultar, dificultar e proibir a divulgação de informações sobre a epidemia de uma doença que se alastra pelo País já foi uma prática do governo brasileiro durante a ditadura militar nos anos 70. Sob a alegação de risco à segurança nacional, a censura que já riscava forte nas páginas do noticiário político passou também a aplicar a caneta com mais rigor nas notícias sobre um surto de meningite no Brasil em 1974. No final daquele ano, quando o País estava sob o governo de Ernesto Geisel, a epidemia de meningite já contava 25 mil casos e 1.796 mortes somente na Grande São Paulo. 

Várias notícias sobre a epidemia de meningite foram proibidas por censores que iam diariamente à sede do jornal desde meados de 1972 verificar com antecedência as provas das páginas do dia seguinte. No Estadão, as notícias censuradas passaram a ser substituídas por poemas de Camões ou calhaus, como eram chamados os anúncios publicitários do próprio jornal.

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> Estadão - 27/7/1974 | censurada | publicada 

Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

A epidemia do silêncio - Um dos textos mais emblemáticos vetados, de autoria do chefe-de-reportagem Clóvis Rossi, analisava justamente a falta de transparência das autoridades sobre os números da epidademia de meningite. "O surto de meningite que matou mais de 200 pessoas em São Paulo só neste mês de julho não é lamentável apenas por suas consequências ou por revelar dramaticamente a precariedade do sistema de Saúde Pública do Estado que se orgulha de ser o mais rico da Federação. Talvez ainda pior do que tudo isso seja o fato de que, com ele, atingiu o seu ponto mais alto também a epidemia de desinformação e ocultamento de fatos que as administrações públicas, a todos os níveis, resolveram desencadear faz já algum tempo.

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Desde que, há dois anos aproximadamente, começaram a aumentar em ritmo alarmante os casos de meningite em São Paulo, as autoridades cuidaram de ocultar fatos, negar informações, reduzir os números referentes à doença a proporções incompatíveis com a realidade — ou seja, levando, deliberadamente, a desinformação à população e abrindo caminho para que boatos ocupassem rapidamente o lugar que deveria ser preenchido per fatos. Fatos que as autoridades tinham a obrigação, por todos os títulos de esclarecer ampla e totalmente." [leia a íntegra]

Número de casos e mortes censurados - As notícias proibidas iam desde o número de casos em diversas localidades a estudos sobre a vacina. Um quadro com estatísticas do surto também foi proibido em 30 de julho daquele ano. Numa página do dia 27 de julho, todas as informações sobre mortes foram retalhadas pela caneta do censor, como a notícia 'Paraná registra mais de mil casos e 110 mortes.'

Outra notícia que informava que um lote de 500 mil vacinas do tipo C encomendadas da França só chegariam em agosto e que as vindas dos Estados Unidos não tinham data para chegar também foi proibida. Um outro trecho vetado falava sobre o medo dos profissionais de saúde serem contaminados: "Enquanto isso, em Porto Alegre, os primeiros casos de descontrole já começaram a aparecer. Funcionários do Hopistal Santo Antonio, que recebe diariamente 50 pessoas com sintoma de meningite, estão com receio de contaminação pelo contato direto com os doentes".

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.Estadão 26/7/1974 | censurada | publicada

Página de 26/7/1974com texto de Clóvis Rossi censurado pela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão

No dia seguinte, o destaque entre as notícias censuradas era sobre a própria proibição da publicação de dados. Com o título 'Governador proíbe informações', o texto descrevia que "o governador Laudo Natel descobriu um modo de diminuir a incidência de casos de meningite em São Paulo: proibiu toda a rede hospitalar estadual de dar informações à imprensa sobre a epidemia. Mas, mesmo sem a proibição do governador, seria difícil conseguir um balanço da situação atual ontem à tarde: os diretores e superintendentes dos hospitais entraram subitamente de folga, apesar da epidemia, e levaram consigo os dados estatísticos da doença na Capital."

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Quadrinhos e Camões - A proibição continuaria em agosto e se estenderia até dezembro, quando um texto do corresponde do jornal em Paris, Reali Jr., relatava que a epidemia de meningite brasileira se transformou em quadrinhos na França: "A revista infantil de maior circulação no país, "Pif", publicação das Edições Vaillant, apresenta periodicamente as aventuras do dr. Justiça, um misto de médico e judoca, chamado ao Brasil para colaborar na aplicação da vacina francesa em São Paulo e no Paraná, onde o surto apresentava maior gravidade". O texto de Reali seria substituído pelo Canto Terceiro, de Os Lusíadas de Camões.

A estratégia de substituição das notícias censuradas por versos era mencionada no final do já citado artigo proibido de Rossi, que lembrava que aquele governo chefiado por um militar prometera justamente 'jogar o jogo da verdade': "O mais triste de tudo isso é que esse clima de desinformação intensificou-se justamente quando se prometeu jogar o "jogo da verdade". Hoje, o que se pode ter é apenas um lado da verdade: o lado oficial, asséptico, geralmente otimista, ufanista o mais das vezes. Quem não aceita só esse lado, que leia poesias.

Veja seleção de páginas censuradas e leia a íntegra do texto "A epidemia do silêncio"

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> Estadão - 30/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 30/7/1974 Foto: Acervo Estadão
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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 6/12/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 06/12/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 6/12/1974 Foto: Acerco Estadão

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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

.> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão 27/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 14/8/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 31/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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Página compoema de Camões no lugar de texto de Clóvis Rossi censuradopela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão
Texto deClóvis Rossi censurado pela ditadura militarem 26/7/1974. Foto: Acervo Estadão

Veja também:

> Páginas censuradas na ditadura militar

> Outras notícias históricas

> Todas as edições > Censuradas  > Tópicos  > Pessoas  > Lugares  > Capas históricas

Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

Ocultar, dificultar e proibir a divulgação de informações sobre a epidemia de uma doença que se alastra pelo País já foi uma prática do governo brasileiro durante a ditadura militar nos anos 70. Sob a alegação de risco à segurança nacional, a censura que já riscava forte nas páginas do noticiário político passou também a aplicar a caneta com mais rigor nas notícias sobre um surto de meningite no Brasil em 1974. No final daquele ano, quando o País estava sob o governo de Ernesto Geisel, a epidemia de meningite já contava 25 mil casos e 1.796 mortes somente na Grande São Paulo. 

Várias notícias sobre a epidemia de meningite foram proibidas por censores que iam diariamente à sede do jornal desde meados de 1972 verificar com antecedência as provas das páginas do dia seguinte. No Estadão, as notícias censuradas passaram a ser substituídas por poemas de Camões ou calhaus, como eram chamados os anúncios publicitários do próprio jornal.

> Estadão - 27/7/1974 | censurada | publicada 

Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

A epidemia do silêncio - Um dos textos mais emblemáticos vetados, de autoria do chefe-de-reportagem Clóvis Rossi, analisava justamente a falta de transparência das autoridades sobre os números da epidademia de meningite. "O surto de meningite que matou mais de 200 pessoas em São Paulo só neste mês de julho não é lamentável apenas por suas consequências ou por revelar dramaticamente a precariedade do sistema de Saúde Pública do Estado que se orgulha de ser o mais rico da Federação. Talvez ainda pior do que tudo isso seja o fato de que, com ele, atingiu o seu ponto mais alto também a epidemia de desinformação e ocultamento de fatos que as administrações públicas, a todos os níveis, resolveram desencadear faz já algum tempo.

Desde que, há dois anos aproximadamente, começaram a aumentar em ritmo alarmante os casos de meningite em São Paulo, as autoridades cuidaram de ocultar fatos, negar informações, reduzir os números referentes à doença a proporções incompatíveis com a realidade — ou seja, levando, deliberadamente, a desinformação à população e abrindo caminho para que boatos ocupassem rapidamente o lugar que deveria ser preenchido per fatos. Fatos que as autoridades tinham a obrigação, por todos os títulos de esclarecer ampla e totalmente." [leia a íntegra]

Número de casos e mortes censurados - As notícias proibidas iam desde o número de casos em diversas localidades a estudos sobre a vacina. Um quadro com estatísticas do surto também foi proibido em 30 de julho daquele ano. Numa página do dia 27 de julho, todas as informações sobre mortes foram retalhadas pela caneta do censor, como a notícia 'Paraná registra mais de mil casos e 110 mortes.'

Outra notícia que informava que um lote de 500 mil vacinas do tipo C encomendadas da França só chegariam em agosto e que as vindas dos Estados Unidos não tinham data para chegar também foi proibida. Um outro trecho vetado falava sobre o medo dos profissionais de saúde serem contaminados: "Enquanto isso, em Porto Alegre, os primeiros casos de descontrole já começaram a aparecer. Funcionários do Hopistal Santo Antonio, que recebe diariamente 50 pessoas com sintoma de meningite, estão com receio de contaminação pelo contato direto com os doentes".

.Estadão 26/7/1974 | censurada | publicada

Página de 26/7/1974com texto de Clóvis Rossi censurado pela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão

No dia seguinte, o destaque entre as notícias censuradas era sobre a própria proibição da publicação de dados. Com o título 'Governador proíbe informações', o texto descrevia que "o governador Laudo Natel descobriu um modo de diminuir a incidência de casos de meningite em São Paulo: proibiu toda a rede hospitalar estadual de dar informações à imprensa sobre a epidemia. Mas, mesmo sem a proibição do governador, seria difícil conseguir um balanço da situação atual ontem à tarde: os diretores e superintendentes dos hospitais entraram subitamente de folga, apesar da epidemia, e levaram consigo os dados estatísticos da doença na Capital."

Quadrinhos e Camões - A proibição continuaria em agosto e se estenderia até dezembro, quando um texto do corresponde do jornal em Paris, Reali Jr., relatava que a epidemia de meningite brasileira se transformou em quadrinhos na França: "A revista infantil de maior circulação no país, "Pif", publicação das Edições Vaillant, apresenta periodicamente as aventuras do dr. Justiça, um misto de médico e judoca, chamado ao Brasil para colaborar na aplicação da vacina francesa em São Paulo e no Paraná, onde o surto apresentava maior gravidade". O texto de Reali seria substituído pelo Canto Terceiro, de Os Lusíadas de Camões.

A estratégia de substituição das notícias censuradas por versos era mencionada no final do já citado artigo proibido de Rossi, que lembrava que aquele governo chefiado por um militar prometera justamente 'jogar o jogo da verdade': "O mais triste de tudo isso é que esse clima de desinformação intensificou-se justamente quando se prometeu jogar o "jogo da verdade". Hoje, o que se pode ter é apenas um lado da verdade: o lado oficial, asséptico, geralmente otimista, ufanista o mais das vezes. Quem não aceita só esse lado, que leia poesias.

Veja seleção de páginas censuradas e leia a íntegra do texto "A epidemia do silêncio"

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Página censuradade 30/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 6/12/1974 | censurada | publicada

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Página censuradade 6/12/1974 Foto: Acerco Estadão

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Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão 27/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 14/8/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 31/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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Página compoema de Camões no lugar de texto de Clóvis Rossi censuradopela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão
Texto deClóvis Rossi censurado pela ditadura militarem 26/7/1974. Foto: Acervo Estadão

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Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

Ocultar, dificultar e proibir a divulgação de informações sobre a epidemia de uma doença que se alastra pelo País já foi uma prática do governo brasileiro durante a ditadura militar nos anos 70. Sob a alegação de risco à segurança nacional, a censura que já riscava forte nas páginas do noticiário político passou também a aplicar a caneta com mais rigor nas notícias sobre um surto de meningite no Brasil em 1974. No final daquele ano, quando o País estava sob o governo de Ernesto Geisel, a epidemia de meningite já contava 25 mil casos e 1.796 mortes somente na Grande São Paulo. 

Várias notícias sobre a epidemia de meningite foram proibidas por censores que iam diariamente à sede do jornal desde meados de 1972 verificar com antecedência as provas das páginas do dia seguinte. No Estadão, as notícias censuradas passaram a ser substituídas por poemas de Camões ou calhaus, como eram chamados os anúncios publicitários do próprio jornal.

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A epidemia do silêncio - Um dos textos mais emblemáticos vetados, de autoria do chefe-de-reportagem Clóvis Rossi, analisava justamente a falta de transparência das autoridades sobre os números da epidademia de meningite. "O surto de meningite que matou mais de 200 pessoas em São Paulo só neste mês de julho não é lamentável apenas por suas consequências ou por revelar dramaticamente a precariedade do sistema de Saúde Pública do Estado que se orgulha de ser o mais rico da Federação. Talvez ainda pior do que tudo isso seja o fato de que, com ele, atingiu o seu ponto mais alto também a epidemia de desinformação e ocultamento de fatos que as administrações públicas, a todos os níveis, resolveram desencadear faz já algum tempo.

Desde que, há dois anos aproximadamente, começaram a aumentar em ritmo alarmante os casos de meningite em São Paulo, as autoridades cuidaram de ocultar fatos, negar informações, reduzir os números referentes à doença a proporções incompatíveis com a realidade — ou seja, levando, deliberadamente, a desinformação à população e abrindo caminho para que boatos ocupassem rapidamente o lugar que deveria ser preenchido per fatos. Fatos que as autoridades tinham a obrigação, por todos os títulos de esclarecer ampla e totalmente." [leia a íntegra]

Número de casos e mortes censurados - As notícias proibidas iam desde o número de casos em diversas localidades a estudos sobre a vacina. Um quadro com estatísticas do surto também foi proibido em 30 de julho daquele ano. Numa página do dia 27 de julho, todas as informações sobre mortes foram retalhadas pela caneta do censor, como a notícia 'Paraná registra mais de mil casos e 110 mortes.'

Outra notícia que informava que um lote de 500 mil vacinas do tipo C encomendadas da França só chegariam em agosto e que as vindas dos Estados Unidos não tinham data para chegar também foi proibida. Um outro trecho vetado falava sobre o medo dos profissionais de saúde serem contaminados: "Enquanto isso, em Porto Alegre, os primeiros casos de descontrole já começaram a aparecer. Funcionários do Hopistal Santo Antonio, que recebe diariamente 50 pessoas com sintoma de meningite, estão com receio de contaminação pelo contato direto com os doentes".

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Página de 26/7/1974com texto de Clóvis Rossi censurado pela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão

No dia seguinte, o destaque entre as notícias censuradas era sobre a própria proibição da publicação de dados. Com o título 'Governador proíbe informações', o texto descrevia que "o governador Laudo Natel descobriu um modo de diminuir a incidência de casos de meningite em São Paulo: proibiu toda a rede hospitalar estadual de dar informações à imprensa sobre a epidemia. Mas, mesmo sem a proibição do governador, seria difícil conseguir um balanço da situação atual ontem à tarde: os diretores e superintendentes dos hospitais entraram subitamente de folga, apesar da epidemia, e levaram consigo os dados estatísticos da doença na Capital."

Quadrinhos e Camões - A proibição continuaria em agosto e se estenderia até dezembro, quando um texto do corresponde do jornal em Paris, Reali Jr., relatava que a epidemia de meningite brasileira se transformou em quadrinhos na França: "A revista infantil de maior circulação no país, "Pif", publicação das Edições Vaillant, apresenta periodicamente as aventuras do dr. Justiça, um misto de médico e judoca, chamado ao Brasil para colaborar na aplicação da vacina francesa em São Paulo e no Paraná, onde o surto apresentava maior gravidade". O texto de Reali seria substituído pelo Canto Terceiro, de Os Lusíadas de Camões.

A estratégia de substituição das notícias censuradas por versos era mencionada no final do já citado artigo proibido de Rossi, que lembrava que aquele governo chefiado por um militar prometera justamente 'jogar o jogo da verdade': "O mais triste de tudo isso é que esse clima de desinformação intensificou-se justamente quando se prometeu jogar o "jogo da verdade". Hoje, o que se pode ter é apenas um lado da verdade: o lado oficial, asséptico, geralmente otimista, ufanista o mais das vezes. Quem não aceita só esse lado, que leia poesias.

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Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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Página censuradade 06/12/1974 Foto: Acervo Estadão
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Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
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Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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> Estadão - 28/7/1974 | censurada | publicada

Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 14/8/1974 Foto: Acervo Estadão
Página censuradade 31/7/1974 Foto: Acervo Estadão

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Texto deClóvis Rossi censurado pela ditadura militarem 26/7/1974. Foto: Acervo Estadão

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Página censuradade 27/7/1974 Foto: Acervo Estadão

Ocultar, dificultar e proibir a divulgação de informações sobre a epidemia de uma doença que se alastra pelo País já foi uma prática do governo brasileiro durante a ditadura militar nos anos 70. Sob a alegação de risco à segurança nacional, a censura que já riscava forte nas páginas do noticiário político passou também a aplicar a caneta com mais rigor nas notícias sobre um surto de meningite no Brasil em 1974. No final daquele ano, quando o País estava sob o governo de Ernesto Geisel, a epidemia de meningite já contava 25 mil casos e 1.796 mortes somente na Grande São Paulo. 

Várias notícias sobre a epidemia de meningite foram proibidas por censores que iam diariamente à sede do jornal desde meados de 1972 verificar com antecedência as provas das páginas do dia seguinte. No Estadão, as notícias censuradas passaram a ser substituídas por poemas de Camões ou calhaus, como eram chamados os anúncios publicitários do próprio jornal.

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A epidemia do silêncio - Um dos textos mais emblemáticos vetados, de autoria do chefe-de-reportagem Clóvis Rossi, analisava justamente a falta de transparência das autoridades sobre os números da epidademia de meningite. "O surto de meningite que matou mais de 200 pessoas em São Paulo só neste mês de julho não é lamentável apenas por suas consequências ou por revelar dramaticamente a precariedade do sistema de Saúde Pública do Estado que se orgulha de ser o mais rico da Federação. Talvez ainda pior do que tudo isso seja o fato de que, com ele, atingiu o seu ponto mais alto também a epidemia de desinformação e ocultamento de fatos que as administrações públicas, a todos os níveis, resolveram desencadear faz já algum tempo.

Desde que, há dois anos aproximadamente, começaram a aumentar em ritmo alarmante os casos de meningite em São Paulo, as autoridades cuidaram de ocultar fatos, negar informações, reduzir os números referentes à doença a proporções incompatíveis com a realidade — ou seja, levando, deliberadamente, a desinformação à população e abrindo caminho para que boatos ocupassem rapidamente o lugar que deveria ser preenchido per fatos. Fatos que as autoridades tinham a obrigação, por todos os títulos de esclarecer ampla e totalmente." [leia a íntegra]

Número de casos e mortes censurados - As notícias proibidas iam desde o número de casos em diversas localidades a estudos sobre a vacina. Um quadro com estatísticas do surto também foi proibido em 30 de julho daquele ano. Numa página do dia 27 de julho, todas as informações sobre mortes foram retalhadas pela caneta do censor, como a notícia 'Paraná registra mais de mil casos e 110 mortes.'

Outra notícia que informava que um lote de 500 mil vacinas do tipo C encomendadas da França só chegariam em agosto e que as vindas dos Estados Unidos não tinham data para chegar também foi proibida. Um outro trecho vetado falava sobre o medo dos profissionais de saúde serem contaminados: "Enquanto isso, em Porto Alegre, os primeiros casos de descontrole já começaram a aparecer. Funcionários do Hopistal Santo Antonio, que recebe diariamente 50 pessoas com sintoma de meningite, estão com receio de contaminação pelo contato direto com os doentes".

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No dia seguinte, o destaque entre as notícias censuradas era sobre a própria proibição da publicação de dados. Com o título 'Governador proíbe informações', o texto descrevia que "o governador Laudo Natel descobriu um modo de diminuir a incidência de casos de meningite em São Paulo: proibiu toda a rede hospitalar estadual de dar informações à imprensa sobre a epidemia. Mas, mesmo sem a proibição do governador, seria difícil conseguir um balanço da situação atual ontem à tarde: os diretores e superintendentes dos hospitais entraram subitamente de folga, apesar da epidemia, e levaram consigo os dados estatísticos da doença na Capital."

Quadrinhos e Camões - A proibição continuaria em agosto e se estenderia até dezembro, quando um texto do corresponde do jornal em Paris, Reali Jr., relatava que a epidemia de meningite brasileira se transformou em quadrinhos na França: "A revista infantil de maior circulação no país, "Pif", publicação das Edições Vaillant, apresenta periodicamente as aventuras do dr. Justiça, um misto de médico e judoca, chamado ao Brasil para colaborar na aplicação da vacina francesa em São Paulo e no Paraná, onde o surto apresentava maior gravidade". O texto de Reali seria substituído pelo Canto Terceiro, de Os Lusíadas de Camões.

A estratégia de substituição das notícias censuradas por versos era mencionada no final do já citado artigo proibido de Rossi, que lembrava que aquele governo chefiado por um militar prometera justamente 'jogar o jogo da verdade': "O mais triste de tudo isso é que esse clima de desinformação intensificou-se justamente quando se prometeu jogar o "jogo da verdade". Hoje, o que se pode ter é apenas um lado da verdade: o lado oficial, asséptico, geralmente otimista, ufanista o mais das vezes. Quem não aceita só esse lado, que leia poesias.

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Página censuradade 28/7/1974 Foto: Acervo Estadão
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Página compoema de Camões no lugar de texto de Clóvis Rossi censuradopela ditadura militar. Foto: Acervo Estadão
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