Daisy Oehlers e Bryce Fredriksz, um casal holandês de 20 e poucos anos, estavam sentados perto da asa esquerda do voo MH17 da Malaysia Airlines a caminho das férias no Bali quando "objetos de alta energia", como as autoridades mais tarde chamaram, atingiram o avião sobre o leste da Ucrânia.
Seus corpos foram despedaçados e espalhados ao longo de quilômetros da zona de conflito.
Três meses depois, o primo de Daisy, Robby, se hospedou em um hotel barato da cidade de Donetsk para começar a procurar sinais de seus parentes na área. "Havia uma cratera de um impacto de foguete bem perto da parte do nariz do avião", disse ele. "Encontrei uma mala azul. Não era dela."
Robby, um cantor, e os familiares de até 50 outras vítimas estão cada vez mais frustrados com o fato de que as autoridades não os ajudaram a rastrear seus entes queridos mortos em 17 de julho, quando o voo de Amsterdã a Kuala Lumpur foi abatido em pleno céu.
Todos os 298 passageiros e tripulantes, sendo dois terços deles holandeses, foram mortos. O governo da Holanda, importante parceiro comercial da Rússia, ainda hesita em classificar o evento como um ataque.
As tentativas de recuperar partes da aeronave e restos mortais foram canceladas várias vezes devido aos combates terrestres. As famílias também afirmam que o governo holandês não está oferecendo informação suficiente. Uma firma de advocacia declarou que está se preparando para processar o governo por negligência por sua conduta no caso.
Os parentes de Bryce e Daisy encontraram um pé de Bryce e parte de um osso de Daisy, e nada mais. Os familiares de nove pessoas a bordo do Boeing 777 não recuperaram quaisquer restos mortais. Algumas famílias estão esperando reunir partes de corpos suficientes para realizar enterros.
"De quanto você precisa?", indagou Robby. "30 por cento? 40 por cento?"
Ele passou três dias vasculhando o local entre Donetsk e Luhansk, cidades do leste ucraniano controlada por rebeldes e cenários de muitos dos combates, e levou uma equipe de televisão para chamar atenção para a revolta crescente de sua família.
Ele disse ter visto sinais de bombardeio no campo, onde cachorros vira-latas perambulavam. Como o inverno está chegando e os combates continuam, a esperança das famílias diminui.
"Você se pergunta 'o que eles estão fazendo?'", indagou ele a respeito das autoridades. "Se fosse outro país, eles simplesmente pegariam suas coisas e viriam para cá. Não sei qual é o espírito da política holandesa, mas acho que são moles demais."
DE QUEM É A CULPA? A Holanda está realizando duas investigações em paralelo: uma sobre a causa da queda e um inquérito criminal --o maior da história do país. No momento há 100 funcionários das forças de segurança holandesas envolvidos no caso, incluindo 10 promotores, informou o porta-voz Wim de Bruin. Mas nenhum investigador forense foi ao local do acidente, o que torna a recuperação de provas quase impossível. Os Estados Unidos afirmam ter dados de inteligência que apoiam a teoria de que o avião foi abatido por um míssil disparado por separatistas pró-Rússia. O governo russo nega qualquer envolvimento. Muitos holandeses também acreditam que a aeronave foi derrubada por rebeldes usando mísseis fornecidos por Moscou, mas seus líderes, cientes da grande dependência de seu país da energia russa, jamais culparam ninguém. O primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, pediu ao presidente russo, Vladimir Putin, que utilize sua influência com os rebeldes. Os desafios enfrentados pelos investigadores holandeses são extremos. A comparação mais próxima é o bombardeio do voo 103 da Pan Am sobre Lockerbie, na Escócia, em 1988, que matou 254 pessoas. A investigação, conduzida na Escócia, levou três anos, durante os quais 4.000 mil peças de evidências foram recuperadas a partir de um local do acidente que abrange 2.000 quilômetros quadrados. O caso demorou uma década para ir a julgamento. "Procuramos em rios, lagos e reservatórios e recuperamos muitos objetos pessoais, pedaços da aeronave e destroços, assim como outros 'restos' muito mais difíceis que prefiro não mencionar aqui", disse um mergulhador da polícia que participou das buscas.