VITÓRIA - A bióloga Thais Fantini Sagrillo Zucolotto é mãe de Selena, de 12 anos, uma das quatro vítimas dos ataques em colégios em Aracruz, no interior capixaba. Ela e a família ainda tentam se recuperar do choque da perda da filha única, mas querem que a tragédia sirva de alerta para que a sociedade seja mais vigilante sobre o problema dos massacres em escolas. “Ainda não consegui tirar nada dela do lugar”, conta a mulher de 31 anos.
“Minha família precisou me ajudar a tirar os uniformes dela que estavam secando no varal. Tem uma cestinha com as roupas dela para lavar e não sei quando vou conseguir forças para fazer isso”, desabafa a mãe da vítima, que era aluna do 6.º ano do ensino fundamental em uma das escolas onde houve o tiroteio.
Ela também cobra uma investigação rigorosa por parte das autoridades e responsabilização dos pais do assassino, que tinha 16 anos e era ex-aluno de um dos colégios. Nas redes sociais, o pai do jovem, que é policial militar, foi acusado de preparar o filho para o uso de armas e o atentado, o que ele nega. “Quero ver polícia investigando polícia, de forma justa”, afirma Thais.
Thais critica ainda a alegação do PM de que o autor dos ataques era alvo de bullying e diz acreditar em influência negativa do pai sobre o rapaz. “Dor estou sentindo eu, que enterrei minha filha”, afirma. A bióloga conta morar “impressionantemente perto” da família do atirador, mas afirma nunca ter tido contato com ele nem seus pais, que agora se mudaram da cidade capixaba. O atirador foi apreendido na sexta-feira.
Apesar da revolta, Thais disse priorizar o luto por sua filha juntamente com seu marido e o restante da família. “Estamos vivenciando nossa dor e nossa revolta. Guardando mensagens boas que recebemos sobre nossa pequena”, relata.
Perguntada sobre que mensagem retirar disso tudo, Thais responde rapidamente que a carta escrita por ela à filha, após o massacre da última sexta-feira, define bem o sentimento de amor e proteção às crianças que ela espera ser passado às pessoas.
“É preciso ter leis específicas para massacres em escolas. Tipificação criminal. Abertura de canais para denunciar comportamentos. Inteligência em análise de dados da internet para mapear preventivamente perfis perigosos para a sociedade. Tem tantas coisas que podemos fazer enquanto sociedade”, alerta. “Em 2022, não deveria ser mais possível fazer exaltação ao nazismo. Já vimos o que esse caminho faz”, acrescenta.
Segundo a apuração policial, o adolescente usou uma suástica nazista na roupa durante o atentado. O pai já havia publicado nas redes sociais uma foto da capa do livro Minha Luta, em que o ex-ditador da Alemanha Adolf Hitler expôs suas ideias antissemitas. A publicação motivou debates nas redes sociais, com pessoas associando o pai à ação do filho. “Livro péssimo. Li e odiei”, afirmou o PM ao Estadão, sobre a obra que é considerada referência ideológica para neonazistas.
Saiba quem são as outras vítimas do ataque a escolas de Aracruz, Espírito Santo
Maria da Penha Pereira de Melo Banhos, de 48 anos: Maria, mais conhecida pelo seu sobrenome, Penha, lecionava artes na Escola Estadual Primo Bitti sob contrato de designação temporária desde março deste ano. A professora morreu no local logo após o disparo dos tiros.
Ela deixou o marido, o eletricista Wellington Banhos, e três filhos: um menino de 11 anos e duas meninas, de 7 e 17 anos. À imprensa, Wellington contou que soube do ataque por meio da filha mais nova. “Minha filha mandou mensagem para mim, fui ao hospital para verificar e fui para a escola. Eu queria ver ela, abraçar ela. Mas não consegui”, disse.
Cybelle Passos Bezerra Lara, de 45 anos: Assim como Maria da Penha, Cybelle também morreu na escola em que trabalhava, a Primo Betti, após os tiros. Ela era mestre em Matemática pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e lecionava a disciplina na escola desde 2018.
Na mesma semana em que foi morta, Cybelle havia recebido a premiação de Boas Práticas da Educação em um evento que aconteceu na própria escola e contou com a presença do governador reeleito Renato Casagrande (PSB).
Flávia Amoss Merçon Leonardo, de 38 anos: Flávia era professora de Sociologia na Escola Estadual Primo Bitti. Ela tinha título de mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e era doutora em Antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela chegou a ser internada no Hospital Estadual Dr. Jayme dos Santos Neves (HEJSN), em Serra, e passou por uma cirurgia, mas morreu no dia seguinte ao atentado.
Em nota, o Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFES disse que “Flávia dedicou sua trajetória acadêmica aos estudos juntos às comunidades pesqueiras e tradicionais do Espírito Santo”. “Aguerrida e doce, sempre acreditou num mundo e num país mais justo e democrático, e sempre esteve à frente em busca dessa conquista. Foi uma pessoa dedicada em tudo que realizou. Uma pesquisadora brilhante e atenta, respeitosa e responsável”, diz o texto.