Após cinco anos de funcionamento, o programa de câmeras corporais individuais da Polícia Militar de Santa Catarina (PMSC) deixou de existir no último dia 16. Pioneiro no País, o projeto foi encerrado pelo Comando-Geral da corporação, que aponta alto custo com a manutenção e o armazenamento das imagens, além da defasagem dos equipamentos.
A tecnologia se mostrou efetiva na redução da letalidade policial e do emprego da violência pelos agentes de segurança. Em Santa Catarina, estudo publicado no fim de 2021 apontou redução de 61,2% no uso da força (como contatos físicos e uso de algemas) pelos agentes, com melhoria também na eficiência dos registros e encaminhamento dos casos.
Nesta semana, o Ministério da Justiça e Segurança Pública encerrou um chamamento que prevê repasse de verbas e compra de equipamentos para os governo locais - 15 Estados aderiram. A pasta recomenda o uso das câmeras pelos agentes.
A adoção das câmeras corporais é uma tendência observada há pelo menos uma década, especialmente por forças de segurança pública de países como Estados Unidos, Canadá e Reino Unido.
“Os aparelhos e o software utilizados pelas atuais câmeras não atendem mais à realidade da PMSC”, afirma o comandante-geral da instituição, coronel Aurélio José Pelozato da Rosa.
Agora a polícia, sob gestão do governador Jorginho Mello (PL), afirma buscar alternativas mais econômicas e eficazes para substituir os equipamentos, que já estão fora de circulação, mas não define prazos.
O contrato de manutenção das câmeras e armazenamento de dados entre a Ditec, empresa fornecedora dos equipamentos, e o governo terminou em setembro de 2023. De lá pra cá, a manutenção das 2.245 câmeras ficou a cargo da PMSC.
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Em nota, a empresa afirmou que “não possui mais responsabilidade pela manutenção dos dispositivos, nem pela segurança dos dados armazenados”.
A PM catarinense disse que “vinha enfrentando uma série de dificuldades com equipamentos defasados, com mais de 5 anos de uso, e que atrapalhavam, pelo constante mau funcionamento, a concentração necessária para operações policiais de alta complexidade, em que o risco de um dos nossos policiais perder a vida sempre está presente”.
A Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina (OAB-SC) se mostrou contrária à retirada das câmeras, pois as entende como ferramenta de proteção aos policiais e aos cidadãos, pois ajudam a evitar abuso de poder.
Em reunião com o comandante-geral, o presidente da Comissão Estadual de Assuntos Prisionais da Seccional da OAB, Wiliam Shinzato, pediu que os equipamentos fossem mantidos até que outra solução seja encontrada.
A implementação do programa de câmeras corporais individuais em 2019 custou R$ 6,4 milhões, sendo que R$ 6,2 milhões foram financiados pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SC).
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Em nota, o Tribunal afirmou que “o restante do valor disponibilizado, mas que não foi utilizado para o fim requerido (aproximadamente R$ 3,2 milhões), foi devolvido pela PMSC”.
O valor foi suficiente para garantir que, ao longo dos cinco anos de funcionamento do projeto, pelo menos um dos dois policiais de cada guarnição estivesse equipado com a câmera em todos os turnos.
O Ministério Público de Santa Catarina afirmou que está “avaliando o encerramento do programa”, e ainda não tem posicionamento oficial.
SP usa tecnologia
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), chegou a afirmar no início do ano que não previa investir em novas câmeras corporais nas fardas dos agentes da Polícia Militar paulista. Segundo ele, as bodycams - implementadas a partir de 2020 na gestão João Doria (então no PSDB) - não seriam efetivas para aumentar a segurança da população.
Depois, porém, ele mudou de discurso e disse que avaliava ampliar o programa. A continuidade do programa chegou a ser alvo de questionamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), que no Rio de Janeiro obrigou a polícia a adotar a tecnologia.
O edital lançado pela gestão paulista em maio para comprar câmeras prevê que o agente tenha a possibilidade de iniciar e desligar o equipamento. A diretriz diverge da orientação federal, que fala em manter o aparelho ligado durante toda a ocorrência.
Segundo estudo feito pelo Fórum de Segurança Pública e pelo Unicef, braço das Organização das Nações Unidas para a infância, houve queda de 62,7% nas mortes de adolescentes cometidas pela PM entre 2019 a 2022.
Em batalhões onde os agentes já utilizavam a tecnologia, a queda chegou a 76,2%, mais do que o dobro da redução observada no resto da corporação (33,3%). Como mostrou o Estadão, as câmeras ajudaram a diminuir de forma expressiva os óbitos de adolescentes.