Jornal da Tarde: A morte do poeta Carlos Drummond de Andrade no meio das notícias


Por Edmundo Leite
Atualização:

No meio da primeira página do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 tinha uma notícia.

"Morreu nosso poeta" tinha como título a notícia no meio da primeira página.

Muitos nunca esqueceram desse acontecimento no meio da primeira página daquele dia.

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Mesmo quem tinha retinas tão fatigadas pelas outras notícias da vida sabia que nosso poeta no meio da primeira página era Carlos Drummond de Andrade.

No meio da primeira página do Jornal da Tarde daquele dia linha tinha uma foto.

Na meio da foto tinha nosso poeta, fotografado por um fotógrafo que parecia que tinha poesia no nome: Nem de Tal.

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No meio da primeira página daquele dia, no meio do título e da foto, tinha um monte de letrinhas que informavam sem poesia: "Carlos Drummond de Andrade, o maior dos poetas brasileiros, morreu aos 84 anos, do coração".

Veja a capa do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 e leia o perfil do poeta Carlos Drummond de Andrade escrito pela repórter Laura Greenhalgh:

 Foto: Estadão
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 Foto: Estadão

Jornal da Tarde - 18 de agosto de 1987

ADEUS, CARLOS

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"Eu só quero que a senhora me receite um enfarte fulminante". Assim o poeta Carlos Drummond de Andrade recebeu a médica que o atendeu no sábado, quando passava muito mal depois de ter escondido um segundo enfarte (o primeiro foi em novembro passado) da família.

Desde então, o estado de saúde do poeta foi piorando e ele morreu ontem à noite, aos 84 anos, na Clinica Pró-Cardíaco, no Rio, exatamente doze dias após a morte de sua filha única, Maria Julieta. Pelo atestado de óbito, morreu de insuficiência respiratória.

Para parentes e amigos, morreu de desgosto. Velado desde a madrugada na capela 3 do cemitério de São João Batista, será enterrado ao meio-dia de hoje, com a simplicidade que pediu. Como honra oficial, três dias de luto no Estado do Rio, decretados pelo governador Moreira Franco.

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A vida simples do mortal sem galões

Laura Greenhalgh

Há muitos anos, Carlos Drummond de Andrade virou uma obsessão na imprensa. O poeta, teimoso, se esquivou pacientemente de um sem-número de entrevistas. As razões foram sempre as mesmas: "Não tenho nada a revelar", "sou uma pessoa comum", "poesia é uma arte secreta, não dá para falar sobre ela". Não se esforçava nem mais para criar desculpas originais aos repórteres e fotógrafos que montavam campana junto do seu apartamento em Copacabana.

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Foram décadas de silêncio, enquanto o seu talento se agigantava no tablado da literatura universal. O Drummond dos anos 80 é melhor do que o Drummond dos anos 40? O poeta e sua arte nunca foram desmembráveis. Ele provou que o gênio, em essência, é mononuclear. Entretanto, nos últimos sete anos, foi mais complacente com seus obstinados entrevistadores. Falou a jornais, revistas e até mesmo concordou em usar pancak sobre a pele alva para aparecer num programa-homenagem na televisão. O país guardou uma nova imagem do seu poeta maior: um sujeito simpático, prosa prazenteira, senso critico aguçado, irônico, um resistente octogenário que achava uma chatice envelhecer.

Ficou-se sabendo, numa dessas conversas mais recentes, que Drummond avaliava sua existência como boa, bastante estável. Tímido, contido nos gestos ia levando mansamente a vida e, quando nos últimos tempos, caminhava pelo Rio de Janeiro com um maroto par de tênis nos pés, comentava cheio de convicção: "Estou decaindo, física e moralmente".

Será que ele desconfiou em vida da sua monumentalidade? Sem nunca ter sido excessivo, o homem franzino, de olhar envidraçado pelos óculos irremovíveis, sempre deixou claro aquilo que pensava e sentia em torno das coisas, do povo e da vida. Era um valente sem esbravejar. O verso, moderno, superior, adiantado no tempo, chegou a arrepiar o gosto conservador de uma época. Como cronista, lutando discretamente pelos jornais, disse o que muito oposicionista furioso não conseguiu balbuciar.Em tempos de ditadura, demonstrou com todas as letras o seu enjôo diante de "tantos generais transformados em presidentes", sem poupar um Congresso dócil e pusilânime.

Recusou também as homenagens pomposas: sobre seus ombros magros, jamais pousaram os galões da Academia Brasileira de Letras: "Se eu um dia estiver nela, como poderei criticá-la? É horrível viver devendo favores". A imortalidade acadêmica só mereceu alguns daqueles sorrisos contidos de canto de boca, do poeta. Ela era assim mesmo: "Quando nasci, um anjo torto, um desses que vivem na sombra/disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida".

Robinson Crusoé à sombra.

Durante boa parte de sua vida, Drummond se enfurnou no Rio de Janeiro, uma cidade vivida mais de perto depois que o poeta-funcionário público se aposentou do Ministério da Educação, em 1962. Mas o afastamento completo de sua cidade natal, a mineira Itabira do Mato Dentro, também conhecida como "o país dos Andrade", virou caso. Tramou-se uma espécie de ressentimento entre os conterrâneos e o filho ilustre que não retornou às origens. De fato, Itabira se fechou para o poeta, quando o mesmo abriu-se para o mundo. Mesmo assim, ele nunca conseguiu se livrar de suas "itabiri ces". Tinha lá um jeito meio seco mas extremamente solidário e fiel com o lugar onde perdeu o umbigo. Era um jeito tipicamente poesia" mineiro de amar.

Foi um dos sete filhos de Carlos de Paula Andrade, um dos fazendeiros mais poderosos da região, herdeiro de uma fortuna que já passava de geração para geração. Carlos, nascido em 31 de outubro de 1902, não precisava se preocupar com o futuro, apenas com as terras. Mesmo assim, o garoto era dado a manias, certas estranhezas. Enquanto os irmãos se soltavam na largueza da fazenda, enquanto o pai corria a lavoura a cavalo, enquanto a mãe, dona Julieta, cozia e zelava pelo casarão, o menino Carlos procurava sombras debaixo de mangueiras para ler. Tapeava as horas entretido nas aventuras de de Robinson Crusoé, "uma história comprida, que não acabava mais".

Um dia, a pasmaceira da infância foi quebrada por um desejo repentino. Em plena aula de geografia, no terceiro ano do grupo escolar, Carlos sentiu uma vontade enorme de escrever. Vinha de dentro a compulsão que o fez grudar o nariz ao papel para esboçar, em dez linhas apenas, uma incrível viagem ao Pólo Norte, que continha não só o naufrágio como a descoberta de um vulcão. A professora, dona Emerenciana Barbosa, ficou encantada com o trabalho do aluno: "Você fez uma redação muito chique".

Foi o principio da carreira literária. Em pouco tempo, o menino já comparecia às reuniões do Grêmio Literário e Dramático "Artur de Azevedo", em Belo Horizonte, e no Colégio Arnaldo, conhecia Gustavo Capanema e Afonso Arinos, amizades para a vida toda. Aos 16 anos, a família decidiu pelo internato num colégio jesuíta em Friburgo. Carlos era o primeiro da classe mas tinha já o espírito sublevado.

Os jesuítas ordenaram a sua expulsão sumária, um episódio que marcou profundamente a vida do poeta: "Quando eles assinaram a minha expulsão, tive que ser isolado num um quarto à parte, sem poder travar contato com os colegas. Mandaram-me de volta para casa de madrugada, quando o colégio todo dormia, para que eu não tivesse chance de me despedir das pessoas. Entrei no trem me sentindo a pessoa mais infeliz deste mundo. Os jesuítas são tão hipócritas, que nem contaram para meu pai o verdadeiro motivo da minha expulsão".

Cartas de Mário

Enquanto isso, Carlos lia tudo: Flaubert, Fialho de Almeida, Euclides da Cunha, Machado de Assis, sua predileção maior, até romances de capa e espada. Em Belo Horizonte, "a velha cidade, de árvores tão repetidas", resolveu mergulhar de cabeça na literatura, acompanhado por Pedro Nava, Cyro dos Anjos, Milton Campos, Emílio Moura e tantos outros ativistas da época.

Sentia uma enorme preguiça para ler compêndios de métrica este foi um os pretextos iniciais para adotar o verso moderno. De São Paulo, Mário de Andrade insuflava o espírito renovador, demonstrando em cartas que os moços mineiros, bem-nascidos e bem-formados, precisavam deseducar-se.

Drummond estreou em literatura depois de duas tentativas fracassadas. Primeiro, tentou editar uma coletânea de poemas denominada Teia de Aranha, mas Ronald de Carvalho, incumbido de levar o material à Livraria Leite Ribeiro, no Rio, terminou perdendo os versos no caminho. O outro livro -- 25 Poemas da Triste Alegria -- terminou esquecido e arquivado entre os papéis do amigo Rodrigo Mello Franco de Andrade. Só em 1930, é que se toma contato com Alguma Poesia, um livro disposto a renovar a poética até então exercitada no País.

Vários críticos se arrepiaram com as liberdades do autor. Diziam que o mineiro era louco. Medeiros de Albuquerque até arranjou um outro título para o livro de Drummond: "Nenhuma Poesia em Alguma Tipografia". No entanto, mineiramente, Drummond apresentou uma obra de incrível modernidade embalada num rótulo, ou melhor, num título, absolutamente despretencioso. Não foi por acaso, recordou o poeta recentemente: "Era um título maroto. Usei da ambigüidade desse alguma. Tanto pode ser a modéstia, alguma poesia entre muitas. Ou o orgulho de uma certa poesia".

Terceiro escalão

Foi por essa época que se casou com Dolores Morais, a companheira inseparável, mãe de sua única filha, Maria Julieta. Foi também por esse tempo que estreou no jornalismo, escrevendo artigos para o Diário de Minas, e que assumiu os primeiros cargos públicos: como funcionário da Secretaria do Interior, de Minas, depois como assessor de Gustavo Capanema, na Secretaria de Educação também do seu estado e, mais tarde, como homem de gabinete no Ministério da Educação, ainda acompanhando o amigo de juventude. Com Rodrigo Mello Franco de Andrade, Drummond serviu no Patrimônio Histórico Artístico Nacional, organizando um arquivo irrepreensível do ponto de vista documental.

O poeta, transformado em funcionário público, era dedicado e organizadíssimo. Em 80, Drummond segredou ao jornal O Estado de S. Paulo: "Corre por aí esse mito de que sou arredio, não dou entrevistas, fujo de solenidades e vida social. É verdade que eu não gosto disso. Qual seria o motivo? Talvez porque fui durante muito tempo funcionário público e era obrigado, por compromissos profissionais, a ter constante contato com muita gente. Como era terceiro escalão, sabe como é, as pessoas vinham sempre ou pedir alguma coisa ou criar uma situação para pedir alguma coisa".

Mesmo cumprindo regularmente suas atribuições como funcionário público e seus compromissos com os editores de jornais, Drummond soltou ao longo da vida a sua poesia inspirada, que o distingue entre os modernos e modernistas. Só não quis ser modelo para ninguém. Certa vez, um poeta estreante foi procurá-lo para pedir conselhos e orientação. De saída, só encontrou a timidez do poeta. A conversa murchou. No dia seguinte, Drummond enviou uma bula de conselhos intitulada "A um Jovem".

A bula continha 13 preciosos itens. Aqui estão os primeiros oito: I -- só escreva quando de todo não puder deixar de fazê-lo. E sempre se pode deixar; II -- só escrever, não pense que vai arrombar as portas do mistério do mundo. Não arrombará nada. Os melhores escritores conseguem apenas reforçá-lo, e não exija de si tamanha proeza; IIII -- se ficar indeciso entre dois adjetivos, jogue fora ambos, e use o substantivo; IV -- não acredite em originalidade, é claro. Mas não vá acreditar tampouco em banalidade, que é a originalidade de todo o mundo; V -- leia muito e esqueça o mais que puder; VI - anote as idéias que lhe vierem na rua. O acaso é mau conselheiro; VII -- não fique baboso se lhe disserem que seu novo livro é melhor do que o anterior. Quer dizer que o anterior não era bom; VII -- mas se disserem que seu novo livro é pior do que o anterior, pode ser que falem a verdade.

Brincadeira divina

"Não sou um escritor na acepção literária da palavra, mas alguém que fez da poesia a sua saída." Em compensação, Drummond se orgulhava em definir-se como um dos jornalistas de mais longa atividade no Brasil.

Esta intimidade com a imprensa começou como leitor. Sempre foi um devorador de jornais e enquanto sua filha esteve morando na Argentina, era capaz de enviar relatos minuciosos sobre tudo o que se passava no país, em todos os setores. Passou por vários jornais: Diário de Minas, Correio da Manhã, Jornal do Brasil e, a partir de 80, colaborou no Jornal da Tarde até setembro de 84, quando se despede definitivamente da imprensa: "Como já disse, ando cansado de ter que escrever por obrigação profissional. É bom terminar-se os dias sem ter patrão".

Aposentado, sem patrões, o poeta não parou de produzir. Até o final do ano passado, ele brindou seus leitores com vários inéditos -- Amar se Aprende Amando, Amor, Sinal Estranho, ambos de poesia, O Observador no Escritório, um diário, História de Dois Amores, o único infantil de sua longa carreira, e ainda Tempo, Vida e Poesia, lançado recentemente pela Record.

O coração não andava bem desde novembro, quando sofreu um enfarte, e tinha constantes crises de angina. Mas a morte ainda era uma maldade que insistia em carregar, um a um seus grandes amigos.

A maldade maior, dia 5 de agosto de 1987, exatos 12 dias antes da morte do poeta: a morte de sua filha Maria Julieta. "Esse é o pior dia de minha vida" -- confidenciou ao amigo Antonio Houaiss "porque eu tinha esperanças que ela fechasse os meus olhos".

A dor foi grande demais. Mas por mais que tentasse, não conseguiu chorar. Em paz com sua consciência, sem religião ou ideologia, o poeta estava pronto para morrer.

Carlos Drummond de Andrade [31/10/1902 - 17/8/1987]

Leia também:

>> Carlos Drummond de Andrade fala ao Caderno 2

Estadão | acesse todas edições desde 1875

No meio da primeira página do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 tinha uma notícia.

"Morreu nosso poeta" tinha como título a notícia no meio da primeira página.

Muitos nunca esqueceram desse acontecimento no meio da primeira página daquele dia.

Mesmo quem tinha retinas tão fatigadas pelas outras notícias da vida sabia que nosso poeta no meio da primeira página era Carlos Drummond de Andrade.

No meio da primeira página do Jornal da Tarde daquele dia linha tinha uma foto.

Na meio da foto tinha nosso poeta, fotografado por um fotógrafo que parecia que tinha poesia no nome: Nem de Tal.

No meio da primeira página daquele dia, no meio do título e da foto, tinha um monte de letrinhas que informavam sem poesia: "Carlos Drummond de Andrade, o maior dos poetas brasileiros, morreu aos 84 anos, do coração".

Veja a capa do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 e leia o perfil do poeta Carlos Drummond de Andrade escrito pela repórter Laura Greenhalgh:

 Foto: Estadão
 Foto: Estadão

Jornal da Tarde - 18 de agosto de 1987

ADEUS, CARLOS

"Eu só quero que a senhora me receite um enfarte fulminante". Assim o poeta Carlos Drummond de Andrade recebeu a médica que o atendeu no sábado, quando passava muito mal depois de ter escondido um segundo enfarte (o primeiro foi em novembro passado) da família.

Desde então, o estado de saúde do poeta foi piorando e ele morreu ontem à noite, aos 84 anos, na Clinica Pró-Cardíaco, no Rio, exatamente doze dias após a morte de sua filha única, Maria Julieta. Pelo atestado de óbito, morreu de insuficiência respiratória.

Para parentes e amigos, morreu de desgosto. Velado desde a madrugada na capela 3 do cemitério de São João Batista, será enterrado ao meio-dia de hoje, com a simplicidade que pediu. Como honra oficial, três dias de luto no Estado do Rio, decretados pelo governador Moreira Franco.

A vida simples do mortal sem galões

Laura Greenhalgh

Há muitos anos, Carlos Drummond de Andrade virou uma obsessão na imprensa. O poeta, teimoso, se esquivou pacientemente de um sem-número de entrevistas. As razões foram sempre as mesmas: "Não tenho nada a revelar", "sou uma pessoa comum", "poesia é uma arte secreta, não dá para falar sobre ela". Não se esforçava nem mais para criar desculpas originais aos repórteres e fotógrafos que montavam campana junto do seu apartamento em Copacabana.

Foram décadas de silêncio, enquanto o seu talento se agigantava no tablado da literatura universal. O Drummond dos anos 80 é melhor do que o Drummond dos anos 40? O poeta e sua arte nunca foram desmembráveis. Ele provou que o gênio, em essência, é mononuclear. Entretanto, nos últimos sete anos, foi mais complacente com seus obstinados entrevistadores. Falou a jornais, revistas e até mesmo concordou em usar pancak sobre a pele alva para aparecer num programa-homenagem na televisão. O país guardou uma nova imagem do seu poeta maior: um sujeito simpático, prosa prazenteira, senso critico aguçado, irônico, um resistente octogenário que achava uma chatice envelhecer.

Ficou-se sabendo, numa dessas conversas mais recentes, que Drummond avaliava sua existência como boa, bastante estável. Tímido, contido nos gestos ia levando mansamente a vida e, quando nos últimos tempos, caminhava pelo Rio de Janeiro com um maroto par de tênis nos pés, comentava cheio de convicção: "Estou decaindo, física e moralmente".

Será que ele desconfiou em vida da sua monumentalidade? Sem nunca ter sido excessivo, o homem franzino, de olhar envidraçado pelos óculos irremovíveis, sempre deixou claro aquilo que pensava e sentia em torno das coisas, do povo e da vida. Era um valente sem esbravejar. O verso, moderno, superior, adiantado no tempo, chegou a arrepiar o gosto conservador de uma época. Como cronista, lutando discretamente pelos jornais, disse o que muito oposicionista furioso não conseguiu balbuciar.Em tempos de ditadura, demonstrou com todas as letras o seu enjôo diante de "tantos generais transformados em presidentes", sem poupar um Congresso dócil e pusilânime.

Recusou também as homenagens pomposas: sobre seus ombros magros, jamais pousaram os galões da Academia Brasileira de Letras: "Se eu um dia estiver nela, como poderei criticá-la? É horrível viver devendo favores". A imortalidade acadêmica só mereceu alguns daqueles sorrisos contidos de canto de boca, do poeta. Ela era assim mesmo: "Quando nasci, um anjo torto, um desses que vivem na sombra/disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida".

Robinson Crusoé à sombra.

Durante boa parte de sua vida, Drummond se enfurnou no Rio de Janeiro, uma cidade vivida mais de perto depois que o poeta-funcionário público se aposentou do Ministério da Educação, em 1962. Mas o afastamento completo de sua cidade natal, a mineira Itabira do Mato Dentro, também conhecida como "o país dos Andrade", virou caso. Tramou-se uma espécie de ressentimento entre os conterrâneos e o filho ilustre que não retornou às origens. De fato, Itabira se fechou para o poeta, quando o mesmo abriu-se para o mundo. Mesmo assim, ele nunca conseguiu se livrar de suas "itabiri ces". Tinha lá um jeito meio seco mas extremamente solidário e fiel com o lugar onde perdeu o umbigo. Era um jeito tipicamente poesia" mineiro de amar.

Foi um dos sete filhos de Carlos de Paula Andrade, um dos fazendeiros mais poderosos da região, herdeiro de uma fortuna que já passava de geração para geração. Carlos, nascido em 31 de outubro de 1902, não precisava se preocupar com o futuro, apenas com as terras. Mesmo assim, o garoto era dado a manias, certas estranhezas. Enquanto os irmãos se soltavam na largueza da fazenda, enquanto o pai corria a lavoura a cavalo, enquanto a mãe, dona Julieta, cozia e zelava pelo casarão, o menino Carlos procurava sombras debaixo de mangueiras para ler. Tapeava as horas entretido nas aventuras de de Robinson Crusoé, "uma história comprida, que não acabava mais".

Um dia, a pasmaceira da infância foi quebrada por um desejo repentino. Em plena aula de geografia, no terceiro ano do grupo escolar, Carlos sentiu uma vontade enorme de escrever. Vinha de dentro a compulsão que o fez grudar o nariz ao papel para esboçar, em dez linhas apenas, uma incrível viagem ao Pólo Norte, que continha não só o naufrágio como a descoberta de um vulcão. A professora, dona Emerenciana Barbosa, ficou encantada com o trabalho do aluno: "Você fez uma redação muito chique".

Foi o principio da carreira literária. Em pouco tempo, o menino já comparecia às reuniões do Grêmio Literário e Dramático "Artur de Azevedo", em Belo Horizonte, e no Colégio Arnaldo, conhecia Gustavo Capanema e Afonso Arinos, amizades para a vida toda. Aos 16 anos, a família decidiu pelo internato num colégio jesuíta em Friburgo. Carlos era o primeiro da classe mas tinha já o espírito sublevado.

Os jesuítas ordenaram a sua expulsão sumária, um episódio que marcou profundamente a vida do poeta: "Quando eles assinaram a minha expulsão, tive que ser isolado num um quarto à parte, sem poder travar contato com os colegas. Mandaram-me de volta para casa de madrugada, quando o colégio todo dormia, para que eu não tivesse chance de me despedir das pessoas. Entrei no trem me sentindo a pessoa mais infeliz deste mundo. Os jesuítas são tão hipócritas, que nem contaram para meu pai o verdadeiro motivo da minha expulsão".

Cartas de Mário

Enquanto isso, Carlos lia tudo: Flaubert, Fialho de Almeida, Euclides da Cunha, Machado de Assis, sua predileção maior, até romances de capa e espada. Em Belo Horizonte, "a velha cidade, de árvores tão repetidas", resolveu mergulhar de cabeça na literatura, acompanhado por Pedro Nava, Cyro dos Anjos, Milton Campos, Emílio Moura e tantos outros ativistas da época.

Sentia uma enorme preguiça para ler compêndios de métrica este foi um os pretextos iniciais para adotar o verso moderno. De São Paulo, Mário de Andrade insuflava o espírito renovador, demonstrando em cartas que os moços mineiros, bem-nascidos e bem-formados, precisavam deseducar-se.

Drummond estreou em literatura depois de duas tentativas fracassadas. Primeiro, tentou editar uma coletânea de poemas denominada Teia de Aranha, mas Ronald de Carvalho, incumbido de levar o material à Livraria Leite Ribeiro, no Rio, terminou perdendo os versos no caminho. O outro livro -- 25 Poemas da Triste Alegria -- terminou esquecido e arquivado entre os papéis do amigo Rodrigo Mello Franco de Andrade. Só em 1930, é que se toma contato com Alguma Poesia, um livro disposto a renovar a poética até então exercitada no País.

Vários críticos se arrepiaram com as liberdades do autor. Diziam que o mineiro era louco. Medeiros de Albuquerque até arranjou um outro título para o livro de Drummond: "Nenhuma Poesia em Alguma Tipografia". No entanto, mineiramente, Drummond apresentou uma obra de incrível modernidade embalada num rótulo, ou melhor, num título, absolutamente despretencioso. Não foi por acaso, recordou o poeta recentemente: "Era um título maroto. Usei da ambigüidade desse alguma. Tanto pode ser a modéstia, alguma poesia entre muitas. Ou o orgulho de uma certa poesia".

Terceiro escalão

Foi por essa época que se casou com Dolores Morais, a companheira inseparável, mãe de sua única filha, Maria Julieta. Foi também por esse tempo que estreou no jornalismo, escrevendo artigos para o Diário de Minas, e que assumiu os primeiros cargos públicos: como funcionário da Secretaria do Interior, de Minas, depois como assessor de Gustavo Capanema, na Secretaria de Educação também do seu estado e, mais tarde, como homem de gabinete no Ministério da Educação, ainda acompanhando o amigo de juventude. Com Rodrigo Mello Franco de Andrade, Drummond serviu no Patrimônio Histórico Artístico Nacional, organizando um arquivo irrepreensível do ponto de vista documental.

O poeta, transformado em funcionário público, era dedicado e organizadíssimo. Em 80, Drummond segredou ao jornal O Estado de S. Paulo: "Corre por aí esse mito de que sou arredio, não dou entrevistas, fujo de solenidades e vida social. É verdade que eu não gosto disso. Qual seria o motivo? Talvez porque fui durante muito tempo funcionário público e era obrigado, por compromissos profissionais, a ter constante contato com muita gente. Como era terceiro escalão, sabe como é, as pessoas vinham sempre ou pedir alguma coisa ou criar uma situação para pedir alguma coisa".

Mesmo cumprindo regularmente suas atribuições como funcionário público e seus compromissos com os editores de jornais, Drummond soltou ao longo da vida a sua poesia inspirada, que o distingue entre os modernos e modernistas. Só não quis ser modelo para ninguém. Certa vez, um poeta estreante foi procurá-lo para pedir conselhos e orientação. De saída, só encontrou a timidez do poeta. A conversa murchou. No dia seguinte, Drummond enviou uma bula de conselhos intitulada "A um Jovem".

A bula continha 13 preciosos itens. Aqui estão os primeiros oito: I -- só escreva quando de todo não puder deixar de fazê-lo. E sempre se pode deixar; II -- só escrever, não pense que vai arrombar as portas do mistério do mundo. Não arrombará nada. Os melhores escritores conseguem apenas reforçá-lo, e não exija de si tamanha proeza; IIII -- se ficar indeciso entre dois adjetivos, jogue fora ambos, e use o substantivo; IV -- não acredite em originalidade, é claro. Mas não vá acreditar tampouco em banalidade, que é a originalidade de todo o mundo; V -- leia muito e esqueça o mais que puder; VI - anote as idéias que lhe vierem na rua. O acaso é mau conselheiro; VII -- não fique baboso se lhe disserem que seu novo livro é melhor do que o anterior. Quer dizer que o anterior não era bom; VII -- mas se disserem que seu novo livro é pior do que o anterior, pode ser que falem a verdade.

Brincadeira divina

"Não sou um escritor na acepção literária da palavra, mas alguém que fez da poesia a sua saída." Em compensação, Drummond se orgulhava em definir-se como um dos jornalistas de mais longa atividade no Brasil.

Esta intimidade com a imprensa começou como leitor. Sempre foi um devorador de jornais e enquanto sua filha esteve morando na Argentina, era capaz de enviar relatos minuciosos sobre tudo o que se passava no país, em todos os setores. Passou por vários jornais: Diário de Minas, Correio da Manhã, Jornal do Brasil e, a partir de 80, colaborou no Jornal da Tarde até setembro de 84, quando se despede definitivamente da imprensa: "Como já disse, ando cansado de ter que escrever por obrigação profissional. É bom terminar-se os dias sem ter patrão".

Aposentado, sem patrões, o poeta não parou de produzir. Até o final do ano passado, ele brindou seus leitores com vários inéditos -- Amar se Aprende Amando, Amor, Sinal Estranho, ambos de poesia, O Observador no Escritório, um diário, História de Dois Amores, o único infantil de sua longa carreira, e ainda Tempo, Vida e Poesia, lançado recentemente pela Record.

O coração não andava bem desde novembro, quando sofreu um enfarte, e tinha constantes crises de angina. Mas a morte ainda era uma maldade que insistia em carregar, um a um seus grandes amigos.

A maldade maior, dia 5 de agosto de 1987, exatos 12 dias antes da morte do poeta: a morte de sua filha Maria Julieta. "Esse é o pior dia de minha vida" -- confidenciou ao amigo Antonio Houaiss "porque eu tinha esperanças que ela fechasse os meus olhos".

A dor foi grande demais. Mas por mais que tentasse, não conseguiu chorar. Em paz com sua consciência, sem religião ou ideologia, o poeta estava pronto para morrer.

Carlos Drummond de Andrade [31/10/1902 - 17/8/1987]

Leia também:

>> Carlos Drummond de Andrade fala ao Caderno 2

Estadão | acesse todas edições desde 1875

No meio da primeira página do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 tinha uma notícia.

"Morreu nosso poeta" tinha como título a notícia no meio da primeira página.

Muitos nunca esqueceram desse acontecimento no meio da primeira página daquele dia.

Mesmo quem tinha retinas tão fatigadas pelas outras notícias da vida sabia que nosso poeta no meio da primeira página era Carlos Drummond de Andrade.

No meio da primeira página do Jornal da Tarde daquele dia linha tinha uma foto.

Na meio da foto tinha nosso poeta, fotografado por um fotógrafo que parecia que tinha poesia no nome: Nem de Tal.

No meio da primeira página daquele dia, no meio do título e da foto, tinha um monte de letrinhas que informavam sem poesia: "Carlos Drummond de Andrade, o maior dos poetas brasileiros, morreu aos 84 anos, do coração".

Veja a capa do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 e leia o perfil do poeta Carlos Drummond de Andrade escrito pela repórter Laura Greenhalgh:

 Foto: Estadão
 Foto: Estadão

Jornal da Tarde - 18 de agosto de 1987

ADEUS, CARLOS

"Eu só quero que a senhora me receite um enfarte fulminante". Assim o poeta Carlos Drummond de Andrade recebeu a médica que o atendeu no sábado, quando passava muito mal depois de ter escondido um segundo enfarte (o primeiro foi em novembro passado) da família.

Desde então, o estado de saúde do poeta foi piorando e ele morreu ontem à noite, aos 84 anos, na Clinica Pró-Cardíaco, no Rio, exatamente doze dias após a morte de sua filha única, Maria Julieta. Pelo atestado de óbito, morreu de insuficiência respiratória.

Para parentes e amigos, morreu de desgosto. Velado desde a madrugada na capela 3 do cemitério de São João Batista, será enterrado ao meio-dia de hoje, com a simplicidade que pediu. Como honra oficial, três dias de luto no Estado do Rio, decretados pelo governador Moreira Franco.

A vida simples do mortal sem galões

Laura Greenhalgh

Há muitos anos, Carlos Drummond de Andrade virou uma obsessão na imprensa. O poeta, teimoso, se esquivou pacientemente de um sem-número de entrevistas. As razões foram sempre as mesmas: "Não tenho nada a revelar", "sou uma pessoa comum", "poesia é uma arte secreta, não dá para falar sobre ela". Não se esforçava nem mais para criar desculpas originais aos repórteres e fotógrafos que montavam campana junto do seu apartamento em Copacabana.

Foram décadas de silêncio, enquanto o seu talento se agigantava no tablado da literatura universal. O Drummond dos anos 80 é melhor do que o Drummond dos anos 40? O poeta e sua arte nunca foram desmembráveis. Ele provou que o gênio, em essência, é mononuclear. Entretanto, nos últimos sete anos, foi mais complacente com seus obstinados entrevistadores. Falou a jornais, revistas e até mesmo concordou em usar pancak sobre a pele alva para aparecer num programa-homenagem na televisão. O país guardou uma nova imagem do seu poeta maior: um sujeito simpático, prosa prazenteira, senso critico aguçado, irônico, um resistente octogenário que achava uma chatice envelhecer.

Ficou-se sabendo, numa dessas conversas mais recentes, que Drummond avaliava sua existência como boa, bastante estável. Tímido, contido nos gestos ia levando mansamente a vida e, quando nos últimos tempos, caminhava pelo Rio de Janeiro com um maroto par de tênis nos pés, comentava cheio de convicção: "Estou decaindo, física e moralmente".

Será que ele desconfiou em vida da sua monumentalidade? Sem nunca ter sido excessivo, o homem franzino, de olhar envidraçado pelos óculos irremovíveis, sempre deixou claro aquilo que pensava e sentia em torno das coisas, do povo e da vida. Era um valente sem esbravejar. O verso, moderno, superior, adiantado no tempo, chegou a arrepiar o gosto conservador de uma época. Como cronista, lutando discretamente pelos jornais, disse o que muito oposicionista furioso não conseguiu balbuciar.Em tempos de ditadura, demonstrou com todas as letras o seu enjôo diante de "tantos generais transformados em presidentes", sem poupar um Congresso dócil e pusilânime.

Recusou também as homenagens pomposas: sobre seus ombros magros, jamais pousaram os galões da Academia Brasileira de Letras: "Se eu um dia estiver nela, como poderei criticá-la? É horrível viver devendo favores". A imortalidade acadêmica só mereceu alguns daqueles sorrisos contidos de canto de boca, do poeta. Ela era assim mesmo: "Quando nasci, um anjo torto, um desses que vivem na sombra/disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida".

Robinson Crusoé à sombra.

Durante boa parte de sua vida, Drummond se enfurnou no Rio de Janeiro, uma cidade vivida mais de perto depois que o poeta-funcionário público se aposentou do Ministério da Educação, em 1962. Mas o afastamento completo de sua cidade natal, a mineira Itabira do Mato Dentro, também conhecida como "o país dos Andrade", virou caso. Tramou-se uma espécie de ressentimento entre os conterrâneos e o filho ilustre que não retornou às origens. De fato, Itabira se fechou para o poeta, quando o mesmo abriu-se para o mundo. Mesmo assim, ele nunca conseguiu se livrar de suas "itabiri ces". Tinha lá um jeito meio seco mas extremamente solidário e fiel com o lugar onde perdeu o umbigo. Era um jeito tipicamente poesia" mineiro de amar.

Foi um dos sete filhos de Carlos de Paula Andrade, um dos fazendeiros mais poderosos da região, herdeiro de uma fortuna que já passava de geração para geração. Carlos, nascido em 31 de outubro de 1902, não precisava se preocupar com o futuro, apenas com as terras. Mesmo assim, o garoto era dado a manias, certas estranhezas. Enquanto os irmãos se soltavam na largueza da fazenda, enquanto o pai corria a lavoura a cavalo, enquanto a mãe, dona Julieta, cozia e zelava pelo casarão, o menino Carlos procurava sombras debaixo de mangueiras para ler. Tapeava as horas entretido nas aventuras de de Robinson Crusoé, "uma história comprida, que não acabava mais".

Um dia, a pasmaceira da infância foi quebrada por um desejo repentino. Em plena aula de geografia, no terceiro ano do grupo escolar, Carlos sentiu uma vontade enorme de escrever. Vinha de dentro a compulsão que o fez grudar o nariz ao papel para esboçar, em dez linhas apenas, uma incrível viagem ao Pólo Norte, que continha não só o naufrágio como a descoberta de um vulcão. A professora, dona Emerenciana Barbosa, ficou encantada com o trabalho do aluno: "Você fez uma redação muito chique".

Foi o principio da carreira literária. Em pouco tempo, o menino já comparecia às reuniões do Grêmio Literário e Dramático "Artur de Azevedo", em Belo Horizonte, e no Colégio Arnaldo, conhecia Gustavo Capanema e Afonso Arinos, amizades para a vida toda. Aos 16 anos, a família decidiu pelo internato num colégio jesuíta em Friburgo. Carlos era o primeiro da classe mas tinha já o espírito sublevado.

Os jesuítas ordenaram a sua expulsão sumária, um episódio que marcou profundamente a vida do poeta: "Quando eles assinaram a minha expulsão, tive que ser isolado num um quarto à parte, sem poder travar contato com os colegas. Mandaram-me de volta para casa de madrugada, quando o colégio todo dormia, para que eu não tivesse chance de me despedir das pessoas. Entrei no trem me sentindo a pessoa mais infeliz deste mundo. Os jesuítas são tão hipócritas, que nem contaram para meu pai o verdadeiro motivo da minha expulsão".

Cartas de Mário

Enquanto isso, Carlos lia tudo: Flaubert, Fialho de Almeida, Euclides da Cunha, Machado de Assis, sua predileção maior, até romances de capa e espada. Em Belo Horizonte, "a velha cidade, de árvores tão repetidas", resolveu mergulhar de cabeça na literatura, acompanhado por Pedro Nava, Cyro dos Anjos, Milton Campos, Emílio Moura e tantos outros ativistas da época.

Sentia uma enorme preguiça para ler compêndios de métrica este foi um os pretextos iniciais para adotar o verso moderno. De São Paulo, Mário de Andrade insuflava o espírito renovador, demonstrando em cartas que os moços mineiros, bem-nascidos e bem-formados, precisavam deseducar-se.

Drummond estreou em literatura depois de duas tentativas fracassadas. Primeiro, tentou editar uma coletânea de poemas denominada Teia de Aranha, mas Ronald de Carvalho, incumbido de levar o material à Livraria Leite Ribeiro, no Rio, terminou perdendo os versos no caminho. O outro livro -- 25 Poemas da Triste Alegria -- terminou esquecido e arquivado entre os papéis do amigo Rodrigo Mello Franco de Andrade. Só em 1930, é que se toma contato com Alguma Poesia, um livro disposto a renovar a poética até então exercitada no País.

Vários críticos se arrepiaram com as liberdades do autor. Diziam que o mineiro era louco. Medeiros de Albuquerque até arranjou um outro título para o livro de Drummond: "Nenhuma Poesia em Alguma Tipografia". No entanto, mineiramente, Drummond apresentou uma obra de incrível modernidade embalada num rótulo, ou melhor, num título, absolutamente despretencioso. Não foi por acaso, recordou o poeta recentemente: "Era um título maroto. Usei da ambigüidade desse alguma. Tanto pode ser a modéstia, alguma poesia entre muitas. Ou o orgulho de uma certa poesia".

Terceiro escalão

Foi por essa época que se casou com Dolores Morais, a companheira inseparável, mãe de sua única filha, Maria Julieta. Foi também por esse tempo que estreou no jornalismo, escrevendo artigos para o Diário de Minas, e que assumiu os primeiros cargos públicos: como funcionário da Secretaria do Interior, de Minas, depois como assessor de Gustavo Capanema, na Secretaria de Educação também do seu estado e, mais tarde, como homem de gabinete no Ministério da Educação, ainda acompanhando o amigo de juventude. Com Rodrigo Mello Franco de Andrade, Drummond serviu no Patrimônio Histórico Artístico Nacional, organizando um arquivo irrepreensível do ponto de vista documental.

O poeta, transformado em funcionário público, era dedicado e organizadíssimo. Em 80, Drummond segredou ao jornal O Estado de S. Paulo: "Corre por aí esse mito de que sou arredio, não dou entrevistas, fujo de solenidades e vida social. É verdade que eu não gosto disso. Qual seria o motivo? Talvez porque fui durante muito tempo funcionário público e era obrigado, por compromissos profissionais, a ter constante contato com muita gente. Como era terceiro escalão, sabe como é, as pessoas vinham sempre ou pedir alguma coisa ou criar uma situação para pedir alguma coisa".

Mesmo cumprindo regularmente suas atribuições como funcionário público e seus compromissos com os editores de jornais, Drummond soltou ao longo da vida a sua poesia inspirada, que o distingue entre os modernos e modernistas. Só não quis ser modelo para ninguém. Certa vez, um poeta estreante foi procurá-lo para pedir conselhos e orientação. De saída, só encontrou a timidez do poeta. A conversa murchou. No dia seguinte, Drummond enviou uma bula de conselhos intitulada "A um Jovem".

A bula continha 13 preciosos itens. Aqui estão os primeiros oito: I -- só escreva quando de todo não puder deixar de fazê-lo. E sempre se pode deixar; II -- só escrever, não pense que vai arrombar as portas do mistério do mundo. Não arrombará nada. Os melhores escritores conseguem apenas reforçá-lo, e não exija de si tamanha proeza; IIII -- se ficar indeciso entre dois adjetivos, jogue fora ambos, e use o substantivo; IV -- não acredite em originalidade, é claro. Mas não vá acreditar tampouco em banalidade, que é a originalidade de todo o mundo; V -- leia muito e esqueça o mais que puder; VI - anote as idéias que lhe vierem na rua. O acaso é mau conselheiro; VII -- não fique baboso se lhe disserem que seu novo livro é melhor do que o anterior. Quer dizer que o anterior não era bom; VII -- mas se disserem que seu novo livro é pior do que o anterior, pode ser que falem a verdade.

Brincadeira divina

"Não sou um escritor na acepção literária da palavra, mas alguém que fez da poesia a sua saída." Em compensação, Drummond se orgulhava em definir-se como um dos jornalistas de mais longa atividade no Brasil.

Esta intimidade com a imprensa começou como leitor. Sempre foi um devorador de jornais e enquanto sua filha esteve morando na Argentina, era capaz de enviar relatos minuciosos sobre tudo o que se passava no país, em todos os setores. Passou por vários jornais: Diário de Minas, Correio da Manhã, Jornal do Brasil e, a partir de 80, colaborou no Jornal da Tarde até setembro de 84, quando se despede definitivamente da imprensa: "Como já disse, ando cansado de ter que escrever por obrigação profissional. É bom terminar-se os dias sem ter patrão".

Aposentado, sem patrões, o poeta não parou de produzir. Até o final do ano passado, ele brindou seus leitores com vários inéditos -- Amar se Aprende Amando, Amor, Sinal Estranho, ambos de poesia, O Observador no Escritório, um diário, História de Dois Amores, o único infantil de sua longa carreira, e ainda Tempo, Vida e Poesia, lançado recentemente pela Record.

O coração não andava bem desde novembro, quando sofreu um enfarte, e tinha constantes crises de angina. Mas a morte ainda era uma maldade que insistia em carregar, um a um seus grandes amigos.

A maldade maior, dia 5 de agosto de 1987, exatos 12 dias antes da morte do poeta: a morte de sua filha Maria Julieta. "Esse é o pior dia de minha vida" -- confidenciou ao amigo Antonio Houaiss "porque eu tinha esperanças que ela fechasse os meus olhos".

A dor foi grande demais. Mas por mais que tentasse, não conseguiu chorar. Em paz com sua consciência, sem religião ou ideologia, o poeta estava pronto para morrer.

Carlos Drummond de Andrade [31/10/1902 - 17/8/1987]

Leia também:

>> Carlos Drummond de Andrade fala ao Caderno 2

Estadão | acesse todas edições desde 1875

No meio da primeira página do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 tinha uma notícia.

"Morreu nosso poeta" tinha como título a notícia no meio da primeira página.

Muitos nunca esqueceram desse acontecimento no meio da primeira página daquele dia.

Mesmo quem tinha retinas tão fatigadas pelas outras notícias da vida sabia que nosso poeta no meio da primeira página era Carlos Drummond de Andrade.

No meio da primeira página do Jornal da Tarde daquele dia linha tinha uma foto.

Na meio da foto tinha nosso poeta, fotografado por um fotógrafo que parecia que tinha poesia no nome: Nem de Tal.

No meio da primeira página daquele dia, no meio do título e da foto, tinha um monte de letrinhas que informavam sem poesia: "Carlos Drummond de Andrade, o maior dos poetas brasileiros, morreu aos 84 anos, do coração".

Veja a capa do Jornal da Tarde de 18 de agosto de 1987 e leia o perfil do poeta Carlos Drummond de Andrade escrito pela repórter Laura Greenhalgh:

 Foto: Estadão
 Foto: Estadão

Jornal da Tarde - 18 de agosto de 1987

ADEUS, CARLOS

"Eu só quero que a senhora me receite um enfarte fulminante". Assim o poeta Carlos Drummond de Andrade recebeu a médica que o atendeu no sábado, quando passava muito mal depois de ter escondido um segundo enfarte (o primeiro foi em novembro passado) da família.

Desde então, o estado de saúde do poeta foi piorando e ele morreu ontem à noite, aos 84 anos, na Clinica Pró-Cardíaco, no Rio, exatamente doze dias após a morte de sua filha única, Maria Julieta. Pelo atestado de óbito, morreu de insuficiência respiratória.

Para parentes e amigos, morreu de desgosto. Velado desde a madrugada na capela 3 do cemitério de São João Batista, será enterrado ao meio-dia de hoje, com a simplicidade que pediu. Como honra oficial, três dias de luto no Estado do Rio, decretados pelo governador Moreira Franco.

A vida simples do mortal sem galões

Laura Greenhalgh

Há muitos anos, Carlos Drummond de Andrade virou uma obsessão na imprensa. O poeta, teimoso, se esquivou pacientemente de um sem-número de entrevistas. As razões foram sempre as mesmas: "Não tenho nada a revelar", "sou uma pessoa comum", "poesia é uma arte secreta, não dá para falar sobre ela". Não se esforçava nem mais para criar desculpas originais aos repórteres e fotógrafos que montavam campana junto do seu apartamento em Copacabana.

Foram décadas de silêncio, enquanto o seu talento se agigantava no tablado da literatura universal. O Drummond dos anos 80 é melhor do que o Drummond dos anos 40? O poeta e sua arte nunca foram desmembráveis. Ele provou que o gênio, em essência, é mononuclear. Entretanto, nos últimos sete anos, foi mais complacente com seus obstinados entrevistadores. Falou a jornais, revistas e até mesmo concordou em usar pancak sobre a pele alva para aparecer num programa-homenagem na televisão. O país guardou uma nova imagem do seu poeta maior: um sujeito simpático, prosa prazenteira, senso critico aguçado, irônico, um resistente octogenário que achava uma chatice envelhecer.

Ficou-se sabendo, numa dessas conversas mais recentes, que Drummond avaliava sua existência como boa, bastante estável. Tímido, contido nos gestos ia levando mansamente a vida e, quando nos últimos tempos, caminhava pelo Rio de Janeiro com um maroto par de tênis nos pés, comentava cheio de convicção: "Estou decaindo, física e moralmente".

Será que ele desconfiou em vida da sua monumentalidade? Sem nunca ter sido excessivo, o homem franzino, de olhar envidraçado pelos óculos irremovíveis, sempre deixou claro aquilo que pensava e sentia em torno das coisas, do povo e da vida. Era um valente sem esbravejar. O verso, moderno, superior, adiantado no tempo, chegou a arrepiar o gosto conservador de uma época. Como cronista, lutando discretamente pelos jornais, disse o que muito oposicionista furioso não conseguiu balbuciar.Em tempos de ditadura, demonstrou com todas as letras o seu enjôo diante de "tantos generais transformados em presidentes", sem poupar um Congresso dócil e pusilânime.

Recusou também as homenagens pomposas: sobre seus ombros magros, jamais pousaram os galões da Academia Brasileira de Letras: "Se eu um dia estiver nela, como poderei criticá-la? É horrível viver devendo favores". A imortalidade acadêmica só mereceu alguns daqueles sorrisos contidos de canto de boca, do poeta. Ela era assim mesmo: "Quando nasci, um anjo torto, um desses que vivem na sombra/disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida".

Robinson Crusoé à sombra.

Durante boa parte de sua vida, Drummond se enfurnou no Rio de Janeiro, uma cidade vivida mais de perto depois que o poeta-funcionário público se aposentou do Ministério da Educação, em 1962. Mas o afastamento completo de sua cidade natal, a mineira Itabira do Mato Dentro, também conhecida como "o país dos Andrade", virou caso. Tramou-se uma espécie de ressentimento entre os conterrâneos e o filho ilustre que não retornou às origens. De fato, Itabira se fechou para o poeta, quando o mesmo abriu-se para o mundo. Mesmo assim, ele nunca conseguiu se livrar de suas "itabiri ces". Tinha lá um jeito meio seco mas extremamente solidário e fiel com o lugar onde perdeu o umbigo. Era um jeito tipicamente poesia" mineiro de amar.

Foi um dos sete filhos de Carlos de Paula Andrade, um dos fazendeiros mais poderosos da região, herdeiro de uma fortuna que já passava de geração para geração. Carlos, nascido em 31 de outubro de 1902, não precisava se preocupar com o futuro, apenas com as terras. Mesmo assim, o garoto era dado a manias, certas estranhezas. Enquanto os irmãos se soltavam na largueza da fazenda, enquanto o pai corria a lavoura a cavalo, enquanto a mãe, dona Julieta, cozia e zelava pelo casarão, o menino Carlos procurava sombras debaixo de mangueiras para ler. Tapeava as horas entretido nas aventuras de de Robinson Crusoé, "uma história comprida, que não acabava mais".

Um dia, a pasmaceira da infância foi quebrada por um desejo repentino. Em plena aula de geografia, no terceiro ano do grupo escolar, Carlos sentiu uma vontade enorme de escrever. Vinha de dentro a compulsão que o fez grudar o nariz ao papel para esboçar, em dez linhas apenas, uma incrível viagem ao Pólo Norte, que continha não só o naufrágio como a descoberta de um vulcão. A professora, dona Emerenciana Barbosa, ficou encantada com o trabalho do aluno: "Você fez uma redação muito chique".

Foi o principio da carreira literária. Em pouco tempo, o menino já comparecia às reuniões do Grêmio Literário e Dramático "Artur de Azevedo", em Belo Horizonte, e no Colégio Arnaldo, conhecia Gustavo Capanema e Afonso Arinos, amizades para a vida toda. Aos 16 anos, a família decidiu pelo internato num colégio jesuíta em Friburgo. Carlos era o primeiro da classe mas tinha já o espírito sublevado.

Os jesuítas ordenaram a sua expulsão sumária, um episódio que marcou profundamente a vida do poeta: "Quando eles assinaram a minha expulsão, tive que ser isolado num um quarto à parte, sem poder travar contato com os colegas. Mandaram-me de volta para casa de madrugada, quando o colégio todo dormia, para que eu não tivesse chance de me despedir das pessoas. Entrei no trem me sentindo a pessoa mais infeliz deste mundo. Os jesuítas são tão hipócritas, que nem contaram para meu pai o verdadeiro motivo da minha expulsão".

Cartas de Mário

Enquanto isso, Carlos lia tudo: Flaubert, Fialho de Almeida, Euclides da Cunha, Machado de Assis, sua predileção maior, até romances de capa e espada. Em Belo Horizonte, "a velha cidade, de árvores tão repetidas", resolveu mergulhar de cabeça na literatura, acompanhado por Pedro Nava, Cyro dos Anjos, Milton Campos, Emílio Moura e tantos outros ativistas da época.

Sentia uma enorme preguiça para ler compêndios de métrica este foi um os pretextos iniciais para adotar o verso moderno. De São Paulo, Mário de Andrade insuflava o espírito renovador, demonstrando em cartas que os moços mineiros, bem-nascidos e bem-formados, precisavam deseducar-se.

Drummond estreou em literatura depois de duas tentativas fracassadas. Primeiro, tentou editar uma coletânea de poemas denominada Teia de Aranha, mas Ronald de Carvalho, incumbido de levar o material à Livraria Leite Ribeiro, no Rio, terminou perdendo os versos no caminho. O outro livro -- 25 Poemas da Triste Alegria -- terminou esquecido e arquivado entre os papéis do amigo Rodrigo Mello Franco de Andrade. Só em 1930, é que se toma contato com Alguma Poesia, um livro disposto a renovar a poética até então exercitada no País.

Vários críticos se arrepiaram com as liberdades do autor. Diziam que o mineiro era louco. Medeiros de Albuquerque até arranjou um outro título para o livro de Drummond: "Nenhuma Poesia em Alguma Tipografia". No entanto, mineiramente, Drummond apresentou uma obra de incrível modernidade embalada num rótulo, ou melhor, num título, absolutamente despretencioso. Não foi por acaso, recordou o poeta recentemente: "Era um título maroto. Usei da ambigüidade desse alguma. Tanto pode ser a modéstia, alguma poesia entre muitas. Ou o orgulho de uma certa poesia".

Terceiro escalão

Foi por essa época que se casou com Dolores Morais, a companheira inseparável, mãe de sua única filha, Maria Julieta. Foi também por esse tempo que estreou no jornalismo, escrevendo artigos para o Diário de Minas, e que assumiu os primeiros cargos públicos: como funcionário da Secretaria do Interior, de Minas, depois como assessor de Gustavo Capanema, na Secretaria de Educação também do seu estado e, mais tarde, como homem de gabinete no Ministério da Educação, ainda acompanhando o amigo de juventude. Com Rodrigo Mello Franco de Andrade, Drummond serviu no Patrimônio Histórico Artístico Nacional, organizando um arquivo irrepreensível do ponto de vista documental.

O poeta, transformado em funcionário público, era dedicado e organizadíssimo. Em 80, Drummond segredou ao jornal O Estado de S. Paulo: "Corre por aí esse mito de que sou arredio, não dou entrevistas, fujo de solenidades e vida social. É verdade que eu não gosto disso. Qual seria o motivo? Talvez porque fui durante muito tempo funcionário público e era obrigado, por compromissos profissionais, a ter constante contato com muita gente. Como era terceiro escalão, sabe como é, as pessoas vinham sempre ou pedir alguma coisa ou criar uma situação para pedir alguma coisa".

Mesmo cumprindo regularmente suas atribuições como funcionário público e seus compromissos com os editores de jornais, Drummond soltou ao longo da vida a sua poesia inspirada, que o distingue entre os modernos e modernistas. Só não quis ser modelo para ninguém. Certa vez, um poeta estreante foi procurá-lo para pedir conselhos e orientação. De saída, só encontrou a timidez do poeta. A conversa murchou. No dia seguinte, Drummond enviou uma bula de conselhos intitulada "A um Jovem".

A bula continha 13 preciosos itens. Aqui estão os primeiros oito: I -- só escreva quando de todo não puder deixar de fazê-lo. E sempre se pode deixar; II -- só escrever, não pense que vai arrombar as portas do mistério do mundo. Não arrombará nada. Os melhores escritores conseguem apenas reforçá-lo, e não exija de si tamanha proeza; IIII -- se ficar indeciso entre dois adjetivos, jogue fora ambos, e use o substantivo; IV -- não acredite em originalidade, é claro. Mas não vá acreditar tampouco em banalidade, que é a originalidade de todo o mundo; V -- leia muito e esqueça o mais que puder; VI - anote as idéias que lhe vierem na rua. O acaso é mau conselheiro; VII -- não fique baboso se lhe disserem que seu novo livro é melhor do que o anterior. Quer dizer que o anterior não era bom; VII -- mas se disserem que seu novo livro é pior do que o anterior, pode ser que falem a verdade.

Brincadeira divina

"Não sou um escritor na acepção literária da palavra, mas alguém que fez da poesia a sua saída." Em compensação, Drummond se orgulhava em definir-se como um dos jornalistas de mais longa atividade no Brasil.

Esta intimidade com a imprensa começou como leitor. Sempre foi um devorador de jornais e enquanto sua filha esteve morando na Argentina, era capaz de enviar relatos minuciosos sobre tudo o que se passava no país, em todos os setores. Passou por vários jornais: Diário de Minas, Correio da Manhã, Jornal do Brasil e, a partir de 80, colaborou no Jornal da Tarde até setembro de 84, quando se despede definitivamente da imprensa: "Como já disse, ando cansado de ter que escrever por obrigação profissional. É bom terminar-se os dias sem ter patrão".

Aposentado, sem patrões, o poeta não parou de produzir. Até o final do ano passado, ele brindou seus leitores com vários inéditos -- Amar se Aprende Amando, Amor, Sinal Estranho, ambos de poesia, O Observador no Escritório, um diário, História de Dois Amores, o único infantil de sua longa carreira, e ainda Tempo, Vida e Poesia, lançado recentemente pela Record.

O coração não andava bem desde novembro, quando sofreu um enfarte, e tinha constantes crises de angina. Mas a morte ainda era uma maldade que insistia em carregar, um a um seus grandes amigos.

A maldade maior, dia 5 de agosto de 1987, exatos 12 dias antes da morte do poeta: a morte de sua filha Maria Julieta. "Esse é o pior dia de minha vida" -- confidenciou ao amigo Antonio Houaiss "porque eu tinha esperanças que ela fechasse os meus olhos".

A dor foi grande demais. Mas por mais que tentasse, não conseguiu chorar. Em paz com sua consciência, sem religião ou ideologia, o poeta estava pronto para morrer.

Carlos Drummond de Andrade [31/10/1902 - 17/8/1987]

Leia também:

>> Carlos Drummond de Andrade fala ao Caderno 2

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