A cearense Benigna Cardoso da Silva foi beatificada nesta segunda-feira, 24, no Crato, no sertão do Ceará, pelo cardeal Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, que representa o papa Francisco. Benigna foi brutalmente assassinada aos 13 anos em 1941 por um rapaz que a assediava. Ela é venerada por católicos como um mártir da pureza e da castidade.
Ainda com 12 anos de idade, Benigna começou a ser assediada por Raul Alves, quatro anos mais velho que ela. Os dois estudavam no mesmo colégio e o rapaz começou a persegui-la. Benigna recorreu ao então pároco da cidade, o padre Cristiano Coelho, para falar do assédio. Ele a aconselhou a ir estudar na sede do município e lhe presenteou com uma Bíblia que, segundo sua biografia, tornou-se o seu livro de cabeceira.
Em 24 de outubro de 1941, Benigna foi ao poço com seu pote para pegar água e Raul estava à espreita, perseguindo ela. O jovem tentou estuprá-la e, com a resistência de Benigna, a matou.
“Ela rejeitou por ver no ato uma ofensa a Deus e, em consequência, ele a golpeou várias vezes com facão, tirando a sua vida. Desde então, ela é invocada como mártir, heroína da castidade, mártir da pureza”, disse Danilo Sobreira, coordenador de Pastoral da Paróquia Senhora Sant’Ana de Santana do Cariri, cidade natal de Benigna, à agência Vatican News.
Raul Alves foi preso, ficou numa casa para recuperação de menores em Fortaleza, até chegar à maioridade. Ele cumpriu pena e voltou ao local do crime 50 anos depois para pedir perdão à família de Benigna.
Benigna Cardoso da Silva nasceu no Sítio Oiti, em Santana do Cariri, no dia 15 de outubro de 1928. Os pais biológicos morreram e ela foi adotada, junto aos seus irmãos mais velhos, pela família Sisnando Leite.
Decreto
O papa Francisco assinou em outubro de 2019 o decreto que reconhece o martírio da menina brasileira – a declaração é decisiva para a beatificação, já que assim não é necessário reconhecer um milagre.
Desde maio de 2019, o dia 24 de outubro é também o Dia de Combate ao Feminicídio no Ceará. A data foi instituída pela Lei 16.892, que prevê a realização de campanhas, debates e seminários para conscientizar a população sobre a importância do combate ao feminicídio e a outras formas de violência contra as mulheres.
“Benigna, em vida, foi vista como uma pessoa santa. Era muito dedicada aos estudos – era a primeira da classe, caridosa, amante da natureza e dos animais, extremamente religiosa, com assídua participação na Eucaristia aos domingos. Recebeu de presente uma Bíblia do pároco na época que virou livro de cabeceira: ela lia as histórias e trazia para a sua vida como reflexão, transmitindo aos amigos e sendo até catequista por ensinar a Palavra de Deus. E também nutria devoção especial a Nossa Senhora do Carmo, a quem sempre invocava para a livrar do inferno”, conta ainda Danilo Sobreira.
Complexo de Benigna
No local, de difícil acesso, da morte da jovem foi erguido um monumento com uma cruz, além de uma lápide e um memorial que conserva alguns de seus objetos pessoais. Católicos iam até lá para rezar e pedir a sua intercessão. Em 2005, foi construída uma capela em uma área próxima para receber os romeiros.
Perto da pequena capela está em construção o chamado Complexo de Benigna. A previsão de entrega da obra está prevista para agosto de 2023. O local vai contar com uma estátua de mais de 20 metros e um espaço para oração que será chamado de Santuário de Benigna, segundo explica Ypsilon Felix, secretário de Cultura de Santana do Cariri à agência Vatican News. “São mais de 48 mil metros quadrados de área, com capacidade para abrigar mais de 100 mil romeiros, com áreas para estacionamento, ambulantes e grandes celebrações.”
Francineide Pereira, agricultora e natural de Santana do Cariri, é uma entre as milhares de santanenses que está participando da programação religiosa. Ela é devota de Benigna e batizou sua filha com o mesmo nome da nova beata para agradecer por uma graça alcançada. “Eu tive muito problema de pressão alta durante minha gravidez. Chegou a 20 por 18, era um sufoco! Quando eu fui ganhar minha filha, fui encaminhada para a cidade de Barbalha, já com uma vaga na UTI aberta. Já estava com começo de pré-eclâmpsia. Então eu pedi à menina Benigna que me ajudasse: ‘Minha santinha, se a senhora me ajudar para minha filha nascer com saúde e eu não sentir nada, ela vai ter o seu nome!’, e assim foi”, conta.
A pequena Benigna Maiara tem 5 anos e foi batizada, inclusive, com um vestido vermelho de bolinhas brancas, assim como é representada a mártir Benigna.
Maria da Penha é membro da comissão de acolhida do Santuário de Benigna, localizado no bairro Inhumas, em Santana do Cariri. Ela acompanha essa trajetória de fé popular há muito tempo e hoje diz que está com o coração a mil. “Eu sempre soube que esse dia iria chegar (da beatificação), mas eu ficava me perguntando qual geração minha que testemunharia isso. Agora, aqui estou eu testemunhando esse dia. Estou muito feliz!”