Uma batalha judicial no Rio pode botar a pique um veleiro americano construído em 1936 que sobreviveu à Segunda Guerra Mundial, quando atuou na Guarda Costeira dos Estados Unidos, e aguentou, incólume, quatro voltas ao redor do mundo. Apesar do perfil de relíquia náutica, o Lord Jim continuou na ativa até março de 2007, quando naufragou após acidente na Baía de Ilha Grande. Rebocado até o Reparos Navais Mangaratiba (Renaman), no sul fluminense, o veleiro virou o pivô de um litígio entre seus proprietários, o casal americano Holger Kreuzhage e Tracy Brown, e os donos do estaleiro. A briga começou um mês depois de o contrato ter sido assinado. Houve divergências em relação ao pagamento de serviços, materiais usados e remunerações. As trocas de acusações evoluíram para xingamentos, até chegar a agressões físicas. Um processo foi movido pelo estaleiro. Em primeira instância, a Justiça determinou a suspensão do contrato e condenou o casal a pagar a quantia simbólica de R$ 8 à empresa por dano moral. Os americanos ganharam o direito de livre acesso à embarcação e de contratar outra empresa. A decisão desagradou a ambos. Enquanto isso, o Lord Jim perece à ação do tempo.Holger e Tracy alegam que já pagaram cerca de R$ 260 mil para o Renaman e sua madeireira. O casal ainda desembolsou R$ 110 mil para a outra empresa contratada para concluir os reparos. Os americanos afirmam que o Lord Jim já está pronto para voltar a navegar. "O barco está pronto há mais de um ano. Os trilhos foram retirados pelo estaleiro, assim como algumas das estruturas que mantêm o barco estabilizado em terra", explica Holger, fotógrafo profissional e capitão de navio há 35 anos. Em protesto, ele hasteou de cabeça para baixo a bandeira dos EUA em seu veleiro. De acordo com o costume americano, o gesto representa "situação de extremo perigo à vida ou à propriedade". "Tudo o que queremos é pegar o nosso barco e voltar para o mar", diz Tracy. Do lado do Renaman, o advogado Flavio Prado - filho do dono do estaleiro, Luiz Prado - alega que buscou entendimento com o casal, mas nunca houve acordo. Ele admite que os estrangeiros pagaram cerca de R$ 180 mil, mas o valor não seria suficiente. "Foi pouco para o serviço que fizemos no barco", diz Flavio Prado. "O estaleiro existe há 50 anos e esta é a primeira vez que nos envolvemos numa disputa judicial." O advogado informa que vai esperar pela publicação da decisão judicial para apresentar recurso. "Aí, daqui a três, quatro ou cinco anos, tem uma decisão. Enquanto isso, o estaleiro não tem nenhuma responsabilidade", afirma Prado, reconhecendo ser bem provável a completa deterioração do barco antes do fim da batalha judicial. Sobre a destruição dos trilhos e suportes, Prado diz que a falta de manutenção por causa da disputa comprometeu os equipamentos. "A estrutura está imobilizada durante todo esse tempo, tomando sol e chuva. Nós não vamos colocar um centavo na reparação."
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