'Avenida Brasil' reflete 'uma classe C que quer se ver'


Até a presidente Dilma Rousseff teve de mudar os planos por causa do desfecho da novela; para especialista, muito do sucesso se deve ao fato de a trama retratar a nova classe média e refletir mudanças na sociedade brasileira

Por Júlia Dias Carneiro

"Eu sou uma vítima!" Depois do episódio em que Carminha, desmascarada, repetia o bordão, mais um pico de consumo de energia é esperado durante o último capítulo do fenômeno de audiência que virou Avenida Brasil - e a culpa pode ser do Divino. Os estilo de vida deste bairro fictício do subúrbio e os personagens carismáticos que nele vivem são um marco da ascensão da classe média brasileira - agora na televisão. Além de altas doses de drama, brigas, vingança e reviravoltas, especialistas dizem que muito do sucesso da novela de João Emanuel Carneiro se deve ao fato de retratar a classe média brasileira e refletir mudanças na sociedade, afastando-se dos personagens e bairros ricos que geralmente estão no centro das tramas. "A novela reflete uma classe C que quer se ver. É diferente do novo rico do passado, que queria parecer quem não era e tinha vergonha de falar de onde vinha", diz Renato Meirelles, sócio diretor do instituto de pesquisa Data Popular, especializado na nova classe média. "Agora não. O Tufão (personagem de Murilo Benício) tem orgulho de falar de sua história e de sua origem. Ele ficou rico, mas não saiu de seu bairro", exemplifica. A expectativa é que metade dos espectadores brasileiros, de todas as classes, estejam vidrados no capítulo em que será revelado "quem matou o Max"; o que será de Nina e Tufão nas mãos de Santiago e Carminha; e uma série de resoluções antes do tão esperado "fim". Aspirações O sucesso da novela levou até a presidente Dilma Rousseff a mudar seus planos de trabalho, adiando o comício em que apoiaria a candidatura de Fernando Haddad (PT) à prefeitura de São Paulo. O consenso da campanha era que o evento poderia ser um fracasso de público, concorrendo com o desfecho da trama que tem sido assunto constante nas redes sociais, responsável por "trending topics" diários no Twitter e comentários no Facebook. A trama centrada no subúrbio destoa de uma tradição na teledramaturgia de protagonistas ricos e donos de um padrão de vida "inalcançável". Para Meirelles, a novidade de Avenida Brasil é trabalhar com o que chama de "aspiracional possível". "É o aspiracional que está ao alcance das mãos. O espectador vê a novela e pensa, 'se eu trabalhar um pouco, eu consigo ter um bar como o do Silas, ou um salão como o da Monalisa. O Tufão enriqueceu, mas olha, ficou no bairro dele'." No Rio que se vê na tela, mal há espaço para os bairros da zona sul, as praias, o Leblon, tão explorados em novelas anteriores. O espírito é dos bairros da zona norte carioca, dos arredores da Avenida Brasil, que corta bairros do subúrbio e leva até o centro da cidade. O sentimento de orgulho do subúrbio se reflete na história de Monalisa, que resolve ir tentar a vida em Ipanema mas se sente um peixe fora d'água em meio a vizinhos que não se conhecem e homens que não têm "pegada". Logo volta para o Divino. "A imagem do morador que sonha em sair do subúrbio é muito cristalizada. Nossa ideia foi fugir disso e criar um subúrbio gostoso e alegre, onde exista prosperidade", disse o diretor de núcleo Ricardo Waddington, coordenador da novela, em entrevista à Folha de S. Paulo. Hábitos Os hábitos da classe média foram pesquisados para compor os personagens, do jeito de falar e se vestir aos valores e aspirações. "Você tem situações muito típicas da classe C. Todo mundo fala ao mesmo tempo, há muitas cenas em que as pessoas estão comendo e há o bar que é o ponto de encontro da comunidade, o bar do Silas", aponta Meirelles. Para ele, a novela é parte de um movimento da Rede Globo de entender e se aproximar mais da classe média, segmento da sociedade que agora abrange mais da metade da população brasileira e que mais cresceu na última década, absorvendo 35 milhões de pessoas que saíram das classes D e E. "Hoje a classe C não é só a maioria da audiência mas também a maioria do mercado consumidor, que é para quem os anunciantes querem vender", diz Meirelles. "Então também é uma busca do público alvo do mercado anunciante." De acordo com o Data Popular, a nova classe média tem hoje metade dos cartões de crédito brasileiros e movimentou, no ano passado, R$ 1 trilhão. Marketing Não à toa, a novela virou um fenômeno de marketing. Anunciantes bolaram propagandas aludindo à trama - como o supermercado que fez propaganda de um pen-drive sugerindo à Nina que guardasse suas fotos; e houve merchandising entremeado nos capítulos. No penúltimo, por exemplo, a grávida Suelen erguia um pacote de fraldas mostrando a marca que queria receber em seu chá de bebê. Mas personagens como Suelen, Tufão, Carminha e Leleco vão deixar saudades de muitos brasileiros, como se vê por manifestações nas redes sociais. O fim de Avenida Brasil vem sendo lamentado por fãs que ficarão órfãos da novela, como uma jornalista que postou no Facebook na quinta-feira: "Amanhã é o fim do mundo. (...) Não haverá mais baile charme. Ou abacaxis de vidro sobre a mesa. Lá se vão as pesadas correntes no pescoço, todo mundo falando ao mesmo tempo e aqueles óculos atravessados no meio da careca. (...) Adeus, Carminha, estou torcendo por você." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

"Eu sou uma vítima!" Depois do episódio em que Carminha, desmascarada, repetia o bordão, mais um pico de consumo de energia é esperado durante o último capítulo do fenômeno de audiência que virou Avenida Brasil - e a culpa pode ser do Divino. Os estilo de vida deste bairro fictício do subúrbio e os personagens carismáticos que nele vivem são um marco da ascensão da classe média brasileira - agora na televisão. Além de altas doses de drama, brigas, vingança e reviravoltas, especialistas dizem que muito do sucesso da novela de João Emanuel Carneiro se deve ao fato de retratar a classe média brasileira e refletir mudanças na sociedade, afastando-se dos personagens e bairros ricos que geralmente estão no centro das tramas. "A novela reflete uma classe C que quer se ver. É diferente do novo rico do passado, que queria parecer quem não era e tinha vergonha de falar de onde vinha", diz Renato Meirelles, sócio diretor do instituto de pesquisa Data Popular, especializado na nova classe média. "Agora não. O Tufão (personagem de Murilo Benício) tem orgulho de falar de sua história e de sua origem. Ele ficou rico, mas não saiu de seu bairro", exemplifica. A expectativa é que metade dos espectadores brasileiros, de todas as classes, estejam vidrados no capítulo em que será revelado "quem matou o Max"; o que será de Nina e Tufão nas mãos de Santiago e Carminha; e uma série de resoluções antes do tão esperado "fim". Aspirações O sucesso da novela levou até a presidente Dilma Rousseff a mudar seus planos de trabalho, adiando o comício em que apoiaria a candidatura de Fernando Haddad (PT) à prefeitura de São Paulo. O consenso da campanha era que o evento poderia ser um fracasso de público, concorrendo com o desfecho da trama que tem sido assunto constante nas redes sociais, responsável por "trending topics" diários no Twitter e comentários no Facebook. A trama centrada no subúrbio destoa de uma tradição na teledramaturgia de protagonistas ricos e donos de um padrão de vida "inalcançável". Para Meirelles, a novidade de Avenida Brasil é trabalhar com o que chama de "aspiracional possível". "É o aspiracional que está ao alcance das mãos. O espectador vê a novela e pensa, 'se eu trabalhar um pouco, eu consigo ter um bar como o do Silas, ou um salão como o da Monalisa. O Tufão enriqueceu, mas olha, ficou no bairro dele'." No Rio que se vê na tela, mal há espaço para os bairros da zona sul, as praias, o Leblon, tão explorados em novelas anteriores. O espírito é dos bairros da zona norte carioca, dos arredores da Avenida Brasil, que corta bairros do subúrbio e leva até o centro da cidade. O sentimento de orgulho do subúrbio se reflete na história de Monalisa, que resolve ir tentar a vida em Ipanema mas se sente um peixe fora d'água em meio a vizinhos que não se conhecem e homens que não têm "pegada". Logo volta para o Divino. "A imagem do morador que sonha em sair do subúrbio é muito cristalizada. Nossa ideia foi fugir disso e criar um subúrbio gostoso e alegre, onde exista prosperidade", disse o diretor de núcleo Ricardo Waddington, coordenador da novela, em entrevista à Folha de S. Paulo. Hábitos Os hábitos da classe média foram pesquisados para compor os personagens, do jeito de falar e se vestir aos valores e aspirações. "Você tem situações muito típicas da classe C. Todo mundo fala ao mesmo tempo, há muitas cenas em que as pessoas estão comendo e há o bar que é o ponto de encontro da comunidade, o bar do Silas", aponta Meirelles. Para ele, a novela é parte de um movimento da Rede Globo de entender e se aproximar mais da classe média, segmento da sociedade que agora abrange mais da metade da população brasileira e que mais cresceu na última década, absorvendo 35 milhões de pessoas que saíram das classes D e E. "Hoje a classe C não é só a maioria da audiência mas também a maioria do mercado consumidor, que é para quem os anunciantes querem vender", diz Meirelles. "Então também é uma busca do público alvo do mercado anunciante." De acordo com o Data Popular, a nova classe média tem hoje metade dos cartões de crédito brasileiros e movimentou, no ano passado, R$ 1 trilhão. Marketing Não à toa, a novela virou um fenômeno de marketing. Anunciantes bolaram propagandas aludindo à trama - como o supermercado que fez propaganda de um pen-drive sugerindo à Nina que guardasse suas fotos; e houve merchandising entremeado nos capítulos. No penúltimo, por exemplo, a grávida Suelen erguia um pacote de fraldas mostrando a marca que queria receber em seu chá de bebê. Mas personagens como Suelen, Tufão, Carminha e Leleco vão deixar saudades de muitos brasileiros, como se vê por manifestações nas redes sociais. O fim de Avenida Brasil vem sendo lamentado por fãs que ficarão órfãos da novela, como uma jornalista que postou no Facebook na quinta-feira: "Amanhã é o fim do mundo. (...) Não haverá mais baile charme. Ou abacaxis de vidro sobre a mesa. Lá se vão as pesadas correntes no pescoço, todo mundo falando ao mesmo tempo e aqueles óculos atravessados no meio da careca. (...) Adeus, Carminha, estou torcendo por você." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

"Eu sou uma vítima!" Depois do episódio em que Carminha, desmascarada, repetia o bordão, mais um pico de consumo de energia é esperado durante o último capítulo do fenômeno de audiência que virou Avenida Brasil - e a culpa pode ser do Divino. Os estilo de vida deste bairro fictício do subúrbio e os personagens carismáticos que nele vivem são um marco da ascensão da classe média brasileira - agora na televisão. Além de altas doses de drama, brigas, vingança e reviravoltas, especialistas dizem que muito do sucesso da novela de João Emanuel Carneiro se deve ao fato de retratar a classe média brasileira e refletir mudanças na sociedade, afastando-se dos personagens e bairros ricos que geralmente estão no centro das tramas. "A novela reflete uma classe C que quer se ver. É diferente do novo rico do passado, que queria parecer quem não era e tinha vergonha de falar de onde vinha", diz Renato Meirelles, sócio diretor do instituto de pesquisa Data Popular, especializado na nova classe média. "Agora não. O Tufão (personagem de Murilo Benício) tem orgulho de falar de sua história e de sua origem. Ele ficou rico, mas não saiu de seu bairro", exemplifica. A expectativa é que metade dos espectadores brasileiros, de todas as classes, estejam vidrados no capítulo em que será revelado "quem matou o Max"; o que será de Nina e Tufão nas mãos de Santiago e Carminha; e uma série de resoluções antes do tão esperado "fim". Aspirações O sucesso da novela levou até a presidente Dilma Rousseff a mudar seus planos de trabalho, adiando o comício em que apoiaria a candidatura de Fernando Haddad (PT) à prefeitura de São Paulo. O consenso da campanha era que o evento poderia ser um fracasso de público, concorrendo com o desfecho da trama que tem sido assunto constante nas redes sociais, responsável por "trending topics" diários no Twitter e comentários no Facebook. A trama centrada no subúrbio destoa de uma tradição na teledramaturgia de protagonistas ricos e donos de um padrão de vida "inalcançável". Para Meirelles, a novidade de Avenida Brasil é trabalhar com o que chama de "aspiracional possível". "É o aspiracional que está ao alcance das mãos. O espectador vê a novela e pensa, 'se eu trabalhar um pouco, eu consigo ter um bar como o do Silas, ou um salão como o da Monalisa. O Tufão enriqueceu, mas olha, ficou no bairro dele'." No Rio que se vê na tela, mal há espaço para os bairros da zona sul, as praias, o Leblon, tão explorados em novelas anteriores. O espírito é dos bairros da zona norte carioca, dos arredores da Avenida Brasil, que corta bairros do subúrbio e leva até o centro da cidade. O sentimento de orgulho do subúrbio se reflete na história de Monalisa, que resolve ir tentar a vida em Ipanema mas se sente um peixe fora d'água em meio a vizinhos que não se conhecem e homens que não têm "pegada". Logo volta para o Divino. "A imagem do morador que sonha em sair do subúrbio é muito cristalizada. Nossa ideia foi fugir disso e criar um subúrbio gostoso e alegre, onde exista prosperidade", disse o diretor de núcleo Ricardo Waddington, coordenador da novela, em entrevista à Folha de S. Paulo. Hábitos Os hábitos da classe média foram pesquisados para compor os personagens, do jeito de falar e se vestir aos valores e aspirações. "Você tem situações muito típicas da classe C. Todo mundo fala ao mesmo tempo, há muitas cenas em que as pessoas estão comendo e há o bar que é o ponto de encontro da comunidade, o bar do Silas", aponta Meirelles. Para ele, a novela é parte de um movimento da Rede Globo de entender e se aproximar mais da classe média, segmento da sociedade que agora abrange mais da metade da população brasileira e que mais cresceu na última década, absorvendo 35 milhões de pessoas que saíram das classes D e E. "Hoje a classe C não é só a maioria da audiência mas também a maioria do mercado consumidor, que é para quem os anunciantes querem vender", diz Meirelles. "Então também é uma busca do público alvo do mercado anunciante." De acordo com o Data Popular, a nova classe média tem hoje metade dos cartões de crédito brasileiros e movimentou, no ano passado, R$ 1 trilhão. Marketing Não à toa, a novela virou um fenômeno de marketing. Anunciantes bolaram propagandas aludindo à trama - como o supermercado que fez propaganda de um pen-drive sugerindo à Nina que guardasse suas fotos; e houve merchandising entremeado nos capítulos. No penúltimo, por exemplo, a grávida Suelen erguia um pacote de fraldas mostrando a marca que queria receber em seu chá de bebê. Mas personagens como Suelen, Tufão, Carminha e Leleco vão deixar saudades de muitos brasileiros, como se vê por manifestações nas redes sociais. O fim de Avenida Brasil vem sendo lamentado por fãs que ficarão órfãos da novela, como uma jornalista que postou no Facebook na quinta-feira: "Amanhã é o fim do mundo. (...) Não haverá mais baile charme. Ou abacaxis de vidro sobre a mesa. Lá se vão as pesadas correntes no pescoço, todo mundo falando ao mesmo tempo e aqueles óculos atravessados no meio da careca. (...) Adeus, Carminha, estou torcendo por você." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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