Uma investigação feita por policiais do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) descobriu que uma centena de motoristas ganha até R$ 100 para assumir pontos de multas de trânsito em suas carteiras de habilitação, livrando os verdadeiros infratores. São os chamados pontuadores profissionais. A máfia da pontuação se utiliza ainda de outro método para limpar os pontos dos maus motoristas: falsificar a assinatura de alguém para que ela assuma os pontos. A fraude só é descoberta quando a pessoa vai renovar a carteira e descobre que ela está suspensa por ter excedido os 20 pontos. Ontem, o Estado mostrou diversas fraudes na obtenção da carteira. Levantamento feito pelos policiais descobriu que a CNH com o maior número de pontos é de um motorista de Santos, litoral paulista. Procurado pelos policiais do Detran, ele não foi localizado. Em sua carteira estão registrados 3.665 pontos de cerca de 800 multas recebidas entre 2006 e 2009 em todo o Estado. Os policiais querem saber se o dono da carteira a emprestou para ser usada pela máfia para a descarga de pontuação ou se ele é vítima dos bandidos. Caso fique comprovada participação na fraude, responderá a processo por falsidade ideológica. O caso do motorista de Santos foi descoberto por causa de um erro grosseiro dos criminosos. Em toda carteira de motorista há duas assinaturas: uma do motorista e outra do delegado que expediu o documento. Já o formulário em que o dono do carro informa o motorista a ser penalizado deve haver a assinatura de quem conduzia o carro no momento da infração e a do proprietário. No caso, os criminosos pegaram a CNH do motorista que ia assumir os pontos, mas, em vez de copiarem sua assinatura, copiaram no formulário a firma do delegado que expediu a CNH. Aí ficou fácil descobrir a fraude. A brecha usada pelos criminosos para fraudar o sistema está na lei. É a possibilidade que o Código de Trânsito Brasileiro dá aos donos de veículos para indicar o motorista que estava conduzindo o automóvel quando a infração foi cometida. A ideia era impedir que, por exemplo, em uma família em que pai, mãe e filhos usam o mesmo carro somente a pessoa em nome de quem o veículo estivesse registrado fosse multado. As investigações da 2ª Delegacia da Divisão de Crimes de Trânsito (DCT), do Detran, mostram que a recordista de pontos por vender para a máfia os seus serviços é uma motorista que tirou a carta em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. Trata-se de Denise Inocêncio Ribeiro, de 30 anos, que foi indiciada sob a acusação de falsidade ideológica. A decisão de investigar a atuação da máfia nasceu de uma constatação feita pelos delegados Ruy Estanislau Silveira Mello, diretor do Detran, e Francisco de Migueli, diretor da DCT. Eles passaram a colecionar os casos de pessoas que se diziam vítimas de fraude e que afirmavam não terem cometido as infrações cujas multas foram passadas às suas carteiras. Foi estudando esses casos que os policiais pegaram o fio da meada. Viram que despachantes e empresas inidôneas estariam oferecendo o serviço de "recorrer dos pontos". Muitas dessas empresas estariam simplesmente passando irregularmente os pontos das CNHs de seus clientes para pontuadores profissionais ou para as pessoas que iam ao Detran se queixar da fraude. Os delegados pediram à Companhia de Processamento de Dados de São Paulo (Prodesp) que fizesse um cruzamento de dados e descobriram 220 casos de pessoas com mais de 50 pontos na carteira obtidos dirigindo pelo menos quatro carros diferentes. Em junho, o recordista foi um homem de São Paulo que assumiu 230 pontos numa dezena de carros. Foi no primeiro levantamento que surgiu o nome de Denise e seus 2.064 pontos. Chamada ao Detran, ela depôs em 2 de junho e admitiu que recebia de R$ 50 a R$ 100 para assumir a pontuação na carteira. Denise disse que trabalhava com um despachante da Lapa, zona oeste, e contou que emprestava a CNH havia seis anos. A acusada contou que gozava de facilidades no Departamento de Operações do Sistema Viário (DSV), onde entregava em branco o formulário para assumir os pontos e cópia da habilitação a um funcionário do órgão que preenchia tudo. No caso de a multa ter como local uma estrada estadual, Denise conta que um motoboy levava ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER) os documentos necessários para que ela assumisse a multa. O Detran quer saber quem seriam as pessoas que supostamente ajudaram Denise, que não apontou nomes. Procurada pelo Estado, ela disse que, "se tiver de falar alguma coisa, vai ser na frente de um juiz". COLABORARAM RENATO MACHADO E NAIANA OSCAR NÚMEROS R$ 100 é o valor pago pela máfia da pontuação a quem aceita assumir os pontos de motoristas infratores 220 casos de motoristas com mais de 50 pontos na carteira já foram detectados pela investigação aberta pelo Detran 3.665 pontos estão registrados na carteira de um motorista de Santos, no litoral paulista. O Detran ainda não sabe se ele é vítima de estelionatários ou se também recebia dinheiro para assumir os pontos