A lama de rejeitos da mineradora Samarco, que chegou ao Espírito Santo após o rompimento da barragem de Mariana, em Minas Gerais, no dia 5 de novembro, deixou uma mancha vermelha que já se espalhou por 57 quilômetros ao norte, 17,5 quilômetros ao sul e 18 quilômetros mar adentro no litoral norte capixaba, com impactos para ao menos 317 mil pessoas no Estado. O acidente deixou 15 mortos e quatro desaparecidos.
Além disso, três toneladas de peixes foram recolhidas ao longo do Rio Doce, no Estado, e cerca de 20 ninhos de tartarugas foram removidos da foz do rio, na cidade de Linhares.
Esse cenário foi visto e descrito pelo fotógrafo, ambientalista e presidente do Instituto Últimos Refúgios, Leonardo Merçon, durante uma expedição às margens do Rio Doce e também ao distrito de Regência, em Linhares, onde fica a foz do rio, no litoral capixaba. Um mês após a tragédia, Merçon, que lança nesta semana o projeto Lágrimas do Rio Doce, exposição de vídeos e fotografias que retratam a atual situação do rio e regiões afetadas, contou que as consequências do desastre são mais graves do que parecem. Segundo ele, a região é berçário de peixes, crustáceos e pássaros – alguns ameaçados de extinção – e, por isso, a preocupação é grande.
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
“As pessoas não têm noção. É mais grave do que possam imaginar. O grosso dos rejeitos ainda deve chegar ao Espírito Santo e agravar ainda mais a situação”, comentou Merçon.
Segundo ele, o problema não se restringe a ambientes aquáticos. Merçon explicou que a lama de rejeitos engoliu o braço do mar onde ocorre a reprodução das tartarugas-marinhas em Regência. Elas tiveram seus ninhos removidos. Os filhotes também precisaram de uma atenção especial e foram realocados para outros pontos do litoral, que não foram atingidos pela lama. Ainda não se sabe o que pode acontecer com esses animais no mar.
Merçon destacou, no entanto, que não apenas as tartarugas foram vítimas da lama de rejeitos. “Jacarés, capivaras, lontras, bois, cachorros, aves migratórias – todos foram afetados. Estive no Rio Doce uma semana antes da chegada dos rejeitos e vi muitos animais. Ir agora e ver todos mortos é desolador.”
Para Merçon, além dos impactos ambientais, a vida das pessoas que dependem do rio também foi afetada. “É absurdo que as pessoas vejam a situação da água e façam uso dela para beber. A situação é muito grave”, alertou.
Tartarugas. A médica veterinária do Projeto Tamar Cecília Baptistotte explicou que o período de desova das tartarugas da região tem o pico no mês de novembro, justamente na época em que a barragem se rompeu. “Estamos no pico de desova e as tartarugas ficam na frente das praias neste período, porque elas colocam ovos várias vezes. É preocupante o impacto negativo que a lama pode trazer à saúde desses animais.”
O médico veterinário Marcelo Renan contou que o sangue das tartarugas vem sendo coletado para a realização de testes que deverão revelar a concentração de elementos tóxicos. “Só assim saberemos como esse material tóxico tem afetado a vida desses animais”, disse.