SÃO PAULO - Prevista por lei desde 1984, a Lei de Execução Penal (LEP), que prevê o direito à "saidinha" de presos em determinadas ocasiões, causa, anualmente, rebuliço nas redes sociais na véspera de determinadas datas comemorativas.
É o caso, por exemplo, da saída de Suzane von Richthofen da prisão no Dia das Mães, mesmo condenada a 40 anos de prisão pela morte dos pais, em 2002; e de Alexandre Nardoni, condenado pela morte da filha Isabella Nardoni, em 2008, e que irá deixar a Penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo, pela primeira vez no Dia dos Pais, neste domingo, 11.
A professora de Direito Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie Erika Chioca Furlan ressalta que a "saidinha" da penitenciária não se trata de um benefício e, sim, de um direito do preso.
"É uma forma de fazer com os sentenciados reingressem à sociedade. Nessas saídas, o preso consegue conviver com a família, sem vigilância direta do Estado", explica Erika.
A LEP contempla somente presos em regime semiaberto, que tenham bom comportamento e tenham cumprido determinado período da pena. Alexandre Nardoni, réu primário, condenado a 40 anos de prisão, obteve, há três meses, progressão para o semiaberto concedida pela juíza Sueli Zeraik, da 1ª Vara de Execuções Penais de Taubaté.
Como já cumpriu um sexto da pena, Nardoni também passa a ter direito à "saidinha" - além de poder deixar a prisão para trabalhar ou estudar, tendo de voltar, obrigatoriamente, à prisão durante o período da noite. A mulher dele, Anna Carolina Jatobá, condenada pelo mesmo crime, recebe o benefício de saída desde 2017.
A "saidinha" foi criticada nesta quinta-feira, 8, pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), em post no Twitter e endossada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
"Tem coisas na legislação brasileira que não dá para entender", escreveu Moro, além de acrescentar que, no projeto de Lei Anti Crime, consta a proibição de saídas temporárias da prisão para condenados por crimes hediondos.
O padre Fábio de Melo também se manifestou contrariamente à "saidinha". "Não entendo de leis, mas a 'saidinha' deveria ser permitida somente no Dia de Finados. Para que visitassem os túmulos dos que eles mataram", escreveu.
Segundo a professora do Mackenzie, são concedidos cinco "saidinhas" anualmente - no calendário do Estado de São Paulo, constam, além do período entre Natal e ano-novo, Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais e Dia de Finados.
Entenda como funciona a 'saidinha'
Como funciona a 'saidinha' temporária dos presos?
As saídas temporárias estão fundamentados na Lei de Execuções Penais (Lei n° 7.210/84) e os princípios nela estabelecidos. Ocorrem em datas comemorativas específicas, como Natal, Dia das Mães e Dia dos Pais, para confraternização e visita aos familiares.
"A lei é específica para quem está no regime semiaberto porque é uma forma paulatina de fazer com que esses sentenciados reingressem à sociedade. Nessas saídas, o preso consegue conviver com a família, sem vigilância direta do Estado", explica Erika.
A especialista explica que, durante um ano, são concedidas cinco saídas, que podem durar até sete dias. Nos dias que antecedem tais datas, o juiz da Vara de Execuções Penais edita uma portaria que determina os critérios para concessão do benefício da saída temporária e as condições impostas aos presos, como o retorno no dia e hora determinados.
Durante a "saidinha", o preso deve manter o mesmo comportamento que tem dentro do presídio ou no trabalho externo. Ele não pode, portanto, frequentar bares, boates, se embriagar, andar armado ou praticar qualquer delito.
Quem criou a lei da 'saidinha'? Desde quando ela existe?
A Lei n° 7.210/84, que institui a "saidinha", foi sancionada durante a ditadura militar pelo então presidente da República João Figueiredo (Arena), em 1984.
Quais são os requisitos para saída temporária? Quem tem direito?
Para conseguir o direito à saída temporária - "as pessoas chamam de benefício, é direito, está previsto na lei", ressalta a professora do Mackenzie -, o sentenciado tem de ter um bom comportamento prisional e ter cumprido o mínimo de um sexto da pena se for réu primário e um quarto se for reincidente.
"A maioria dos presos consegue esses requisitos porque, para progredirem do regime fechado para o semiaberto, eles só precisam cumprir uma fração da pena. Então, quando eles estão no semiaberto, já estão com o requisito temporal cumprido, tudo o que precisam é manter o bom comportamento", explica Erika.
Segundo ela, os funcionários do presídio mandam uma lista com o nome dos contemplados para um juiz de execução penal. Em seguida, o magistrado consulta o Ministério Público e, então, concede a saída. O benefício não se aplica aos presos que estejam sob investigação, respondendo a inquérito disciplinar ou que tenham recebido sanção disciplinar.
Condenados por crimes hediondos têm direito à 'saidinha'?
Sim, condenados por crimes hediondos têm direito à "saidinha", desde que estejam em regime semiaberto. De acordo com o Código Penal brasileiro, são considerados hediondos os crimes de latrocínio, extorsão qualificada pela morte, extorsão mediante sequestro e na forma qualificada, estupro, atentado violento ao pudor, epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal e genocídio - tentados ou consumados.
Em quais datas comemorativas os presos têm direito à saída temporária?
Em São Paulo, as saídas são concedidas em:
- Natal/ano-novo
- Páscoa
- Dia das Mães
- Dia dos Pais
- Finados
Apenas presos no regime semiaberto tem direito à 'saidinha'?
Sim, somente os presos em regime semiaberto têm direito à saidinha. Os presos em regime fechado só podem deixar a prisão quando houver falecimento de cônjuge ou ascendente, descendente ou irmão; ou necessidade de tratamento médico. "O próprio diretor do presídio pode liberar os presos em regime fechado nessas condições para sair, caso eles tenham condições de fazer a escolta e tudo mais", diz Erika.
Qual a diferença entre indulto e saída temporária?
Ao contrário da saída temporária, o indulto é editado anualmente pelo presidente da República, no dia 25 de dezembro, e pode ou não conceder a liberdade para detentos que cumpram os requisitos determinados naquele ano.
Segundo a LEP nº 8.072/90, não podem ser beneficiados os condenados que cumprem pena pelos crimes de tortura, terrorismo, tráfico de entorpecentes e os condenados por crime hediondo. O preso também deve ter bom comportamento e não responder a processo por outro crime de violência.
"É importante ressaltar que não é uma saída automática todo dia 25 de dezembro, o preso tem que cumprir requisitos. No ano seguinte, os contemplados entram com o pedido de soltura, que é analisado por um juiz de execução penal e pode receber ou não um parecer positivo do conselho penitenciário", resume Erika.