Paulo Maluf tocando um piano de cauda e sendo tietado no camarim, Eduardo Suplicy falando por quase 10 minutos sem parar, Orestes Quércia ovacionado como galã e Antonio Ermírio negando ser pão duro. Tudo isso em meio a apresentações musicais como a do grupo Dominó, dos comediantes Rony Cócegas e Nhá Barbina com smoking e vestido de noiva numa motoca, de um atirador de circo com uma arma e da eleição do Rei Brega. E, claro, com os gritos de “Viva a Noite!” do apresentador Gugu complementado euforicamente pela plateia: “Viva, Viva, Viva!”
Apesar do nome Viva a Noite, tudo isso aconteceu numa tarde de segunda-feira, em 21 de julho de 1986, quando foi gravado o programa número 200 da atração comandada por Gugu Liberato no SBT que era a segunda maior audiência da televisão brasileira nas noites de sábados.
Como tem coisas que só acontecem na emissora de Silvio Santos, o programa de Gugu conseguiu a façanha que nenhum outro canal tinha conseguido até então naquela campanha eleitoral: levar num mesmo dia ao seu show semanal os quatro políticos candidatos ao governo do Estado de São Paulo nas eleições daquele ano para um programa de TV, ainda que em momentos diferentes da atração de auditório.
Com os debates ainda tentando se estabelecer com um formato na televisão e os candidatos em busca de maior visibilidade e tempo de TV, Gugu apostou em fazer entrevistas separadas com os quatro, com cada um deles chegando ao estúdio na avenida Ataliba Leonel dentro de um carro como uma estrela de cinema e descendo no palco para ser recebido pelo apresentador.
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Gugu entrevista candidatos no Viva a Noite
O repórter Pedro Costa e o fotógrafo Juvenal Pereira acompanharam tudo e contaram e mostraram como foi o inusitado programa com a participação dos políticos na edição do dia seguinte do Estadão.
No Caderno 2 do jornal, a reportagem brincava com a fama de Maluf no título para dizer que ele foi a atração de maior sucesso: “Maluf rouba a festa”. “Ele rouba, mas faz”, já dizia, antes da gravação começar, o jurado e veterano comediante Roni Cócegas, cantando “Maluf é um avião, onde vê o piano vai logo metendo a mão”. [leia a íntegra da reportagem de 1986 mais abaixo]
Na página de política, sob o título “Quatro candidatos no mesmo programa” e uma foto de Maluf e Antonio Ermírio se cumprimentando na entrada, o texto informava que “apesar de algum cuidados tomados pela produção, alguns encontros foram inevitáveis”.
“Antonio Ermírio de Moraes ainda estava à porta quando Maluf chegou. “Olá Paulo, você está bom?” - cumprimentou Ermírio. “Estou bem, um abraço a você”, devolveu Maluf com a mão estendida”. Mal ele entrou no auditório, Ermírio puxou um lenço do bolso e, sem a menor cerimônia, limpou a mão que acabara de apertar a mão do pedessista.”
Um outro encontro não previsto de candidatos no programa foi parar no alto da primeira página do jornal, com Antonio Ermírio e Eduardo Suplicy fotografados cara a cara por Juvenal Pereira. Sob o título “Troca de elogios”, a legenda informava como foi a conversa:
“Antonio Ermírio, do PTB, encontra, Eduardo Suplicy, do PT, no auditório da TV-S, e lembra a primeira conversa que tiveram. “Percebi que você era um homem sincero”, elogiou. Mal virou as costas, Suplicy comenta: “Ele foi um empresário duro com os empregados, agora parece que mudou um pouco.”
Maluf rouba a festa
Foi durante uma gravação na TV. Ele fechou mais que Orestes, Ermírio e Suplicy
Pedro Costa
Cerca de 3,5 milhões de telespectadores assistirão neste sábado, às 21h30, pela TVS de São Paulo, ao deputado Paulo Salim Maluf tocar, ao piano, um prelúdio de Chopin (Opus 28), falar sobre seu casamento com d. Sylvia e, de quebra, discorrer sobre a adoção da pena de morte no Brasil.
Mais uma vez, o candidato da Unidade Popular (UP) ao governo paulista roubou a festa: foi durante a gravação do programa Viva a Noite, de Gugu Liberato, ontem à tarde, num velho teatro da avenida Ataliba Leonel, em Santana. Maluf conseguiu mais sucesso que os rebolados do travesti Telma Lippi, o canto chorado do Dominó, a eleição do Rei Brega e os discursos de seus três concorrentes: Eduardo Suplicy (PT), Antônio Ermírio (PTB) e Orestes Quércia (PMDB).
“Ele rouba, mas faz”, já dizia, antes da gravação começar, o jurado e veterano comediante Roni Cócegas, cantando “Maluf é um avião, onde vê o piano vai logo metendo a mão”.
Depois, entre holofotes, lantejoulas, o olhar das câmeras e o grito das “guguetes”, a produção do programa conseguiu o que até agora nenhum órgão de comunicação conseguiu: fazer com que os quatro candidatos, mesmo em momentos diferentes, aparecessem para falar de suas plataformas.
Tudo começou quando Gugu Liberato, de 27 anos, fez com que o programa n° 200 do Viva a Noite, que tem 18 pontos no Ibope aos sábados (só perde para os filmes da Globo), fosse comemorado com as visitas dos quatro candidatos. Conseguiu o que desejava. Numa animada gincana, os seis mil alunos dos colégios Meta e Elite pressionaram tanto que os quatro deram o ar da graça.
Orestes Quércia foi o primeiro a chegar, ainda no final da manhã. Entrou no palco com um Opala Diplomata, expediente que seria utilizado por todos os outros candidatos. Falou sobre sua origem interiorana e a segurança na Capital. Disse que vai construir BrizoIões no Estado e só terminou a cantilena quando Gugu perguntou ao auditório: vocês acham ele bonito? E veio a resposta: achaaaaaaaamos.
Ao sair, Gugu disse aos repórteres que não sabe em quem vai votar, mas lembrou que apoiou Fernando Henrique na última eleição e que, hoje, seu programa é o segundo em faturamento na TVS. Cada meio minuto custa 60 mil cruzados.
Calmo, olhar distante, Suplicy entrou no palco com seu Monza vermelho, chofer ao lado, depois que o cantor Adriano comemorou seu aniversário: 29 anos. Não deixou Gugu perguntar nada, falou o tempo inteiro (quase dez minutos) sobre os incidentes de Leme, desde os métodos de produção do açúcar até a vida econômica dos usineiros. Ao final eximiu o PT de alguma culpa na morte dos dois trabalhadores dessa cidade, e culpou a polícia militar de Franco Montoro pelos incidentes. Depois, disse que Sarney e Brossard estão fazendo acusações inverídicas sobre o PT.
Mal o conjunto Dominó beijava várias vovós em pleno auditório, em comemoração ao Dia da Vovó, Antônio Ermírio de Moraes, candidato do PTB, apareceu. Calça cinza, terno azul-marinho e sapato marrom, ele disse que sua vida é um livro aberto e que agora chegou a hora de retribuir o que o País fez por ele. Disse que Sarney votaria em seu nome, caso seu domicílio eleitoral fosse em São Paulo. E, por fim, desmentiu os boatos de que é “sovina” em questões financeiras: “Não afronto ninguém com a minha riqueza”, salientou.
Quando Ermírio já estava no passeio, dando entrevista à imprensa, Maluf chegou, também de Opala, e guardado por um imenso segurança. Sorriso amarelo, ele cumprimentou Ermírio e, já na portaria, descobriu que ali estava um terreno fértil à sua candidatura. Jurados, diretores, técnicos, até bailarinos se emocionaram com a sua chegada.
Na platéia, as “guguetes” queriam saber do destino do conjunto Dominó, mas as coordenadoras de auditório transformaram as meninas, a maioria menores de 16 anos, em coro malufista.
Após um rápido coquetel nos bastidores, Maluf chegou e arrasou. Pôs a mão no coração quando começaram a gritar seu nome, falou que, no seu governo, marginal na cadeia pagará o seu sustento e que menor infrator ficará atrás de muros de 10 metros. Disse que adora d. Sylvia, com quem está casado há 31 anos, e que, pessoalmente, seria a favor da pena de morte — caso ficasse comprovada sua eficiência — e, ao final, atendendo a apelos, tocou um caudaloso piano por cerca de 5 minutos.
Candidatos cariocas
Duas semanas depois, em 7 de agosto de 1986, Gugu repetiria a fórmula levando os quatro candidatos a governador do Rio de Janeiro ao seu programa. Também dividindo o palco com atrações habituais do Viva a Noite, Agnaldo Timóteo, Fernando Gabeira, Moreira Franco e Aarão Steinbruch aceitaram participar para mostrar suas plataformas ao público do SBT. O candidato Darcy Ribeiro não participou.
[Agradecimentos à leitora Lígia Ricelli e ao leitor Moacir Maia que nos informaram o nome da comediante Nhá Barbina.]
Debates eleitorais
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