Quando Maduro deixará o poder na Venezuela


Sem acesso a grande parte do dinheiro do petróleo e diante de uma oposição mais organizada, o chavismo se apega à fidelidade da cúpula militar para ganhar dias, não mais anos, de vida

Por Rodrigo Cavalheiro

Caro leitor,

Este é o primeiro capítulo do fim de um regime autoritário. Nicolás Maduro está hoje mais perto de cair do que estava ontem e, quando você terminar esta supercoluna, estará ainda mais. Isso é algo novo. Mesmo durante a onda de protestos que resultou em mais de 120 mortos no primeiro semestre de 2017, não havia sinais semelhantes. A sanção americana ao petróleo é o mais claro indício de que há um movimento irreversível, inexistente há dois anos.

Em meio à sangrenta repressão daquele ano, a oposição brigava para escolher um líder e o êxodo de venezuelanos não tinha contorno de crise mundial. Naquele ano, meses de carnificina transcorreram sem grande abalo ao governo, que aproveitou uma negociação mediada pela República Dominicana para ganhar tempo. Os mortos pelo chavismo perderam espaço nas manchetes, em boa parte para as medidas inéditas do começo da administração Trump. O medo e o cansaço calaram os manifestantes.

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Estudante protesta em Caracas contra o governo de Nicolás Maduro; Venezuela cedeu e aceitará ajuda humanitária da ONU Foto: YURI CORTEZ / AFP

O marasmo que se seguiu começou a ser rompido em maio de 2018, quando Maduro antecipou eleições das quais saiu menor. Naquela votação com observadores internacionais amigos do regime, boicotada por grande parte da oposição, milícias que impõem a lei em favelas fizeram campanha porta a porta para o chavismo. Gratificações e comida chegaram a quem foi votar com uma carteira de identidade chavista. Funcionários públicos foram coagidos. A "vitória" chavista estimulou ainda mais venezuelanos, de todas classes sociais, a arricar a vida em fugas de ônibus para Colômbia e Brasil. A legitimidade de Maduro ruiu.

Ungido por Hugo Chávez pouco antes de morrer de câncer em 2013, o ex-motorista e chanceler nunca teve o carisma do mentor. À frente das maiores reservas de petróleo de mundo, faltou-lhe também competência. Em meio a uma crise econômica cada vez mais grave, sua sobrevivência financeira depende de empréstimos de China e Rússia. De Moscou, além de apoio diplomático, chegam armas novas e até uma fábrica de Kalashnikov, como explica o especialista em defesa Roberto Godoy.

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Ao tomar posse no dia 10 para governar até 2025, Maduro viu seu isolamento aumentar. No dia 21, um levante de 27 oficiais de baixa patente da Guarda Nacional Bolivariana foi sufocado em Caracas, depois de um grupo rebelde roubar armas, dois blindados e se animar a mostrar o rosto em vídeos contra o regime. O ato, é provável que deliberadamente, serviu de catalizador para a marcha do dia 23, que reuniu milhões nas ruas pela primeira vez desde 2017. A manifestação voltou a colocar o país no centro do noticiário internacional, que passou a destacar o jovem líder opositor Juan Guaidó. Ele é o presidente de Assembleia Nacional, organização da qual o chavismo tirou todos os poderes, dados a uma Assembleia Constituinte governista. Durante a marcha, Guaidó acusou Maduro de usurpador e declarou-se presidente interino (veja por que e como aqui). Alguns venezuelanos, acredite, passaram a brincar com o fato de terem dois presidentes, dois Parlamentos e até dois Judiciários. A questão mais importante passou a ser: há um só Exército na Venezuela?

Referência na defesa da democracia liberal, a revista britânica Economist apontou divisão nas filas chavistas e traçou um perfil de Guaidó que, como alerta o colunista Helio Gurovitz, ainda não tomou posse material da presidência.

O presidente americano, criticado em casa por se dar bem com autocratas, foi chave para que a ferida aberta em Maduro virasse gangrena. Logo após Guaidó declarar-se presidente interino, Trump o reconheceu como tal, a pedido do senador republicano Marco Rubio. Os EUA foram seguidos por 12 países, entre eles o Brasil, que determinou a seus diplomatas ignorar as instruções de Maduro, fato analisado pelo correspondente Jamil Chade na Rádio Eldorado. Washington levou o pedido de reconhecimento de Guaidó a uma reunião de emergência no Conselho de Segurança da ONU, e a América do Sul voltou a receber um sopro de Guerra Fria, com a Rússia prevendo um "banho de sangue" e defendendo a permanência de Maduro no poder. Uma queda de braço internacional analisada com profundidade neste podcast Estadão Notícias.

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É verdade que a formação de um governo paralelo não é garantia de sucesso, como mostram esses exemplos históricos. Também é verdade que Maduro conserva apoio entre os oficiais de mais alta patente, conforme relataram oficiais brasileiros à jornalista Tânia Monteiro, uma fidelidade explicada pelo colunista Lourival Sant'Anna. Mas é igualmente certo que a saga venezuelana iniciada com a ascensão de Chávez em 1999 nunca esteve tão próxima de um desfecho. Falta saber o número de capítulos.

Caro leitor,

Este é o primeiro capítulo do fim de um regime autoritário. Nicolás Maduro está hoje mais perto de cair do que estava ontem e, quando você terminar esta supercoluna, estará ainda mais. Isso é algo novo. Mesmo durante a onda de protestos que resultou em mais de 120 mortos no primeiro semestre de 2017, não havia sinais semelhantes. A sanção americana ao petróleo é o mais claro indício de que há um movimento irreversível, inexistente há dois anos.

Em meio à sangrenta repressão daquele ano, a oposição brigava para escolher um líder e o êxodo de venezuelanos não tinha contorno de crise mundial. Naquele ano, meses de carnificina transcorreram sem grande abalo ao governo, que aproveitou uma negociação mediada pela República Dominicana para ganhar tempo. Os mortos pelo chavismo perderam espaço nas manchetes, em boa parte para as medidas inéditas do começo da administração Trump. O medo e o cansaço calaram os manifestantes.

Estudante protesta em Caracas contra o governo de Nicolás Maduro; Venezuela cedeu e aceitará ajuda humanitária da ONU Foto: YURI CORTEZ / AFP

O marasmo que se seguiu começou a ser rompido em maio de 2018, quando Maduro antecipou eleições das quais saiu menor. Naquela votação com observadores internacionais amigos do regime, boicotada por grande parte da oposição, milícias que impõem a lei em favelas fizeram campanha porta a porta para o chavismo. Gratificações e comida chegaram a quem foi votar com uma carteira de identidade chavista. Funcionários públicos foram coagidos. A "vitória" chavista estimulou ainda mais venezuelanos, de todas classes sociais, a arricar a vida em fugas de ônibus para Colômbia e Brasil. A legitimidade de Maduro ruiu.

Ungido por Hugo Chávez pouco antes de morrer de câncer em 2013, o ex-motorista e chanceler nunca teve o carisma do mentor. À frente das maiores reservas de petróleo de mundo, faltou-lhe também competência. Em meio a uma crise econômica cada vez mais grave, sua sobrevivência financeira depende de empréstimos de China e Rússia. De Moscou, além de apoio diplomático, chegam armas novas e até uma fábrica de Kalashnikov, como explica o especialista em defesa Roberto Godoy.

Ao tomar posse no dia 10 para governar até 2025, Maduro viu seu isolamento aumentar. No dia 21, um levante de 27 oficiais de baixa patente da Guarda Nacional Bolivariana foi sufocado em Caracas, depois de um grupo rebelde roubar armas, dois blindados e se animar a mostrar o rosto em vídeos contra o regime. O ato, é provável que deliberadamente, serviu de catalizador para a marcha do dia 23, que reuniu milhões nas ruas pela primeira vez desde 2017. A manifestação voltou a colocar o país no centro do noticiário internacional, que passou a destacar o jovem líder opositor Juan Guaidó. Ele é o presidente de Assembleia Nacional, organização da qual o chavismo tirou todos os poderes, dados a uma Assembleia Constituinte governista. Durante a marcha, Guaidó acusou Maduro de usurpador e declarou-se presidente interino (veja por que e como aqui). Alguns venezuelanos, acredite, passaram a brincar com o fato de terem dois presidentes, dois Parlamentos e até dois Judiciários. A questão mais importante passou a ser: há um só Exército na Venezuela?

Referência na defesa da democracia liberal, a revista britânica Economist apontou divisão nas filas chavistas e traçou um perfil de Guaidó que, como alerta o colunista Helio Gurovitz, ainda não tomou posse material da presidência.

O presidente americano, criticado em casa por se dar bem com autocratas, foi chave para que a ferida aberta em Maduro virasse gangrena. Logo após Guaidó declarar-se presidente interino, Trump o reconheceu como tal, a pedido do senador republicano Marco Rubio. Os EUA foram seguidos por 12 países, entre eles o Brasil, que determinou a seus diplomatas ignorar as instruções de Maduro, fato analisado pelo correspondente Jamil Chade na Rádio Eldorado. Washington levou o pedido de reconhecimento de Guaidó a uma reunião de emergência no Conselho de Segurança da ONU, e a América do Sul voltou a receber um sopro de Guerra Fria, com a Rússia prevendo um "banho de sangue" e defendendo a permanência de Maduro no poder. Uma queda de braço internacional analisada com profundidade neste podcast Estadão Notícias.

É verdade que a formação de um governo paralelo não é garantia de sucesso, como mostram esses exemplos históricos. Também é verdade que Maduro conserva apoio entre os oficiais de mais alta patente, conforme relataram oficiais brasileiros à jornalista Tânia Monteiro, uma fidelidade explicada pelo colunista Lourival Sant'Anna. Mas é igualmente certo que a saga venezuelana iniciada com a ascensão de Chávez em 1999 nunca esteve tão próxima de um desfecho. Falta saber o número de capítulos.

Caro leitor,

Este é o primeiro capítulo do fim de um regime autoritário. Nicolás Maduro está hoje mais perto de cair do que estava ontem e, quando você terminar esta supercoluna, estará ainda mais. Isso é algo novo. Mesmo durante a onda de protestos que resultou em mais de 120 mortos no primeiro semestre de 2017, não havia sinais semelhantes. A sanção americana ao petróleo é o mais claro indício de que há um movimento irreversível, inexistente há dois anos.

Em meio à sangrenta repressão daquele ano, a oposição brigava para escolher um líder e o êxodo de venezuelanos não tinha contorno de crise mundial. Naquele ano, meses de carnificina transcorreram sem grande abalo ao governo, que aproveitou uma negociação mediada pela República Dominicana para ganhar tempo. Os mortos pelo chavismo perderam espaço nas manchetes, em boa parte para as medidas inéditas do começo da administração Trump. O medo e o cansaço calaram os manifestantes.

Estudante protesta em Caracas contra o governo de Nicolás Maduro; Venezuela cedeu e aceitará ajuda humanitária da ONU Foto: YURI CORTEZ / AFP

O marasmo que se seguiu começou a ser rompido em maio de 2018, quando Maduro antecipou eleições das quais saiu menor. Naquela votação com observadores internacionais amigos do regime, boicotada por grande parte da oposição, milícias que impõem a lei em favelas fizeram campanha porta a porta para o chavismo. Gratificações e comida chegaram a quem foi votar com uma carteira de identidade chavista. Funcionários públicos foram coagidos. A "vitória" chavista estimulou ainda mais venezuelanos, de todas classes sociais, a arricar a vida em fugas de ônibus para Colômbia e Brasil. A legitimidade de Maduro ruiu.

Ungido por Hugo Chávez pouco antes de morrer de câncer em 2013, o ex-motorista e chanceler nunca teve o carisma do mentor. À frente das maiores reservas de petróleo de mundo, faltou-lhe também competência. Em meio a uma crise econômica cada vez mais grave, sua sobrevivência financeira depende de empréstimos de China e Rússia. De Moscou, além de apoio diplomático, chegam armas novas e até uma fábrica de Kalashnikov, como explica o especialista em defesa Roberto Godoy.

Ao tomar posse no dia 10 para governar até 2025, Maduro viu seu isolamento aumentar. No dia 21, um levante de 27 oficiais de baixa patente da Guarda Nacional Bolivariana foi sufocado em Caracas, depois de um grupo rebelde roubar armas, dois blindados e se animar a mostrar o rosto em vídeos contra o regime. O ato, é provável que deliberadamente, serviu de catalizador para a marcha do dia 23, que reuniu milhões nas ruas pela primeira vez desde 2017. A manifestação voltou a colocar o país no centro do noticiário internacional, que passou a destacar o jovem líder opositor Juan Guaidó. Ele é o presidente de Assembleia Nacional, organização da qual o chavismo tirou todos os poderes, dados a uma Assembleia Constituinte governista. Durante a marcha, Guaidó acusou Maduro de usurpador e declarou-se presidente interino (veja por que e como aqui). Alguns venezuelanos, acredite, passaram a brincar com o fato de terem dois presidentes, dois Parlamentos e até dois Judiciários. A questão mais importante passou a ser: há um só Exército na Venezuela?

Referência na defesa da democracia liberal, a revista britânica Economist apontou divisão nas filas chavistas e traçou um perfil de Guaidó que, como alerta o colunista Helio Gurovitz, ainda não tomou posse material da presidência.

O presidente americano, criticado em casa por se dar bem com autocratas, foi chave para que a ferida aberta em Maduro virasse gangrena. Logo após Guaidó declarar-se presidente interino, Trump o reconheceu como tal, a pedido do senador republicano Marco Rubio. Os EUA foram seguidos por 12 países, entre eles o Brasil, que determinou a seus diplomatas ignorar as instruções de Maduro, fato analisado pelo correspondente Jamil Chade na Rádio Eldorado. Washington levou o pedido de reconhecimento de Guaidó a uma reunião de emergência no Conselho de Segurança da ONU, e a América do Sul voltou a receber um sopro de Guerra Fria, com a Rússia prevendo um "banho de sangue" e defendendo a permanência de Maduro no poder. Uma queda de braço internacional analisada com profundidade neste podcast Estadão Notícias.

É verdade que a formação de um governo paralelo não é garantia de sucesso, como mostram esses exemplos históricos. Também é verdade que Maduro conserva apoio entre os oficiais de mais alta patente, conforme relataram oficiais brasileiros à jornalista Tânia Monteiro, uma fidelidade explicada pelo colunista Lourival Sant'Anna. Mas é igualmente certo que a saga venezuelana iniciada com a ascensão de Chávez em 1999 nunca esteve tão próxima de um desfecho. Falta saber o número de capítulos.

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