Ações da PRF têm 156 mortes desde 2018: o que repensar na polícia rodoviária após caso Heloísa?


Morte de menina de 3 anos se soma a episódio de ‘câmara de gás’ e suspeita de interferência nas eleições; governo diz investigar abordagem e prevê reformular protocolos da corporação

Por Ítalo Lo Re e Marcio Dolzan
Atualização:

A morte da menina Heloísa Santos Silva, de 3 anos, baleada na cabeça quando estava no carro dos pais na Baixada Fluminense, pôs a Polícia Rodoviária Federal (PRF) mais uma vez em xeque – os disparos partiram de agentes da corporação. O episódio se soma a mais casos recentes, como o de Genivaldo de Jesus, de 38 anos, morto no ano passado após ser trancado com gás no porta-malas de uma viatura da corporação em Umbaúba, Sergipe.

As mortes em ações da PRF dobraram entre 2018 e o ano passado: de 22 para 44, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que não detalhou as ocorrências. A pasta afirma que houve esforço nos últimos meses para baixar as taxas de letalidade: são oito este ano. “Queremos e vamos alcançar que este número seja zero”, disse o ministro Flávio Dino nesta segunda-feira, 18. No total, foram 156 óbitos desde 2018.

Os resultados fracos na segurança pública tem desgastado Dino até mesmo entre aliados. Ele também é cotado para deixar o ministério para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).

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Mortes em ações da Polícia Rodoviária Federal dobraram entre 2018 e 2022, saltando de 22 para 44 Foto: Divulgação/PRF-SP

Além disso, o antigo comando da PRF é alvo de investigação por suposta interferência para atrapalhar a votação no 2º turno das eleições de 2022 no Nordeste e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diretor da corporação à época, Silvinei Vasques está preso desde agosto. Ele nega as acusações.

Após a morte de Heloísa, no sábado, 16, o ministro Gilmar Mendes, do STF, sugeriu que a existência da PRF seja “repensada”. Na avaliação do magistrado, “para violações estruturais, (é preciso) medidas também estruturais”.

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A declaração foi repudiada por representantes dos agentes, mas reforçou a discussão sobre a mudança de rota, que é admitida pelo próprio governo. Conhecida principalmente pela fiscalização em estradas, a corporação tem ampliado seu escopo e atuado mais em operações de polícias locais. Conforme especialistas ouvidos pelo Estadão, os episódios recentes lançam luz sobre a necessidade não de extinguir a corporação, mas de ter protocolos mais específicos para nortear seus agentes.

As operações de combate à criminalidade da PRF praticamente triplicaram em dois anos, segundo relatório de gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foram de 3,3 mil, em 2020, para 9,7 mil, no último ano. Segundo o documento, as operações são, sobretudo, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste”, descritas como “as principais áreas críticas de acidentalidade e de criminalidade do País”.

O orçamento do órgão tem crescido: em 2023 é de R$ 6,1 bilhões, diz o Portal de Transparência do governo federal. Em 2019, o gasto da PRF foi de R$ 4,4 bilhões, em valor não corrigido pela inflação.

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O efetivo é de quase 13 mil agentes, praticamente o mesmo de policiais federais. Supera o das polícias militares de vários Estados, como Santa Catarina (9,9 mil) e Maranhão (11 mil), segundo o Perfil Nacional das Instituições de Segurança Pública.

Heloísa Santos Silva, de 3 anos, foi baleada na cabeça quando estava no carro dos pais no Rio Foto: @instagram/w.i.l.l.i.a.n_s.i.l.v.a_

Para o sociólogo Daniel Veloso Hirata, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), a PRF tem, sim, razão para existir, mas para se mostrar efetiva é preciso que retorne o quanto antes às funções para a qual foi originalmente criada, em 1928.

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“A PRF foi pensada para atuar nas rodovias e estradas federais. O escopo de atuação dela é bem definido, delimitado. Mas o que vimos nos últimos anos foi um aumento não só no efetivo e no orçamento, sobretudo no governo Bolsonaro, como das competências. A PRF passou a atuar em atividades ostensivas e repressivas, não só em estradas e rodovias federais, mas também em favelas e periferias”, pondera Hirata. “Está mais do que na hora de a PRF voltar às suas atribuições originais.”

Corporação atuou em operações letais no Rio

A participação da PRF em operações fora das rodovias foi definida em portarias da gestão passada. Em 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, definiu diretrizes para a participação da PRF em operações conjuntas nas estradas federais ou “em áreas de interesse da União”, o que aumentou muito o escopo de atribuição da força.

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A portaria foi questionada na Justiça e substituída dois anos mais tarde. O novo texto limitou operações ostensivas da PRF, mas parte das definições foi mantida. Entre elas, a permissão para integrar operações conjuntas, ingressar em locais alvos de mandado de busca e apreensão, com decisão judicial, e lavrar termos circunstanciados de ocorrência.

Operação da PRF junto do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Rio, em maio de 2022, terminou com 22 mortos na Vila Cruzeiro, zona norte carioca, a 3ª ação policial mais letal da história do Estado. Naquela mesma comunidade, outra ação com participação dos agentes rodoviários federais teve oito óbitos. “É fundamental a revogação imediata da portaria das chamadas operações conjuntas”, afirma Hirata.

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Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o trabalho integrado não é ruim, mas demanda fixar melhor os protocolos. “A PRF é fundamental no apoio a operações integradas de combate ao trabalho análogo à escravidão, à prostituição e à pornografia infantil, porque são ações tocadas pelo Ministério Público Federal (MPF)”, diz.

“Como a PRF não tem uma missão tão definida como a Polícia Federal, que é uma polícia judiciária, ela vai ampliando o mandato dela de polícia ostensiva e, ao mesmo tempo, se coloca à disposição do poder (vigente)”, afirma. Esse processo, na opinião dele, avançou nas últimas duas décadas, sobretudo na gestão Bolsonaro.

Nessa segunda-feira, 18, o diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, declarou que a corporação deverá mudar sua “doutrina de atuação”. A afirmação veio após Oliveira afirmar que a morte da menina Heloísa é “uma dor institucional”.

“Nós estamos fazendo não só um curso de reciclagem, estamos fazendo um estudo para mudança da doutrina de atuação da Polícia Rodoviária Federal. Inclusive, já marcada para o próximo mês, uma audiência pública. Porque nós queremos escutar a sociedade também, no redesenho dessa doutrina”, sustentou o diretor-geral.

Justiça define R$ 1, 4 milhão após ‘câmara de gás’ em viatura

A ação que resultou na morte de Heloísa, atingida na cabeça e na coluna no último dia 7, é investigada pelo MPF. Os agentes rodoviários dizem que atiraram por acreditar que o veículo onde ela estava era roubado. Nesta segunda-feira, 16, a Justiça negou o pedido de prisão dos três policiais envolvidos na abordagem, mas determinou que eles fiquem apenas em funções administrativas, dentre outras sanções.

Em maio de 2022, Genivaldo de Jesus, de 38 anos, foi morto no Sergipe após agentes da PRF local o colocarem dentro de uma viatura e jogarem bombas de gás no veículo. Ele, que sofria de esquizofrenia e estava em surto, morreu asfixiado. Na semana passada, a Justiça condenou a União a pagar R$ 1 milhão ao filho de Genivaldo e R$ 405 mil à mãe da vítima.

Genivaldo morreu após ser trancado em viatura da PRF com gás em Sergipe Foto: Reprodução Redes Sociais

Após a repercussão negativa do caso, a corporação também planeja instalar câmeras corporais nos uniformes dos agentes: a implementação gradual a partir de abril de 2024. Os casos de Heloísa, Genivaldo e as blitze nas eleições foram lembrados por Gilmar Mendes em publicação na rede social X (antigo Twitter) no fim de semana, onde ele sugere repensar a existência da PRF.

Para o sociólogo Daniel Hirata, a série de falhas desfaz a boa impressão que a PRF tinha em meados da década passada. “Tinha uso de tecnologia e atuação que sempre foram bem vistas por aqueles que se dedicam a olhar a essas questões”, considera.

PRF defende a democracia, diz federação da categoria

O Estadão pediu posicionamento à PRF sobre a manifestação do ministro Gilmar Mendes. Sem citar o ministro, a corporação declarou que “a comoção social no País é justificada”, e acrescentou que “o volume de manifestações públicas sobre a atuação da PRF também indica o tamanho da instituição e comprova a tese de que a sociedade exige resultados cada vez mais precisos e profissionais”.

Ainda de acordo com a PRF, os episódios recentes servirão de base para que se apromire a atuação da polícia. “As falhas, mesmo as mais duras, são ocasiões para aprimorar o que a PRF entrega à população brasileira: segurança pública. Dessa forma, estamos debruçados sobre trágicas ocorrências em que a instituição esteve envolvida, estudando formas de, juntos, impedir que episódios semelhantes se repitam”, diz a nota.

O Ministério da Justiça tem afirmado implementar mudanças na formação e na orientação dadas às equipes. Nessa segunda, Dino chamou a ação que resultou na morte de Heloísa de “absurdo” e disse que as normas da PRF preveem justamente o contrário. “Essas normas dizem que não é possível a um agente, diante da não parada de um veículo, disparar arma de fogo.”

Além do procedimento interno de investigação do governo, o MPF investiga a ação que matou Heloísa. A Corregedoria da PRF também apura a ida de 28 agentes da corporação onde a criança estava internada, segundo parentes de Heloísa, e suspeita de tentativas de constranger a família.

A Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), por sua vez, publicou nota repudiando as declarações do ministro. “A PRF é uma instituição que defende a democracia, a independência e o respeito aos poderes. Casos como o ocorrido na última semana (morte da menina Heloísa) não podem ser utilizados para condenar o nobre ofício dos nossos policiais”, aponta o texto

“A Polícia Rodoviária Federal é uma corporação quase centenária, com baixíssimo índice de letalidade, e de maior credibilidade entre os brasileiros, conforme demonstram todas as pesquisas de opinião pública”, acrescenta a FenaPRF.

A morte da menina Heloísa Santos Silva, de 3 anos, baleada na cabeça quando estava no carro dos pais na Baixada Fluminense, pôs a Polícia Rodoviária Federal (PRF) mais uma vez em xeque – os disparos partiram de agentes da corporação. O episódio se soma a mais casos recentes, como o de Genivaldo de Jesus, de 38 anos, morto no ano passado após ser trancado com gás no porta-malas de uma viatura da corporação em Umbaúba, Sergipe.

As mortes em ações da PRF dobraram entre 2018 e o ano passado: de 22 para 44, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que não detalhou as ocorrências. A pasta afirma que houve esforço nos últimos meses para baixar as taxas de letalidade: são oito este ano. “Queremos e vamos alcançar que este número seja zero”, disse o ministro Flávio Dino nesta segunda-feira, 18. No total, foram 156 óbitos desde 2018.

Os resultados fracos na segurança pública tem desgastado Dino até mesmo entre aliados. Ele também é cotado para deixar o ministério para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mortes em ações da Polícia Rodoviária Federal dobraram entre 2018 e 2022, saltando de 22 para 44 Foto: Divulgação/PRF-SP

Além disso, o antigo comando da PRF é alvo de investigação por suposta interferência para atrapalhar a votação no 2º turno das eleições de 2022 no Nordeste e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diretor da corporação à época, Silvinei Vasques está preso desde agosto. Ele nega as acusações.

Após a morte de Heloísa, no sábado, 16, o ministro Gilmar Mendes, do STF, sugeriu que a existência da PRF seja “repensada”. Na avaliação do magistrado, “para violações estruturais, (é preciso) medidas também estruturais”.

A declaração foi repudiada por representantes dos agentes, mas reforçou a discussão sobre a mudança de rota, que é admitida pelo próprio governo. Conhecida principalmente pela fiscalização em estradas, a corporação tem ampliado seu escopo e atuado mais em operações de polícias locais. Conforme especialistas ouvidos pelo Estadão, os episódios recentes lançam luz sobre a necessidade não de extinguir a corporação, mas de ter protocolos mais específicos para nortear seus agentes.

As operações de combate à criminalidade da PRF praticamente triplicaram em dois anos, segundo relatório de gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foram de 3,3 mil, em 2020, para 9,7 mil, no último ano. Segundo o documento, as operações são, sobretudo, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste”, descritas como “as principais áreas críticas de acidentalidade e de criminalidade do País”.

O orçamento do órgão tem crescido: em 2023 é de R$ 6,1 bilhões, diz o Portal de Transparência do governo federal. Em 2019, o gasto da PRF foi de R$ 4,4 bilhões, em valor não corrigido pela inflação.

O efetivo é de quase 13 mil agentes, praticamente o mesmo de policiais federais. Supera o das polícias militares de vários Estados, como Santa Catarina (9,9 mil) e Maranhão (11 mil), segundo o Perfil Nacional das Instituições de Segurança Pública.

Heloísa Santos Silva, de 3 anos, foi baleada na cabeça quando estava no carro dos pais no Rio Foto: @instagram/w.i.l.l.i.a.n_s.i.l.v.a_

Para o sociólogo Daniel Veloso Hirata, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), a PRF tem, sim, razão para existir, mas para se mostrar efetiva é preciso que retorne o quanto antes às funções para a qual foi originalmente criada, em 1928.

“A PRF foi pensada para atuar nas rodovias e estradas federais. O escopo de atuação dela é bem definido, delimitado. Mas o que vimos nos últimos anos foi um aumento não só no efetivo e no orçamento, sobretudo no governo Bolsonaro, como das competências. A PRF passou a atuar em atividades ostensivas e repressivas, não só em estradas e rodovias federais, mas também em favelas e periferias”, pondera Hirata. “Está mais do que na hora de a PRF voltar às suas atribuições originais.”

Corporação atuou em operações letais no Rio

A participação da PRF em operações fora das rodovias foi definida em portarias da gestão passada. Em 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, definiu diretrizes para a participação da PRF em operações conjuntas nas estradas federais ou “em áreas de interesse da União”, o que aumentou muito o escopo de atribuição da força.

A portaria foi questionada na Justiça e substituída dois anos mais tarde. O novo texto limitou operações ostensivas da PRF, mas parte das definições foi mantida. Entre elas, a permissão para integrar operações conjuntas, ingressar em locais alvos de mandado de busca e apreensão, com decisão judicial, e lavrar termos circunstanciados de ocorrência.

Operação da PRF junto do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Rio, em maio de 2022, terminou com 22 mortos na Vila Cruzeiro, zona norte carioca, a 3ª ação policial mais letal da história do Estado. Naquela mesma comunidade, outra ação com participação dos agentes rodoviários federais teve oito óbitos. “É fundamental a revogação imediata da portaria das chamadas operações conjuntas”, afirma Hirata.

Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o trabalho integrado não é ruim, mas demanda fixar melhor os protocolos. “A PRF é fundamental no apoio a operações integradas de combate ao trabalho análogo à escravidão, à prostituição e à pornografia infantil, porque são ações tocadas pelo Ministério Público Federal (MPF)”, diz.

“Como a PRF não tem uma missão tão definida como a Polícia Federal, que é uma polícia judiciária, ela vai ampliando o mandato dela de polícia ostensiva e, ao mesmo tempo, se coloca à disposição do poder (vigente)”, afirma. Esse processo, na opinião dele, avançou nas últimas duas décadas, sobretudo na gestão Bolsonaro.

Nessa segunda-feira, 18, o diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, declarou que a corporação deverá mudar sua “doutrina de atuação”. A afirmação veio após Oliveira afirmar que a morte da menina Heloísa é “uma dor institucional”.

“Nós estamos fazendo não só um curso de reciclagem, estamos fazendo um estudo para mudança da doutrina de atuação da Polícia Rodoviária Federal. Inclusive, já marcada para o próximo mês, uma audiência pública. Porque nós queremos escutar a sociedade também, no redesenho dessa doutrina”, sustentou o diretor-geral.

Justiça define R$ 1, 4 milhão após ‘câmara de gás’ em viatura

A ação que resultou na morte de Heloísa, atingida na cabeça e na coluna no último dia 7, é investigada pelo MPF. Os agentes rodoviários dizem que atiraram por acreditar que o veículo onde ela estava era roubado. Nesta segunda-feira, 16, a Justiça negou o pedido de prisão dos três policiais envolvidos na abordagem, mas determinou que eles fiquem apenas em funções administrativas, dentre outras sanções.

Em maio de 2022, Genivaldo de Jesus, de 38 anos, foi morto no Sergipe após agentes da PRF local o colocarem dentro de uma viatura e jogarem bombas de gás no veículo. Ele, que sofria de esquizofrenia e estava em surto, morreu asfixiado. Na semana passada, a Justiça condenou a União a pagar R$ 1 milhão ao filho de Genivaldo e R$ 405 mil à mãe da vítima.

Genivaldo morreu após ser trancado em viatura da PRF com gás em Sergipe Foto: Reprodução Redes Sociais

Após a repercussão negativa do caso, a corporação também planeja instalar câmeras corporais nos uniformes dos agentes: a implementação gradual a partir de abril de 2024. Os casos de Heloísa, Genivaldo e as blitze nas eleições foram lembrados por Gilmar Mendes em publicação na rede social X (antigo Twitter) no fim de semana, onde ele sugere repensar a existência da PRF.

Para o sociólogo Daniel Hirata, a série de falhas desfaz a boa impressão que a PRF tinha em meados da década passada. “Tinha uso de tecnologia e atuação que sempre foram bem vistas por aqueles que se dedicam a olhar a essas questões”, considera.

PRF defende a democracia, diz federação da categoria

O Estadão pediu posicionamento à PRF sobre a manifestação do ministro Gilmar Mendes. Sem citar o ministro, a corporação declarou que “a comoção social no País é justificada”, e acrescentou que “o volume de manifestações públicas sobre a atuação da PRF também indica o tamanho da instituição e comprova a tese de que a sociedade exige resultados cada vez mais precisos e profissionais”.

Ainda de acordo com a PRF, os episódios recentes servirão de base para que se apromire a atuação da polícia. “As falhas, mesmo as mais duras, são ocasiões para aprimorar o que a PRF entrega à população brasileira: segurança pública. Dessa forma, estamos debruçados sobre trágicas ocorrências em que a instituição esteve envolvida, estudando formas de, juntos, impedir que episódios semelhantes se repitam”, diz a nota.

O Ministério da Justiça tem afirmado implementar mudanças na formação e na orientação dadas às equipes. Nessa segunda, Dino chamou a ação que resultou na morte de Heloísa de “absurdo” e disse que as normas da PRF preveem justamente o contrário. “Essas normas dizem que não é possível a um agente, diante da não parada de um veículo, disparar arma de fogo.”

Além do procedimento interno de investigação do governo, o MPF investiga a ação que matou Heloísa. A Corregedoria da PRF também apura a ida de 28 agentes da corporação onde a criança estava internada, segundo parentes de Heloísa, e suspeita de tentativas de constranger a família.

A Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), por sua vez, publicou nota repudiando as declarações do ministro. “A PRF é uma instituição que defende a democracia, a independência e o respeito aos poderes. Casos como o ocorrido na última semana (morte da menina Heloísa) não podem ser utilizados para condenar o nobre ofício dos nossos policiais”, aponta o texto

“A Polícia Rodoviária Federal é uma corporação quase centenária, com baixíssimo índice de letalidade, e de maior credibilidade entre os brasileiros, conforme demonstram todas as pesquisas de opinião pública”, acrescenta a FenaPRF.

A morte da menina Heloísa Santos Silva, de 3 anos, baleada na cabeça quando estava no carro dos pais na Baixada Fluminense, pôs a Polícia Rodoviária Federal (PRF) mais uma vez em xeque – os disparos partiram de agentes da corporação. O episódio se soma a mais casos recentes, como o de Genivaldo de Jesus, de 38 anos, morto no ano passado após ser trancado com gás no porta-malas de uma viatura da corporação em Umbaúba, Sergipe.

As mortes em ações da PRF dobraram entre 2018 e o ano passado: de 22 para 44, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que não detalhou as ocorrências. A pasta afirma que houve esforço nos últimos meses para baixar as taxas de letalidade: são oito este ano. “Queremos e vamos alcançar que este número seja zero”, disse o ministro Flávio Dino nesta segunda-feira, 18. No total, foram 156 óbitos desde 2018.

Os resultados fracos na segurança pública tem desgastado Dino até mesmo entre aliados. Ele também é cotado para deixar o ministério para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mortes em ações da Polícia Rodoviária Federal dobraram entre 2018 e 2022, saltando de 22 para 44 Foto: Divulgação/PRF-SP

Além disso, o antigo comando da PRF é alvo de investigação por suposta interferência para atrapalhar a votação no 2º turno das eleições de 2022 no Nordeste e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diretor da corporação à época, Silvinei Vasques está preso desde agosto. Ele nega as acusações.

Após a morte de Heloísa, no sábado, 16, o ministro Gilmar Mendes, do STF, sugeriu que a existência da PRF seja “repensada”. Na avaliação do magistrado, “para violações estruturais, (é preciso) medidas também estruturais”.

A declaração foi repudiada por representantes dos agentes, mas reforçou a discussão sobre a mudança de rota, que é admitida pelo próprio governo. Conhecida principalmente pela fiscalização em estradas, a corporação tem ampliado seu escopo e atuado mais em operações de polícias locais. Conforme especialistas ouvidos pelo Estadão, os episódios recentes lançam luz sobre a necessidade não de extinguir a corporação, mas de ter protocolos mais específicos para nortear seus agentes.

As operações de combate à criminalidade da PRF praticamente triplicaram em dois anos, segundo relatório de gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foram de 3,3 mil, em 2020, para 9,7 mil, no último ano. Segundo o documento, as operações são, sobretudo, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste”, descritas como “as principais áreas críticas de acidentalidade e de criminalidade do País”.

O orçamento do órgão tem crescido: em 2023 é de R$ 6,1 bilhões, diz o Portal de Transparência do governo federal. Em 2019, o gasto da PRF foi de R$ 4,4 bilhões, em valor não corrigido pela inflação.

O efetivo é de quase 13 mil agentes, praticamente o mesmo de policiais federais. Supera o das polícias militares de vários Estados, como Santa Catarina (9,9 mil) e Maranhão (11 mil), segundo o Perfil Nacional das Instituições de Segurança Pública.

Heloísa Santos Silva, de 3 anos, foi baleada na cabeça quando estava no carro dos pais no Rio Foto: @instagram/w.i.l.l.i.a.n_s.i.l.v.a_

Para o sociólogo Daniel Veloso Hirata, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), a PRF tem, sim, razão para existir, mas para se mostrar efetiva é preciso que retorne o quanto antes às funções para a qual foi originalmente criada, em 1928.

“A PRF foi pensada para atuar nas rodovias e estradas federais. O escopo de atuação dela é bem definido, delimitado. Mas o que vimos nos últimos anos foi um aumento não só no efetivo e no orçamento, sobretudo no governo Bolsonaro, como das competências. A PRF passou a atuar em atividades ostensivas e repressivas, não só em estradas e rodovias federais, mas também em favelas e periferias”, pondera Hirata. “Está mais do que na hora de a PRF voltar às suas atribuições originais.”

Corporação atuou em operações letais no Rio

A participação da PRF em operações fora das rodovias foi definida em portarias da gestão passada. Em 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, definiu diretrizes para a participação da PRF em operações conjuntas nas estradas federais ou “em áreas de interesse da União”, o que aumentou muito o escopo de atribuição da força.

A portaria foi questionada na Justiça e substituída dois anos mais tarde. O novo texto limitou operações ostensivas da PRF, mas parte das definições foi mantida. Entre elas, a permissão para integrar operações conjuntas, ingressar em locais alvos de mandado de busca e apreensão, com decisão judicial, e lavrar termos circunstanciados de ocorrência.

Operação da PRF junto do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Rio, em maio de 2022, terminou com 22 mortos na Vila Cruzeiro, zona norte carioca, a 3ª ação policial mais letal da história do Estado. Naquela mesma comunidade, outra ação com participação dos agentes rodoviários federais teve oito óbitos. “É fundamental a revogação imediata da portaria das chamadas operações conjuntas”, afirma Hirata.

Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o trabalho integrado não é ruim, mas demanda fixar melhor os protocolos. “A PRF é fundamental no apoio a operações integradas de combate ao trabalho análogo à escravidão, à prostituição e à pornografia infantil, porque são ações tocadas pelo Ministério Público Federal (MPF)”, diz.

“Como a PRF não tem uma missão tão definida como a Polícia Federal, que é uma polícia judiciária, ela vai ampliando o mandato dela de polícia ostensiva e, ao mesmo tempo, se coloca à disposição do poder (vigente)”, afirma. Esse processo, na opinião dele, avançou nas últimas duas décadas, sobretudo na gestão Bolsonaro.

Nessa segunda-feira, 18, o diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, declarou que a corporação deverá mudar sua “doutrina de atuação”. A afirmação veio após Oliveira afirmar que a morte da menina Heloísa é “uma dor institucional”.

“Nós estamos fazendo não só um curso de reciclagem, estamos fazendo um estudo para mudança da doutrina de atuação da Polícia Rodoviária Federal. Inclusive, já marcada para o próximo mês, uma audiência pública. Porque nós queremos escutar a sociedade também, no redesenho dessa doutrina”, sustentou o diretor-geral.

Justiça define R$ 1, 4 milhão após ‘câmara de gás’ em viatura

A ação que resultou na morte de Heloísa, atingida na cabeça e na coluna no último dia 7, é investigada pelo MPF. Os agentes rodoviários dizem que atiraram por acreditar que o veículo onde ela estava era roubado. Nesta segunda-feira, 16, a Justiça negou o pedido de prisão dos três policiais envolvidos na abordagem, mas determinou que eles fiquem apenas em funções administrativas, dentre outras sanções.

Em maio de 2022, Genivaldo de Jesus, de 38 anos, foi morto no Sergipe após agentes da PRF local o colocarem dentro de uma viatura e jogarem bombas de gás no veículo. Ele, que sofria de esquizofrenia e estava em surto, morreu asfixiado. Na semana passada, a Justiça condenou a União a pagar R$ 1 milhão ao filho de Genivaldo e R$ 405 mil à mãe da vítima.

Genivaldo morreu após ser trancado em viatura da PRF com gás em Sergipe Foto: Reprodução Redes Sociais

Após a repercussão negativa do caso, a corporação também planeja instalar câmeras corporais nos uniformes dos agentes: a implementação gradual a partir de abril de 2024. Os casos de Heloísa, Genivaldo e as blitze nas eleições foram lembrados por Gilmar Mendes em publicação na rede social X (antigo Twitter) no fim de semana, onde ele sugere repensar a existência da PRF.

Para o sociólogo Daniel Hirata, a série de falhas desfaz a boa impressão que a PRF tinha em meados da década passada. “Tinha uso de tecnologia e atuação que sempre foram bem vistas por aqueles que se dedicam a olhar a essas questões”, considera.

PRF defende a democracia, diz federação da categoria

O Estadão pediu posicionamento à PRF sobre a manifestação do ministro Gilmar Mendes. Sem citar o ministro, a corporação declarou que “a comoção social no País é justificada”, e acrescentou que “o volume de manifestações públicas sobre a atuação da PRF também indica o tamanho da instituição e comprova a tese de que a sociedade exige resultados cada vez mais precisos e profissionais”.

Ainda de acordo com a PRF, os episódios recentes servirão de base para que se apromire a atuação da polícia. “As falhas, mesmo as mais duras, são ocasiões para aprimorar o que a PRF entrega à população brasileira: segurança pública. Dessa forma, estamos debruçados sobre trágicas ocorrências em que a instituição esteve envolvida, estudando formas de, juntos, impedir que episódios semelhantes se repitam”, diz a nota.

O Ministério da Justiça tem afirmado implementar mudanças na formação e na orientação dadas às equipes. Nessa segunda, Dino chamou a ação que resultou na morte de Heloísa de “absurdo” e disse que as normas da PRF preveem justamente o contrário. “Essas normas dizem que não é possível a um agente, diante da não parada de um veículo, disparar arma de fogo.”

Além do procedimento interno de investigação do governo, o MPF investiga a ação que matou Heloísa. A Corregedoria da PRF também apura a ida de 28 agentes da corporação onde a criança estava internada, segundo parentes de Heloísa, e suspeita de tentativas de constranger a família.

A Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), por sua vez, publicou nota repudiando as declarações do ministro. “A PRF é uma instituição que defende a democracia, a independência e o respeito aos poderes. Casos como o ocorrido na última semana (morte da menina Heloísa) não podem ser utilizados para condenar o nobre ofício dos nossos policiais”, aponta o texto

“A Polícia Rodoviária Federal é uma corporação quase centenária, com baixíssimo índice de letalidade, e de maior credibilidade entre os brasileiros, conforme demonstram todas as pesquisas de opinião pública”, acrescenta a FenaPRF.

A morte da menina Heloísa Santos Silva, de 3 anos, baleada na cabeça quando estava no carro dos pais na Baixada Fluminense, pôs a Polícia Rodoviária Federal (PRF) mais uma vez em xeque – os disparos partiram de agentes da corporação. O episódio se soma a mais casos recentes, como o de Genivaldo de Jesus, de 38 anos, morto no ano passado após ser trancado com gás no porta-malas de uma viatura da corporação em Umbaúba, Sergipe.

As mortes em ações da PRF dobraram entre 2018 e o ano passado: de 22 para 44, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que não detalhou as ocorrências. A pasta afirma que houve esforço nos últimos meses para baixar as taxas de letalidade: são oito este ano. “Queremos e vamos alcançar que este número seja zero”, disse o ministro Flávio Dino nesta segunda-feira, 18. No total, foram 156 óbitos desde 2018.

Os resultados fracos na segurança pública tem desgastado Dino até mesmo entre aliados. Ele também é cotado para deixar o ministério para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mortes em ações da Polícia Rodoviária Federal dobraram entre 2018 e 2022, saltando de 22 para 44 Foto: Divulgação/PRF-SP

Além disso, o antigo comando da PRF é alvo de investigação por suposta interferência para atrapalhar a votação no 2º turno das eleições de 2022 no Nordeste e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diretor da corporação à época, Silvinei Vasques está preso desde agosto. Ele nega as acusações.

Após a morte de Heloísa, no sábado, 16, o ministro Gilmar Mendes, do STF, sugeriu que a existência da PRF seja “repensada”. Na avaliação do magistrado, “para violações estruturais, (é preciso) medidas também estruturais”.

A declaração foi repudiada por representantes dos agentes, mas reforçou a discussão sobre a mudança de rota, que é admitida pelo próprio governo. Conhecida principalmente pela fiscalização em estradas, a corporação tem ampliado seu escopo e atuado mais em operações de polícias locais. Conforme especialistas ouvidos pelo Estadão, os episódios recentes lançam luz sobre a necessidade não de extinguir a corporação, mas de ter protocolos mais específicos para nortear seus agentes.

As operações de combate à criminalidade da PRF praticamente triplicaram em dois anos, segundo relatório de gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foram de 3,3 mil, em 2020, para 9,7 mil, no último ano. Segundo o documento, as operações são, sobretudo, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste”, descritas como “as principais áreas críticas de acidentalidade e de criminalidade do País”.

O orçamento do órgão tem crescido: em 2023 é de R$ 6,1 bilhões, diz o Portal de Transparência do governo federal. Em 2019, o gasto da PRF foi de R$ 4,4 bilhões, em valor não corrigido pela inflação.

O efetivo é de quase 13 mil agentes, praticamente o mesmo de policiais federais. Supera o das polícias militares de vários Estados, como Santa Catarina (9,9 mil) e Maranhão (11 mil), segundo o Perfil Nacional das Instituições de Segurança Pública.

Heloísa Santos Silva, de 3 anos, foi baleada na cabeça quando estava no carro dos pais no Rio Foto: @instagram/w.i.l.l.i.a.n_s.i.l.v.a_

Para o sociólogo Daniel Veloso Hirata, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), a PRF tem, sim, razão para existir, mas para se mostrar efetiva é preciso que retorne o quanto antes às funções para a qual foi originalmente criada, em 1928.

“A PRF foi pensada para atuar nas rodovias e estradas federais. O escopo de atuação dela é bem definido, delimitado. Mas o que vimos nos últimos anos foi um aumento não só no efetivo e no orçamento, sobretudo no governo Bolsonaro, como das competências. A PRF passou a atuar em atividades ostensivas e repressivas, não só em estradas e rodovias federais, mas também em favelas e periferias”, pondera Hirata. “Está mais do que na hora de a PRF voltar às suas atribuições originais.”

Corporação atuou em operações letais no Rio

A participação da PRF em operações fora das rodovias foi definida em portarias da gestão passada. Em 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, definiu diretrizes para a participação da PRF em operações conjuntas nas estradas federais ou “em áreas de interesse da União”, o que aumentou muito o escopo de atribuição da força.

A portaria foi questionada na Justiça e substituída dois anos mais tarde. O novo texto limitou operações ostensivas da PRF, mas parte das definições foi mantida. Entre elas, a permissão para integrar operações conjuntas, ingressar em locais alvos de mandado de busca e apreensão, com decisão judicial, e lavrar termos circunstanciados de ocorrência.

Operação da PRF junto do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Rio, em maio de 2022, terminou com 22 mortos na Vila Cruzeiro, zona norte carioca, a 3ª ação policial mais letal da história do Estado. Naquela mesma comunidade, outra ação com participação dos agentes rodoviários federais teve oito óbitos. “É fundamental a revogação imediata da portaria das chamadas operações conjuntas”, afirma Hirata.

Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o trabalho integrado não é ruim, mas demanda fixar melhor os protocolos. “A PRF é fundamental no apoio a operações integradas de combate ao trabalho análogo à escravidão, à prostituição e à pornografia infantil, porque são ações tocadas pelo Ministério Público Federal (MPF)”, diz.

“Como a PRF não tem uma missão tão definida como a Polícia Federal, que é uma polícia judiciária, ela vai ampliando o mandato dela de polícia ostensiva e, ao mesmo tempo, se coloca à disposição do poder (vigente)”, afirma. Esse processo, na opinião dele, avançou nas últimas duas décadas, sobretudo na gestão Bolsonaro.

Nessa segunda-feira, 18, o diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, declarou que a corporação deverá mudar sua “doutrina de atuação”. A afirmação veio após Oliveira afirmar que a morte da menina Heloísa é “uma dor institucional”.

“Nós estamos fazendo não só um curso de reciclagem, estamos fazendo um estudo para mudança da doutrina de atuação da Polícia Rodoviária Federal. Inclusive, já marcada para o próximo mês, uma audiência pública. Porque nós queremos escutar a sociedade também, no redesenho dessa doutrina”, sustentou o diretor-geral.

Justiça define R$ 1, 4 milhão após ‘câmara de gás’ em viatura

A ação que resultou na morte de Heloísa, atingida na cabeça e na coluna no último dia 7, é investigada pelo MPF. Os agentes rodoviários dizem que atiraram por acreditar que o veículo onde ela estava era roubado. Nesta segunda-feira, 16, a Justiça negou o pedido de prisão dos três policiais envolvidos na abordagem, mas determinou que eles fiquem apenas em funções administrativas, dentre outras sanções.

Em maio de 2022, Genivaldo de Jesus, de 38 anos, foi morto no Sergipe após agentes da PRF local o colocarem dentro de uma viatura e jogarem bombas de gás no veículo. Ele, que sofria de esquizofrenia e estava em surto, morreu asfixiado. Na semana passada, a Justiça condenou a União a pagar R$ 1 milhão ao filho de Genivaldo e R$ 405 mil à mãe da vítima.

Genivaldo morreu após ser trancado em viatura da PRF com gás em Sergipe Foto: Reprodução Redes Sociais

Após a repercussão negativa do caso, a corporação também planeja instalar câmeras corporais nos uniformes dos agentes: a implementação gradual a partir de abril de 2024. Os casos de Heloísa, Genivaldo e as blitze nas eleições foram lembrados por Gilmar Mendes em publicação na rede social X (antigo Twitter) no fim de semana, onde ele sugere repensar a existência da PRF.

Para o sociólogo Daniel Hirata, a série de falhas desfaz a boa impressão que a PRF tinha em meados da década passada. “Tinha uso de tecnologia e atuação que sempre foram bem vistas por aqueles que se dedicam a olhar a essas questões”, considera.

PRF defende a democracia, diz federação da categoria

O Estadão pediu posicionamento à PRF sobre a manifestação do ministro Gilmar Mendes. Sem citar o ministro, a corporação declarou que “a comoção social no País é justificada”, e acrescentou que “o volume de manifestações públicas sobre a atuação da PRF também indica o tamanho da instituição e comprova a tese de que a sociedade exige resultados cada vez mais precisos e profissionais”.

Ainda de acordo com a PRF, os episódios recentes servirão de base para que se apromire a atuação da polícia. “As falhas, mesmo as mais duras, são ocasiões para aprimorar o que a PRF entrega à população brasileira: segurança pública. Dessa forma, estamos debruçados sobre trágicas ocorrências em que a instituição esteve envolvida, estudando formas de, juntos, impedir que episódios semelhantes se repitam”, diz a nota.

O Ministério da Justiça tem afirmado implementar mudanças na formação e na orientação dadas às equipes. Nessa segunda, Dino chamou a ação que resultou na morte de Heloísa de “absurdo” e disse que as normas da PRF preveem justamente o contrário. “Essas normas dizem que não é possível a um agente, diante da não parada de um veículo, disparar arma de fogo.”

Além do procedimento interno de investigação do governo, o MPF investiga a ação que matou Heloísa. A Corregedoria da PRF também apura a ida de 28 agentes da corporação onde a criança estava internada, segundo parentes de Heloísa, e suspeita de tentativas de constranger a família.

A Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), por sua vez, publicou nota repudiando as declarações do ministro. “A PRF é uma instituição que defende a democracia, a independência e o respeito aos poderes. Casos como o ocorrido na última semana (morte da menina Heloísa) não podem ser utilizados para condenar o nobre ofício dos nossos policiais”, aponta o texto

“A Polícia Rodoviária Federal é uma corporação quase centenária, com baixíssimo índice de letalidade, e de maior credibilidade entre os brasileiros, conforme demonstram todas as pesquisas de opinião pública”, acrescenta a FenaPRF.

A morte da menina Heloísa Santos Silva, de 3 anos, baleada na cabeça quando estava no carro dos pais na Baixada Fluminense, pôs a Polícia Rodoviária Federal (PRF) mais uma vez em xeque – os disparos partiram de agentes da corporação. O episódio se soma a mais casos recentes, como o de Genivaldo de Jesus, de 38 anos, morto no ano passado após ser trancado com gás no porta-malas de uma viatura da corporação em Umbaúba, Sergipe.

As mortes em ações da PRF dobraram entre 2018 e o ano passado: de 22 para 44, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que não detalhou as ocorrências. A pasta afirma que houve esforço nos últimos meses para baixar as taxas de letalidade: são oito este ano. “Queremos e vamos alcançar que este número seja zero”, disse o ministro Flávio Dino nesta segunda-feira, 18. No total, foram 156 óbitos desde 2018.

Os resultados fracos na segurança pública tem desgastado Dino até mesmo entre aliados. Ele também é cotado para deixar o ministério para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mortes em ações da Polícia Rodoviária Federal dobraram entre 2018 e 2022, saltando de 22 para 44 Foto: Divulgação/PRF-SP

Além disso, o antigo comando da PRF é alvo de investigação por suposta interferência para atrapalhar a votação no 2º turno das eleições de 2022 no Nordeste e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diretor da corporação à época, Silvinei Vasques está preso desde agosto. Ele nega as acusações.

Após a morte de Heloísa, no sábado, 16, o ministro Gilmar Mendes, do STF, sugeriu que a existência da PRF seja “repensada”. Na avaliação do magistrado, “para violações estruturais, (é preciso) medidas também estruturais”.

A declaração foi repudiada por representantes dos agentes, mas reforçou a discussão sobre a mudança de rota, que é admitida pelo próprio governo. Conhecida principalmente pela fiscalização em estradas, a corporação tem ampliado seu escopo e atuado mais em operações de polícias locais. Conforme especialistas ouvidos pelo Estadão, os episódios recentes lançam luz sobre a necessidade não de extinguir a corporação, mas de ter protocolos mais específicos para nortear seus agentes.

As operações de combate à criminalidade da PRF praticamente triplicaram em dois anos, segundo relatório de gestão do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foram de 3,3 mil, em 2020, para 9,7 mil, no último ano. Segundo o documento, as operações são, sobretudo, no Sul, Sudeste e Centro-Oeste”, descritas como “as principais áreas críticas de acidentalidade e de criminalidade do País”.

O orçamento do órgão tem crescido: em 2023 é de R$ 6,1 bilhões, diz o Portal de Transparência do governo federal. Em 2019, o gasto da PRF foi de R$ 4,4 bilhões, em valor não corrigido pela inflação.

O efetivo é de quase 13 mil agentes, praticamente o mesmo de policiais federais. Supera o das polícias militares de vários Estados, como Santa Catarina (9,9 mil) e Maranhão (11 mil), segundo o Perfil Nacional das Instituições de Segurança Pública.

Heloísa Santos Silva, de 3 anos, foi baleada na cabeça quando estava no carro dos pais no Rio Foto: @instagram/w.i.l.l.i.a.n_s.i.l.v.a_

Para o sociólogo Daniel Veloso Hirata, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), a PRF tem, sim, razão para existir, mas para se mostrar efetiva é preciso que retorne o quanto antes às funções para a qual foi originalmente criada, em 1928.

“A PRF foi pensada para atuar nas rodovias e estradas federais. O escopo de atuação dela é bem definido, delimitado. Mas o que vimos nos últimos anos foi um aumento não só no efetivo e no orçamento, sobretudo no governo Bolsonaro, como das competências. A PRF passou a atuar em atividades ostensivas e repressivas, não só em estradas e rodovias federais, mas também em favelas e periferias”, pondera Hirata. “Está mais do que na hora de a PRF voltar às suas atribuições originais.”

Corporação atuou em operações letais no Rio

A participação da PRF em operações fora das rodovias foi definida em portarias da gestão passada. Em 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, definiu diretrizes para a participação da PRF em operações conjuntas nas estradas federais ou “em áreas de interesse da União”, o que aumentou muito o escopo de atribuição da força.

A portaria foi questionada na Justiça e substituída dois anos mais tarde. O novo texto limitou operações ostensivas da PRF, mas parte das definições foi mantida. Entre elas, a permissão para integrar operações conjuntas, ingressar em locais alvos de mandado de busca e apreensão, com decisão judicial, e lavrar termos circunstanciados de ocorrência.

Operação da PRF junto do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Rio, em maio de 2022, terminou com 22 mortos na Vila Cruzeiro, zona norte carioca, a 3ª ação policial mais letal da história do Estado. Naquela mesma comunidade, outra ação com participação dos agentes rodoviários federais teve oito óbitos. “É fundamental a revogação imediata da portaria das chamadas operações conjuntas”, afirma Hirata.

Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o trabalho integrado não é ruim, mas demanda fixar melhor os protocolos. “A PRF é fundamental no apoio a operações integradas de combate ao trabalho análogo à escravidão, à prostituição e à pornografia infantil, porque são ações tocadas pelo Ministério Público Federal (MPF)”, diz.

“Como a PRF não tem uma missão tão definida como a Polícia Federal, que é uma polícia judiciária, ela vai ampliando o mandato dela de polícia ostensiva e, ao mesmo tempo, se coloca à disposição do poder (vigente)”, afirma. Esse processo, na opinião dele, avançou nas últimas duas décadas, sobretudo na gestão Bolsonaro.

Nessa segunda-feira, 18, o diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Souza Oliveira, declarou que a corporação deverá mudar sua “doutrina de atuação”. A afirmação veio após Oliveira afirmar que a morte da menina Heloísa é “uma dor institucional”.

“Nós estamos fazendo não só um curso de reciclagem, estamos fazendo um estudo para mudança da doutrina de atuação da Polícia Rodoviária Federal. Inclusive, já marcada para o próximo mês, uma audiência pública. Porque nós queremos escutar a sociedade também, no redesenho dessa doutrina”, sustentou o diretor-geral.

Justiça define R$ 1, 4 milhão após ‘câmara de gás’ em viatura

A ação que resultou na morte de Heloísa, atingida na cabeça e na coluna no último dia 7, é investigada pelo MPF. Os agentes rodoviários dizem que atiraram por acreditar que o veículo onde ela estava era roubado. Nesta segunda-feira, 16, a Justiça negou o pedido de prisão dos três policiais envolvidos na abordagem, mas determinou que eles fiquem apenas em funções administrativas, dentre outras sanções.

Em maio de 2022, Genivaldo de Jesus, de 38 anos, foi morto no Sergipe após agentes da PRF local o colocarem dentro de uma viatura e jogarem bombas de gás no veículo. Ele, que sofria de esquizofrenia e estava em surto, morreu asfixiado. Na semana passada, a Justiça condenou a União a pagar R$ 1 milhão ao filho de Genivaldo e R$ 405 mil à mãe da vítima.

Genivaldo morreu após ser trancado em viatura da PRF com gás em Sergipe Foto: Reprodução Redes Sociais

Após a repercussão negativa do caso, a corporação também planeja instalar câmeras corporais nos uniformes dos agentes: a implementação gradual a partir de abril de 2024. Os casos de Heloísa, Genivaldo e as blitze nas eleições foram lembrados por Gilmar Mendes em publicação na rede social X (antigo Twitter) no fim de semana, onde ele sugere repensar a existência da PRF.

Para o sociólogo Daniel Hirata, a série de falhas desfaz a boa impressão que a PRF tinha em meados da década passada. “Tinha uso de tecnologia e atuação que sempre foram bem vistas por aqueles que se dedicam a olhar a essas questões”, considera.

PRF defende a democracia, diz federação da categoria

O Estadão pediu posicionamento à PRF sobre a manifestação do ministro Gilmar Mendes. Sem citar o ministro, a corporação declarou que “a comoção social no País é justificada”, e acrescentou que “o volume de manifestações públicas sobre a atuação da PRF também indica o tamanho da instituição e comprova a tese de que a sociedade exige resultados cada vez mais precisos e profissionais”.

Ainda de acordo com a PRF, os episódios recentes servirão de base para que se apromire a atuação da polícia. “As falhas, mesmo as mais duras, são ocasiões para aprimorar o que a PRF entrega à população brasileira: segurança pública. Dessa forma, estamos debruçados sobre trágicas ocorrências em que a instituição esteve envolvida, estudando formas de, juntos, impedir que episódios semelhantes se repitam”, diz a nota.

O Ministério da Justiça tem afirmado implementar mudanças na formação e na orientação dadas às equipes. Nessa segunda, Dino chamou a ação que resultou na morte de Heloísa de “absurdo” e disse que as normas da PRF preveem justamente o contrário. “Essas normas dizem que não é possível a um agente, diante da não parada de um veículo, disparar arma de fogo.”

Além do procedimento interno de investigação do governo, o MPF investiga a ação que matou Heloísa. A Corregedoria da PRF também apura a ida de 28 agentes da corporação onde a criança estava internada, segundo parentes de Heloísa, e suspeita de tentativas de constranger a família.

A Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), por sua vez, publicou nota repudiando as declarações do ministro. “A PRF é uma instituição que defende a democracia, a independência e o respeito aos poderes. Casos como o ocorrido na última semana (morte da menina Heloísa) não podem ser utilizados para condenar o nobre ofício dos nossos policiais”, aponta o texto

“A Polícia Rodoviária Federal é uma corporação quase centenária, com baixíssimo índice de letalidade, e de maior credibilidade entre os brasileiros, conforme demonstram todas as pesquisas de opinião pública”, acrescenta a FenaPRF.

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