Agroglifos em SC: ‘Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá’, diz dono de terra onde surgiu desenho


Imagens de desenhos em plantação na cidade catarinense de Ipuaçu viralizaram no último mês. Prefeitura quer capitalizar fama e atrair turistas

Por Luís Lopes
Atualização:

CHAPECÓ - A rotina do agricultor Sérgio Girotto, de 62 anos, não difere muito do resto de Ipuaçu, cidade de 7,6 mil habitantes no oeste catarinense. Acorda às 5h30, prepara o chimarrão e sai para trabalhar. Na manhã do último dia 4, pipocaram fotos no celular de Girotto. Eram agroglifos, desenhos que aparecem em plantações locais desde 2008. Ele só não imaginava, segundo conta, que dava para ver a novidade da sua varanda. “Quando saí, pude ver lá do alto.”

As imagens - formas geométricas com pentágono, círculos e um triângulo em meio ao trigo - não correram só o WhatsApp de Girotto e seus vizinhos: viralizaram nas redes sociais. “Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá”, diz ele. O agricultor jura não ter ideia de como as inscrições misteriosas foram parar nas suas terras, onde, além de trigo e agroglifos, costumam brotar feijão, milho e aveia.

“Não é a primeira vez. Em 2013 já tinha acontecido (na propriedade dos Girotto), mas a gente não deu muita importância”, relata ele, que vive com a mulher.

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A diferença desta vez, afirmam moradores, foi a proximidade com a área urbana e também as formas diferentes de qualquer outra já vista na região. Grafismos de grande porte criados a partir do achatamento de plantações, os agroglifos costumam ter origem desconhecida, alimentando a imaginação de vizinhos e embates entre ciência e ufologia.

Por causa dos desenhos que aparecem de forma recorrente, a cidade de Ipuaçu virou um destino na rota de ufólogos Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

Católico, Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços na sua lavoura, que tem um total de 17 hectares. Invasores? Animais? Fantasmas? OVNIs? “Não acredito nem desacredito. Mas que é muito estranho, é!”, admite. O mistério atrai curiosos - na maior parte de estudantes e de caçadores de vida extraterrestre.

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“Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas. Teve um casal de franceses também, que nem deu para entender o que falavam. Disseram que moram em Foz do Iguaçu”, conta o agricultor.

Muitos desses grupos, inclusive, apontam falsos agroglifos - o que seriam apenas imitações dos desenhos legítimos, que obedecem a uma série de supostos padrões, como curvatura dos vegetais, distâncias simétricas, e preservação da estrutura das plantas, sem dano ao caule ou às folhas. Na propriedade de Girotto, as fortes chuvas desta semana já apagaram os desenhos.

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Turismo de aeroglifos? Não (ainda)

Se os desenhistas seguem no anonimato, Ipuaçu quer usufruir da fama. A prefeitura já ostenta no site o título de “capital nacional dos agroglifos”, mas ainda está longe de receber o mesmo volume de turistas que Roswell (EUA), onde supostamente um disco voador teria sido achado, ou Stonehenge (Reino Unido), monumento pré-histórico de pedra.

A prefeitura de Ipuaçu afirma que, a cada novo agroglifo (a lista no site do município aponta que esse seria pelo menos o quinto na região desde 2008), aparecem cerca de 2 mil pessoas. O comércio, porém, não tem visto todo esse movimento.

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Agroglifos em Ipuaçu, Santa Catarina Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

“Desta vez tivemos apenas dois repórteres que se hospedaram aqui. As pessoas vêm mais por curiosidade, ficam meia hora e vão embora. Não chegam a consumir na cidade”, reclama Eliamar Seraglio, de 40 anos, dona do único hotel do município. A reportagem do Estadão até passou o dia e almoçou na cidade, mas também não pernoitou.

Já Luiz Prates Junior, do Grupo de Pesquisa Ufológica de Santa Catarina, investiu tempo no local para colher amostras de terra, das plantas, ouvir testemunhas e coletar imagens do desenho, com cerca de 700 m².

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“Apesar de o desenho ter sido criado sobre as marcas de roda de trator, não foram identificadas marcas de pegadas humanas, descartando que o agroglifo tenha sido produzido com cordas ou madeira”, afirmou Prates, em nota. “Se assim fosse, a vegetação não estaria deitada da forma como foi encontrada, mas sim com várias plantas quebradas ou levantadas”, complementa. Ele também pretende medir diferenças eletromagnéticas entre a área dos agroglifos e de outros pontos, trabalho que ele acredita que vai reforçar sua tese.

Dona do único hotel da cidade reclama que curiosos não consomem na cidade Foto: Reprodução

Cordas e tábuas - e sem disco voador

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Na ciência, é difícil encontrar alguém para endossar a tese de artistas vindos do espaço, com preferência por áreas rurais no interior do Brasil. Há notícia de desenhos enigmáticos em plantações desde a Idade Média.

Na história mais recente, os agroglifos ficaram famosos nos anos 1980, quando diversas formas começaram a surgir em campos de trigo e outros cereais no Reino Unido. Feitas a partir do achatamento da vegetação, as imagens motivaram curiosidade e teorias.

Girotto conta que o desenho atraiu curiosos de diferentes cidades: 'Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas' Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoal

Até que, em 1991, dois artistas reivindicaram a autoria dos desenhos. A um jornal britânico, os amigos Doug Bower e Dave Chorley revelaram ter feito mais de 200 deles na última década, usando tábuas e pedaços de cordas.

Um ano depois, foi organizado no Reino Unido um concurso de círculos nas colheitas (do inglês crop circles), outro nome dado aos agroglifos. Entre os participantes, estavam universitários, alunos de uma escola local e até uma dupla de mulheres acompanhada de um cão, treinado especialmente para puxar tábuas. Os resultados mostraram que os humanos eram capazes de reproduzir o design proposto.

Segundo Adolfo Stotz Neto, astrônomo e presidente do Grupo de Estudos de Astronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a técnica usada pela dupla segue sendo empregada para a criação dos recortes nas plantações. As tábuas eram usadas para amassar a plantação. Já as cordas garantem a estética, por meio de movimentos precisos.

Mesmo achando os desenhos 'muito estranhos', Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoa

Revista promete até recompensa por flagra

Uma versão ao vivo do papo nas redes sociais, na pequena Ipuaçu sobram especulações, boatos e palpites - alguns mantidos em segredo, com receio de virar piada. Não descartam ser ação publicitária, competição de gente da agronomia ou, de fato, a mensagem dos irmãos marcianos.

“Com tanta tecnologia, seria perfeitamente possível produzir essas formações. É puro interesse comercial, para sobrevivência da pesquisa ufológica”, opina o engenheiro agrônomo Alexandre Seron, de 30 anos.

Para o astrônomo Stotz Neto, da UFSC, não faria sentido o alienígena ter tecnologia e corpo resistente para a viagem interplanetária e se limitar a essa intervenção. “Por que iria deixar um desenho em uma plantação de trigo e ir embora?”, questiona ele. Outra moradora de Ipuaçu, Janete Bevilaqua, de 53 anos, também aposta na precisão de uma máquina. “Se fosse extraterrestre, alguém teria visto!”, aponta.

Caso alguém tenha feito o flagra, existe a chance até de ganhar uns trocados. A Revista Ovni Pesquisa, de Belo Horizonte, diz que vai pagar R$ 1,5 mil a quem enviar informações seguras sobre os autores das figuras. O e-mail é contato@ovnipesquisa.com.br e o periódico promete guardar sigilo sobre os colaboradores.

Já Ivo Bohl, ufólogo de 56 anos, acredita haver fartos indícios sobre a impossibilidade de os desenhos ipuaçuenses não serem fruto de trabalho humano. Mas ele, espiritualista, defende não se prender a provas estritamente técnicas. “Cada um pode interpretar da forma que desejar, porém está acima da nossa compreensão humana. Seria egoísmo da nossa parte pensar que estamos sozinhos, basta olhar para as estrelas.”/COLABOROU RAISA TOLEDO

CHAPECÓ - A rotina do agricultor Sérgio Girotto, de 62 anos, não difere muito do resto de Ipuaçu, cidade de 7,6 mil habitantes no oeste catarinense. Acorda às 5h30, prepara o chimarrão e sai para trabalhar. Na manhã do último dia 4, pipocaram fotos no celular de Girotto. Eram agroglifos, desenhos que aparecem em plantações locais desde 2008. Ele só não imaginava, segundo conta, que dava para ver a novidade da sua varanda. “Quando saí, pude ver lá do alto.”

As imagens - formas geométricas com pentágono, círculos e um triângulo em meio ao trigo - não correram só o WhatsApp de Girotto e seus vizinhos: viralizaram nas redes sociais. “Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá”, diz ele. O agricultor jura não ter ideia de como as inscrições misteriosas foram parar nas suas terras, onde, além de trigo e agroglifos, costumam brotar feijão, milho e aveia.

“Não é a primeira vez. Em 2013 já tinha acontecido (na propriedade dos Girotto), mas a gente não deu muita importância”, relata ele, que vive com a mulher.

A diferença desta vez, afirmam moradores, foi a proximidade com a área urbana e também as formas diferentes de qualquer outra já vista na região. Grafismos de grande porte criados a partir do achatamento de plantações, os agroglifos costumam ter origem desconhecida, alimentando a imaginação de vizinhos e embates entre ciência e ufologia.

Por causa dos desenhos que aparecem de forma recorrente, a cidade de Ipuaçu virou um destino na rota de ufólogos Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

Católico, Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços na sua lavoura, que tem um total de 17 hectares. Invasores? Animais? Fantasmas? OVNIs? “Não acredito nem desacredito. Mas que é muito estranho, é!”, admite. O mistério atrai curiosos - na maior parte de estudantes e de caçadores de vida extraterrestre.

“Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas. Teve um casal de franceses também, que nem deu para entender o que falavam. Disseram que moram em Foz do Iguaçu”, conta o agricultor.

Muitos desses grupos, inclusive, apontam falsos agroglifos - o que seriam apenas imitações dos desenhos legítimos, que obedecem a uma série de supostos padrões, como curvatura dos vegetais, distâncias simétricas, e preservação da estrutura das plantas, sem dano ao caule ou às folhas. Na propriedade de Girotto, as fortes chuvas desta semana já apagaram os desenhos.

Turismo de aeroglifos? Não (ainda)

Se os desenhistas seguem no anonimato, Ipuaçu quer usufruir da fama. A prefeitura já ostenta no site o título de “capital nacional dos agroglifos”, mas ainda está longe de receber o mesmo volume de turistas que Roswell (EUA), onde supostamente um disco voador teria sido achado, ou Stonehenge (Reino Unido), monumento pré-histórico de pedra.

A prefeitura de Ipuaçu afirma que, a cada novo agroglifo (a lista no site do município aponta que esse seria pelo menos o quinto na região desde 2008), aparecem cerca de 2 mil pessoas. O comércio, porém, não tem visto todo esse movimento.

Agroglifos em Ipuaçu, Santa Catarina Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

“Desta vez tivemos apenas dois repórteres que se hospedaram aqui. As pessoas vêm mais por curiosidade, ficam meia hora e vão embora. Não chegam a consumir na cidade”, reclama Eliamar Seraglio, de 40 anos, dona do único hotel do município. A reportagem do Estadão até passou o dia e almoçou na cidade, mas também não pernoitou.

Já Luiz Prates Junior, do Grupo de Pesquisa Ufológica de Santa Catarina, investiu tempo no local para colher amostras de terra, das plantas, ouvir testemunhas e coletar imagens do desenho, com cerca de 700 m².

“Apesar de o desenho ter sido criado sobre as marcas de roda de trator, não foram identificadas marcas de pegadas humanas, descartando que o agroglifo tenha sido produzido com cordas ou madeira”, afirmou Prates, em nota. “Se assim fosse, a vegetação não estaria deitada da forma como foi encontrada, mas sim com várias plantas quebradas ou levantadas”, complementa. Ele também pretende medir diferenças eletromagnéticas entre a área dos agroglifos e de outros pontos, trabalho que ele acredita que vai reforçar sua tese.

Dona do único hotel da cidade reclama que curiosos não consomem na cidade Foto: Reprodução

Cordas e tábuas - e sem disco voador

Na ciência, é difícil encontrar alguém para endossar a tese de artistas vindos do espaço, com preferência por áreas rurais no interior do Brasil. Há notícia de desenhos enigmáticos em plantações desde a Idade Média.

Na história mais recente, os agroglifos ficaram famosos nos anos 1980, quando diversas formas começaram a surgir em campos de trigo e outros cereais no Reino Unido. Feitas a partir do achatamento da vegetação, as imagens motivaram curiosidade e teorias.

Girotto conta que o desenho atraiu curiosos de diferentes cidades: 'Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas' Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoal

Até que, em 1991, dois artistas reivindicaram a autoria dos desenhos. A um jornal britânico, os amigos Doug Bower e Dave Chorley revelaram ter feito mais de 200 deles na última década, usando tábuas e pedaços de cordas.

Um ano depois, foi organizado no Reino Unido um concurso de círculos nas colheitas (do inglês crop circles), outro nome dado aos agroglifos. Entre os participantes, estavam universitários, alunos de uma escola local e até uma dupla de mulheres acompanhada de um cão, treinado especialmente para puxar tábuas. Os resultados mostraram que os humanos eram capazes de reproduzir o design proposto.

Segundo Adolfo Stotz Neto, astrônomo e presidente do Grupo de Estudos de Astronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a técnica usada pela dupla segue sendo empregada para a criação dos recortes nas plantações. As tábuas eram usadas para amassar a plantação. Já as cordas garantem a estética, por meio de movimentos precisos.

Mesmo achando os desenhos 'muito estranhos', Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoa

Revista promete até recompensa por flagra

Uma versão ao vivo do papo nas redes sociais, na pequena Ipuaçu sobram especulações, boatos e palpites - alguns mantidos em segredo, com receio de virar piada. Não descartam ser ação publicitária, competição de gente da agronomia ou, de fato, a mensagem dos irmãos marcianos.

“Com tanta tecnologia, seria perfeitamente possível produzir essas formações. É puro interesse comercial, para sobrevivência da pesquisa ufológica”, opina o engenheiro agrônomo Alexandre Seron, de 30 anos.

Para o astrônomo Stotz Neto, da UFSC, não faria sentido o alienígena ter tecnologia e corpo resistente para a viagem interplanetária e se limitar a essa intervenção. “Por que iria deixar um desenho em uma plantação de trigo e ir embora?”, questiona ele. Outra moradora de Ipuaçu, Janete Bevilaqua, de 53 anos, também aposta na precisão de uma máquina. “Se fosse extraterrestre, alguém teria visto!”, aponta.

Caso alguém tenha feito o flagra, existe a chance até de ganhar uns trocados. A Revista Ovni Pesquisa, de Belo Horizonte, diz que vai pagar R$ 1,5 mil a quem enviar informações seguras sobre os autores das figuras. O e-mail é contato@ovnipesquisa.com.br e o periódico promete guardar sigilo sobre os colaboradores.

Já Ivo Bohl, ufólogo de 56 anos, acredita haver fartos indícios sobre a impossibilidade de os desenhos ipuaçuenses não serem fruto de trabalho humano. Mas ele, espiritualista, defende não se prender a provas estritamente técnicas. “Cada um pode interpretar da forma que desejar, porém está acima da nossa compreensão humana. Seria egoísmo da nossa parte pensar que estamos sozinhos, basta olhar para as estrelas.”/COLABOROU RAISA TOLEDO

CHAPECÓ - A rotina do agricultor Sérgio Girotto, de 62 anos, não difere muito do resto de Ipuaçu, cidade de 7,6 mil habitantes no oeste catarinense. Acorda às 5h30, prepara o chimarrão e sai para trabalhar. Na manhã do último dia 4, pipocaram fotos no celular de Girotto. Eram agroglifos, desenhos que aparecem em plantações locais desde 2008. Ele só não imaginava, segundo conta, que dava para ver a novidade da sua varanda. “Quando saí, pude ver lá do alto.”

As imagens - formas geométricas com pentágono, círculos e um triângulo em meio ao trigo - não correram só o WhatsApp de Girotto e seus vizinhos: viralizaram nas redes sociais. “Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá”, diz ele. O agricultor jura não ter ideia de como as inscrições misteriosas foram parar nas suas terras, onde, além de trigo e agroglifos, costumam brotar feijão, milho e aveia.

“Não é a primeira vez. Em 2013 já tinha acontecido (na propriedade dos Girotto), mas a gente não deu muita importância”, relata ele, que vive com a mulher.

A diferença desta vez, afirmam moradores, foi a proximidade com a área urbana e também as formas diferentes de qualquer outra já vista na região. Grafismos de grande porte criados a partir do achatamento de plantações, os agroglifos costumam ter origem desconhecida, alimentando a imaginação de vizinhos e embates entre ciência e ufologia.

Por causa dos desenhos que aparecem de forma recorrente, a cidade de Ipuaçu virou um destino na rota de ufólogos Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

Católico, Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços na sua lavoura, que tem um total de 17 hectares. Invasores? Animais? Fantasmas? OVNIs? “Não acredito nem desacredito. Mas que é muito estranho, é!”, admite. O mistério atrai curiosos - na maior parte de estudantes e de caçadores de vida extraterrestre.

“Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas. Teve um casal de franceses também, que nem deu para entender o que falavam. Disseram que moram em Foz do Iguaçu”, conta o agricultor.

Muitos desses grupos, inclusive, apontam falsos agroglifos - o que seriam apenas imitações dos desenhos legítimos, que obedecem a uma série de supostos padrões, como curvatura dos vegetais, distâncias simétricas, e preservação da estrutura das plantas, sem dano ao caule ou às folhas. Na propriedade de Girotto, as fortes chuvas desta semana já apagaram os desenhos.

Turismo de aeroglifos? Não (ainda)

Se os desenhistas seguem no anonimato, Ipuaçu quer usufruir da fama. A prefeitura já ostenta no site o título de “capital nacional dos agroglifos”, mas ainda está longe de receber o mesmo volume de turistas que Roswell (EUA), onde supostamente um disco voador teria sido achado, ou Stonehenge (Reino Unido), monumento pré-histórico de pedra.

A prefeitura de Ipuaçu afirma que, a cada novo agroglifo (a lista no site do município aponta que esse seria pelo menos o quinto na região desde 2008), aparecem cerca de 2 mil pessoas. O comércio, porém, não tem visto todo esse movimento.

Agroglifos em Ipuaçu, Santa Catarina Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

“Desta vez tivemos apenas dois repórteres que se hospedaram aqui. As pessoas vêm mais por curiosidade, ficam meia hora e vão embora. Não chegam a consumir na cidade”, reclama Eliamar Seraglio, de 40 anos, dona do único hotel do município. A reportagem do Estadão até passou o dia e almoçou na cidade, mas também não pernoitou.

Já Luiz Prates Junior, do Grupo de Pesquisa Ufológica de Santa Catarina, investiu tempo no local para colher amostras de terra, das plantas, ouvir testemunhas e coletar imagens do desenho, com cerca de 700 m².

“Apesar de o desenho ter sido criado sobre as marcas de roda de trator, não foram identificadas marcas de pegadas humanas, descartando que o agroglifo tenha sido produzido com cordas ou madeira”, afirmou Prates, em nota. “Se assim fosse, a vegetação não estaria deitada da forma como foi encontrada, mas sim com várias plantas quebradas ou levantadas”, complementa. Ele também pretende medir diferenças eletromagnéticas entre a área dos agroglifos e de outros pontos, trabalho que ele acredita que vai reforçar sua tese.

Dona do único hotel da cidade reclama que curiosos não consomem na cidade Foto: Reprodução

Cordas e tábuas - e sem disco voador

Na ciência, é difícil encontrar alguém para endossar a tese de artistas vindos do espaço, com preferência por áreas rurais no interior do Brasil. Há notícia de desenhos enigmáticos em plantações desde a Idade Média.

Na história mais recente, os agroglifos ficaram famosos nos anos 1980, quando diversas formas começaram a surgir em campos de trigo e outros cereais no Reino Unido. Feitas a partir do achatamento da vegetação, as imagens motivaram curiosidade e teorias.

Girotto conta que o desenho atraiu curiosos de diferentes cidades: 'Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas' Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoal

Até que, em 1991, dois artistas reivindicaram a autoria dos desenhos. A um jornal britânico, os amigos Doug Bower e Dave Chorley revelaram ter feito mais de 200 deles na última década, usando tábuas e pedaços de cordas.

Um ano depois, foi organizado no Reino Unido um concurso de círculos nas colheitas (do inglês crop circles), outro nome dado aos agroglifos. Entre os participantes, estavam universitários, alunos de uma escola local e até uma dupla de mulheres acompanhada de um cão, treinado especialmente para puxar tábuas. Os resultados mostraram que os humanos eram capazes de reproduzir o design proposto.

Segundo Adolfo Stotz Neto, astrônomo e presidente do Grupo de Estudos de Astronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a técnica usada pela dupla segue sendo empregada para a criação dos recortes nas plantações. As tábuas eram usadas para amassar a plantação. Já as cordas garantem a estética, por meio de movimentos precisos.

Mesmo achando os desenhos 'muito estranhos', Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoa

Revista promete até recompensa por flagra

Uma versão ao vivo do papo nas redes sociais, na pequena Ipuaçu sobram especulações, boatos e palpites - alguns mantidos em segredo, com receio de virar piada. Não descartam ser ação publicitária, competição de gente da agronomia ou, de fato, a mensagem dos irmãos marcianos.

“Com tanta tecnologia, seria perfeitamente possível produzir essas formações. É puro interesse comercial, para sobrevivência da pesquisa ufológica”, opina o engenheiro agrônomo Alexandre Seron, de 30 anos.

Para o astrônomo Stotz Neto, da UFSC, não faria sentido o alienígena ter tecnologia e corpo resistente para a viagem interplanetária e se limitar a essa intervenção. “Por que iria deixar um desenho em uma plantação de trigo e ir embora?”, questiona ele. Outra moradora de Ipuaçu, Janete Bevilaqua, de 53 anos, também aposta na precisão de uma máquina. “Se fosse extraterrestre, alguém teria visto!”, aponta.

Caso alguém tenha feito o flagra, existe a chance até de ganhar uns trocados. A Revista Ovni Pesquisa, de Belo Horizonte, diz que vai pagar R$ 1,5 mil a quem enviar informações seguras sobre os autores das figuras. O e-mail é contato@ovnipesquisa.com.br e o periódico promete guardar sigilo sobre os colaboradores.

Já Ivo Bohl, ufólogo de 56 anos, acredita haver fartos indícios sobre a impossibilidade de os desenhos ipuaçuenses não serem fruto de trabalho humano. Mas ele, espiritualista, defende não se prender a provas estritamente técnicas. “Cada um pode interpretar da forma que desejar, porém está acima da nossa compreensão humana. Seria egoísmo da nossa parte pensar que estamos sozinhos, basta olhar para as estrelas.”/COLABOROU RAISA TOLEDO

CHAPECÓ - A rotina do agricultor Sérgio Girotto, de 62 anos, não difere muito do resto de Ipuaçu, cidade de 7,6 mil habitantes no oeste catarinense. Acorda às 5h30, prepara o chimarrão e sai para trabalhar. Na manhã do último dia 4, pipocaram fotos no celular de Girotto. Eram agroglifos, desenhos que aparecem em plantações locais desde 2008. Ele só não imaginava, segundo conta, que dava para ver a novidade da sua varanda. “Quando saí, pude ver lá do alto.”

As imagens - formas geométricas com pentágono, círculos e um triângulo em meio ao trigo - não correram só o WhatsApp de Girotto e seus vizinhos: viralizaram nas redes sociais. “Ninguém vê nada. Acordei e já estava lá”, diz ele. O agricultor jura não ter ideia de como as inscrições misteriosas foram parar nas suas terras, onde, além de trigo e agroglifos, costumam brotar feijão, milho e aveia.

“Não é a primeira vez. Em 2013 já tinha acontecido (na propriedade dos Girotto), mas a gente não deu muita importância”, relata ele, que vive com a mulher.

A diferença desta vez, afirmam moradores, foi a proximidade com a área urbana e também as formas diferentes de qualquer outra já vista na região. Grafismos de grande porte criados a partir do achatamento de plantações, os agroglifos costumam ter origem desconhecida, alimentando a imaginação de vizinhos e embates entre ciência e ufologia.

Por causa dos desenhos que aparecem de forma recorrente, a cidade de Ipuaçu virou um destino na rota de ufólogos Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

Católico, Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços na sua lavoura, que tem um total de 17 hectares. Invasores? Animais? Fantasmas? OVNIs? “Não acredito nem desacredito. Mas que é muito estranho, é!”, admite. O mistério atrai curiosos - na maior parte de estudantes e de caçadores de vida extraterrestre.

“Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas. Teve um casal de franceses também, que nem deu para entender o que falavam. Disseram que moram em Foz do Iguaçu”, conta o agricultor.

Muitos desses grupos, inclusive, apontam falsos agroglifos - o que seriam apenas imitações dos desenhos legítimos, que obedecem a uma série de supostos padrões, como curvatura dos vegetais, distâncias simétricas, e preservação da estrutura das plantas, sem dano ao caule ou às folhas. Na propriedade de Girotto, as fortes chuvas desta semana já apagaram os desenhos.

Turismo de aeroglifos? Não (ainda)

Se os desenhistas seguem no anonimato, Ipuaçu quer usufruir da fama. A prefeitura já ostenta no site o título de “capital nacional dos agroglifos”, mas ainda está longe de receber o mesmo volume de turistas que Roswell (EUA), onde supostamente um disco voador teria sido achado, ou Stonehenge (Reino Unido), monumento pré-histórico de pedra.

A prefeitura de Ipuaçu afirma que, a cada novo agroglifo (a lista no site do município aponta que esse seria pelo menos o quinto na região desde 2008), aparecem cerca de 2 mil pessoas. O comércio, porém, não tem visto todo esse movimento.

Agroglifos em Ipuaçu, Santa Catarina Foto: Tiago Kosinski II/Reprodução

“Desta vez tivemos apenas dois repórteres que se hospedaram aqui. As pessoas vêm mais por curiosidade, ficam meia hora e vão embora. Não chegam a consumir na cidade”, reclama Eliamar Seraglio, de 40 anos, dona do único hotel do município. A reportagem do Estadão até passou o dia e almoçou na cidade, mas também não pernoitou.

Já Luiz Prates Junior, do Grupo de Pesquisa Ufológica de Santa Catarina, investiu tempo no local para colher amostras de terra, das plantas, ouvir testemunhas e coletar imagens do desenho, com cerca de 700 m².

“Apesar de o desenho ter sido criado sobre as marcas de roda de trator, não foram identificadas marcas de pegadas humanas, descartando que o agroglifo tenha sido produzido com cordas ou madeira”, afirmou Prates, em nota. “Se assim fosse, a vegetação não estaria deitada da forma como foi encontrada, mas sim com várias plantas quebradas ou levantadas”, complementa. Ele também pretende medir diferenças eletromagnéticas entre a área dos agroglifos e de outros pontos, trabalho que ele acredita que vai reforçar sua tese.

Dona do único hotel da cidade reclama que curiosos não consomem na cidade Foto: Reprodução

Cordas e tábuas - e sem disco voador

Na ciência, é difícil encontrar alguém para endossar a tese de artistas vindos do espaço, com preferência por áreas rurais no interior do Brasil. Há notícia de desenhos enigmáticos em plantações desde a Idade Média.

Na história mais recente, os agroglifos ficaram famosos nos anos 1980, quando diversas formas começaram a surgir em campos de trigo e outros cereais no Reino Unido. Feitas a partir do achatamento da vegetação, as imagens motivaram curiosidade e teorias.

Girotto conta que o desenho atraiu curiosos de diferentes cidades: 'Gente de Curitiba, de São Paulo e até do Amazonas' Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoal

Até que, em 1991, dois artistas reivindicaram a autoria dos desenhos. A um jornal britânico, os amigos Doug Bower e Dave Chorley revelaram ter feito mais de 200 deles na última década, usando tábuas e pedaços de cordas.

Um ano depois, foi organizado no Reino Unido um concurso de círculos nas colheitas (do inglês crop circles), outro nome dado aos agroglifos. Entre os participantes, estavam universitários, alunos de uma escola local e até uma dupla de mulheres acompanhada de um cão, treinado especialmente para puxar tábuas. Os resultados mostraram que os humanos eram capazes de reproduzir o design proposto.

Segundo Adolfo Stotz Neto, astrônomo e presidente do Grupo de Estudos de Astronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a técnica usada pela dupla segue sendo empregada para a criação dos recortes nas plantações. As tábuas eram usadas para amassar a plantação. Já as cordas garantem a estética, por meio de movimentos precisos.

Mesmo achando os desenhos 'muito estranhos', Girotto prefere não arriscar uma autoria para os traços Foto: Sérgio Girotto/Arquivo Pessoa

Revista promete até recompensa por flagra

Uma versão ao vivo do papo nas redes sociais, na pequena Ipuaçu sobram especulações, boatos e palpites - alguns mantidos em segredo, com receio de virar piada. Não descartam ser ação publicitária, competição de gente da agronomia ou, de fato, a mensagem dos irmãos marcianos.

“Com tanta tecnologia, seria perfeitamente possível produzir essas formações. É puro interesse comercial, para sobrevivência da pesquisa ufológica”, opina o engenheiro agrônomo Alexandre Seron, de 30 anos.

Para o astrônomo Stotz Neto, da UFSC, não faria sentido o alienígena ter tecnologia e corpo resistente para a viagem interplanetária e se limitar a essa intervenção. “Por que iria deixar um desenho em uma plantação de trigo e ir embora?”, questiona ele. Outra moradora de Ipuaçu, Janete Bevilaqua, de 53 anos, também aposta na precisão de uma máquina. “Se fosse extraterrestre, alguém teria visto!”, aponta.

Caso alguém tenha feito o flagra, existe a chance até de ganhar uns trocados. A Revista Ovni Pesquisa, de Belo Horizonte, diz que vai pagar R$ 1,5 mil a quem enviar informações seguras sobre os autores das figuras. O e-mail é contato@ovnipesquisa.com.br e o periódico promete guardar sigilo sobre os colaboradores.

Já Ivo Bohl, ufólogo de 56 anos, acredita haver fartos indícios sobre a impossibilidade de os desenhos ipuaçuenses não serem fruto de trabalho humano. Mas ele, espiritualista, defende não se prender a provas estritamente técnicas. “Cada um pode interpretar da forma que desejar, porém está acima da nossa compreensão humana. Seria egoísmo da nossa parte pensar que estamos sozinhos, basta olhar para as estrelas.”/COLABOROU RAISA TOLEDO

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