Palmeiras derrubado no gramado: o dia em que um raio atingiu o time num treino em 1983


Jogadores e técnico foram atingidos por forte carga elétrica. O jogador Carlos Alberto Borges precisou ser reanimado pelo médico

Por Edmundo Leite
Atualização:

Aconteceu no tempo em que os treinos do Palmeiras eram realizados no próprio campo de jogo, no Parque Antártica, atual Allianz Parque. O treino matinal de quinta-feira em 15 de setembro de 1983 ia começar quando um raio atingiu o campo e quase todos que estavam no gramado foram ao chão.

Capa do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1993 com notícia de raio que caiu durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e o técnico. Foto: Acervo Estadão

O técnico Rubens Minelli foi atirado de costas por quatro metros e vários jogadores ficaram desnorteados, caídos ou cambaleando de pé. O caso mais grave foi de Carlos Alberto Borges, que ficou de olhos virados, língua presa, não conseguia falar e respirava com dificuldade, conforme relatou o repórter Dinoel Marcos de Abreu.

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A notícia do raio no Parque Antártica ocupou quase toda a capa do Jornal da Tarde do dia seguinte, com a manchete “Terror no treino: um raio cai sobre o Palmeiras”, uma grande foto dos jogadores caídos e uma ilustração de Gepp com detalhes do acontecido:

“Veja a foto: um raio acaba de cair no treino do Palmeiras. Ninguém viu a faísca: houve um estrondo e o impacto da descarga elétrica atirou a distância jogadores e o técnico. Carlos Alberto Borges, o mais atingido, quase morreu, foi salvo pelo médico. Nosso fotógrafo estava lá no momento e documentou toda a cena em fotos exclusivas que estão na última página. No desenho, o momento do impacto.”

Leia abaixo a íntegra da reportagem de Dinoel Marcos de Abreu e o relato do fotógrafo Benedito Salgado.

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Jornal da Tarde - 16 de setembro de 1983

Página do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1983 sobre raio que caiu no campo durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e técnico. Foto: Acervo Estadão

O raio, na câmera de Benedito.

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“Após o apito para o início do treino no Parque Antártica, um violento estrondo. Eu me preparava com minha câmera para algum bom lance. O dia escurecera de repente, e sabia que o treino, com a chuva que se anunciava, não duraria muito. Entretanto, depois do susto, e um pouco tonto, vi que minha pauta havia mudado: o treino parecia ter-se transformado numa tragédia.

Por sorte, eu estava na lateral do campo, num local cimentado, e só senti uma pressão muito forte. Mas pude observar que as pessoas, no gramado, além da pressão, receberam uma violenta descarga elétrica. Se não, que aquecimento seria aquele, com a maioria dos jogadores deitado no chão, se contorcendo?

Os que estavam em pé, tremiam, e os que estavam em melhores condições corriam desesperados, sem direção. E depois do grande susto, os comentários entre os jogadores chegaram a ser cômicos. Houve até quem imaginasse haver morrido...” (Benedito Salgado)

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Manhã de terror no velho Parque

O treino do Palmeiras ia começar. Ia. A descarga elétrica de um raio derrubou quase todos no campo

Dinoel Marcos de Abreu

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Foi tudo muito rápido; um estrondo, a região do campo escureceu bruscamente e os jogadores, o técnico Minelli e seus auxiliares sentiram vários tipos de efeitos da descarga elétrica, provocada por um raio. Uns foram derrubados violentamente; Minelli foi atirado de costas a cerca de quatro metros de distância e houve quem sentisse a sensação de que havia morrido, caso de Carlos Henrique.

Mas o drama maior foi sofrido por Carlos Alberto Borges, que realmente quase morreu. Eram 11h20 de ontem, quando o pânico começou: durou de 20 a 30 segundos. Os jogadores já haviam feito o aquecimento e estavam prontos para o rachão. Mas o treino nem começou. Foi o tempo de Zé Carlos Paulista jogar a bola para Fedato, que iria apitar o treino. Logo em seguida houve o estrondo, o tempo escureceu e quase todos os jogadores que estavam no campo foram atingidos pela descarga elétrica.

Carlos Alberto Borges estava quase no meio de campo, próximo a Vágner e Carlos Alberto Seixas, onde o efeito do impacto foi maior. Borges foi jogado violentamente ao chão, e enquanto a maioria dos jogadores corria desesperada para o vestiário, Fedato, Medina, Luís Pereira e Aragonez correram em sua direção.

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O primeiro a chegar perto de Borges foi Aragonez que, ao ver o companheiro contorcendo-se, ficou desesperado, imaginando que ele iria morrer. Aragonez, então, saiu correndo para chamar o médico Naércio Correia dos Santos, que estava no saguão de acesso ao vestiário:

— Foi uma cena horrível — contou mais tarde Aragonez, ainda visivelmente assustado.

— Tive a impressão que ele estava mesmo morrendo. Seus olhos estavam virados, a língua estava presa, ele não conseguia falar e estava respirando com dificuldade. Naércio chegou correndo e a sua primeira providência foi destravar a língua de Borges com os dedos, e manter a sua boca bem aberta, para que ele pudesse respirar.

Pouco antes, Fedato e Medina já haviam tentado reanimar o jogador com massagens no peito. Essa técnica depois foi reforçada pelo médico. Imediatamente, Borges foi carregado para a enfermaria do clube, onde recebeu oxigênio, e posteriormente soro. Aos poucos ele fel reagindo, e em cerca de 15 minutos já estava fora de perigo. Mesmo assim, passou a tarde inteira na enfermaria do clube em observação, mas o médico garantia que não havia mais o menor risco de vida.

Suspeitou-se de que, na hora em que foi atingido pela descarga elétrica, Borges havia sofrido uma parada cardíaca, mas Naércio afastou totalmente essa hipótese, embora revelasse que a sua situação realmente era bastante delicada:

Sua pressão havia baixado para zero, ele estava muito pálido — disse Naércio.

— Com o choque, a sua pulsação diminuiu sensivelmente e com isso automaticamente diminuiu o fluxo sanguíneo para o organismo. Mas nós felizmente conseguimos desobstruir as suas vias respiratórias em tempo.

Naércio comentou também que hoje Borges ainda deve sentir bastante as consequências da descarga elétrica. Vai sentir, por exemplo, seus músculos contraídos, mas, com os medicamentos que já vem tomando, não deve sofrer muitas dores. Naércio, porém, afirmou que ele não tem a menor condição para o jogo com o Taquaritinga, domingo, em Taquaritinga.

O caso de Borges deixou todos no Parque Antártica muito preocupados. A maioria dos jogadores só mais tarde foi saber de todos os detalhes acontecidos com o companheiro. Vágner, que estava bem perto de Borges, recebeu também um impacto muito forte e teve uma sensação bastante estranha:

— Acho que como tenho uma ponte com metal na boca, eu atraí a força do raio — disse ele. Senti o ralo bater no meu rosto e sofri uma dor horrível. Parecia que a minha cabeça ia estourar e que eu estava encolhendo. Era isso mesmo. Mi-nhas pernas estavam encolhendo e o meu corpo estava se torcendo. Com muito esforço, corri para o vestiário e me joguei no chão, com medo que viesse outro raio. Sabe, eu não senti levar os três tombos no campo. Meus companheiros é que me disseram que eu fui jogado uns dois metros.

Carlos Alberto Seixas foi outro que sofreu muito. Ele disse que havia ficado surdo do ouvido do lado esquerdo, o mesmo que havia operado nos tempos em que jogava no Santo André. Seixas não viu como começou. Sentiu uma forte dor de cabeça e uma ânsia de vômito. Mas ficou consciente e percebeu que com o impacto fora derrubado violentamente ao chão.

Já Carlos Henrique imaginou que tivesse morrido. Ele também tem uma ponte com metal na boca e sentiu um impacto forte no rosto, que o atirou ao chão:

— Depois eu fiquei desligado por uns segundos — comentou Carlos Henrique.

— Não sei para onde fui. Eu só sei que gritava, mas não escutava a minha voz. Não sabia se eu estava surdo ou mudo. Depois, quando me recuperei, vi quase todos meus companheiros caindo de um lado para outro. Foi uma coisa terrível, e eu acho que eu morri mesmo por uns dez segundos.

Gilmar levou uma pancada forte na cabeça e pensou que tivesse sido atingido por um tijolo. Ele caiu e imediatamente passou as mãos na cabeça para ver se estava saindo sangue. Sentiu também ânsia de vômito e quando se recuperou correu para o vestiário.

Nenê foi um dos que foi atirado violentamente no chão. Ele pensou que Eneas, que estava ao seu lado, havia lhe dado um pontapé por trás. Mas depois viu Eneas também virar uma cambalhota e não entendeu mais nada. Zé Carlos Paulista pensou também que tivesse sido derrubado por um companheiro:

— Eu tinha dado a bola para que o Fedato começasse o treino, e de repente fui jogado para cima — disse Zé Carlos Paulista.

— Aí, disse para o pessoal: poxa, o treino nem começou e já me acertaram. Mas depois, vi todo mundo correndo torto e dando cambalhotas. Foi esquisito mesmo.

Minelli foi atirado cerca de quatro metros para trás, e não sabe onde foi parar o apito que estava em sua boca. Ele disse que, como o apito é de metal, foi atingido por um forte impacto. Não se machucou, mas ficou muito assustado

— Já pensou se isso tivesse acontecido na hora de um jogo? Haveria pánico entre os torcedores e muitos deles poderiam morrer pisoteados.

Cléo, que hoje se apresenta definitivamente ao Flamengo, teve mais sorte. Ele estava no vestiário com o júnior Osias, quando ouviu o estrondo. Pensou que tivesse acontecido um acidente:

— Parecia um choque entre dois aviões Jumbos — contou Cléo. — O barulho foi violento e me deu a impressão que as paredes estavam-se rachando.

Os únicos Jogadores que estavam no campo e que resistiram ao impacto foram Rocha e Luis Pereira. Eles ficaram com dor de cabeça, mas não foram atirados ao chão. Luis Pereira, mais tarde, chegou a brincar com os companheiros:

— Quem disse que eu sou velho? Vocês viram que nem o raio derruba o Luisão. Medina e Fedato, porém, foram jogados ao chão e não sabiam explicar como tudo aconteceu.

Medina foi embora para casa, mancando da perna direita:

— Olha, pareceu que alguém me deu uma paulada por baixo — disse Medina.

Já Fedato apenas caiu, mas não viu nada, por uns 30 segundos. Sua vista ficou embaçada e sentiu que o campo estava torto:

— Foram os 30 segundos mais horríveis da minha vida.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Aconteceu no tempo em que os treinos do Palmeiras eram realizados no próprio campo de jogo, no Parque Antártica, atual Allianz Parque. O treino matinal de quinta-feira em 15 de setembro de 1983 ia começar quando um raio atingiu o campo e quase todos que estavam no gramado foram ao chão.

Capa do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1993 com notícia de raio que caiu durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e o técnico. Foto: Acervo Estadão

O técnico Rubens Minelli foi atirado de costas por quatro metros e vários jogadores ficaram desnorteados, caídos ou cambaleando de pé. O caso mais grave foi de Carlos Alberto Borges, que ficou de olhos virados, língua presa, não conseguia falar e respirava com dificuldade, conforme relatou o repórter Dinoel Marcos de Abreu.

A notícia do raio no Parque Antártica ocupou quase toda a capa do Jornal da Tarde do dia seguinte, com a manchete “Terror no treino: um raio cai sobre o Palmeiras”, uma grande foto dos jogadores caídos e uma ilustração de Gepp com detalhes do acontecido:

“Veja a foto: um raio acaba de cair no treino do Palmeiras. Ninguém viu a faísca: houve um estrondo e o impacto da descarga elétrica atirou a distância jogadores e o técnico. Carlos Alberto Borges, o mais atingido, quase morreu, foi salvo pelo médico. Nosso fotógrafo estava lá no momento e documentou toda a cena em fotos exclusivas que estão na última página. No desenho, o momento do impacto.”

Leia abaixo a íntegra da reportagem de Dinoel Marcos de Abreu e o relato do fotógrafo Benedito Salgado.

Jornal da Tarde - 16 de setembro de 1983

Página do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1983 sobre raio que caiu no campo durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e técnico. Foto: Acervo Estadão

O raio, na câmera de Benedito.

“Após o apito para o início do treino no Parque Antártica, um violento estrondo. Eu me preparava com minha câmera para algum bom lance. O dia escurecera de repente, e sabia que o treino, com a chuva que se anunciava, não duraria muito. Entretanto, depois do susto, e um pouco tonto, vi que minha pauta havia mudado: o treino parecia ter-se transformado numa tragédia.

Por sorte, eu estava na lateral do campo, num local cimentado, e só senti uma pressão muito forte. Mas pude observar que as pessoas, no gramado, além da pressão, receberam uma violenta descarga elétrica. Se não, que aquecimento seria aquele, com a maioria dos jogadores deitado no chão, se contorcendo?

Os que estavam em pé, tremiam, e os que estavam em melhores condições corriam desesperados, sem direção. E depois do grande susto, os comentários entre os jogadores chegaram a ser cômicos. Houve até quem imaginasse haver morrido...” (Benedito Salgado)

Manhã de terror no velho Parque

O treino do Palmeiras ia começar. Ia. A descarga elétrica de um raio derrubou quase todos no campo

Dinoel Marcos de Abreu

Foi tudo muito rápido; um estrondo, a região do campo escureceu bruscamente e os jogadores, o técnico Minelli e seus auxiliares sentiram vários tipos de efeitos da descarga elétrica, provocada por um raio. Uns foram derrubados violentamente; Minelli foi atirado de costas a cerca de quatro metros de distância e houve quem sentisse a sensação de que havia morrido, caso de Carlos Henrique.

Mas o drama maior foi sofrido por Carlos Alberto Borges, que realmente quase morreu. Eram 11h20 de ontem, quando o pânico começou: durou de 20 a 30 segundos. Os jogadores já haviam feito o aquecimento e estavam prontos para o rachão. Mas o treino nem começou. Foi o tempo de Zé Carlos Paulista jogar a bola para Fedato, que iria apitar o treino. Logo em seguida houve o estrondo, o tempo escureceu e quase todos os jogadores que estavam no campo foram atingidos pela descarga elétrica.

Carlos Alberto Borges estava quase no meio de campo, próximo a Vágner e Carlos Alberto Seixas, onde o efeito do impacto foi maior. Borges foi jogado violentamente ao chão, e enquanto a maioria dos jogadores corria desesperada para o vestiário, Fedato, Medina, Luís Pereira e Aragonez correram em sua direção.

O primeiro a chegar perto de Borges foi Aragonez que, ao ver o companheiro contorcendo-se, ficou desesperado, imaginando que ele iria morrer. Aragonez, então, saiu correndo para chamar o médico Naércio Correia dos Santos, que estava no saguão de acesso ao vestiário:

— Foi uma cena horrível — contou mais tarde Aragonez, ainda visivelmente assustado.

— Tive a impressão que ele estava mesmo morrendo. Seus olhos estavam virados, a língua estava presa, ele não conseguia falar e estava respirando com dificuldade. Naércio chegou correndo e a sua primeira providência foi destravar a língua de Borges com os dedos, e manter a sua boca bem aberta, para que ele pudesse respirar.

Pouco antes, Fedato e Medina já haviam tentado reanimar o jogador com massagens no peito. Essa técnica depois foi reforçada pelo médico. Imediatamente, Borges foi carregado para a enfermaria do clube, onde recebeu oxigênio, e posteriormente soro. Aos poucos ele fel reagindo, e em cerca de 15 minutos já estava fora de perigo. Mesmo assim, passou a tarde inteira na enfermaria do clube em observação, mas o médico garantia que não havia mais o menor risco de vida.

Suspeitou-se de que, na hora em que foi atingido pela descarga elétrica, Borges havia sofrido uma parada cardíaca, mas Naércio afastou totalmente essa hipótese, embora revelasse que a sua situação realmente era bastante delicada:

Sua pressão havia baixado para zero, ele estava muito pálido — disse Naércio.

— Com o choque, a sua pulsação diminuiu sensivelmente e com isso automaticamente diminuiu o fluxo sanguíneo para o organismo. Mas nós felizmente conseguimos desobstruir as suas vias respiratórias em tempo.

Naércio comentou também que hoje Borges ainda deve sentir bastante as consequências da descarga elétrica. Vai sentir, por exemplo, seus músculos contraídos, mas, com os medicamentos que já vem tomando, não deve sofrer muitas dores. Naércio, porém, afirmou que ele não tem a menor condição para o jogo com o Taquaritinga, domingo, em Taquaritinga.

O caso de Borges deixou todos no Parque Antártica muito preocupados. A maioria dos jogadores só mais tarde foi saber de todos os detalhes acontecidos com o companheiro. Vágner, que estava bem perto de Borges, recebeu também um impacto muito forte e teve uma sensação bastante estranha:

— Acho que como tenho uma ponte com metal na boca, eu atraí a força do raio — disse ele. Senti o ralo bater no meu rosto e sofri uma dor horrível. Parecia que a minha cabeça ia estourar e que eu estava encolhendo. Era isso mesmo. Mi-nhas pernas estavam encolhendo e o meu corpo estava se torcendo. Com muito esforço, corri para o vestiário e me joguei no chão, com medo que viesse outro raio. Sabe, eu não senti levar os três tombos no campo. Meus companheiros é que me disseram que eu fui jogado uns dois metros.

Carlos Alberto Seixas foi outro que sofreu muito. Ele disse que havia ficado surdo do ouvido do lado esquerdo, o mesmo que havia operado nos tempos em que jogava no Santo André. Seixas não viu como começou. Sentiu uma forte dor de cabeça e uma ânsia de vômito. Mas ficou consciente e percebeu que com o impacto fora derrubado violentamente ao chão.

Já Carlos Henrique imaginou que tivesse morrido. Ele também tem uma ponte com metal na boca e sentiu um impacto forte no rosto, que o atirou ao chão:

— Depois eu fiquei desligado por uns segundos — comentou Carlos Henrique.

— Não sei para onde fui. Eu só sei que gritava, mas não escutava a minha voz. Não sabia se eu estava surdo ou mudo. Depois, quando me recuperei, vi quase todos meus companheiros caindo de um lado para outro. Foi uma coisa terrível, e eu acho que eu morri mesmo por uns dez segundos.

Gilmar levou uma pancada forte na cabeça e pensou que tivesse sido atingido por um tijolo. Ele caiu e imediatamente passou as mãos na cabeça para ver se estava saindo sangue. Sentiu também ânsia de vômito e quando se recuperou correu para o vestiário.

Nenê foi um dos que foi atirado violentamente no chão. Ele pensou que Eneas, que estava ao seu lado, havia lhe dado um pontapé por trás. Mas depois viu Eneas também virar uma cambalhota e não entendeu mais nada. Zé Carlos Paulista pensou também que tivesse sido derrubado por um companheiro:

— Eu tinha dado a bola para que o Fedato começasse o treino, e de repente fui jogado para cima — disse Zé Carlos Paulista.

— Aí, disse para o pessoal: poxa, o treino nem começou e já me acertaram. Mas depois, vi todo mundo correndo torto e dando cambalhotas. Foi esquisito mesmo.

Minelli foi atirado cerca de quatro metros para trás, e não sabe onde foi parar o apito que estava em sua boca. Ele disse que, como o apito é de metal, foi atingido por um forte impacto. Não se machucou, mas ficou muito assustado

— Já pensou se isso tivesse acontecido na hora de um jogo? Haveria pánico entre os torcedores e muitos deles poderiam morrer pisoteados.

Cléo, que hoje se apresenta definitivamente ao Flamengo, teve mais sorte. Ele estava no vestiário com o júnior Osias, quando ouviu o estrondo. Pensou que tivesse acontecido um acidente:

— Parecia um choque entre dois aviões Jumbos — contou Cléo. — O barulho foi violento e me deu a impressão que as paredes estavam-se rachando.

Os únicos Jogadores que estavam no campo e que resistiram ao impacto foram Rocha e Luis Pereira. Eles ficaram com dor de cabeça, mas não foram atirados ao chão. Luis Pereira, mais tarde, chegou a brincar com os companheiros:

— Quem disse que eu sou velho? Vocês viram que nem o raio derruba o Luisão. Medina e Fedato, porém, foram jogados ao chão e não sabiam explicar como tudo aconteceu.

Medina foi embora para casa, mancando da perna direita:

— Olha, pareceu que alguém me deu uma paulada por baixo — disse Medina.

Já Fedato apenas caiu, mas não viu nada, por uns 30 segundos. Sua vista ficou embaçada e sentiu que o campo estava torto:

— Foram os 30 segundos mais horríveis da minha vida.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Aconteceu no tempo em que os treinos do Palmeiras eram realizados no próprio campo de jogo, no Parque Antártica, atual Allianz Parque. O treino matinal de quinta-feira em 15 de setembro de 1983 ia começar quando um raio atingiu o campo e quase todos que estavam no gramado foram ao chão.

Capa do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1993 com notícia de raio que caiu durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e o técnico. Foto: Acervo Estadão

O técnico Rubens Minelli foi atirado de costas por quatro metros e vários jogadores ficaram desnorteados, caídos ou cambaleando de pé. O caso mais grave foi de Carlos Alberto Borges, que ficou de olhos virados, língua presa, não conseguia falar e respirava com dificuldade, conforme relatou o repórter Dinoel Marcos de Abreu.

A notícia do raio no Parque Antártica ocupou quase toda a capa do Jornal da Tarde do dia seguinte, com a manchete “Terror no treino: um raio cai sobre o Palmeiras”, uma grande foto dos jogadores caídos e uma ilustração de Gepp com detalhes do acontecido:

“Veja a foto: um raio acaba de cair no treino do Palmeiras. Ninguém viu a faísca: houve um estrondo e o impacto da descarga elétrica atirou a distância jogadores e o técnico. Carlos Alberto Borges, o mais atingido, quase morreu, foi salvo pelo médico. Nosso fotógrafo estava lá no momento e documentou toda a cena em fotos exclusivas que estão na última página. No desenho, o momento do impacto.”

Leia abaixo a íntegra da reportagem de Dinoel Marcos de Abreu e o relato do fotógrafo Benedito Salgado.

Jornal da Tarde - 16 de setembro de 1983

Página do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1983 sobre raio que caiu no campo durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e técnico. Foto: Acervo Estadão

O raio, na câmera de Benedito.

“Após o apito para o início do treino no Parque Antártica, um violento estrondo. Eu me preparava com minha câmera para algum bom lance. O dia escurecera de repente, e sabia que o treino, com a chuva que se anunciava, não duraria muito. Entretanto, depois do susto, e um pouco tonto, vi que minha pauta havia mudado: o treino parecia ter-se transformado numa tragédia.

Por sorte, eu estava na lateral do campo, num local cimentado, e só senti uma pressão muito forte. Mas pude observar que as pessoas, no gramado, além da pressão, receberam uma violenta descarga elétrica. Se não, que aquecimento seria aquele, com a maioria dos jogadores deitado no chão, se contorcendo?

Os que estavam em pé, tremiam, e os que estavam em melhores condições corriam desesperados, sem direção. E depois do grande susto, os comentários entre os jogadores chegaram a ser cômicos. Houve até quem imaginasse haver morrido...” (Benedito Salgado)

Manhã de terror no velho Parque

O treino do Palmeiras ia começar. Ia. A descarga elétrica de um raio derrubou quase todos no campo

Dinoel Marcos de Abreu

Foi tudo muito rápido; um estrondo, a região do campo escureceu bruscamente e os jogadores, o técnico Minelli e seus auxiliares sentiram vários tipos de efeitos da descarga elétrica, provocada por um raio. Uns foram derrubados violentamente; Minelli foi atirado de costas a cerca de quatro metros de distância e houve quem sentisse a sensação de que havia morrido, caso de Carlos Henrique.

Mas o drama maior foi sofrido por Carlos Alberto Borges, que realmente quase morreu. Eram 11h20 de ontem, quando o pânico começou: durou de 20 a 30 segundos. Os jogadores já haviam feito o aquecimento e estavam prontos para o rachão. Mas o treino nem começou. Foi o tempo de Zé Carlos Paulista jogar a bola para Fedato, que iria apitar o treino. Logo em seguida houve o estrondo, o tempo escureceu e quase todos os jogadores que estavam no campo foram atingidos pela descarga elétrica.

Carlos Alberto Borges estava quase no meio de campo, próximo a Vágner e Carlos Alberto Seixas, onde o efeito do impacto foi maior. Borges foi jogado violentamente ao chão, e enquanto a maioria dos jogadores corria desesperada para o vestiário, Fedato, Medina, Luís Pereira e Aragonez correram em sua direção.

O primeiro a chegar perto de Borges foi Aragonez que, ao ver o companheiro contorcendo-se, ficou desesperado, imaginando que ele iria morrer. Aragonez, então, saiu correndo para chamar o médico Naércio Correia dos Santos, que estava no saguão de acesso ao vestiário:

— Foi uma cena horrível — contou mais tarde Aragonez, ainda visivelmente assustado.

— Tive a impressão que ele estava mesmo morrendo. Seus olhos estavam virados, a língua estava presa, ele não conseguia falar e estava respirando com dificuldade. Naércio chegou correndo e a sua primeira providência foi destravar a língua de Borges com os dedos, e manter a sua boca bem aberta, para que ele pudesse respirar.

Pouco antes, Fedato e Medina já haviam tentado reanimar o jogador com massagens no peito. Essa técnica depois foi reforçada pelo médico. Imediatamente, Borges foi carregado para a enfermaria do clube, onde recebeu oxigênio, e posteriormente soro. Aos poucos ele fel reagindo, e em cerca de 15 minutos já estava fora de perigo. Mesmo assim, passou a tarde inteira na enfermaria do clube em observação, mas o médico garantia que não havia mais o menor risco de vida.

Suspeitou-se de que, na hora em que foi atingido pela descarga elétrica, Borges havia sofrido uma parada cardíaca, mas Naércio afastou totalmente essa hipótese, embora revelasse que a sua situação realmente era bastante delicada:

Sua pressão havia baixado para zero, ele estava muito pálido — disse Naércio.

— Com o choque, a sua pulsação diminuiu sensivelmente e com isso automaticamente diminuiu o fluxo sanguíneo para o organismo. Mas nós felizmente conseguimos desobstruir as suas vias respiratórias em tempo.

Naércio comentou também que hoje Borges ainda deve sentir bastante as consequências da descarga elétrica. Vai sentir, por exemplo, seus músculos contraídos, mas, com os medicamentos que já vem tomando, não deve sofrer muitas dores. Naércio, porém, afirmou que ele não tem a menor condição para o jogo com o Taquaritinga, domingo, em Taquaritinga.

O caso de Borges deixou todos no Parque Antártica muito preocupados. A maioria dos jogadores só mais tarde foi saber de todos os detalhes acontecidos com o companheiro. Vágner, que estava bem perto de Borges, recebeu também um impacto muito forte e teve uma sensação bastante estranha:

— Acho que como tenho uma ponte com metal na boca, eu atraí a força do raio — disse ele. Senti o ralo bater no meu rosto e sofri uma dor horrível. Parecia que a minha cabeça ia estourar e que eu estava encolhendo. Era isso mesmo. Mi-nhas pernas estavam encolhendo e o meu corpo estava se torcendo. Com muito esforço, corri para o vestiário e me joguei no chão, com medo que viesse outro raio. Sabe, eu não senti levar os três tombos no campo. Meus companheiros é que me disseram que eu fui jogado uns dois metros.

Carlos Alberto Seixas foi outro que sofreu muito. Ele disse que havia ficado surdo do ouvido do lado esquerdo, o mesmo que havia operado nos tempos em que jogava no Santo André. Seixas não viu como começou. Sentiu uma forte dor de cabeça e uma ânsia de vômito. Mas ficou consciente e percebeu que com o impacto fora derrubado violentamente ao chão.

Já Carlos Henrique imaginou que tivesse morrido. Ele também tem uma ponte com metal na boca e sentiu um impacto forte no rosto, que o atirou ao chão:

— Depois eu fiquei desligado por uns segundos — comentou Carlos Henrique.

— Não sei para onde fui. Eu só sei que gritava, mas não escutava a minha voz. Não sabia se eu estava surdo ou mudo. Depois, quando me recuperei, vi quase todos meus companheiros caindo de um lado para outro. Foi uma coisa terrível, e eu acho que eu morri mesmo por uns dez segundos.

Gilmar levou uma pancada forte na cabeça e pensou que tivesse sido atingido por um tijolo. Ele caiu e imediatamente passou as mãos na cabeça para ver se estava saindo sangue. Sentiu também ânsia de vômito e quando se recuperou correu para o vestiário.

Nenê foi um dos que foi atirado violentamente no chão. Ele pensou que Eneas, que estava ao seu lado, havia lhe dado um pontapé por trás. Mas depois viu Eneas também virar uma cambalhota e não entendeu mais nada. Zé Carlos Paulista pensou também que tivesse sido derrubado por um companheiro:

— Eu tinha dado a bola para que o Fedato começasse o treino, e de repente fui jogado para cima — disse Zé Carlos Paulista.

— Aí, disse para o pessoal: poxa, o treino nem começou e já me acertaram. Mas depois, vi todo mundo correndo torto e dando cambalhotas. Foi esquisito mesmo.

Minelli foi atirado cerca de quatro metros para trás, e não sabe onde foi parar o apito que estava em sua boca. Ele disse que, como o apito é de metal, foi atingido por um forte impacto. Não se machucou, mas ficou muito assustado

— Já pensou se isso tivesse acontecido na hora de um jogo? Haveria pánico entre os torcedores e muitos deles poderiam morrer pisoteados.

Cléo, que hoje se apresenta definitivamente ao Flamengo, teve mais sorte. Ele estava no vestiário com o júnior Osias, quando ouviu o estrondo. Pensou que tivesse acontecido um acidente:

— Parecia um choque entre dois aviões Jumbos — contou Cléo. — O barulho foi violento e me deu a impressão que as paredes estavam-se rachando.

Os únicos Jogadores que estavam no campo e que resistiram ao impacto foram Rocha e Luis Pereira. Eles ficaram com dor de cabeça, mas não foram atirados ao chão. Luis Pereira, mais tarde, chegou a brincar com os companheiros:

— Quem disse que eu sou velho? Vocês viram que nem o raio derruba o Luisão. Medina e Fedato, porém, foram jogados ao chão e não sabiam explicar como tudo aconteceu.

Medina foi embora para casa, mancando da perna direita:

— Olha, pareceu que alguém me deu uma paulada por baixo — disse Medina.

Já Fedato apenas caiu, mas não viu nada, por uns 30 segundos. Sua vista ficou embaçada e sentiu que o campo estava torto:

— Foram os 30 segundos mais horríveis da minha vida.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Aconteceu no tempo em que os treinos do Palmeiras eram realizados no próprio campo de jogo, no Parque Antártica, atual Allianz Parque. O treino matinal de quinta-feira em 15 de setembro de 1983 ia começar quando um raio atingiu o campo e quase todos que estavam no gramado foram ao chão.

Capa do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1993 com notícia de raio que caiu durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e o técnico. Foto: Acervo Estadão

O técnico Rubens Minelli foi atirado de costas por quatro metros e vários jogadores ficaram desnorteados, caídos ou cambaleando de pé. O caso mais grave foi de Carlos Alberto Borges, que ficou de olhos virados, língua presa, não conseguia falar e respirava com dificuldade, conforme relatou o repórter Dinoel Marcos de Abreu.

A notícia do raio no Parque Antártica ocupou quase toda a capa do Jornal da Tarde do dia seguinte, com a manchete “Terror no treino: um raio cai sobre o Palmeiras”, uma grande foto dos jogadores caídos e uma ilustração de Gepp com detalhes do acontecido:

“Veja a foto: um raio acaba de cair no treino do Palmeiras. Ninguém viu a faísca: houve um estrondo e o impacto da descarga elétrica atirou a distância jogadores e o técnico. Carlos Alberto Borges, o mais atingido, quase morreu, foi salvo pelo médico. Nosso fotógrafo estava lá no momento e documentou toda a cena em fotos exclusivas que estão na última página. No desenho, o momento do impacto.”

Leia abaixo a íntegra da reportagem de Dinoel Marcos de Abreu e o relato do fotógrafo Benedito Salgado.

Jornal da Tarde - 16 de setembro de 1983

Página do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1983 sobre raio que caiu no campo durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e técnico. Foto: Acervo Estadão

O raio, na câmera de Benedito.

“Após o apito para o início do treino no Parque Antártica, um violento estrondo. Eu me preparava com minha câmera para algum bom lance. O dia escurecera de repente, e sabia que o treino, com a chuva que se anunciava, não duraria muito. Entretanto, depois do susto, e um pouco tonto, vi que minha pauta havia mudado: o treino parecia ter-se transformado numa tragédia.

Por sorte, eu estava na lateral do campo, num local cimentado, e só senti uma pressão muito forte. Mas pude observar que as pessoas, no gramado, além da pressão, receberam uma violenta descarga elétrica. Se não, que aquecimento seria aquele, com a maioria dos jogadores deitado no chão, se contorcendo?

Os que estavam em pé, tremiam, e os que estavam em melhores condições corriam desesperados, sem direção. E depois do grande susto, os comentários entre os jogadores chegaram a ser cômicos. Houve até quem imaginasse haver morrido...” (Benedito Salgado)

Manhã de terror no velho Parque

O treino do Palmeiras ia começar. Ia. A descarga elétrica de um raio derrubou quase todos no campo

Dinoel Marcos de Abreu

Foi tudo muito rápido; um estrondo, a região do campo escureceu bruscamente e os jogadores, o técnico Minelli e seus auxiliares sentiram vários tipos de efeitos da descarga elétrica, provocada por um raio. Uns foram derrubados violentamente; Minelli foi atirado de costas a cerca de quatro metros de distância e houve quem sentisse a sensação de que havia morrido, caso de Carlos Henrique.

Mas o drama maior foi sofrido por Carlos Alberto Borges, que realmente quase morreu. Eram 11h20 de ontem, quando o pânico começou: durou de 20 a 30 segundos. Os jogadores já haviam feito o aquecimento e estavam prontos para o rachão. Mas o treino nem começou. Foi o tempo de Zé Carlos Paulista jogar a bola para Fedato, que iria apitar o treino. Logo em seguida houve o estrondo, o tempo escureceu e quase todos os jogadores que estavam no campo foram atingidos pela descarga elétrica.

Carlos Alberto Borges estava quase no meio de campo, próximo a Vágner e Carlos Alberto Seixas, onde o efeito do impacto foi maior. Borges foi jogado violentamente ao chão, e enquanto a maioria dos jogadores corria desesperada para o vestiário, Fedato, Medina, Luís Pereira e Aragonez correram em sua direção.

O primeiro a chegar perto de Borges foi Aragonez que, ao ver o companheiro contorcendo-se, ficou desesperado, imaginando que ele iria morrer. Aragonez, então, saiu correndo para chamar o médico Naércio Correia dos Santos, que estava no saguão de acesso ao vestiário:

— Foi uma cena horrível — contou mais tarde Aragonez, ainda visivelmente assustado.

— Tive a impressão que ele estava mesmo morrendo. Seus olhos estavam virados, a língua estava presa, ele não conseguia falar e estava respirando com dificuldade. Naércio chegou correndo e a sua primeira providência foi destravar a língua de Borges com os dedos, e manter a sua boca bem aberta, para que ele pudesse respirar.

Pouco antes, Fedato e Medina já haviam tentado reanimar o jogador com massagens no peito. Essa técnica depois foi reforçada pelo médico. Imediatamente, Borges foi carregado para a enfermaria do clube, onde recebeu oxigênio, e posteriormente soro. Aos poucos ele fel reagindo, e em cerca de 15 minutos já estava fora de perigo. Mesmo assim, passou a tarde inteira na enfermaria do clube em observação, mas o médico garantia que não havia mais o menor risco de vida.

Suspeitou-se de que, na hora em que foi atingido pela descarga elétrica, Borges havia sofrido uma parada cardíaca, mas Naércio afastou totalmente essa hipótese, embora revelasse que a sua situação realmente era bastante delicada:

Sua pressão havia baixado para zero, ele estava muito pálido — disse Naércio.

— Com o choque, a sua pulsação diminuiu sensivelmente e com isso automaticamente diminuiu o fluxo sanguíneo para o organismo. Mas nós felizmente conseguimos desobstruir as suas vias respiratórias em tempo.

Naércio comentou também que hoje Borges ainda deve sentir bastante as consequências da descarga elétrica. Vai sentir, por exemplo, seus músculos contraídos, mas, com os medicamentos que já vem tomando, não deve sofrer muitas dores. Naércio, porém, afirmou que ele não tem a menor condição para o jogo com o Taquaritinga, domingo, em Taquaritinga.

O caso de Borges deixou todos no Parque Antártica muito preocupados. A maioria dos jogadores só mais tarde foi saber de todos os detalhes acontecidos com o companheiro. Vágner, que estava bem perto de Borges, recebeu também um impacto muito forte e teve uma sensação bastante estranha:

— Acho que como tenho uma ponte com metal na boca, eu atraí a força do raio — disse ele. Senti o ralo bater no meu rosto e sofri uma dor horrível. Parecia que a minha cabeça ia estourar e que eu estava encolhendo. Era isso mesmo. Mi-nhas pernas estavam encolhendo e o meu corpo estava se torcendo. Com muito esforço, corri para o vestiário e me joguei no chão, com medo que viesse outro raio. Sabe, eu não senti levar os três tombos no campo. Meus companheiros é que me disseram que eu fui jogado uns dois metros.

Carlos Alberto Seixas foi outro que sofreu muito. Ele disse que havia ficado surdo do ouvido do lado esquerdo, o mesmo que havia operado nos tempos em que jogava no Santo André. Seixas não viu como começou. Sentiu uma forte dor de cabeça e uma ânsia de vômito. Mas ficou consciente e percebeu que com o impacto fora derrubado violentamente ao chão.

Já Carlos Henrique imaginou que tivesse morrido. Ele também tem uma ponte com metal na boca e sentiu um impacto forte no rosto, que o atirou ao chão:

— Depois eu fiquei desligado por uns segundos — comentou Carlos Henrique.

— Não sei para onde fui. Eu só sei que gritava, mas não escutava a minha voz. Não sabia se eu estava surdo ou mudo. Depois, quando me recuperei, vi quase todos meus companheiros caindo de um lado para outro. Foi uma coisa terrível, e eu acho que eu morri mesmo por uns dez segundos.

Gilmar levou uma pancada forte na cabeça e pensou que tivesse sido atingido por um tijolo. Ele caiu e imediatamente passou as mãos na cabeça para ver se estava saindo sangue. Sentiu também ânsia de vômito e quando se recuperou correu para o vestiário.

Nenê foi um dos que foi atirado violentamente no chão. Ele pensou que Eneas, que estava ao seu lado, havia lhe dado um pontapé por trás. Mas depois viu Eneas também virar uma cambalhota e não entendeu mais nada. Zé Carlos Paulista pensou também que tivesse sido derrubado por um companheiro:

— Eu tinha dado a bola para que o Fedato começasse o treino, e de repente fui jogado para cima — disse Zé Carlos Paulista.

— Aí, disse para o pessoal: poxa, o treino nem começou e já me acertaram. Mas depois, vi todo mundo correndo torto e dando cambalhotas. Foi esquisito mesmo.

Minelli foi atirado cerca de quatro metros para trás, e não sabe onde foi parar o apito que estava em sua boca. Ele disse que, como o apito é de metal, foi atingido por um forte impacto. Não se machucou, mas ficou muito assustado

— Já pensou se isso tivesse acontecido na hora de um jogo? Haveria pánico entre os torcedores e muitos deles poderiam morrer pisoteados.

Cléo, que hoje se apresenta definitivamente ao Flamengo, teve mais sorte. Ele estava no vestiário com o júnior Osias, quando ouviu o estrondo. Pensou que tivesse acontecido um acidente:

— Parecia um choque entre dois aviões Jumbos — contou Cléo. — O barulho foi violento e me deu a impressão que as paredes estavam-se rachando.

Os únicos Jogadores que estavam no campo e que resistiram ao impacto foram Rocha e Luis Pereira. Eles ficaram com dor de cabeça, mas não foram atirados ao chão. Luis Pereira, mais tarde, chegou a brincar com os companheiros:

— Quem disse que eu sou velho? Vocês viram que nem o raio derruba o Luisão. Medina e Fedato, porém, foram jogados ao chão e não sabiam explicar como tudo aconteceu.

Medina foi embora para casa, mancando da perna direita:

— Olha, pareceu que alguém me deu uma paulada por baixo — disse Medina.

Já Fedato apenas caiu, mas não viu nada, por uns 30 segundos. Sua vista ficou embaçada e sentiu que o campo estava torto:

— Foram os 30 segundos mais horríveis da minha vida.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Aconteceu no tempo em que os treinos do Palmeiras eram realizados no próprio campo de jogo, no Parque Antártica, atual Allianz Parque. O treino matinal de quinta-feira em 15 de setembro de 1983 ia começar quando um raio atingiu o campo e quase todos que estavam no gramado foram ao chão.

Capa do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1993 com notícia de raio que caiu durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e o técnico. Foto: Acervo Estadão

O técnico Rubens Minelli foi atirado de costas por quatro metros e vários jogadores ficaram desnorteados, caídos ou cambaleando de pé. O caso mais grave foi de Carlos Alberto Borges, que ficou de olhos virados, língua presa, não conseguia falar e respirava com dificuldade, conforme relatou o repórter Dinoel Marcos de Abreu.

A notícia do raio no Parque Antártica ocupou quase toda a capa do Jornal da Tarde do dia seguinte, com a manchete “Terror no treino: um raio cai sobre o Palmeiras”, uma grande foto dos jogadores caídos e uma ilustração de Gepp com detalhes do acontecido:

“Veja a foto: um raio acaba de cair no treino do Palmeiras. Ninguém viu a faísca: houve um estrondo e o impacto da descarga elétrica atirou a distância jogadores e o técnico. Carlos Alberto Borges, o mais atingido, quase morreu, foi salvo pelo médico. Nosso fotógrafo estava lá no momento e documentou toda a cena em fotos exclusivas que estão na última página. No desenho, o momento do impacto.”

Leia abaixo a íntegra da reportagem de Dinoel Marcos de Abreu e o relato do fotógrafo Benedito Salgado.

Jornal da Tarde - 16 de setembro de 1983

Página do Jornal da Tarde de 16 de setembro de 1983 sobre raio que caiu no campo durante treino do Palmeiras, atingindo jogadores e técnico. Foto: Acervo Estadão

O raio, na câmera de Benedito.

“Após o apito para o início do treino no Parque Antártica, um violento estrondo. Eu me preparava com minha câmera para algum bom lance. O dia escurecera de repente, e sabia que o treino, com a chuva que se anunciava, não duraria muito. Entretanto, depois do susto, e um pouco tonto, vi que minha pauta havia mudado: o treino parecia ter-se transformado numa tragédia.

Por sorte, eu estava na lateral do campo, num local cimentado, e só senti uma pressão muito forte. Mas pude observar que as pessoas, no gramado, além da pressão, receberam uma violenta descarga elétrica. Se não, que aquecimento seria aquele, com a maioria dos jogadores deitado no chão, se contorcendo?

Os que estavam em pé, tremiam, e os que estavam em melhores condições corriam desesperados, sem direção. E depois do grande susto, os comentários entre os jogadores chegaram a ser cômicos. Houve até quem imaginasse haver morrido...” (Benedito Salgado)

Manhã de terror no velho Parque

O treino do Palmeiras ia começar. Ia. A descarga elétrica de um raio derrubou quase todos no campo

Dinoel Marcos de Abreu

Foi tudo muito rápido; um estrondo, a região do campo escureceu bruscamente e os jogadores, o técnico Minelli e seus auxiliares sentiram vários tipos de efeitos da descarga elétrica, provocada por um raio. Uns foram derrubados violentamente; Minelli foi atirado de costas a cerca de quatro metros de distância e houve quem sentisse a sensação de que havia morrido, caso de Carlos Henrique.

Mas o drama maior foi sofrido por Carlos Alberto Borges, que realmente quase morreu. Eram 11h20 de ontem, quando o pânico começou: durou de 20 a 30 segundos. Os jogadores já haviam feito o aquecimento e estavam prontos para o rachão. Mas o treino nem começou. Foi o tempo de Zé Carlos Paulista jogar a bola para Fedato, que iria apitar o treino. Logo em seguida houve o estrondo, o tempo escureceu e quase todos os jogadores que estavam no campo foram atingidos pela descarga elétrica.

Carlos Alberto Borges estava quase no meio de campo, próximo a Vágner e Carlos Alberto Seixas, onde o efeito do impacto foi maior. Borges foi jogado violentamente ao chão, e enquanto a maioria dos jogadores corria desesperada para o vestiário, Fedato, Medina, Luís Pereira e Aragonez correram em sua direção.

O primeiro a chegar perto de Borges foi Aragonez que, ao ver o companheiro contorcendo-se, ficou desesperado, imaginando que ele iria morrer. Aragonez, então, saiu correndo para chamar o médico Naércio Correia dos Santos, que estava no saguão de acesso ao vestiário:

— Foi uma cena horrível — contou mais tarde Aragonez, ainda visivelmente assustado.

— Tive a impressão que ele estava mesmo morrendo. Seus olhos estavam virados, a língua estava presa, ele não conseguia falar e estava respirando com dificuldade. Naércio chegou correndo e a sua primeira providência foi destravar a língua de Borges com os dedos, e manter a sua boca bem aberta, para que ele pudesse respirar.

Pouco antes, Fedato e Medina já haviam tentado reanimar o jogador com massagens no peito. Essa técnica depois foi reforçada pelo médico. Imediatamente, Borges foi carregado para a enfermaria do clube, onde recebeu oxigênio, e posteriormente soro. Aos poucos ele fel reagindo, e em cerca de 15 minutos já estava fora de perigo. Mesmo assim, passou a tarde inteira na enfermaria do clube em observação, mas o médico garantia que não havia mais o menor risco de vida.

Suspeitou-se de que, na hora em que foi atingido pela descarga elétrica, Borges havia sofrido uma parada cardíaca, mas Naércio afastou totalmente essa hipótese, embora revelasse que a sua situação realmente era bastante delicada:

Sua pressão havia baixado para zero, ele estava muito pálido — disse Naércio.

— Com o choque, a sua pulsação diminuiu sensivelmente e com isso automaticamente diminuiu o fluxo sanguíneo para o organismo. Mas nós felizmente conseguimos desobstruir as suas vias respiratórias em tempo.

Naércio comentou também que hoje Borges ainda deve sentir bastante as consequências da descarga elétrica. Vai sentir, por exemplo, seus músculos contraídos, mas, com os medicamentos que já vem tomando, não deve sofrer muitas dores. Naércio, porém, afirmou que ele não tem a menor condição para o jogo com o Taquaritinga, domingo, em Taquaritinga.

O caso de Borges deixou todos no Parque Antártica muito preocupados. A maioria dos jogadores só mais tarde foi saber de todos os detalhes acontecidos com o companheiro. Vágner, que estava bem perto de Borges, recebeu também um impacto muito forte e teve uma sensação bastante estranha:

— Acho que como tenho uma ponte com metal na boca, eu atraí a força do raio — disse ele. Senti o ralo bater no meu rosto e sofri uma dor horrível. Parecia que a minha cabeça ia estourar e que eu estava encolhendo. Era isso mesmo. Mi-nhas pernas estavam encolhendo e o meu corpo estava se torcendo. Com muito esforço, corri para o vestiário e me joguei no chão, com medo que viesse outro raio. Sabe, eu não senti levar os três tombos no campo. Meus companheiros é que me disseram que eu fui jogado uns dois metros.

Carlos Alberto Seixas foi outro que sofreu muito. Ele disse que havia ficado surdo do ouvido do lado esquerdo, o mesmo que havia operado nos tempos em que jogava no Santo André. Seixas não viu como começou. Sentiu uma forte dor de cabeça e uma ânsia de vômito. Mas ficou consciente e percebeu que com o impacto fora derrubado violentamente ao chão.

Já Carlos Henrique imaginou que tivesse morrido. Ele também tem uma ponte com metal na boca e sentiu um impacto forte no rosto, que o atirou ao chão:

— Depois eu fiquei desligado por uns segundos — comentou Carlos Henrique.

— Não sei para onde fui. Eu só sei que gritava, mas não escutava a minha voz. Não sabia se eu estava surdo ou mudo. Depois, quando me recuperei, vi quase todos meus companheiros caindo de um lado para outro. Foi uma coisa terrível, e eu acho que eu morri mesmo por uns dez segundos.

Gilmar levou uma pancada forte na cabeça e pensou que tivesse sido atingido por um tijolo. Ele caiu e imediatamente passou as mãos na cabeça para ver se estava saindo sangue. Sentiu também ânsia de vômito e quando se recuperou correu para o vestiário.

Nenê foi um dos que foi atirado violentamente no chão. Ele pensou que Eneas, que estava ao seu lado, havia lhe dado um pontapé por trás. Mas depois viu Eneas também virar uma cambalhota e não entendeu mais nada. Zé Carlos Paulista pensou também que tivesse sido derrubado por um companheiro:

— Eu tinha dado a bola para que o Fedato começasse o treino, e de repente fui jogado para cima — disse Zé Carlos Paulista.

— Aí, disse para o pessoal: poxa, o treino nem começou e já me acertaram. Mas depois, vi todo mundo correndo torto e dando cambalhotas. Foi esquisito mesmo.

Minelli foi atirado cerca de quatro metros para trás, e não sabe onde foi parar o apito que estava em sua boca. Ele disse que, como o apito é de metal, foi atingido por um forte impacto. Não se machucou, mas ficou muito assustado

— Já pensou se isso tivesse acontecido na hora de um jogo? Haveria pánico entre os torcedores e muitos deles poderiam morrer pisoteados.

Cléo, que hoje se apresenta definitivamente ao Flamengo, teve mais sorte. Ele estava no vestiário com o júnior Osias, quando ouviu o estrondo. Pensou que tivesse acontecido um acidente:

— Parecia um choque entre dois aviões Jumbos — contou Cléo. — O barulho foi violento e me deu a impressão que as paredes estavam-se rachando.

Os únicos Jogadores que estavam no campo e que resistiram ao impacto foram Rocha e Luis Pereira. Eles ficaram com dor de cabeça, mas não foram atirados ao chão. Luis Pereira, mais tarde, chegou a brincar com os companheiros:

— Quem disse que eu sou velho? Vocês viram que nem o raio derruba o Luisão. Medina e Fedato, porém, foram jogados ao chão e não sabiam explicar como tudo aconteceu.

Medina foi embora para casa, mancando da perna direita:

— Olha, pareceu que alguém me deu uma paulada por baixo — disse Medina.

Já Fedato apenas caiu, mas não viu nada, por uns 30 segundos. Sua vista ficou embaçada e sentiu que o campo estava torto:

— Foram os 30 segundos mais horríveis da minha vida.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

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