Congresso tem 100 novos projetos na área da segurança por mês, com ênfase no endurecimento penal


¼ dos PLs são de autoria de policiais e militares eleitos para o parlamento; Instituto Sou da Paz vê fórmula repetida e sem efeito duradouro sobre redução da violência no País

Por Marco Antônio Carvalho

O primeiro ano da atual legislatura do Congresso Nacional teve um recorde na apresentação de propostas legislativas na área da segurança pública e justiça criminal. Ao todo, a média de novas propostas por mês ao longo de 2019 foi de mais de 100 PLs. Uma análise realizada pelo Instituto Sou da Paz divulgada agora revela que os parlamentares buscam com frequência endurecer penas de crimes já existentes e criar novas tipificações para passar a punir novas condutas. Especialistas ponderam que a aposta nessa fórmula tem surtido pouco efeito no Brasil. 

Com a pandemia, a tramitação do volume recorde de propostas acabou travada diante das restrições dos trabalhos no Congresso e com a priorização de pautas voltadas ao apoio à situação de emergência em saúde pública. Mesmo assim, a tendência nos projetos de segurançapública se manteve, com foco no aumento da pena para crimes cometidos no contexto da pandemia do novo coronavírus. A expectativa dos parlamentares é que em 2021 o andamento da análise dos projetos apresentados desde 2019 possa ser retomado em seu ritmo normal. 

Sede do Congresso Nacional em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão
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Entre os 5,1 mil projetos de lei apresentados em 2019 na Câmara dos Deputados, o Instituto Sou da Paz constatou 1.214 ligados a temas da segurança pública. Dentre eles, 21% buscavam aumento de pena para algum tipo de crime e 14,4% propunham criminalizar alguma nova conduta. Esses foram os temas mais comuns, mas outros tópicos também apareceram com frequência, como alterações no processo penal (12,5%), alterações na política de armas (5,2%) e medidas sobre a violência contra a mulher (8,4%). No Senado, o padrão se repetiu. 

“Há uma primazia da busca pelo direito penal como o remédio prioritário para a segurança pública. Mas isso não tem o efeito desejado porque é o que vem sendo feito há décadas e o resultado está aí”, diz o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Ele detalha que a pesquisa sobre as propostas legislativas é realizada desde 2015 e de lá para cá tem reforçado o mesmo padrão de atuação dos parlamentares. 

Sobre o cenário da segurança no País, dado de outubro deste ano do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou queda recorde nos homicídios em 2019, mas o padrão não se manteve ao longo do primeiro semestre deste ano, quando esse tipo de crime voltou a aumentar. Os registros de assassinatos com frequência são usados como um bom parâmetro de avaliação da qualidade da segurança pública nos países, por se tratar de um crime grave e envolver também a capacidade reativa das forças policiais em solucionar os casos e interromper os ciclos de impunidade. O recorde de homicídios no Brasil ocorreu em 2017, com mais de 60 mil vítimas.

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“Os índices não apresentam uma melhora sistêmica e sustentada. A explosão carcerária que o País viu na última década encontra pouco paralelo no mundo e isso levou a uma crise que culminou com massacres e o fortalecimento das facções criminosas”, diz Angeli. “Com isso, estou dizendo que tem que liberar todo mundo que está preso? Óbvio que não. Há uma dimensão importante na responsabilização do criminoso, mas o assunto tem de ser tratado de forma menos populista.” 

Cresce número de policiais, vigilantes e militares no Congresso

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As propostas da nova legislatura nascem fruto de um Congresso ocupado de forma sem precedentes por policiais, vigilantes e militares em geral. A eleição de 2010 terminou com quatro deputados com esse perfil entre os vencedores. O número subiu para 19 no pleito de 2014 e chegou a 42 na escolha popular de 2018. Esses agentes, que representam 8,2% do total da Casa, foram autores de 278 projetos de lei sobre segurança pública e justiça criminal (24,6% do total). 

Quem se encaixa nesse perfil é o deputado federal Sanderson, do PSL do Rio Grande do Sul. O policial federal destacou logo no início da conversa com o Estadão que antes da eleição de 2018 nem filiação partidária tinha. A vontade de integrar a política partidária surgiu do desejo de ver mudança a partir da observação diária da segurança pública ao longo de 24 anos de carreira. Foi essa experiência que fez Sanderson ser o parlamentar com mais projetos sobre segurança apresentados ao longo de 2019: 42.

“Quem comete crime no Brasil tem a certeza de que não será punido. Com mais de 60 mil homicídios, tínhamos de fazer alguma coisa e o endurecimento dá a mensagem para a sociedade de que o Estado está disposto a colocar na cadeia e deixar lá seus infratores. Então, vamos endurecer a pena mínima e a pena máxima dos crimes”, explicou o parlamentar. 

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As suas propostas variam desde o endurecimento da pena para quem comete roubo de animais no contexto rural - “mete a arma no capataz e leva 20 bois”, diz Sanderson - até dificultar a progressão de pena para pessoas que cometem homicídios. “E se não tem cadeia para botar, vamos construir mais cadeia”, completa o deputado. A proposta mais recente do parlamentar tenta criar um novo tipo penal batizado de “domínio de cidades” para fazer frente a quadrilhas como a que atacou recentemente a cidade de Criciúma. 

O gerente do Sou da Paz, Felippe Angeli, lamenta que o parlamento, nesse sentido, quase não leve em consideração a busca por políticas públicas baseadas em evidências. “A atuação acaba sendo muito pouco pautada pelo conhecimento organizado que aponta boas soluções. Aqui, cito o exemplo das armas de fogo, tema para o qual existe um consenso científico de que o aumento na circulação de armas leva a uma maior insegurança. Mas a partir de polarizações e ideologias se acaba indo numa posição totalmente contrária”, diz. 

Projetos que embasem políticas de prevenção da violência ou que discutam a gestão e o financiamento para os governos aparecem com menos frequência entre as propostas dos parlamentares. 

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No Senado, a liderança nos projetos na área de segurança e justiça criminal é do professor de direito e ex-delegado da Polícia Civil Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele diz que a sua atuação nessa área visa a “proteger a população de crimes como roubo e estelionato”, sendo voltada também para a “defesa de maiorias minorizadas que precisam de espaços de representatividade, como pobres, negros, índios, população LGBTQIA+”. 

“Temos proposto mudanças legislativas no Código Penal. Lei sancionada recentemente tem emenda de nossa autoria que garante cadeia de fato para motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Também apresentamos texto cortando privilégio de direito a prisão especial para autoridades públicas. Defendemos, por meio de projetos, maior pena para casos de corrupção. O processo de construção política para aprovação dessas propostas está em curso, e lutamos de maneira incansável para gerar paz social, desenvolvimento e justiça no país”, disse em nota enviada à reportagem. 

Angeli, do Sou da Paz, analisa que, no caso dos parlamentares que apostam nas tradicionais propostas de endurecimento penal como solução para a segurança pública, há uma conversa direta com o eleitor que precisa ser levada em consideração e reavaliada. “Os deputados julgam que isso traz dividendos eleitorais e se alimentam da visibilidade. Se a sociedade falar para o representante que não é isso que se espera, ele não é eleito. Mas talvez a sociedade esteja pedindo isso mesmo, alguém que apareça com a solução supostamente simples. A gente precisa qualificar o debate.”

O primeiro ano da atual legislatura do Congresso Nacional teve um recorde na apresentação de propostas legislativas na área da segurança pública e justiça criminal. Ao todo, a média de novas propostas por mês ao longo de 2019 foi de mais de 100 PLs. Uma análise realizada pelo Instituto Sou da Paz divulgada agora revela que os parlamentares buscam com frequência endurecer penas de crimes já existentes e criar novas tipificações para passar a punir novas condutas. Especialistas ponderam que a aposta nessa fórmula tem surtido pouco efeito no Brasil. 

Com a pandemia, a tramitação do volume recorde de propostas acabou travada diante das restrições dos trabalhos no Congresso e com a priorização de pautas voltadas ao apoio à situação de emergência em saúde pública. Mesmo assim, a tendência nos projetos de segurançapública se manteve, com foco no aumento da pena para crimes cometidos no contexto da pandemia do novo coronavírus. A expectativa dos parlamentares é que em 2021 o andamento da análise dos projetos apresentados desde 2019 possa ser retomado em seu ritmo normal. 

Sede do Congresso Nacional em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão

Entre os 5,1 mil projetos de lei apresentados em 2019 na Câmara dos Deputados, o Instituto Sou da Paz constatou 1.214 ligados a temas da segurança pública. Dentre eles, 21% buscavam aumento de pena para algum tipo de crime e 14,4% propunham criminalizar alguma nova conduta. Esses foram os temas mais comuns, mas outros tópicos também apareceram com frequência, como alterações no processo penal (12,5%), alterações na política de armas (5,2%) e medidas sobre a violência contra a mulher (8,4%). No Senado, o padrão se repetiu. 

“Há uma primazia da busca pelo direito penal como o remédio prioritário para a segurança pública. Mas isso não tem o efeito desejado porque é o que vem sendo feito há décadas e o resultado está aí”, diz o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Ele detalha que a pesquisa sobre as propostas legislativas é realizada desde 2015 e de lá para cá tem reforçado o mesmo padrão de atuação dos parlamentares. 

Sobre o cenário da segurança no País, dado de outubro deste ano do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou queda recorde nos homicídios em 2019, mas o padrão não se manteve ao longo do primeiro semestre deste ano, quando esse tipo de crime voltou a aumentar. Os registros de assassinatos com frequência são usados como um bom parâmetro de avaliação da qualidade da segurança pública nos países, por se tratar de um crime grave e envolver também a capacidade reativa das forças policiais em solucionar os casos e interromper os ciclos de impunidade. O recorde de homicídios no Brasil ocorreu em 2017, com mais de 60 mil vítimas.

“Os índices não apresentam uma melhora sistêmica e sustentada. A explosão carcerária que o País viu na última década encontra pouco paralelo no mundo e isso levou a uma crise que culminou com massacres e o fortalecimento das facções criminosas”, diz Angeli. “Com isso, estou dizendo que tem que liberar todo mundo que está preso? Óbvio que não. Há uma dimensão importante na responsabilização do criminoso, mas o assunto tem de ser tratado de forma menos populista.” 

Cresce número de policiais, vigilantes e militares no Congresso

As propostas da nova legislatura nascem fruto de um Congresso ocupado de forma sem precedentes por policiais, vigilantes e militares em geral. A eleição de 2010 terminou com quatro deputados com esse perfil entre os vencedores. O número subiu para 19 no pleito de 2014 e chegou a 42 na escolha popular de 2018. Esses agentes, que representam 8,2% do total da Casa, foram autores de 278 projetos de lei sobre segurança pública e justiça criminal (24,6% do total). 

Quem se encaixa nesse perfil é o deputado federal Sanderson, do PSL do Rio Grande do Sul. O policial federal destacou logo no início da conversa com o Estadão que antes da eleição de 2018 nem filiação partidária tinha. A vontade de integrar a política partidária surgiu do desejo de ver mudança a partir da observação diária da segurança pública ao longo de 24 anos de carreira. Foi essa experiência que fez Sanderson ser o parlamentar com mais projetos sobre segurança apresentados ao longo de 2019: 42.

“Quem comete crime no Brasil tem a certeza de que não será punido. Com mais de 60 mil homicídios, tínhamos de fazer alguma coisa e o endurecimento dá a mensagem para a sociedade de que o Estado está disposto a colocar na cadeia e deixar lá seus infratores. Então, vamos endurecer a pena mínima e a pena máxima dos crimes”, explicou o parlamentar. 

As suas propostas variam desde o endurecimento da pena para quem comete roubo de animais no contexto rural - “mete a arma no capataz e leva 20 bois”, diz Sanderson - até dificultar a progressão de pena para pessoas que cometem homicídios. “E se não tem cadeia para botar, vamos construir mais cadeia”, completa o deputado. A proposta mais recente do parlamentar tenta criar um novo tipo penal batizado de “domínio de cidades” para fazer frente a quadrilhas como a que atacou recentemente a cidade de Criciúma. 

O gerente do Sou da Paz, Felippe Angeli, lamenta que o parlamento, nesse sentido, quase não leve em consideração a busca por políticas públicas baseadas em evidências. “A atuação acaba sendo muito pouco pautada pelo conhecimento organizado que aponta boas soluções. Aqui, cito o exemplo das armas de fogo, tema para o qual existe um consenso científico de que o aumento na circulação de armas leva a uma maior insegurança. Mas a partir de polarizações e ideologias se acaba indo numa posição totalmente contrária”, diz. 

Projetos que embasem políticas de prevenção da violência ou que discutam a gestão e o financiamento para os governos aparecem com menos frequência entre as propostas dos parlamentares. 

No Senado, a liderança nos projetos na área de segurança e justiça criminal é do professor de direito e ex-delegado da Polícia Civil Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele diz que a sua atuação nessa área visa a “proteger a população de crimes como roubo e estelionato”, sendo voltada também para a “defesa de maiorias minorizadas que precisam de espaços de representatividade, como pobres, negros, índios, população LGBTQIA+”. 

“Temos proposto mudanças legislativas no Código Penal. Lei sancionada recentemente tem emenda de nossa autoria que garante cadeia de fato para motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Também apresentamos texto cortando privilégio de direito a prisão especial para autoridades públicas. Defendemos, por meio de projetos, maior pena para casos de corrupção. O processo de construção política para aprovação dessas propostas está em curso, e lutamos de maneira incansável para gerar paz social, desenvolvimento e justiça no país”, disse em nota enviada à reportagem. 

Angeli, do Sou da Paz, analisa que, no caso dos parlamentares que apostam nas tradicionais propostas de endurecimento penal como solução para a segurança pública, há uma conversa direta com o eleitor que precisa ser levada em consideração e reavaliada. “Os deputados julgam que isso traz dividendos eleitorais e se alimentam da visibilidade. Se a sociedade falar para o representante que não é isso que se espera, ele não é eleito. Mas talvez a sociedade esteja pedindo isso mesmo, alguém que apareça com a solução supostamente simples. A gente precisa qualificar o debate.”

O primeiro ano da atual legislatura do Congresso Nacional teve um recorde na apresentação de propostas legislativas na área da segurança pública e justiça criminal. Ao todo, a média de novas propostas por mês ao longo de 2019 foi de mais de 100 PLs. Uma análise realizada pelo Instituto Sou da Paz divulgada agora revela que os parlamentares buscam com frequência endurecer penas de crimes já existentes e criar novas tipificações para passar a punir novas condutas. Especialistas ponderam que a aposta nessa fórmula tem surtido pouco efeito no Brasil. 

Com a pandemia, a tramitação do volume recorde de propostas acabou travada diante das restrições dos trabalhos no Congresso e com a priorização de pautas voltadas ao apoio à situação de emergência em saúde pública. Mesmo assim, a tendência nos projetos de segurançapública se manteve, com foco no aumento da pena para crimes cometidos no contexto da pandemia do novo coronavírus. A expectativa dos parlamentares é que em 2021 o andamento da análise dos projetos apresentados desde 2019 possa ser retomado em seu ritmo normal. 

Sede do Congresso Nacional em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão

Entre os 5,1 mil projetos de lei apresentados em 2019 na Câmara dos Deputados, o Instituto Sou da Paz constatou 1.214 ligados a temas da segurança pública. Dentre eles, 21% buscavam aumento de pena para algum tipo de crime e 14,4% propunham criminalizar alguma nova conduta. Esses foram os temas mais comuns, mas outros tópicos também apareceram com frequência, como alterações no processo penal (12,5%), alterações na política de armas (5,2%) e medidas sobre a violência contra a mulher (8,4%). No Senado, o padrão se repetiu. 

“Há uma primazia da busca pelo direito penal como o remédio prioritário para a segurança pública. Mas isso não tem o efeito desejado porque é o que vem sendo feito há décadas e o resultado está aí”, diz o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Ele detalha que a pesquisa sobre as propostas legislativas é realizada desde 2015 e de lá para cá tem reforçado o mesmo padrão de atuação dos parlamentares. 

Sobre o cenário da segurança no País, dado de outubro deste ano do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou queda recorde nos homicídios em 2019, mas o padrão não se manteve ao longo do primeiro semestre deste ano, quando esse tipo de crime voltou a aumentar. Os registros de assassinatos com frequência são usados como um bom parâmetro de avaliação da qualidade da segurança pública nos países, por se tratar de um crime grave e envolver também a capacidade reativa das forças policiais em solucionar os casos e interromper os ciclos de impunidade. O recorde de homicídios no Brasil ocorreu em 2017, com mais de 60 mil vítimas.

“Os índices não apresentam uma melhora sistêmica e sustentada. A explosão carcerária que o País viu na última década encontra pouco paralelo no mundo e isso levou a uma crise que culminou com massacres e o fortalecimento das facções criminosas”, diz Angeli. “Com isso, estou dizendo que tem que liberar todo mundo que está preso? Óbvio que não. Há uma dimensão importante na responsabilização do criminoso, mas o assunto tem de ser tratado de forma menos populista.” 

Cresce número de policiais, vigilantes e militares no Congresso

As propostas da nova legislatura nascem fruto de um Congresso ocupado de forma sem precedentes por policiais, vigilantes e militares em geral. A eleição de 2010 terminou com quatro deputados com esse perfil entre os vencedores. O número subiu para 19 no pleito de 2014 e chegou a 42 na escolha popular de 2018. Esses agentes, que representam 8,2% do total da Casa, foram autores de 278 projetos de lei sobre segurança pública e justiça criminal (24,6% do total). 

Quem se encaixa nesse perfil é o deputado federal Sanderson, do PSL do Rio Grande do Sul. O policial federal destacou logo no início da conversa com o Estadão que antes da eleição de 2018 nem filiação partidária tinha. A vontade de integrar a política partidária surgiu do desejo de ver mudança a partir da observação diária da segurança pública ao longo de 24 anos de carreira. Foi essa experiência que fez Sanderson ser o parlamentar com mais projetos sobre segurança apresentados ao longo de 2019: 42.

“Quem comete crime no Brasil tem a certeza de que não será punido. Com mais de 60 mil homicídios, tínhamos de fazer alguma coisa e o endurecimento dá a mensagem para a sociedade de que o Estado está disposto a colocar na cadeia e deixar lá seus infratores. Então, vamos endurecer a pena mínima e a pena máxima dos crimes”, explicou o parlamentar. 

As suas propostas variam desde o endurecimento da pena para quem comete roubo de animais no contexto rural - “mete a arma no capataz e leva 20 bois”, diz Sanderson - até dificultar a progressão de pena para pessoas que cometem homicídios. “E se não tem cadeia para botar, vamos construir mais cadeia”, completa o deputado. A proposta mais recente do parlamentar tenta criar um novo tipo penal batizado de “domínio de cidades” para fazer frente a quadrilhas como a que atacou recentemente a cidade de Criciúma. 

O gerente do Sou da Paz, Felippe Angeli, lamenta que o parlamento, nesse sentido, quase não leve em consideração a busca por políticas públicas baseadas em evidências. “A atuação acaba sendo muito pouco pautada pelo conhecimento organizado que aponta boas soluções. Aqui, cito o exemplo das armas de fogo, tema para o qual existe um consenso científico de que o aumento na circulação de armas leva a uma maior insegurança. Mas a partir de polarizações e ideologias se acaba indo numa posição totalmente contrária”, diz. 

Projetos que embasem políticas de prevenção da violência ou que discutam a gestão e o financiamento para os governos aparecem com menos frequência entre as propostas dos parlamentares. 

No Senado, a liderança nos projetos na área de segurança e justiça criminal é do professor de direito e ex-delegado da Polícia Civil Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele diz que a sua atuação nessa área visa a “proteger a população de crimes como roubo e estelionato”, sendo voltada também para a “defesa de maiorias minorizadas que precisam de espaços de representatividade, como pobres, negros, índios, população LGBTQIA+”. 

“Temos proposto mudanças legislativas no Código Penal. Lei sancionada recentemente tem emenda de nossa autoria que garante cadeia de fato para motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Também apresentamos texto cortando privilégio de direito a prisão especial para autoridades públicas. Defendemos, por meio de projetos, maior pena para casos de corrupção. O processo de construção política para aprovação dessas propostas está em curso, e lutamos de maneira incansável para gerar paz social, desenvolvimento e justiça no país”, disse em nota enviada à reportagem. 

Angeli, do Sou da Paz, analisa que, no caso dos parlamentares que apostam nas tradicionais propostas de endurecimento penal como solução para a segurança pública, há uma conversa direta com o eleitor que precisa ser levada em consideração e reavaliada. “Os deputados julgam que isso traz dividendos eleitorais e se alimentam da visibilidade. Se a sociedade falar para o representante que não é isso que se espera, ele não é eleito. Mas talvez a sociedade esteja pedindo isso mesmo, alguém que apareça com a solução supostamente simples. A gente precisa qualificar o debate.”

O primeiro ano da atual legislatura do Congresso Nacional teve um recorde na apresentação de propostas legislativas na área da segurança pública e justiça criminal. Ao todo, a média de novas propostas por mês ao longo de 2019 foi de mais de 100 PLs. Uma análise realizada pelo Instituto Sou da Paz divulgada agora revela que os parlamentares buscam com frequência endurecer penas de crimes já existentes e criar novas tipificações para passar a punir novas condutas. Especialistas ponderam que a aposta nessa fórmula tem surtido pouco efeito no Brasil. 

Com a pandemia, a tramitação do volume recorde de propostas acabou travada diante das restrições dos trabalhos no Congresso e com a priorização de pautas voltadas ao apoio à situação de emergência em saúde pública. Mesmo assim, a tendência nos projetos de segurançapública se manteve, com foco no aumento da pena para crimes cometidos no contexto da pandemia do novo coronavírus. A expectativa dos parlamentares é que em 2021 o andamento da análise dos projetos apresentados desde 2019 possa ser retomado em seu ritmo normal. 

Sede do Congresso Nacional em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão

Entre os 5,1 mil projetos de lei apresentados em 2019 na Câmara dos Deputados, o Instituto Sou da Paz constatou 1.214 ligados a temas da segurança pública. Dentre eles, 21% buscavam aumento de pena para algum tipo de crime e 14,4% propunham criminalizar alguma nova conduta. Esses foram os temas mais comuns, mas outros tópicos também apareceram com frequência, como alterações no processo penal (12,5%), alterações na política de armas (5,2%) e medidas sobre a violência contra a mulher (8,4%). No Senado, o padrão se repetiu. 

“Há uma primazia da busca pelo direito penal como o remédio prioritário para a segurança pública. Mas isso não tem o efeito desejado porque é o que vem sendo feito há décadas e o resultado está aí”, diz o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Ele detalha que a pesquisa sobre as propostas legislativas é realizada desde 2015 e de lá para cá tem reforçado o mesmo padrão de atuação dos parlamentares. 

Sobre o cenário da segurança no País, dado de outubro deste ano do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou queda recorde nos homicídios em 2019, mas o padrão não se manteve ao longo do primeiro semestre deste ano, quando esse tipo de crime voltou a aumentar. Os registros de assassinatos com frequência são usados como um bom parâmetro de avaliação da qualidade da segurança pública nos países, por se tratar de um crime grave e envolver também a capacidade reativa das forças policiais em solucionar os casos e interromper os ciclos de impunidade. O recorde de homicídios no Brasil ocorreu em 2017, com mais de 60 mil vítimas.

“Os índices não apresentam uma melhora sistêmica e sustentada. A explosão carcerária que o País viu na última década encontra pouco paralelo no mundo e isso levou a uma crise que culminou com massacres e o fortalecimento das facções criminosas”, diz Angeli. “Com isso, estou dizendo que tem que liberar todo mundo que está preso? Óbvio que não. Há uma dimensão importante na responsabilização do criminoso, mas o assunto tem de ser tratado de forma menos populista.” 

Cresce número de policiais, vigilantes e militares no Congresso

As propostas da nova legislatura nascem fruto de um Congresso ocupado de forma sem precedentes por policiais, vigilantes e militares em geral. A eleição de 2010 terminou com quatro deputados com esse perfil entre os vencedores. O número subiu para 19 no pleito de 2014 e chegou a 42 na escolha popular de 2018. Esses agentes, que representam 8,2% do total da Casa, foram autores de 278 projetos de lei sobre segurança pública e justiça criminal (24,6% do total). 

Quem se encaixa nesse perfil é o deputado federal Sanderson, do PSL do Rio Grande do Sul. O policial federal destacou logo no início da conversa com o Estadão que antes da eleição de 2018 nem filiação partidária tinha. A vontade de integrar a política partidária surgiu do desejo de ver mudança a partir da observação diária da segurança pública ao longo de 24 anos de carreira. Foi essa experiência que fez Sanderson ser o parlamentar com mais projetos sobre segurança apresentados ao longo de 2019: 42.

“Quem comete crime no Brasil tem a certeza de que não será punido. Com mais de 60 mil homicídios, tínhamos de fazer alguma coisa e o endurecimento dá a mensagem para a sociedade de que o Estado está disposto a colocar na cadeia e deixar lá seus infratores. Então, vamos endurecer a pena mínima e a pena máxima dos crimes”, explicou o parlamentar. 

As suas propostas variam desde o endurecimento da pena para quem comete roubo de animais no contexto rural - “mete a arma no capataz e leva 20 bois”, diz Sanderson - até dificultar a progressão de pena para pessoas que cometem homicídios. “E se não tem cadeia para botar, vamos construir mais cadeia”, completa o deputado. A proposta mais recente do parlamentar tenta criar um novo tipo penal batizado de “domínio de cidades” para fazer frente a quadrilhas como a que atacou recentemente a cidade de Criciúma. 

O gerente do Sou da Paz, Felippe Angeli, lamenta que o parlamento, nesse sentido, quase não leve em consideração a busca por políticas públicas baseadas em evidências. “A atuação acaba sendo muito pouco pautada pelo conhecimento organizado que aponta boas soluções. Aqui, cito o exemplo das armas de fogo, tema para o qual existe um consenso científico de que o aumento na circulação de armas leva a uma maior insegurança. Mas a partir de polarizações e ideologias se acaba indo numa posição totalmente contrária”, diz. 

Projetos que embasem políticas de prevenção da violência ou que discutam a gestão e o financiamento para os governos aparecem com menos frequência entre as propostas dos parlamentares. 

No Senado, a liderança nos projetos na área de segurança e justiça criminal é do professor de direito e ex-delegado da Polícia Civil Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele diz que a sua atuação nessa área visa a “proteger a população de crimes como roubo e estelionato”, sendo voltada também para a “defesa de maiorias minorizadas que precisam de espaços de representatividade, como pobres, negros, índios, população LGBTQIA+”. 

“Temos proposto mudanças legislativas no Código Penal. Lei sancionada recentemente tem emenda de nossa autoria que garante cadeia de fato para motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Também apresentamos texto cortando privilégio de direito a prisão especial para autoridades públicas. Defendemos, por meio de projetos, maior pena para casos de corrupção. O processo de construção política para aprovação dessas propostas está em curso, e lutamos de maneira incansável para gerar paz social, desenvolvimento e justiça no país”, disse em nota enviada à reportagem. 

Angeli, do Sou da Paz, analisa que, no caso dos parlamentares que apostam nas tradicionais propostas de endurecimento penal como solução para a segurança pública, há uma conversa direta com o eleitor que precisa ser levada em consideração e reavaliada. “Os deputados julgam que isso traz dividendos eleitorais e se alimentam da visibilidade. Se a sociedade falar para o representante que não é isso que se espera, ele não é eleito. Mas talvez a sociedade esteja pedindo isso mesmo, alguém que apareça com a solução supostamente simples. A gente precisa qualificar o debate.”

O primeiro ano da atual legislatura do Congresso Nacional teve um recorde na apresentação de propostas legislativas na área da segurança pública e justiça criminal. Ao todo, a média de novas propostas por mês ao longo de 2019 foi de mais de 100 PLs. Uma análise realizada pelo Instituto Sou da Paz divulgada agora revela que os parlamentares buscam com frequência endurecer penas de crimes já existentes e criar novas tipificações para passar a punir novas condutas. Especialistas ponderam que a aposta nessa fórmula tem surtido pouco efeito no Brasil. 

Com a pandemia, a tramitação do volume recorde de propostas acabou travada diante das restrições dos trabalhos no Congresso e com a priorização de pautas voltadas ao apoio à situação de emergência em saúde pública. Mesmo assim, a tendência nos projetos de segurançapública se manteve, com foco no aumento da pena para crimes cometidos no contexto da pandemia do novo coronavírus. A expectativa dos parlamentares é que em 2021 o andamento da análise dos projetos apresentados desde 2019 possa ser retomado em seu ritmo normal. 

Sede do Congresso Nacional em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão

Entre os 5,1 mil projetos de lei apresentados em 2019 na Câmara dos Deputados, o Instituto Sou da Paz constatou 1.214 ligados a temas da segurança pública. Dentre eles, 21% buscavam aumento de pena para algum tipo de crime e 14,4% propunham criminalizar alguma nova conduta. Esses foram os temas mais comuns, mas outros tópicos também apareceram com frequência, como alterações no processo penal (12,5%), alterações na política de armas (5,2%) e medidas sobre a violência contra a mulher (8,4%). No Senado, o padrão se repetiu. 

“Há uma primazia da busca pelo direito penal como o remédio prioritário para a segurança pública. Mas isso não tem o efeito desejado porque é o que vem sendo feito há décadas e o resultado está aí”, diz o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Ele detalha que a pesquisa sobre as propostas legislativas é realizada desde 2015 e de lá para cá tem reforçado o mesmo padrão de atuação dos parlamentares. 

Sobre o cenário da segurança no País, dado de outubro deste ano do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou queda recorde nos homicídios em 2019, mas o padrão não se manteve ao longo do primeiro semestre deste ano, quando esse tipo de crime voltou a aumentar. Os registros de assassinatos com frequência são usados como um bom parâmetro de avaliação da qualidade da segurança pública nos países, por se tratar de um crime grave e envolver também a capacidade reativa das forças policiais em solucionar os casos e interromper os ciclos de impunidade. O recorde de homicídios no Brasil ocorreu em 2017, com mais de 60 mil vítimas.

“Os índices não apresentam uma melhora sistêmica e sustentada. A explosão carcerária que o País viu na última década encontra pouco paralelo no mundo e isso levou a uma crise que culminou com massacres e o fortalecimento das facções criminosas”, diz Angeli. “Com isso, estou dizendo que tem que liberar todo mundo que está preso? Óbvio que não. Há uma dimensão importante na responsabilização do criminoso, mas o assunto tem de ser tratado de forma menos populista.” 

Cresce número de policiais, vigilantes e militares no Congresso

As propostas da nova legislatura nascem fruto de um Congresso ocupado de forma sem precedentes por policiais, vigilantes e militares em geral. A eleição de 2010 terminou com quatro deputados com esse perfil entre os vencedores. O número subiu para 19 no pleito de 2014 e chegou a 42 na escolha popular de 2018. Esses agentes, que representam 8,2% do total da Casa, foram autores de 278 projetos de lei sobre segurança pública e justiça criminal (24,6% do total). 

Quem se encaixa nesse perfil é o deputado federal Sanderson, do PSL do Rio Grande do Sul. O policial federal destacou logo no início da conversa com o Estadão que antes da eleição de 2018 nem filiação partidária tinha. A vontade de integrar a política partidária surgiu do desejo de ver mudança a partir da observação diária da segurança pública ao longo de 24 anos de carreira. Foi essa experiência que fez Sanderson ser o parlamentar com mais projetos sobre segurança apresentados ao longo de 2019: 42.

“Quem comete crime no Brasil tem a certeza de que não será punido. Com mais de 60 mil homicídios, tínhamos de fazer alguma coisa e o endurecimento dá a mensagem para a sociedade de que o Estado está disposto a colocar na cadeia e deixar lá seus infratores. Então, vamos endurecer a pena mínima e a pena máxima dos crimes”, explicou o parlamentar. 

As suas propostas variam desde o endurecimento da pena para quem comete roubo de animais no contexto rural - “mete a arma no capataz e leva 20 bois”, diz Sanderson - até dificultar a progressão de pena para pessoas que cometem homicídios. “E se não tem cadeia para botar, vamos construir mais cadeia”, completa o deputado. A proposta mais recente do parlamentar tenta criar um novo tipo penal batizado de “domínio de cidades” para fazer frente a quadrilhas como a que atacou recentemente a cidade de Criciúma. 

O gerente do Sou da Paz, Felippe Angeli, lamenta que o parlamento, nesse sentido, quase não leve em consideração a busca por políticas públicas baseadas em evidências. “A atuação acaba sendo muito pouco pautada pelo conhecimento organizado que aponta boas soluções. Aqui, cito o exemplo das armas de fogo, tema para o qual existe um consenso científico de que o aumento na circulação de armas leva a uma maior insegurança. Mas a partir de polarizações e ideologias se acaba indo numa posição totalmente contrária”, diz. 

Projetos que embasem políticas de prevenção da violência ou que discutam a gestão e o financiamento para os governos aparecem com menos frequência entre as propostas dos parlamentares. 

No Senado, a liderança nos projetos na área de segurança e justiça criminal é do professor de direito e ex-delegado da Polícia Civil Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele diz que a sua atuação nessa área visa a “proteger a população de crimes como roubo e estelionato”, sendo voltada também para a “defesa de maiorias minorizadas que precisam de espaços de representatividade, como pobres, negros, índios, população LGBTQIA+”. 

“Temos proposto mudanças legislativas no Código Penal. Lei sancionada recentemente tem emenda de nossa autoria que garante cadeia de fato para motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Também apresentamos texto cortando privilégio de direito a prisão especial para autoridades públicas. Defendemos, por meio de projetos, maior pena para casos de corrupção. O processo de construção política para aprovação dessas propostas está em curso, e lutamos de maneira incansável para gerar paz social, desenvolvimento e justiça no país”, disse em nota enviada à reportagem. 

Angeli, do Sou da Paz, analisa que, no caso dos parlamentares que apostam nas tradicionais propostas de endurecimento penal como solução para a segurança pública, há uma conversa direta com o eleitor que precisa ser levada em consideração e reavaliada. “Os deputados julgam que isso traz dividendos eleitorais e se alimentam da visibilidade. Se a sociedade falar para o representante que não é isso que se espera, ele não é eleito. Mas talvez a sociedade esteja pedindo isso mesmo, alguém que apareça com a solução supostamente simples. A gente precisa qualificar o debate.”

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