O que é linguagem neutra e como decisão do STF afeta uso nas escolas


Ação sobre caso em Rondônia produz o ‘efeito vinculante’ e serve de referência para situações semelhantes pelo País

Por José Maria Tomazela
Atualização:

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar uma lei de Rondônia que proíbe a linguagem neutra na grade curricular e no material didático das escolas públicas e privadas do Estado vai afetar de imediato leis ou projetos em outras 19 unidades da federação. Ao menos 45 iniciativas semelhantes foram aprovadas ou tramitam nos legislativos municipais e estaduais pelo País, segundo levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Juristas apontam que, após a publicação do acórdão, a aplicação da lei será imediata e automática, revogando as leis em vigor e impedindo a aprovação de normas contrárias a esse entendimento.

Votaram pela inconstitucionalidade da proibição, acompanhando o relator Edson Fachin, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux. O ministro Nunes Marques acompanhou o relator com ressalva. Às 22 horas, falta o voto do ministro André Mendonça. A votação virtual se encerraria às 23h59.

Após a lei ser sancionada pelo governo de Rondônia, a Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF pedindo sua revogação. O ministro Fachin já havia dado liminar suspendendo a vigência da norma.

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Ministro do STF e relator da ação, Edson, Fachin, entende que legislar sobre diretrizes e bases da educação é competência privativa da União. Foto: Abdias Pinheiro/TSE

O uso da linguagem neutra é mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+. O objetivo é adaptar o português, considerada a língua oficial do Brasil desde 1758 por decreto do Marquês de Pombal, então secretário do Reino de Portugal, para o uso de expressões em que as pessoas não binárias – que não se identificam com os gêneros masculino e feminino – se sintam representadas.

Artigos feminino e masculino são substituídos por um “x”, “e” ou “@” em alguns casos. Amigo ou amiga virariam “amigue” ou “amigx”, enquanto as palavras “todos” e “todas” seriam trocadas por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. O pronome neutro “elu” seria usado para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero.

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Os especialistas afirmam que a lei também não obriga as escolas a adotarem a linguagem neutra e lembram que ainda há muita resistência ao seu emprego, sobretudo dos pais de alunos. Para o jurista Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional, o entendimento do Supremo em uma ação que tem repercussão geral é pela inconstitucionalidade das legislações que façam esse tipo de vedação. “Diante disso, todas as legislações que tiverem o mesmo teor, vedando a utilização da linguagem neutra, serão inconstitucionais e consequentemente não serão aplicadas no nosso ordenamento jurídico”, disse.

Os efeitos práticos, segundo ele, são imediatos, levando a que todos os municípios ou Estados que já aprovaram essas legislações, no dia seguinte à publicação do acórdão, já devem deixar de aplicar a vedação à linguagem neutra. “No que diz respeito ao mérito, é importante entendermos que o que se discute é a liberdade quanto à autodeterminação de cada um e a possibilidade, quanto da formação educacional das crianças e do adolescente, de eles terem minimamente acesso à pluralidade da nossa sociedade e, a partir disso, que todos os direitos humanos sejam respeitados.”

Miranda reforça que não há necessidade de provocação, ou seja, de se entrar com alguma medida para que as leis já aprovadas em Estados e municípios sejam revogadas. “O entendimento do Supremo é aplicado erga omnes (expressão latina indicando que alcança a todos), ou seja, todas as leis que tiverem o mesmo objeto serão afetadas por essa. É um efeito automático.”

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Já para o professor de Direito Constitucional Fábio Tavares Sobreira, a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que é uma das ações do controle concentrado federal (atribuição exclusiva do STF). “Toda e qualquer decisão assim pautada produz efeito a partir da publicação do acórdão e todos deverão cumprir, não podendo nenhuma lei ir na contramão desse entendimento do STF.”

Segundo ele, a decisão irá retroagir até a data da promulgação da lei de Rondônia e de todas as demais que estejam em vigor. “É diferente de uma decisão isolada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), de qualquer outro tribunal ou até mesmo de um juiz monocrático. Na decisão de controle concentrado federal, os efeitos são contra todas as leis em vigor, que naturalmente são inconstitucionais.”

Conforme o jurista, a decisão não ‘engessa’ o poder legislativo federal. “Se o Congresso Nacional quiser criar uma lei na contramão da decisão do STF, até pode, mas isso não quer dizer que essa lei não possa ser questionada. Se a administração pública direta ou indireta baixar qualquer portaria ou ato administrativo que vá contra essa decisão, independentemente da esfera, municipal, estadual e, nesse caso, federal, isso pode gerar uma reclamação para que a medida seja revogada.”

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Para a ex-desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é importante para a sociedade brasileira. “É mais uma decisão de vanguarda da nossa Corte superior, indo na direção de um movimento irreversível que é a necessidade de se atribuir visibilidade às mulheres e aos outros segmentos da sociedade que não se inserem no contexto social majoritário.”

Em 20 unidades federativas

Um levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) apontou que, entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022, foram apresentados 45 projetos de lei em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal proibindo a linguagem neutra e de gênero em escolas e, em alguns casos, em locais de acesso público, como unidades de saúde e hospitais.

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Os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro lideram com 5 propostas cada. Os outros são Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia.

A linguagem neutra enfrenta oposição de grupos conservadores, entre eles alguns ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com a argumentação de que essas variações não são reconhecidas pela norma culta do idioma. A maioria das leis e propostas vedando o seu uso foram de iniciativa de parlamentares apoiadores de Bolsonaro. Já o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a adotar o prenome ‘todes’ em eventos e cerimônias oficiais.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar uma lei de Rondônia que proíbe a linguagem neutra na grade curricular e no material didático das escolas públicas e privadas do Estado vai afetar de imediato leis ou projetos em outras 19 unidades da federação. Ao menos 45 iniciativas semelhantes foram aprovadas ou tramitam nos legislativos municipais e estaduais pelo País, segundo levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Juristas apontam que, após a publicação do acórdão, a aplicação da lei será imediata e automática, revogando as leis em vigor e impedindo a aprovação de normas contrárias a esse entendimento.

Votaram pela inconstitucionalidade da proibição, acompanhando o relator Edson Fachin, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux. O ministro Nunes Marques acompanhou o relator com ressalva. Às 22 horas, falta o voto do ministro André Mendonça. A votação virtual se encerraria às 23h59.

Após a lei ser sancionada pelo governo de Rondônia, a Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF pedindo sua revogação. O ministro Fachin já havia dado liminar suspendendo a vigência da norma.

Ministro do STF e relator da ação, Edson, Fachin, entende que legislar sobre diretrizes e bases da educação é competência privativa da União. Foto: Abdias Pinheiro/TSE

O uso da linguagem neutra é mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+. O objetivo é adaptar o português, considerada a língua oficial do Brasil desde 1758 por decreto do Marquês de Pombal, então secretário do Reino de Portugal, para o uso de expressões em que as pessoas não binárias – que não se identificam com os gêneros masculino e feminino – se sintam representadas.

Artigos feminino e masculino são substituídos por um “x”, “e” ou “@” em alguns casos. Amigo ou amiga virariam “amigue” ou “amigx”, enquanto as palavras “todos” e “todas” seriam trocadas por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. O pronome neutro “elu” seria usado para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero.

Os especialistas afirmam que a lei também não obriga as escolas a adotarem a linguagem neutra e lembram que ainda há muita resistência ao seu emprego, sobretudo dos pais de alunos. Para o jurista Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional, o entendimento do Supremo em uma ação que tem repercussão geral é pela inconstitucionalidade das legislações que façam esse tipo de vedação. “Diante disso, todas as legislações que tiverem o mesmo teor, vedando a utilização da linguagem neutra, serão inconstitucionais e consequentemente não serão aplicadas no nosso ordenamento jurídico”, disse.

Os efeitos práticos, segundo ele, são imediatos, levando a que todos os municípios ou Estados que já aprovaram essas legislações, no dia seguinte à publicação do acórdão, já devem deixar de aplicar a vedação à linguagem neutra. “No que diz respeito ao mérito, é importante entendermos que o que se discute é a liberdade quanto à autodeterminação de cada um e a possibilidade, quanto da formação educacional das crianças e do adolescente, de eles terem minimamente acesso à pluralidade da nossa sociedade e, a partir disso, que todos os direitos humanos sejam respeitados.”

Miranda reforça que não há necessidade de provocação, ou seja, de se entrar com alguma medida para que as leis já aprovadas em Estados e municípios sejam revogadas. “O entendimento do Supremo é aplicado erga omnes (expressão latina indicando que alcança a todos), ou seja, todas as leis que tiverem o mesmo objeto serão afetadas por essa. É um efeito automático.”

Já para o professor de Direito Constitucional Fábio Tavares Sobreira, a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que é uma das ações do controle concentrado federal (atribuição exclusiva do STF). “Toda e qualquer decisão assim pautada produz efeito a partir da publicação do acórdão e todos deverão cumprir, não podendo nenhuma lei ir na contramão desse entendimento do STF.”

Segundo ele, a decisão irá retroagir até a data da promulgação da lei de Rondônia e de todas as demais que estejam em vigor. “É diferente de uma decisão isolada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), de qualquer outro tribunal ou até mesmo de um juiz monocrático. Na decisão de controle concentrado federal, os efeitos são contra todas as leis em vigor, que naturalmente são inconstitucionais.”

Conforme o jurista, a decisão não ‘engessa’ o poder legislativo federal. “Se o Congresso Nacional quiser criar uma lei na contramão da decisão do STF, até pode, mas isso não quer dizer que essa lei não possa ser questionada. Se a administração pública direta ou indireta baixar qualquer portaria ou ato administrativo que vá contra essa decisão, independentemente da esfera, municipal, estadual e, nesse caso, federal, isso pode gerar uma reclamação para que a medida seja revogada.”

Para a ex-desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é importante para a sociedade brasileira. “É mais uma decisão de vanguarda da nossa Corte superior, indo na direção de um movimento irreversível que é a necessidade de se atribuir visibilidade às mulheres e aos outros segmentos da sociedade que não se inserem no contexto social majoritário.”

Em 20 unidades federativas

Um levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) apontou que, entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022, foram apresentados 45 projetos de lei em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal proibindo a linguagem neutra e de gênero em escolas e, em alguns casos, em locais de acesso público, como unidades de saúde e hospitais.

Os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro lideram com 5 propostas cada. Os outros são Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia.

A linguagem neutra enfrenta oposição de grupos conservadores, entre eles alguns ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com a argumentação de que essas variações não são reconhecidas pela norma culta do idioma. A maioria das leis e propostas vedando o seu uso foram de iniciativa de parlamentares apoiadores de Bolsonaro. Já o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a adotar o prenome ‘todes’ em eventos e cerimônias oficiais.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar uma lei de Rondônia que proíbe a linguagem neutra na grade curricular e no material didático das escolas públicas e privadas do Estado vai afetar de imediato leis ou projetos em outras 19 unidades da federação. Ao menos 45 iniciativas semelhantes foram aprovadas ou tramitam nos legislativos municipais e estaduais pelo País, segundo levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Juristas apontam que, após a publicação do acórdão, a aplicação da lei será imediata e automática, revogando as leis em vigor e impedindo a aprovação de normas contrárias a esse entendimento.

Votaram pela inconstitucionalidade da proibição, acompanhando o relator Edson Fachin, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux. O ministro Nunes Marques acompanhou o relator com ressalva. Às 22 horas, falta o voto do ministro André Mendonça. A votação virtual se encerraria às 23h59.

Após a lei ser sancionada pelo governo de Rondônia, a Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF pedindo sua revogação. O ministro Fachin já havia dado liminar suspendendo a vigência da norma.

Ministro do STF e relator da ação, Edson, Fachin, entende que legislar sobre diretrizes e bases da educação é competência privativa da União. Foto: Abdias Pinheiro/TSE

O uso da linguagem neutra é mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+. O objetivo é adaptar o português, considerada a língua oficial do Brasil desde 1758 por decreto do Marquês de Pombal, então secretário do Reino de Portugal, para o uso de expressões em que as pessoas não binárias – que não se identificam com os gêneros masculino e feminino – se sintam representadas.

Artigos feminino e masculino são substituídos por um “x”, “e” ou “@” em alguns casos. Amigo ou amiga virariam “amigue” ou “amigx”, enquanto as palavras “todos” e “todas” seriam trocadas por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. O pronome neutro “elu” seria usado para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero.

Os especialistas afirmam que a lei também não obriga as escolas a adotarem a linguagem neutra e lembram que ainda há muita resistência ao seu emprego, sobretudo dos pais de alunos. Para o jurista Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional, o entendimento do Supremo em uma ação que tem repercussão geral é pela inconstitucionalidade das legislações que façam esse tipo de vedação. “Diante disso, todas as legislações que tiverem o mesmo teor, vedando a utilização da linguagem neutra, serão inconstitucionais e consequentemente não serão aplicadas no nosso ordenamento jurídico”, disse.

Os efeitos práticos, segundo ele, são imediatos, levando a que todos os municípios ou Estados que já aprovaram essas legislações, no dia seguinte à publicação do acórdão, já devem deixar de aplicar a vedação à linguagem neutra. “No que diz respeito ao mérito, é importante entendermos que o que se discute é a liberdade quanto à autodeterminação de cada um e a possibilidade, quanto da formação educacional das crianças e do adolescente, de eles terem minimamente acesso à pluralidade da nossa sociedade e, a partir disso, que todos os direitos humanos sejam respeitados.”

Miranda reforça que não há necessidade de provocação, ou seja, de se entrar com alguma medida para que as leis já aprovadas em Estados e municípios sejam revogadas. “O entendimento do Supremo é aplicado erga omnes (expressão latina indicando que alcança a todos), ou seja, todas as leis que tiverem o mesmo objeto serão afetadas por essa. É um efeito automático.”

Já para o professor de Direito Constitucional Fábio Tavares Sobreira, a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que é uma das ações do controle concentrado federal (atribuição exclusiva do STF). “Toda e qualquer decisão assim pautada produz efeito a partir da publicação do acórdão e todos deverão cumprir, não podendo nenhuma lei ir na contramão desse entendimento do STF.”

Segundo ele, a decisão irá retroagir até a data da promulgação da lei de Rondônia e de todas as demais que estejam em vigor. “É diferente de uma decisão isolada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), de qualquer outro tribunal ou até mesmo de um juiz monocrático. Na decisão de controle concentrado federal, os efeitos são contra todas as leis em vigor, que naturalmente são inconstitucionais.”

Conforme o jurista, a decisão não ‘engessa’ o poder legislativo federal. “Se o Congresso Nacional quiser criar uma lei na contramão da decisão do STF, até pode, mas isso não quer dizer que essa lei não possa ser questionada. Se a administração pública direta ou indireta baixar qualquer portaria ou ato administrativo que vá contra essa decisão, independentemente da esfera, municipal, estadual e, nesse caso, federal, isso pode gerar uma reclamação para que a medida seja revogada.”

Para a ex-desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é importante para a sociedade brasileira. “É mais uma decisão de vanguarda da nossa Corte superior, indo na direção de um movimento irreversível que é a necessidade de se atribuir visibilidade às mulheres e aos outros segmentos da sociedade que não se inserem no contexto social majoritário.”

Em 20 unidades federativas

Um levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) apontou que, entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022, foram apresentados 45 projetos de lei em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal proibindo a linguagem neutra e de gênero em escolas e, em alguns casos, em locais de acesso público, como unidades de saúde e hospitais.

Os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro lideram com 5 propostas cada. Os outros são Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia.

A linguagem neutra enfrenta oposição de grupos conservadores, entre eles alguns ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com a argumentação de que essas variações não são reconhecidas pela norma culta do idioma. A maioria das leis e propostas vedando o seu uso foram de iniciativa de parlamentares apoiadores de Bolsonaro. Já o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a adotar o prenome ‘todes’ em eventos e cerimônias oficiais.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar uma lei de Rondônia que proíbe a linguagem neutra na grade curricular e no material didático das escolas públicas e privadas do Estado vai afetar de imediato leis ou projetos em outras 19 unidades da federação. Ao menos 45 iniciativas semelhantes foram aprovadas ou tramitam nos legislativos municipais e estaduais pelo País, segundo levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Juristas apontam que, após a publicação do acórdão, a aplicação da lei será imediata e automática, revogando as leis em vigor e impedindo a aprovação de normas contrárias a esse entendimento.

Votaram pela inconstitucionalidade da proibição, acompanhando o relator Edson Fachin, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux. O ministro Nunes Marques acompanhou o relator com ressalva. Às 22 horas, falta o voto do ministro André Mendonça. A votação virtual se encerraria às 23h59.

Após a lei ser sancionada pelo governo de Rondônia, a Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF pedindo sua revogação. O ministro Fachin já havia dado liminar suspendendo a vigência da norma.

Ministro do STF e relator da ação, Edson, Fachin, entende que legislar sobre diretrizes e bases da educação é competência privativa da União. Foto: Abdias Pinheiro/TSE

O uso da linguagem neutra é mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+. O objetivo é adaptar o português, considerada a língua oficial do Brasil desde 1758 por decreto do Marquês de Pombal, então secretário do Reino de Portugal, para o uso de expressões em que as pessoas não binárias – que não se identificam com os gêneros masculino e feminino – se sintam representadas.

Artigos feminino e masculino são substituídos por um “x”, “e” ou “@” em alguns casos. Amigo ou amiga virariam “amigue” ou “amigx”, enquanto as palavras “todos” e “todas” seriam trocadas por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. O pronome neutro “elu” seria usado para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero.

Os especialistas afirmam que a lei também não obriga as escolas a adotarem a linguagem neutra e lembram que ainda há muita resistência ao seu emprego, sobretudo dos pais de alunos. Para o jurista Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional, o entendimento do Supremo em uma ação que tem repercussão geral é pela inconstitucionalidade das legislações que façam esse tipo de vedação. “Diante disso, todas as legislações que tiverem o mesmo teor, vedando a utilização da linguagem neutra, serão inconstitucionais e consequentemente não serão aplicadas no nosso ordenamento jurídico”, disse.

Os efeitos práticos, segundo ele, são imediatos, levando a que todos os municípios ou Estados que já aprovaram essas legislações, no dia seguinte à publicação do acórdão, já devem deixar de aplicar a vedação à linguagem neutra. “No que diz respeito ao mérito, é importante entendermos que o que se discute é a liberdade quanto à autodeterminação de cada um e a possibilidade, quanto da formação educacional das crianças e do adolescente, de eles terem minimamente acesso à pluralidade da nossa sociedade e, a partir disso, que todos os direitos humanos sejam respeitados.”

Miranda reforça que não há necessidade de provocação, ou seja, de se entrar com alguma medida para que as leis já aprovadas em Estados e municípios sejam revogadas. “O entendimento do Supremo é aplicado erga omnes (expressão latina indicando que alcança a todos), ou seja, todas as leis que tiverem o mesmo objeto serão afetadas por essa. É um efeito automático.”

Já para o professor de Direito Constitucional Fábio Tavares Sobreira, a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que é uma das ações do controle concentrado federal (atribuição exclusiva do STF). “Toda e qualquer decisão assim pautada produz efeito a partir da publicação do acórdão e todos deverão cumprir, não podendo nenhuma lei ir na contramão desse entendimento do STF.”

Segundo ele, a decisão irá retroagir até a data da promulgação da lei de Rondônia e de todas as demais que estejam em vigor. “É diferente de uma decisão isolada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), de qualquer outro tribunal ou até mesmo de um juiz monocrático. Na decisão de controle concentrado federal, os efeitos são contra todas as leis em vigor, que naturalmente são inconstitucionais.”

Conforme o jurista, a decisão não ‘engessa’ o poder legislativo federal. “Se o Congresso Nacional quiser criar uma lei na contramão da decisão do STF, até pode, mas isso não quer dizer que essa lei não possa ser questionada. Se a administração pública direta ou indireta baixar qualquer portaria ou ato administrativo que vá contra essa decisão, independentemente da esfera, municipal, estadual e, nesse caso, federal, isso pode gerar uma reclamação para que a medida seja revogada.”

Para a ex-desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é importante para a sociedade brasileira. “É mais uma decisão de vanguarda da nossa Corte superior, indo na direção de um movimento irreversível que é a necessidade de se atribuir visibilidade às mulheres e aos outros segmentos da sociedade que não se inserem no contexto social majoritário.”

Em 20 unidades federativas

Um levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) apontou que, entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022, foram apresentados 45 projetos de lei em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal proibindo a linguagem neutra e de gênero em escolas e, em alguns casos, em locais de acesso público, como unidades de saúde e hospitais.

Os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro lideram com 5 propostas cada. Os outros são Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia.

A linguagem neutra enfrenta oposição de grupos conservadores, entre eles alguns ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com a argumentação de que essas variações não são reconhecidas pela norma culta do idioma. A maioria das leis e propostas vedando o seu uso foram de iniciativa de parlamentares apoiadores de Bolsonaro. Já o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a adotar o prenome ‘todes’ em eventos e cerimônias oficiais.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar uma lei de Rondônia que proíbe a linguagem neutra na grade curricular e no material didático das escolas públicas e privadas do Estado vai afetar de imediato leis ou projetos em outras 19 unidades da federação. Ao menos 45 iniciativas semelhantes foram aprovadas ou tramitam nos legislativos municipais e estaduais pelo País, segundo levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Juristas apontam que, após a publicação do acórdão, a aplicação da lei será imediata e automática, revogando as leis em vigor e impedindo a aprovação de normas contrárias a esse entendimento.

Votaram pela inconstitucionalidade da proibição, acompanhando o relator Edson Fachin, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux. O ministro Nunes Marques acompanhou o relator com ressalva. Às 22 horas, falta o voto do ministro André Mendonça. A votação virtual se encerraria às 23h59.

Após a lei ser sancionada pelo governo de Rondônia, a Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF pedindo sua revogação. O ministro Fachin já havia dado liminar suspendendo a vigência da norma.

Ministro do STF e relator da ação, Edson, Fachin, entende que legislar sobre diretrizes e bases da educação é competência privativa da União. Foto: Abdias Pinheiro/TSE

O uso da linguagem neutra é mais comum nas redes sociais e entre membros da comunidade LGBTQIA+. O objetivo é adaptar o português, considerada a língua oficial do Brasil desde 1758 por decreto do Marquês de Pombal, então secretário do Reino de Portugal, para o uso de expressões em que as pessoas não binárias – que não se identificam com os gêneros masculino e feminino – se sintam representadas.

Artigos feminino e masculino são substituídos por um “x”, “e” ou “@” em alguns casos. Amigo ou amiga virariam “amigue” ou “amigx”, enquanto as palavras “todos” e “todas” seriam trocadas por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. O pronome neutro “elu” seria usado para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero.

Os especialistas afirmam que a lei também não obriga as escolas a adotarem a linguagem neutra e lembram que ainda há muita resistência ao seu emprego, sobretudo dos pais de alunos. Para o jurista Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional, o entendimento do Supremo em uma ação que tem repercussão geral é pela inconstitucionalidade das legislações que façam esse tipo de vedação. “Diante disso, todas as legislações que tiverem o mesmo teor, vedando a utilização da linguagem neutra, serão inconstitucionais e consequentemente não serão aplicadas no nosso ordenamento jurídico”, disse.

Os efeitos práticos, segundo ele, são imediatos, levando a que todos os municípios ou Estados que já aprovaram essas legislações, no dia seguinte à publicação do acórdão, já devem deixar de aplicar a vedação à linguagem neutra. “No que diz respeito ao mérito, é importante entendermos que o que se discute é a liberdade quanto à autodeterminação de cada um e a possibilidade, quanto da formação educacional das crianças e do adolescente, de eles terem minimamente acesso à pluralidade da nossa sociedade e, a partir disso, que todos os direitos humanos sejam respeitados.”

Miranda reforça que não há necessidade de provocação, ou seja, de se entrar com alguma medida para que as leis já aprovadas em Estados e municípios sejam revogadas. “O entendimento do Supremo é aplicado erga omnes (expressão latina indicando que alcança a todos), ou seja, todas as leis que tiverem o mesmo objeto serão afetadas por essa. É um efeito automático.”

Já para o professor de Direito Constitucional Fábio Tavares Sobreira, a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que é uma das ações do controle concentrado federal (atribuição exclusiva do STF). “Toda e qualquer decisão assim pautada produz efeito a partir da publicação do acórdão e todos deverão cumprir, não podendo nenhuma lei ir na contramão desse entendimento do STF.”

Segundo ele, a decisão irá retroagir até a data da promulgação da lei de Rondônia e de todas as demais que estejam em vigor. “É diferente de uma decisão isolada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), de qualquer outro tribunal ou até mesmo de um juiz monocrático. Na decisão de controle concentrado federal, os efeitos são contra todas as leis em vigor, que naturalmente são inconstitucionais.”

Conforme o jurista, a decisão não ‘engessa’ o poder legislativo federal. “Se o Congresso Nacional quiser criar uma lei na contramão da decisão do STF, até pode, mas isso não quer dizer que essa lei não possa ser questionada. Se a administração pública direta ou indireta baixar qualquer portaria ou ato administrativo que vá contra essa decisão, independentemente da esfera, municipal, estadual e, nesse caso, federal, isso pode gerar uma reclamação para que a medida seja revogada.”

Para a ex-desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), a decisão é importante para a sociedade brasileira. “É mais uma decisão de vanguarda da nossa Corte superior, indo na direção de um movimento irreversível que é a necessidade de se atribuir visibilidade às mulheres e aos outros segmentos da sociedade que não se inserem no contexto social majoritário.”

Em 20 unidades federativas

Um levantamento da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) apontou que, entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2022, foram apresentados 45 projetos de lei em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal proibindo a linguagem neutra e de gênero em escolas e, em alguns casos, em locais de acesso público, como unidades de saúde e hospitais.

Os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro lideram com 5 propostas cada. Os outros são Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rondônia.

A linguagem neutra enfrenta oposição de grupos conservadores, entre eles alguns ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com a argumentação de que essas variações não são reconhecidas pela norma culta do idioma. A maioria das leis e propostas vedando o seu uso foram de iniciativa de parlamentares apoiadores de Bolsonaro. Já o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a adotar o prenome ‘todes’ em eventos e cerimônias oficiais.

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