A ameaça de um general à Lei de Anistia


Eros Grau diz que ação de Rocha Paiva afronta decisão do Supremo sobre a legislação

Por Marcelo Godoy

O general Luiz Eduardo Rocha Paiva decidiu afrontar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei de Anistia. É o que afirma Eros Grau, ex-ministro da Corte com o peso da autoridade que lhe conferiu o fato de ter sido o relator do julgamento em 2010 que manteve a legislação e impediu que o “herói de Jair Bolsonaro”, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, terminasse seus dias na cadeia.

O governo Bolsonaro nomeou o general para a Comissão de Anistia e a transferiu do Ministério da Justiça para o dos Direitos Humanos. Tirou-a das mãos de Sérgio Moro e a entregou às de Damares Alves. Talvez porque precisasse pôr esse órgão de Estado criado por Fernando Henrique Cardoso nas mãos de guerreiros ideológicos. Mas nenhum governo pode desprezar os limites da lei e as ordens das Cortes.

O generalLuiz Eduardo Rocha Paiva Foto: Moreira Moriz/Agência Senado
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Rocha Paiva, conforme viu o leitor, era um entusiasta apoiador de Ustra. Ficou conhecido depois de Bolsonaro lhe dar o apodo de “melancia”. Era uma licença poética. O general é um empedernido anticomunista. Tornou-se alvo do twitter presidencial por ter visto na declaração do chefe sobre governadores ”paraíbas” uma afronta à nacionalidade.

No dia 25 de julho, Rocha Paiva passou por cima da Lei de Anistia em um julgamento da comissão. Ele analisava o processo da professora Claudia de Arruda Campos, antiga militante da Ação Popular, que requeria indenização por ter sido perseguida pelo ditadura. Presa pelo Dops, Claudia perdeu estudo e trabalho. O general se exaltou. A advogada Ana Lucia Marchione estava na sessão e testemunhou o banzé.

O relator do caso recomendara o reconhecimento da anistia. O general se opôs. Alegou que a mulher pertencera a “uma das organizações terroristas mais violentas!”. E continuou: “É lícito que o Estado estivesse investigando uma organização dessa natureza. O que aconteceu com ela não foi perseguição política, é porque ela era uma militante de organização terrorista! Se ela diz que era da AP tem de assumir a responsabilidade pelo que disse.” A sessão foi gravada.

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Rocha Paiva submeteu a novo julgamento a ex-militante da AP. Fez do relato da vítima a confissão de um crime. Transformou a Comissão de Anistia em Auditoria Militar. E a professora Claudia não estava ali para se defender.

O ex-ministro do STF Eros Graus Foto: Felipe Rau/Estadão

Ela militara no mesmo grupo que abrigara o senador José Serra, Hebert José de Souza, o Betinho, e Fernando Santa Cruz, o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nascida da esquerda católica, a AP nunca foi uma organização terrorista, embora um de seus membros tenha se envolvido no sangrento atentado do Aeroporto de Guararapes, em 1966.

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E mesmo que fosse. Em artigo publicado aqui, Grau diz que a Lei de Anistia, a Emenda Constitucional 26/85 e o Artigo 8° das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 afirmam que a anistia foi ampla, geral e irrestrita para os “crimes políticos e conexos”. Entre os conexos estavam os assassinatos, as torturas e os desaparecimentos praticados por Ustra, que o general Rocha Paiva defende. Entre os políticos, anistiava-se pessoas como a professora que o general condenou.

“(A ação de Rocha Paiva) não é só contra o meu voto. É contra o acórdão do Supremo”, disse Grau. A fala do ministro que manteve a anistia é uma reação à extravagância dos termos com que o general se manifestou ao julgar a professora. “Negar a indenização é uma afronta ao Supremo e um desrespeito às instituições”, afirmou à coluna. O ministro lembrou que o caráter amplo, geral e irrestrito da norma não pode ser reduzido por um governo. Não é dado a ninguém a faculdade de respeitar as leis apenas quando lhe convém. Ou quando sua ideologia manda.

Grau lembra que nenhum militar perdeu a aposentadoria em razão dos crimes da ditadura. Se receberam os proventos é porque foram anistiados. Sendo assim, não se pode negar a indenização aos militantes de quaisquer organizações. A lógica da anistia é simples: se o Estado paga de um lado, tem de pagar do outro. O revanchismo contra a esquerda levou o ex-ministro a fazer, por fim, uma advertência: “O risco e consequência da manifestação do general é que o Estado se volte no futuro contra os militares e civis que defenderam o regime.”

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A comissão de Rocha Paiva se vangloria de ter negado 1.300 pedidos de anistia e de ter concedido só meia dúzia. Alega haver nas decisões passadas do órgão uma farra com o dinheiro público, mas após 9 meses de governo não apresentou provas. O que há de concreto são casos como o da professora. Ou como contou a advogada Ana Lúcia, o dos trabalhadores da Ford de São Paulo, demitidos em 1979 e enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Zelar pelo dinheiro público é obrigação do governante. Obedecer às leis também. Se convicções não lhe permitem julgar segundo a lei, Rocha Paiva não devia aceitar o cargo. Se aceitou, não devia jogar pedras na Anistia. Não se exerce uma função pública em nome da desforra ou do ressentimento. O alerta de Eros Grau é claro: se a conduta de Rocha Paiva chegar ao Supremo, as pedras do general podem se voltar contra a sua própria vidraça. 

O general Luiz Eduardo Rocha Paiva decidiu afrontar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei de Anistia. É o que afirma Eros Grau, ex-ministro da Corte com o peso da autoridade que lhe conferiu o fato de ter sido o relator do julgamento em 2010 que manteve a legislação e impediu que o “herói de Jair Bolsonaro”, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, terminasse seus dias na cadeia.

O governo Bolsonaro nomeou o general para a Comissão de Anistia e a transferiu do Ministério da Justiça para o dos Direitos Humanos. Tirou-a das mãos de Sérgio Moro e a entregou às de Damares Alves. Talvez porque precisasse pôr esse órgão de Estado criado por Fernando Henrique Cardoso nas mãos de guerreiros ideológicos. Mas nenhum governo pode desprezar os limites da lei e as ordens das Cortes.

O generalLuiz Eduardo Rocha Paiva Foto: Moreira Moriz/Agência Senado

Rocha Paiva, conforme viu o leitor, era um entusiasta apoiador de Ustra. Ficou conhecido depois de Bolsonaro lhe dar o apodo de “melancia”. Era uma licença poética. O general é um empedernido anticomunista. Tornou-se alvo do twitter presidencial por ter visto na declaração do chefe sobre governadores ”paraíbas” uma afronta à nacionalidade.

No dia 25 de julho, Rocha Paiva passou por cima da Lei de Anistia em um julgamento da comissão. Ele analisava o processo da professora Claudia de Arruda Campos, antiga militante da Ação Popular, que requeria indenização por ter sido perseguida pelo ditadura. Presa pelo Dops, Claudia perdeu estudo e trabalho. O general se exaltou. A advogada Ana Lucia Marchione estava na sessão e testemunhou o banzé.

O relator do caso recomendara o reconhecimento da anistia. O general se opôs. Alegou que a mulher pertencera a “uma das organizações terroristas mais violentas!”. E continuou: “É lícito que o Estado estivesse investigando uma organização dessa natureza. O que aconteceu com ela não foi perseguição política, é porque ela era uma militante de organização terrorista! Se ela diz que era da AP tem de assumir a responsabilidade pelo que disse.” A sessão foi gravada.

Rocha Paiva submeteu a novo julgamento a ex-militante da AP. Fez do relato da vítima a confissão de um crime. Transformou a Comissão de Anistia em Auditoria Militar. E a professora Claudia não estava ali para se defender.

O ex-ministro do STF Eros Graus Foto: Felipe Rau/Estadão

Ela militara no mesmo grupo que abrigara o senador José Serra, Hebert José de Souza, o Betinho, e Fernando Santa Cruz, o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nascida da esquerda católica, a AP nunca foi uma organização terrorista, embora um de seus membros tenha se envolvido no sangrento atentado do Aeroporto de Guararapes, em 1966.

E mesmo que fosse. Em artigo publicado aqui, Grau diz que a Lei de Anistia, a Emenda Constitucional 26/85 e o Artigo 8° das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 afirmam que a anistia foi ampla, geral e irrestrita para os “crimes políticos e conexos”. Entre os conexos estavam os assassinatos, as torturas e os desaparecimentos praticados por Ustra, que o general Rocha Paiva defende. Entre os políticos, anistiava-se pessoas como a professora que o general condenou.

“(A ação de Rocha Paiva) não é só contra o meu voto. É contra o acórdão do Supremo”, disse Grau. A fala do ministro que manteve a anistia é uma reação à extravagância dos termos com que o general se manifestou ao julgar a professora. “Negar a indenização é uma afronta ao Supremo e um desrespeito às instituições”, afirmou à coluna. O ministro lembrou que o caráter amplo, geral e irrestrito da norma não pode ser reduzido por um governo. Não é dado a ninguém a faculdade de respeitar as leis apenas quando lhe convém. Ou quando sua ideologia manda.

Grau lembra que nenhum militar perdeu a aposentadoria em razão dos crimes da ditadura. Se receberam os proventos é porque foram anistiados. Sendo assim, não se pode negar a indenização aos militantes de quaisquer organizações. A lógica da anistia é simples: se o Estado paga de um lado, tem de pagar do outro. O revanchismo contra a esquerda levou o ex-ministro a fazer, por fim, uma advertência: “O risco e consequência da manifestação do general é que o Estado se volte no futuro contra os militares e civis que defenderam o regime.”

A comissão de Rocha Paiva se vangloria de ter negado 1.300 pedidos de anistia e de ter concedido só meia dúzia. Alega haver nas decisões passadas do órgão uma farra com o dinheiro público, mas após 9 meses de governo não apresentou provas. O que há de concreto são casos como o da professora. Ou como contou a advogada Ana Lúcia, o dos trabalhadores da Ford de São Paulo, demitidos em 1979 e enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Zelar pelo dinheiro público é obrigação do governante. Obedecer às leis também. Se convicções não lhe permitem julgar segundo a lei, Rocha Paiva não devia aceitar o cargo. Se aceitou, não devia jogar pedras na Anistia. Não se exerce uma função pública em nome da desforra ou do ressentimento. O alerta de Eros Grau é claro: se a conduta de Rocha Paiva chegar ao Supremo, as pedras do general podem se voltar contra a sua própria vidraça. 

O general Luiz Eduardo Rocha Paiva decidiu afrontar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei de Anistia. É o que afirma Eros Grau, ex-ministro da Corte com o peso da autoridade que lhe conferiu o fato de ter sido o relator do julgamento em 2010 que manteve a legislação e impediu que o “herói de Jair Bolsonaro”, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, terminasse seus dias na cadeia.

O governo Bolsonaro nomeou o general para a Comissão de Anistia e a transferiu do Ministério da Justiça para o dos Direitos Humanos. Tirou-a das mãos de Sérgio Moro e a entregou às de Damares Alves. Talvez porque precisasse pôr esse órgão de Estado criado por Fernando Henrique Cardoso nas mãos de guerreiros ideológicos. Mas nenhum governo pode desprezar os limites da lei e as ordens das Cortes.

O generalLuiz Eduardo Rocha Paiva Foto: Moreira Moriz/Agência Senado

Rocha Paiva, conforme viu o leitor, era um entusiasta apoiador de Ustra. Ficou conhecido depois de Bolsonaro lhe dar o apodo de “melancia”. Era uma licença poética. O general é um empedernido anticomunista. Tornou-se alvo do twitter presidencial por ter visto na declaração do chefe sobre governadores ”paraíbas” uma afronta à nacionalidade.

No dia 25 de julho, Rocha Paiva passou por cima da Lei de Anistia em um julgamento da comissão. Ele analisava o processo da professora Claudia de Arruda Campos, antiga militante da Ação Popular, que requeria indenização por ter sido perseguida pelo ditadura. Presa pelo Dops, Claudia perdeu estudo e trabalho. O general se exaltou. A advogada Ana Lucia Marchione estava na sessão e testemunhou o banzé.

O relator do caso recomendara o reconhecimento da anistia. O general se opôs. Alegou que a mulher pertencera a “uma das organizações terroristas mais violentas!”. E continuou: “É lícito que o Estado estivesse investigando uma organização dessa natureza. O que aconteceu com ela não foi perseguição política, é porque ela era uma militante de organização terrorista! Se ela diz que era da AP tem de assumir a responsabilidade pelo que disse.” A sessão foi gravada.

Rocha Paiva submeteu a novo julgamento a ex-militante da AP. Fez do relato da vítima a confissão de um crime. Transformou a Comissão de Anistia em Auditoria Militar. E a professora Claudia não estava ali para se defender.

O ex-ministro do STF Eros Graus Foto: Felipe Rau/Estadão

Ela militara no mesmo grupo que abrigara o senador José Serra, Hebert José de Souza, o Betinho, e Fernando Santa Cruz, o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nascida da esquerda católica, a AP nunca foi uma organização terrorista, embora um de seus membros tenha se envolvido no sangrento atentado do Aeroporto de Guararapes, em 1966.

E mesmo que fosse. Em artigo publicado aqui, Grau diz que a Lei de Anistia, a Emenda Constitucional 26/85 e o Artigo 8° das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 afirmam que a anistia foi ampla, geral e irrestrita para os “crimes políticos e conexos”. Entre os conexos estavam os assassinatos, as torturas e os desaparecimentos praticados por Ustra, que o general Rocha Paiva defende. Entre os políticos, anistiava-se pessoas como a professora que o general condenou.

“(A ação de Rocha Paiva) não é só contra o meu voto. É contra o acórdão do Supremo”, disse Grau. A fala do ministro que manteve a anistia é uma reação à extravagância dos termos com que o general se manifestou ao julgar a professora. “Negar a indenização é uma afronta ao Supremo e um desrespeito às instituições”, afirmou à coluna. O ministro lembrou que o caráter amplo, geral e irrestrito da norma não pode ser reduzido por um governo. Não é dado a ninguém a faculdade de respeitar as leis apenas quando lhe convém. Ou quando sua ideologia manda.

Grau lembra que nenhum militar perdeu a aposentadoria em razão dos crimes da ditadura. Se receberam os proventos é porque foram anistiados. Sendo assim, não se pode negar a indenização aos militantes de quaisquer organizações. A lógica da anistia é simples: se o Estado paga de um lado, tem de pagar do outro. O revanchismo contra a esquerda levou o ex-ministro a fazer, por fim, uma advertência: “O risco e consequência da manifestação do general é que o Estado se volte no futuro contra os militares e civis que defenderam o regime.”

A comissão de Rocha Paiva se vangloria de ter negado 1.300 pedidos de anistia e de ter concedido só meia dúzia. Alega haver nas decisões passadas do órgão uma farra com o dinheiro público, mas após 9 meses de governo não apresentou provas. O que há de concreto são casos como o da professora. Ou como contou a advogada Ana Lúcia, o dos trabalhadores da Ford de São Paulo, demitidos em 1979 e enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Zelar pelo dinheiro público é obrigação do governante. Obedecer às leis também. Se convicções não lhe permitem julgar segundo a lei, Rocha Paiva não devia aceitar o cargo. Se aceitou, não devia jogar pedras na Anistia. Não se exerce uma função pública em nome da desforra ou do ressentimento. O alerta de Eros Grau é claro: se a conduta de Rocha Paiva chegar ao Supremo, as pedras do general podem se voltar contra a sua própria vidraça. 

O general Luiz Eduardo Rocha Paiva decidiu afrontar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei de Anistia. É o que afirma Eros Grau, ex-ministro da Corte com o peso da autoridade que lhe conferiu o fato de ter sido o relator do julgamento em 2010 que manteve a legislação e impediu que o “herói de Jair Bolsonaro”, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, terminasse seus dias na cadeia.

O governo Bolsonaro nomeou o general para a Comissão de Anistia e a transferiu do Ministério da Justiça para o dos Direitos Humanos. Tirou-a das mãos de Sérgio Moro e a entregou às de Damares Alves. Talvez porque precisasse pôr esse órgão de Estado criado por Fernando Henrique Cardoso nas mãos de guerreiros ideológicos. Mas nenhum governo pode desprezar os limites da lei e as ordens das Cortes.

O generalLuiz Eduardo Rocha Paiva Foto: Moreira Moriz/Agência Senado

Rocha Paiva, conforme viu o leitor, era um entusiasta apoiador de Ustra. Ficou conhecido depois de Bolsonaro lhe dar o apodo de “melancia”. Era uma licença poética. O general é um empedernido anticomunista. Tornou-se alvo do twitter presidencial por ter visto na declaração do chefe sobre governadores ”paraíbas” uma afronta à nacionalidade.

No dia 25 de julho, Rocha Paiva passou por cima da Lei de Anistia em um julgamento da comissão. Ele analisava o processo da professora Claudia de Arruda Campos, antiga militante da Ação Popular, que requeria indenização por ter sido perseguida pelo ditadura. Presa pelo Dops, Claudia perdeu estudo e trabalho. O general se exaltou. A advogada Ana Lucia Marchione estava na sessão e testemunhou o banzé.

O relator do caso recomendara o reconhecimento da anistia. O general se opôs. Alegou que a mulher pertencera a “uma das organizações terroristas mais violentas!”. E continuou: “É lícito que o Estado estivesse investigando uma organização dessa natureza. O que aconteceu com ela não foi perseguição política, é porque ela era uma militante de organização terrorista! Se ela diz que era da AP tem de assumir a responsabilidade pelo que disse.” A sessão foi gravada.

Rocha Paiva submeteu a novo julgamento a ex-militante da AP. Fez do relato da vítima a confissão de um crime. Transformou a Comissão de Anistia em Auditoria Militar. E a professora Claudia não estava ali para se defender.

O ex-ministro do STF Eros Graus Foto: Felipe Rau/Estadão

Ela militara no mesmo grupo que abrigara o senador José Serra, Hebert José de Souza, o Betinho, e Fernando Santa Cruz, o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nascida da esquerda católica, a AP nunca foi uma organização terrorista, embora um de seus membros tenha se envolvido no sangrento atentado do Aeroporto de Guararapes, em 1966.

E mesmo que fosse. Em artigo publicado aqui, Grau diz que a Lei de Anistia, a Emenda Constitucional 26/85 e o Artigo 8° das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 afirmam que a anistia foi ampla, geral e irrestrita para os “crimes políticos e conexos”. Entre os conexos estavam os assassinatos, as torturas e os desaparecimentos praticados por Ustra, que o general Rocha Paiva defende. Entre os políticos, anistiava-se pessoas como a professora que o general condenou.

“(A ação de Rocha Paiva) não é só contra o meu voto. É contra o acórdão do Supremo”, disse Grau. A fala do ministro que manteve a anistia é uma reação à extravagância dos termos com que o general se manifestou ao julgar a professora. “Negar a indenização é uma afronta ao Supremo e um desrespeito às instituições”, afirmou à coluna. O ministro lembrou que o caráter amplo, geral e irrestrito da norma não pode ser reduzido por um governo. Não é dado a ninguém a faculdade de respeitar as leis apenas quando lhe convém. Ou quando sua ideologia manda.

Grau lembra que nenhum militar perdeu a aposentadoria em razão dos crimes da ditadura. Se receberam os proventos é porque foram anistiados. Sendo assim, não se pode negar a indenização aos militantes de quaisquer organizações. A lógica da anistia é simples: se o Estado paga de um lado, tem de pagar do outro. O revanchismo contra a esquerda levou o ex-ministro a fazer, por fim, uma advertência: “O risco e consequência da manifestação do general é que o Estado se volte no futuro contra os militares e civis que defenderam o regime.”

A comissão de Rocha Paiva se vangloria de ter negado 1.300 pedidos de anistia e de ter concedido só meia dúzia. Alega haver nas decisões passadas do órgão uma farra com o dinheiro público, mas após 9 meses de governo não apresentou provas. O que há de concreto são casos como o da professora. Ou como contou a advogada Ana Lúcia, o dos trabalhadores da Ford de São Paulo, demitidos em 1979 e enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Zelar pelo dinheiro público é obrigação do governante. Obedecer às leis também. Se convicções não lhe permitem julgar segundo a lei, Rocha Paiva não devia aceitar o cargo. Se aceitou, não devia jogar pedras na Anistia. Não se exerce uma função pública em nome da desforra ou do ressentimento. O alerta de Eros Grau é claro: se a conduta de Rocha Paiva chegar ao Supremo, as pedras do general podem se voltar contra a sua própria vidraça. 

O general Luiz Eduardo Rocha Paiva decidiu afrontar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei de Anistia. É o que afirma Eros Grau, ex-ministro da Corte com o peso da autoridade que lhe conferiu o fato de ter sido o relator do julgamento em 2010 que manteve a legislação e impediu que o “herói de Jair Bolsonaro”, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, terminasse seus dias na cadeia.

O governo Bolsonaro nomeou o general para a Comissão de Anistia e a transferiu do Ministério da Justiça para o dos Direitos Humanos. Tirou-a das mãos de Sérgio Moro e a entregou às de Damares Alves. Talvez porque precisasse pôr esse órgão de Estado criado por Fernando Henrique Cardoso nas mãos de guerreiros ideológicos. Mas nenhum governo pode desprezar os limites da lei e as ordens das Cortes.

O generalLuiz Eduardo Rocha Paiva Foto: Moreira Moriz/Agência Senado

Rocha Paiva, conforme viu o leitor, era um entusiasta apoiador de Ustra. Ficou conhecido depois de Bolsonaro lhe dar o apodo de “melancia”. Era uma licença poética. O general é um empedernido anticomunista. Tornou-se alvo do twitter presidencial por ter visto na declaração do chefe sobre governadores ”paraíbas” uma afronta à nacionalidade.

No dia 25 de julho, Rocha Paiva passou por cima da Lei de Anistia em um julgamento da comissão. Ele analisava o processo da professora Claudia de Arruda Campos, antiga militante da Ação Popular, que requeria indenização por ter sido perseguida pelo ditadura. Presa pelo Dops, Claudia perdeu estudo e trabalho. O general se exaltou. A advogada Ana Lucia Marchione estava na sessão e testemunhou o banzé.

O relator do caso recomendara o reconhecimento da anistia. O general se opôs. Alegou que a mulher pertencera a “uma das organizações terroristas mais violentas!”. E continuou: “É lícito que o Estado estivesse investigando uma organização dessa natureza. O que aconteceu com ela não foi perseguição política, é porque ela era uma militante de organização terrorista! Se ela diz que era da AP tem de assumir a responsabilidade pelo que disse.” A sessão foi gravada.

Rocha Paiva submeteu a novo julgamento a ex-militante da AP. Fez do relato da vítima a confissão de um crime. Transformou a Comissão de Anistia em Auditoria Militar. E a professora Claudia não estava ali para se defender.

O ex-ministro do STF Eros Graus Foto: Felipe Rau/Estadão

Ela militara no mesmo grupo que abrigara o senador José Serra, Hebert José de Souza, o Betinho, e Fernando Santa Cruz, o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nascida da esquerda católica, a AP nunca foi uma organização terrorista, embora um de seus membros tenha se envolvido no sangrento atentado do Aeroporto de Guararapes, em 1966.

E mesmo que fosse. Em artigo publicado aqui, Grau diz que a Lei de Anistia, a Emenda Constitucional 26/85 e o Artigo 8° das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 afirmam que a anistia foi ampla, geral e irrestrita para os “crimes políticos e conexos”. Entre os conexos estavam os assassinatos, as torturas e os desaparecimentos praticados por Ustra, que o general Rocha Paiva defende. Entre os políticos, anistiava-se pessoas como a professora que o general condenou.

“(A ação de Rocha Paiva) não é só contra o meu voto. É contra o acórdão do Supremo”, disse Grau. A fala do ministro que manteve a anistia é uma reação à extravagância dos termos com que o general se manifestou ao julgar a professora. “Negar a indenização é uma afronta ao Supremo e um desrespeito às instituições”, afirmou à coluna. O ministro lembrou que o caráter amplo, geral e irrestrito da norma não pode ser reduzido por um governo. Não é dado a ninguém a faculdade de respeitar as leis apenas quando lhe convém. Ou quando sua ideologia manda.

Grau lembra que nenhum militar perdeu a aposentadoria em razão dos crimes da ditadura. Se receberam os proventos é porque foram anistiados. Sendo assim, não se pode negar a indenização aos militantes de quaisquer organizações. A lógica da anistia é simples: se o Estado paga de um lado, tem de pagar do outro. O revanchismo contra a esquerda levou o ex-ministro a fazer, por fim, uma advertência: “O risco e consequência da manifestação do general é que o Estado se volte no futuro contra os militares e civis que defenderam o regime.”

A comissão de Rocha Paiva se vangloria de ter negado 1.300 pedidos de anistia e de ter concedido só meia dúzia. Alega haver nas decisões passadas do órgão uma farra com o dinheiro público, mas após 9 meses de governo não apresentou provas. O que há de concreto são casos como o da professora. Ou como contou a advogada Ana Lúcia, o dos trabalhadores da Ford de São Paulo, demitidos em 1979 e enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

Zelar pelo dinheiro público é obrigação do governante. Obedecer às leis também. Se convicções não lhe permitem julgar segundo a lei, Rocha Paiva não devia aceitar o cargo. Se aceitou, não devia jogar pedras na Anistia. Não se exerce uma função pública em nome da desforra ou do ressentimento. O alerta de Eros Grau é claro: se a conduta de Rocha Paiva chegar ao Supremo, as pedras do general podem se voltar contra a sua própria vidraça. 

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