Na pequena Ipuaçu, cidade do interior de Santa Catarina, sobram especulações, boatos e palpites - alguns mantidos em segredo, com receio de virar piada - sobre a autoria dos agroglifos, desenhos que surgiram em plantações locais. Não descartam ser ação publicitária, competição de gente da agronomia ou, de fato, a mensagem dos irmãos marcianos.
“Com tanta tecnologia, seria perfeitamente possível produzir essas formações. É puro interesse comercial, para sobrevivência da pesquisa ufológica”, opina o engenheiro agrônomo Alexandre Seron, de 30 anos.
Para o astrônomo Stotz Neto, da UFSC, não faria sentido o alienígena ter tecnologia e corpo resistente para a viagem interplanetária e se limitar a essa intervenção. “Por que iria deixar um desenho em uma plantação de trigo e ir embora?”, questiona ele. Outra moradora de Ipuaçu, Janete Bevilaqua, de 53 anos, também aposta na precisão de uma máquina. “Se fosse extraterrestre, alguém teria visto!”, aponta.
Caso alguém tenha feito o flagra, existe a chance até de ganhar uns trocados. A Revista Ovni Pesquisa, de Belo Horizonte, diz que vai pagar R$ 1,5 mil a quem enviar informações seguras sobre os autores das figuras. O e-mail é contato@ovnipesquisa.com.br e o periódico promete guardar sigilo sobre os colaboradores.
Já Ivo Bohl, ufólogo de 56 anos, acredita haver fartos indícios sobre a impossibilidade de os desenhos ipuaçuenses não serem fruto de trabalho humano. Mas ele, espiritualista, defende não se prender a provas estritamente técnicas. “Cada um pode interpretar da forma que desejar, porém está acima da nossa compreensão humana. Seria egoísmo da nossa parte pensar que estamos sozinhos, basta olhar para as estrelas.”
‘Ninguém vê nada’
As imagens - formas geométricas com pentágono, círculos e um triângulo em meio ao trigo - não correram só o WhatsApp local: viralizaram nas redes sociais. “Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá”, diz o agricultor Sérgio Girotto, de 62 anos. Ele jura não ter ideia de como as inscrições misteriosas foram parar nas suas terras, onde, além de trigo e agroglifos, costumam brotar feijão, milho e aveia.
“Não é a primeira vez. Em 2013 já tinha acontecido (na propriedade dos Girotto), mas a gente não deu muita importância”, relata ele, que vive com a mulher.
A diferença desta vez, afirmam moradores, foi a proximidade com a área urbana e também as formas diferentes de qualquer outra já vista na região. Grafismos de grande porte criados a partir do achatamento de plantações, os agroglifos costumam ter origem desconhecida, alimentando a imaginação de vizinhos e embates entre ciência e ufologia.
Católico, Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços na sua lavoura, que tem um total de 17 hectares. Invasores? Animais? Fantasmas? OVNIs? “Não acredito nem desacredito. Mas que é muito estranho, é!”, admite. O mistério atrai curiosos - na maior parte de estudantes e de caçadores de vida extraterrestre.
“Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas. Teve um casal de franceses também, que nem deu para entender o que falavam. Disseram que moram em Foz do Iguaçu”, conta o agricultor.
Muitos desses grupos, inclusive, apontam falsos agroglifos - o que seriam apenas imitações dos desenhos legítimos, que obedecem a uma série de supostos padrões, como curvatura dos vegetais, distâncias simétricas, e preservação da estrutura das plantas, sem dano ao caule ou às folhas. Na propriedade de Girotto, as fortes chuvas desta semana já apagaram os desenhos.
Prefeitura quer surfar na fama
Se os desenhistas seguem no anonimato, Ipuaçu quer usufruir da fama. A prefeitura já ostenta no site o título de “capital nacional dos agroglifos”, mas ainda está longe de receber o mesmo volume de turistas que Roswell (EUA), onde supostamente um disco voador teria sido achado, ou Stonehenge (Reino Unido), monumento pré-histórico de pedra.
A prefeitura de Ipuaçu afirma que, a cada novo agroglifo (a lista no site do município aponta que esse seria pelo menos o quinto na região desde 2008), aparecem cerca de 2 mil pessoas. O comércio, porém, não tem visto todo esse movimento.
“Desta vez tivemos apenas dois repórteres que se hospedaram aqui. As pessoas vêm mais por curiosidade, ficam meia hora e vão embora. Não chegam a consumir na cidade”, reclama Eliamar Seraglio, de 40 anos, dona do único hotel do município. A reportagem do Estadão até passou o dia e almoçou na cidade, mas também não pernoitou.
Já Luiz Prates Junior, do Grupo de Pesquisa Ufológica de Santa Catarina, investiu tempo no local para colher amostras de terra, das plantas, ouvir testemunhas e coletar imagens do desenho, com cerca de 700 m².
“Apesar de o desenho ter sido criado sobre as marcas de roda de trator, não foram identificadas marcas de pegadas humanas, descartando que o agroglifo tenha sido produzido com cordas ou madeira”, afirmou Prates, em nota. “Se assim fosse, a vegetação não estaria deitada da forma como foi encontrada, mas sim com várias plantas quebradas ou levantadas”, complementa. Ele também pretende medir diferenças eletromagnéticas entre a área dos agroglifos e de outros pontos, trabalho que ele acredita que vai reforçar sua tese.