A volta de Zelaya


Por Redação

A aparição do deposto presidente hondurenho Manuel Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa foi - sem jogo de palavras - um golpe para o regime que se instalou no país em 28 de junho. Na madrugada daquele domingo em que pretendia realizar uma consulta popular considerada ilegal pelo Congresso e pela Justiça, Zelaya foi preso e despachado, ainda de pijama, para a Costa Rica. No dia seguinte, o então presidente do Legislativo, Roberto Micheletti, assumiu o governo. O plebiscito se destinava a abrir caminho a uma mudança constitucional que permitiria a Zelaya disputar um segundo mandato. Refletindo a preocupação dos seus autores com o passado de quarteladas, violência política e perpetuação no poder dos dirigentes de turno, a Constituição hondurenha considera cláusula pétrea o mandato presidencial único.Era, portanto, uma ameaça à democracia instalada no país a manobra chavista de Zelaya, um abastado político de origens conservadoras que, depois de eleito em 2006, se deixou levar pela lábia bolivariana e o petróleo subsidiado do caudilho de Caracas. No entanto, a comunidade interamericana não poderia, a esta altura da história do Hemisfério, resignar-se à violação consumada da Carta Democrática adotada em 2001 pela OEA. A entidade foi coerente com os seus princípios ao condenar de imediato, sem meios tons, o ato de força em Tegucigalpa, repudiado igualmente pela União Europeia e a Assembleia-Geral da ONU. O chamado governo de facto de Roberto Micheletti ficou completamente isolado e assim permanece. Os EUA e organismos internacionais congelaram cerca de US$ 300 milhões em ajuda ao país.Apesar disso, provavelmente contando com a passagem do tempo até a próxima eleição presidencial de 29 de novembro e o arrefecimento da condenação externa, o regime rejeitou a saída honrosa que lhe foi oferecida pouco mais de uma semana depois do golpe pela própria OEA e o governo americano - a proposta de acordo intermediado pelo presidente Oscar Arias, da Costa Rica, por isso conhecido como Pacto de San José, numa alusão à capital do país. Em suas linhas gerais, previa o restabelecimento do mandato de Zelaya, com a formação de um governo o mais próximo possível do que seria a unidade nacional, anistia aos envolvidos na ruptura da legalidade, abandono do plano da consulta popular e eleições na data prevista sob supervisão internacional. A inflexibilidade das autoridades hondurenhas se revelaria obtusa. Semanas atrás, Washington endureceu, anunciando que, "no momento", não aceitaria os resultados de uma eleição promovida pelo governo Micheletti.O governo de Tegucigalpa cometeu outro erro ao não cuidar prioritariamente de impedir o regresso de Zelaya. Duas vezes, em julho, ele encenara a volta de forma ostensiva: primeiro, por avião, depois, por terra, vindo da Nicarágua. O bloqueio do aeroporto da capital e a presença militar na fronteira interromperam o espetáculo. Anteontem, numa reviravolta desmoralizante para os seus inimigos, Zelaya entrou às escondidas no país, depois de "uma caminhada difícil, por montanhas" e foi acolhido na Embaixada do Brasil. Da parte dele, uma escolha sem dúvida bem pensada. Da parte do Brasil, um ato coerente com a política do Itamaraty - ainda que possa ser classificado como uma interferência nos negócios internos de Honduras. O País, afinal de contas, tem estado à frente dos esforços da OEA para a recondução de Zelaya, tendo retirado o seu embaixador em Tegucigalpa em protesto contra o golpe.Agora, o jogo está feito e a equação política do país muda irremediavelmente. Ou o governo de facto aceita o Pacto de San José e se retira de cena, ou tenta se manter e praticamente estimula a eclosão de distúrbios de rua que terão tudo para terminar em derramamento de sangue. Ontem, as forças de segurança já dispersaram com bombas de efeito moral e balas de borracha os partidários de Zelaya que, instigados por ele em entrevistas à TV, haviam passado a noite em frente à embaixada brasileira. Ainda que o pior não aconteça, não se imagina como Micheletti poderá resistir à inevitável intensificação das pressões externas para devolver o mando ao presidente que, sob a proteção do Brasil, o espreita, por assim dizer, do outro lado da rua.

A aparição do deposto presidente hondurenho Manuel Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa foi - sem jogo de palavras - um golpe para o regime que se instalou no país em 28 de junho. Na madrugada daquele domingo em que pretendia realizar uma consulta popular considerada ilegal pelo Congresso e pela Justiça, Zelaya foi preso e despachado, ainda de pijama, para a Costa Rica. No dia seguinte, o então presidente do Legislativo, Roberto Micheletti, assumiu o governo. O plebiscito se destinava a abrir caminho a uma mudança constitucional que permitiria a Zelaya disputar um segundo mandato. Refletindo a preocupação dos seus autores com o passado de quarteladas, violência política e perpetuação no poder dos dirigentes de turno, a Constituição hondurenha considera cláusula pétrea o mandato presidencial único.Era, portanto, uma ameaça à democracia instalada no país a manobra chavista de Zelaya, um abastado político de origens conservadoras que, depois de eleito em 2006, se deixou levar pela lábia bolivariana e o petróleo subsidiado do caudilho de Caracas. No entanto, a comunidade interamericana não poderia, a esta altura da história do Hemisfério, resignar-se à violação consumada da Carta Democrática adotada em 2001 pela OEA. A entidade foi coerente com os seus princípios ao condenar de imediato, sem meios tons, o ato de força em Tegucigalpa, repudiado igualmente pela União Europeia e a Assembleia-Geral da ONU. O chamado governo de facto de Roberto Micheletti ficou completamente isolado e assim permanece. Os EUA e organismos internacionais congelaram cerca de US$ 300 milhões em ajuda ao país.Apesar disso, provavelmente contando com a passagem do tempo até a próxima eleição presidencial de 29 de novembro e o arrefecimento da condenação externa, o regime rejeitou a saída honrosa que lhe foi oferecida pouco mais de uma semana depois do golpe pela própria OEA e o governo americano - a proposta de acordo intermediado pelo presidente Oscar Arias, da Costa Rica, por isso conhecido como Pacto de San José, numa alusão à capital do país. Em suas linhas gerais, previa o restabelecimento do mandato de Zelaya, com a formação de um governo o mais próximo possível do que seria a unidade nacional, anistia aos envolvidos na ruptura da legalidade, abandono do plano da consulta popular e eleições na data prevista sob supervisão internacional. A inflexibilidade das autoridades hondurenhas se revelaria obtusa. Semanas atrás, Washington endureceu, anunciando que, "no momento", não aceitaria os resultados de uma eleição promovida pelo governo Micheletti.O governo de Tegucigalpa cometeu outro erro ao não cuidar prioritariamente de impedir o regresso de Zelaya. Duas vezes, em julho, ele encenara a volta de forma ostensiva: primeiro, por avião, depois, por terra, vindo da Nicarágua. O bloqueio do aeroporto da capital e a presença militar na fronteira interromperam o espetáculo. Anteontem, numa reviravolta desmoralizante para os seus inimigos, Zelaya entrou às escondidas no país, depois de "uma caminhada difícil, por montanhas" e foi acolhido na Embaixada do Brasil. Da parte dele, uma escolha sem dúvida bem pensada. Da parte do Brasil, um ato coerente com a política do Itamaraty - ainda que possa ser classificado como uma interferência nos negócios internos de Honduras. O País, afinal de contas, tem estado à frente dos esforços da OEA para a recondução de Zelaya, tendo retirado o seu embaixador em Tegucigalpa em protesto contra o golpe.Agora, o jogo está feito e a equação política do país muda irremediavelmente. Ou o governo de facto aceita o Pacto de San José e se retira de cena, ou tenta se manter e praticamente estimula a eclosão de distúrbios de rua que terão tudo para terminar em derramamento de sangue. Ontem, as forças de segurança já dispersaram com bombas de efeito moral e balas de borracha os partidários de Zelaya que, instigados por ele em entrevistas à TV, haviam passado a noite em frente à embaixada brasileira. Ainda que o pior não aconteça, não se imagina como Micheletti poderá resistir à inevitável intensificação das pressões externas para devolver o mando ao presidente que, sob a proteção do Brasil, o espreita, por assim dizer, do outro lado da rua.

A aparição do deposto presidente hondurenho Manuel Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa foi - sem jogo de palavras - um golpe para o regime que se instalou no país em 28 de junho. Na madrugada daquele domingo em que pretendia realizar uma consulta popular considerada ilegal pelo Congresso e pela Justiça, Zelaya foi preso e despachado, ainda de pijama, para a Costa Rica. No dia seguinte, o então presidente do Legislativo, Roberto Micheletti, assumiu o governo. O plebiscito se destinava a abrir caminho a uma mudança constitucional que permitiria a Zelaya disputar um segundo mandato. Refletindo a preocupação dos seus autores com o passado de quarteladas, violência política e perpetuação no poder dos dirigentes de turno, a Constituição hondurenha considera cláusula pétrea o mandato presidencial único.Era, portanto, uma ameaça à democracia instalada no país a manobra chavista de Zelaya, um abastado político de origens conservadoras que, depois de eleito em 2006, se deixou levar pela lábia bolivariana e o petróleo subsidiado do caudilho de Caracas. No entanto, a comunidade interamericana não poderia, a esta altura da história do Hemisfério, resignar-se à violação consumada da Carta Democrática adotada em 2001 pela OEA. A entidade foi coerente com os seus princípios ao condenar de imediato, sem meios tons, o ato de força em Tegucigalpa, repudiado igualmente pela União Europeia e a Assembleia-Geral da ONU. O chamado governo de facto de Roberto Micheletti ficou completamente isolado e assim permanece. Os EUA e organismos internacionais congelaram cerca de US$ 300 milhões em ajuda ao país.Apesar disso, provavelmente contando com a passagem do tempo até a próxima eleição presidencial de 29 de novembro e o arrefecimento da condenação externa, o regime rejeitou a saída honrosa que lhe foi oferecida pouco mais de uma semana depois do golpe pela própria OEA e o governo americano - a proposta de acordo intermediado pelo presidente Oscar Arias, da Costa Rica, por isso conhecido como Pacto de San José, numa alusão à capital do país. Em suas linhas gerais, previa o restabelecimento do mandato de Zelaya, com a formação de um governo o mais próximo possível do que seria a unidade nacional, anistia aos envolvidos na ruptura da legalidade, abandono do plano da consulta popular e eleições na data prevista sob supervisão internacional. A inflexibilidade das autoridades hondurenhas se revelaria obtusa. Semanas atrás, Washington endureceu, anunciando que, "no momento", não aceitaria os resultados de uma eleição promovida pelo governo Micheletti.O governo de Tegucigalpa cometeu outro erro ao não cuidar prioritariamente de impedir o regresso de Zelaya. Duas vezes, em julho, ele encenara a volta de forma ostensiva: primeiro, por avião, depois, por terra, vindo da Nicarágua. O bloqueio do aeroporto da capital e a presença militar na fronteira interromperam o espetáculo. Anteontem, numa reviravolta desmoralizante para os seus inimigos, Zelaya entrou às escondidas no país, depois de "uma caminhada difícil, por montanhas" e foi acolhido na Embaixada do Brasil. Da parte dele, uma escolha sem dúvida bem pensada. Da parte do Brasil, um ato coerente com a política do Itamaraty - ainda que possa ser classificado como uma interferência nos negócios internos de Honduras. O País, afinal de contas, tem estado à frente dos esforços da OEA para a recondução de Zelaya, tendo retirado o seu embaixador em Tegucigalpa em protesto contra o golpe.Agora, o jogo está feito e a equação política do país muda irremediavelmente. Ou o governo de facto aceita o Pacto de San José e se retira de cena, ou tenta se manter e praticamente estimula a eclosão de distúrbios de rua que terão tudo para terminar em derramamento de sangue. Ontem, as forças de segurança já dispersaram com bombas de efeito moral e balas de borracha os partidários de Zelaya que, instigados por ele em entrevistas à TV, haviam passado a noite em frente à embaixada brasileira. Ainda que o pior não aconteça, não se imagina como Micheletti poderá resistir à inevitável intensificação das pressões externas para devolver o mando ao presidente que, sob a proteção do Brasil, o espreita, por assim dizer, do outro lado da rua.

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