Santos com Pelé e Portuguesa dividiram título de campeão paulista em 1973 por causa de erro do juiz


Árbitro Armando Marques errou contagem de pênaltis e dirigentes decidiram declarar dois campeões. Leia análise de Roberto Avallone

Por Edmundo Leite
Atualização:

Um dos capítulos mais inusitados da história do futebol brasileiro aconteceu no estádio do Morumbi em 26 de agosto de 1973. Naquele domingo foi disputada a decisão do Campeonato Paulista de Futebol, entre Santos e Portuguesa, e o resultado foi que os dois times acabaram sendo declarados campeões do estadual daquele ano.

Capa do Jornal da Tarde de 27 de agosto de 1973 com a manchete "Temos dois campeões" Foto: Acervo Estadão

Como isso aconteceu foi o que o Jornal da Tarde publicou na capa do dia seguinte, com fotos de todos os pênaltis e sinais de interrogação no que seriam os dois últimos de cada time. Sob a manchete “Temos dois campeões”, vinha a explicação: “Veja como isso foi possível depois de 120 minutos de jogo. A criativa diagramação da página transformou o texto afirmativo do título numa grande pergunta com quatro interrogações.

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No caderno Edição de Esportes, uma detalhada cobertura recapitulava todos os lances da partida. Após o empate sem gols no tempo normal e na prorrogação, a decisão foi para a cobrança de pênaltis, mas o juiz Armando Marques - “Tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo” - encerrou o jogo ainda faltando duas cobranças para cada time.

O Santos havia perdido uma e acertado duas cobranças, enquanto a Portuguesa havia perdido três chutes diretos. O apito final antecipado, no entanto, causou uma grande confusão. O Santos chegou a desfilar em campo comemorando como campeão, mas o protesto dos jogadores da Portuguesa provocou uma reunião de dirigentes no túnel do vestiário do Santos após o juiz admitir que errou.

Pelé reclama

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Pelé, que se preparava para encerrar a carreia no Santos, reclamava: “Não quero saber qual a decisão deles. Eu me considero campeão paulista. Porque nós não voltamos ao campo para bater os outros pênaltis? Eu estou de uniforme ainda, é so me chamar”.

Os presidentes dos clubes e o presidente da Federação Paulista de Futebol decidiram em 12 minutos de conversas que os dois times seriam declarados campeões do Paulistão 73.

O presidente da Portuguesa, Oswaldo Teixeira Duarte, abraçado com Vasco Faé, do Santos, comemorava: “Teremos muito bacalhau e peixe por aí”. O santista emendou: “Carnaval duplo: no planalto e na baixada santista.”

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Roberto Avallone analisa a decisão de declarar dois campeões. Foto: Acervo Estadão
Reunião de dirigentes decidiu dividir título. Foto: Acervo Estadão
O juiz Armando Marques admite erro Foto: Acervo Estadão
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Leia a análise do jornalista Roberto Avallone.

Jornal da Tarde - 27 de agosto de 1973

Santos, campeão. Portuguesa, campeã. Mas isso é justo?

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Roberto Avallone

Com um sorriso satisfeito, o presidente da Federação, José Ermírio de Morais Justificou a proclamação de dois campeões como uma atitude a serviço da boa vontade. Mas o Morumbi lotado não poderia concordar com essa simplicidade de argumentos: eles viram, em 120 minutos, o melhor futebol do Santos.

Para os que possam considerar desonesta a inédita decisão de se proclamar Santos e Portuguesa campeões, depois de 120 minutos de futebol (em que persistiu o zero a zero) e do suspense dos pênaltis, onde o Santos levava nítida vantagem, é aconselhável acompanhar as palavras de José Ermírio de Morais Filho, presidente da Federaãão Paulista de Futebol. Estas:

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- Às vezes, a boa vontade vale mais do que a lei. Sábias ou não, as palavras de José Ermírio, envolvidas num largo sorriso do presidente, como se ele tivesse descoberto a fórmula mágica de fazer justiça, não acompanharam a seriedade dos 116 mil torcedores que foram ao Morumbi ontem à tarde, na esperança de conhecer um único - e verdadeiro - campeão paulista.

Pelo jogo de ontem, deixando de lado as lembranças das excelentes atuações da Portuguesa no segundo turno, o campeão deveria ser o Santos. Não só pela vantagem nos pênaltis, de acôrdo com a lei e não com a boa vontade (o Santos e a Portuguesa tinham ainda dois pênaltis cada um a cobrar, tendo nos anteriores o Santos tinha marcado dois gois e a Portuguesa nenhum, quando o juiz Armando Marques, “tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo”, errou na contagem) -, mas pelo futebol, bonito e superior que apresentou nos 120 minutos de jogo.

Contra os dois gois perdidos pela Portuguesa, nas únicas chances que teve na partida - Cabinho, aos 40 minutos do segundo tempo, e Basílio, frente a Cejas, no último minuto da prorrogação, o Santos chutou três bolas nas traves de Zecão - duas por Pelé, uma por Edu e dominou totalmente o jogo.

Um domínio baseado no meio-campo perfeito formado por Clodoaldo, como libero à frente dos zagueiros, e Léo, que estabilizava o setor, e no revezamento entre Pelé e Eusébio, que ajudavam os dois companheiros; além disso, na frente, o Santos contou com os incríveis dribles de Pelé e Edu, que reviveram seus melhores tempos, mostrando um futebol-arte e irresistível.

A Portuguesa, menos ambiciosa que o Santos, jogava quase toda na defesa, com Badeco sendo um autêntico zagueiro e os pontas Xaxá e Wilsinho transformados em simples ajudantes do meio-campo. Na frente, a Portuguesa era obrigada a contar apenas com as folclóricas tentativas de rush de Cabinho (que chegava só a divertir os torcedores neutros, com seus erros primários) e com a pouca inspiração de Enéas, prejudicado pela falta de um bom companheiro para as tabelas.

Se no fim do segundo tempo a Portuguesa subiu de produção, foi menos por seus méritos técnicos do que pelo cansaço do Santos, onde Pelé, com quase 33 anos, já não conseguia fazer as mesmas jogadas e Edu, meia caídas à altura do calcanhar, encontrava dificuldades até mesmo para andar em campo. Seria o momento exato para a Portuguesa aproveitar-se da situação e fazer o gol que daria, pela primeira vez na história, um título de campeão paulista ganho no campo (o de 1936 foi conquistado na APEA; enquanto os outros clubes grandes disputavam o Campeonato da Liga Paulista) e não nos bastidores.

Mas, para isso, o técnico Oto Glória precisava do futebol de Luisinho, especialista em gols no segundo tempo, que, inexplicavelmente, nem estava no banco de reservas.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Um dos capítulos mais inusitados da história do futebol brasileiro aconteceu no estádio do Morumbi em 26 de agosto de 1973. Naquele domingo foi disputada a decisão do Campeonato Paulista de Futebol, entre Santos e Portuguesa, e o resultado foi que os dois times acabaram sendo declarados campeões do estadual daquele ano.

Capa do Jornal da Tarde de 27 de agosto de 1973 com a manchete "Temos dois campeões" Foto: Acervo Estadão

Como isso aconteceu foi o que o Jornal da Tarde publicou na capa do dia seguinte, com fotos de todos os pênaltis e sinais de interrogação no que seriam os dois últimos de cada time. Sob a manchete “Temos dois campeões”, vinha a explicação: “Veja como isso foi possível depois de 120 minutos de jogo. A criativa diagramação da página transformou o texto afirmativo do título numa grande pergunta com quatro interrogações.

No caderno Edição de Esportes, uma detalhada cobertura recapitulava todos os lances da partida. Após o empate sem gols no tempo normal e na prorrogação, a decisão foi para a cobrança de pênaltis, mas o juiz Armando Marques - “Tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo” - encerrou o jogo ainda faltando duas cobranças para cada time.

O Santos havia perdido uma e acertado duas cobranças, enquanto a Portuguesa havia perdido três chutes diretos. O apito final antecipado, no entanto, causou uma grande confusão. O Santos chegou a desfilar em campo comemorando como campeão, mas o protesto dos jogadores da Portuguesa provocou uma reunião de dirigentes no túnel do vestiário do Santos após o juiz admitir que errou.

Pelé reclama

Pelé, que se preparava para encerrar a carreia no Santos, reclamava: “Não quero saber qual a decisão deles. Eu me considero campeão paulista. Porque nós não voltamos ao campo para bater os outros pênaltis? Eu estou de uniforme ainda, é so me chamar”.

Os presidentes dos clubes e o presidente da Federação Paulista de Futebol decidiram em 12 minutos de conversas que os dois times seriam declarados campeões do Paulistão 73.

O presidente da Portuguesa, Oswaldo Teixeira Duarte, abraçado com Vasco Faé, do Santos, comemorava: “Teremos muito bacalhau e peixe por aí”. O santista emendou: “Carnaval duplo: no planalto e na baixada santista.”

Roberto Avallone analisa a decisão de declarar dois campeões. Foto: Acervo Estadão
Reunião de dirigentes decidiu dividir título. Foto: Acervo Estadão
O juiz Armando Marques admite erro Foto: Acervo Estadão

Leia a análise do jornalista Roberto Avallone.

Jornal da Tarde - 27 de agosto de 1973

Santos, campeão. Portuguesa, campeã. Mas isso é justo?

Roberto Avallone

Com um sorriso satisfeito, o presidente da Federação, José Ermírio de Morais Justificou a proclamação de dois campeões como uma atitude a serviço da boa vontade. Mas o Morumbi lotado não poderia concordar com essa simplicidade de argumentos: eles viram, em 120 minutos, o melhor futebol do Santos.

Para os que possam considerar desonesta a inédita decisão de se proclamar Santos e Portuguesa campeões, depois de 120 minutos de futebol (em que persistiu o zero a zero) e do suspense dos pênaltis, onde o Santos levava nítida vantagem, é aconselhável acompanhar as palavras de José Ermírio de Morais Filho, presidente da Federaãão Paulista de Futebol. Estas:

- Às vezes, a boa vontade vale mais do que a lei. Sábias ou não, as palavras de José Ermírio, envolvidas num largo sorriso do presidente, como se ele tivesse descoberto a fórmula mágica de fazer justiça, não acompanharam a seriedade dos 116 mil torcedores que foram ao Morumbi ontem à tarde, na esperança de conhecer um único - e verdadeiro - campeão paulista.

Pelo jogo de ontem, deixando de lado as lembranças das excelentes atuações da Portuguesa no segundo turno, o campeão deveria ser o Santos. Não só pela vantagem nos pênaltis, de acôrdo com a lei e não com a boa vontade (o Santos e a Portuguesa tinham ainda dois pênaltis cada um a cobrar, tendo nos anteriores o Santos tinha marcado dois gois e a Portuguesa nenhum, quando o juiz Armando Marques, “tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo”, errou na contagem) -, mas pelo futebol, bonito e superior que apresentou nos 120 minutos de jogo.

Contra os dois gois perdidos pela Portuguesa, nas únicas chances que teve na partida - Cabinho, aos 40 minutos do segundo tempo, e Basílio, frente a Cejas, no último minuto da prorrogação, o Santos chutou três bolas nas traves de Zecão - duas por Pelé, uma por Edu e dominou totalmente o jogo.

Um domínio baseado no meio-campo perfeito formado por Clodoaldo, como libero à frente dos zagueiros, e Léo, que estabilizava o setor, e no revezamento entre Pelé e Eusébio, que ajudavam os dois companheiros; além disso, na frente, o Santos contou com os incríveis dribles de Pelé e Edu, que reviveram seus melhores tempos, mostrando um futebol-arte e irresistível.

A Portuguesa, menos ambiciosa que o Santos, jogava quase toda na defesa, com Badeco sendo um autêntico zagueiro e os pontas Xaxá e Wilsinho transformados em simples ajudantes do meio-campo. Na frente, a Portuguesa era obrigada a contar apenas com as folclóricas tentativas de rush de Cabinho (que chegava só a divertir os torcedores neutros, com seus erros primários) e com a pouca inspiração de Enéas, prejudicado pela falta de um bom companheiro para as tabelas.

Se no fim do segundo tempo a Portuguesa subiu de produção, foi menos por seus méritos técnicos do que pelo cansaço do Santos, onde Pelé, com quase 33 anos, já não conseguia fazer as mesmas jogadas e Edu, meia caídas à altura do calcanhar, encontrava dificuldades até mesmo para andar em campo. Seria o momento exato para a Portuguesa aproveitar-se da situação e fazer o gol que daria, pela primeira vez na história, um título de campeão paulista ganho no campo (o de 1936 foi conquistado na APEA; enquanto os outros clubes grandes disputavam o Campeonato da Liga Paulista) e não nos bastidores.

Mas, para isso, o técnico Oto Glória precisava do futebol de Luisinho, especialista em gols no segundo tempo, que, inexplicavelmente, nem estava no banco de reservas.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Um dos capítulos mais inusitados da história do futebol brasileiro aconteceu no estádio do Morumbi em 26 de agosto de 1973. Naquele domingo foi disputada a decisão do Campeonato Paulista de Futebol, entre Santos e Portuguesa, e o resultado foi que os dois times acabaram sendo declarados campeões do estadual daquele ano.

Capa do Jornal da Tarde de 27 de agosto de 1973 com a manchete "Temos dois campeões" Foto: Acervo Estadão

Como isso aconteceu foi o que o Jornal da Tarde publicou na capa do dia seguinte, com fotos de todos os pênaltis e sinais de interrogação no que seriam os dois últimos de cada time. Sob a manchete “Temos dois campeões”, vinha a explicação: “Veja como isso foi possível depois de 120 minutos de jogo. A criativa diagramação da página transformou o texto afirmativo do título numa grande pergunta com quatro interrogações.

No caderno Edição de Esportes, uma detalhada cobertura recapitulava todos os lances da partida. Após o empate sem gols no tempo normal e na prorrogação, a decisão foi para a cobrança de pênaltis, mas o juiz Armando Marques - “Tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo” - encerrou o jogo ainda faltando duas cobranças para cada time.

O Santos havia perdido uma e acertado duas cobranças, enquanto a Portuguesa havia perdido três chutes diretos. O apito final antecipado, no entanto, causou uma grande confusão. O Santos chegou a desfilar em campo comemorando como campeão, mas o protesto dos jogadores da Portuguesa provocou uma reunião de dirigentes no túnel do vestiário do Santos após o juiz admitir que errou.

Pelé reclama

Pelé, que se preparava para encerrar a carreia no Santos, reclamava: “Não quero saber qual a decisão deles. Eu me considero campeão paulista. Porque nós não voltamos ao campo para bater os outros pênaltis? Eu estou de uniforme ainda, é so me chamar”.

Os presidentes dos clubes e o presidente da Federação Paulista de Futebol decidiram em 12 minutos de conversas que os dois times seriam declarados campeões do Paulistão 73.

O presidente da Portuguesa, Oswaldo Teixeira Duarte, abraçado com Vasco Faé, do Santos, comemorava: “Teremos muito bacalhau e peixe por aí”. O santista emendou: “Carnaval duplo: no planalto e na baixada santista.”

Roberto Avallone analisa a decisão de declarar dois campeões. Foto: Acervo Estadão
Reunião de dirigentes decidiu dividir título. Foto: Acervo Estadão
O juiz Armando Marques admite erro Foto: Acervo Estadão

Leia a análise do jornalista Roberto Avallone.

Jornal da Tarde - 27 de agosto de 1973

Santos, campeão. Portuguesa, campeã. Mas isso é justo?

Roberto Avallone

Com um sorriso satisfeito, o presidente da Federação, José Ermírio de Morais Justificou a proclamação de dois campeões como uma atitude a serviço da boa vontade. Mas o Morumbi lotado não poderia concordar com essa simplicidade de argumentos: eles viram, em 120 minutos, o melhor futebol do Santos.

Para os que possam considerar desonesta a inédita decisão de se proclamar Santos e Portuguesa campeões, depois de 120 minutos de futebol (em que persistiu o zero a zero) e do suspense dos pênaltis, onde o Santos levava nítida vantagem, é aconselhável acompanhar as palavras de José Ermírio de Morais Filho, presidente da Federaãão Paulista de Futebol. Estas:

- Às vezes, a boa vontade vale mais do que a lei. Sábias ou não, as palavras de José Ermírio, envolvidas num largo sorriso do presidente, como se ele tivesse descoberto a fórmula mágica de fazer justiça, não acompanharam a seriedade dos 116 mil torcedores que foram ao Morumbi ontem à tarde, na esperança de conhecer um único - e verdadeiro - campeão paulista.

Pelo jogo de ontem, deixando de lado as lembranças das excelentes atuações da Portuguesa no segundo turno, o campeão deveria ser o Santos. Não só pela vantagem nos pênaltis, de acôrdo com a lei e não com a boa vontade (o Santos e a Portuguesa tinham ainda dois pênaltis cada um a cobrar, tendo nos anteriores o Santos tinha marcado dois gois e a Portuguesa nenhum, quando o juiz Armando Marques, “tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo”, errou na contagem) -, mas pelo futebol, bonito e superior que apresentou nos 120 minutos de jogo.

Contra os dois gois perdidos pela Portuguesa, nas únicas chances que teve na partida - Cabinho, aos 40 minutos do segundo tempo, e Basílio, frente a Cejas, no último minuto da prorrogação, o Santos chutou três bolas nas traves de Zecão - duas por Pelé, uma por Edu e dominou totalmente o jogo.

Um domínio baseado no meio-campo perfeito formado por Clodoaldo, como libero à frente dos zagueiros, e Léo, que estabilizava o setor, e no revezamento entre Pelé e Eusébio, que ajudavam os dois companheiros; além disso, na frente, o Santos contou com os incríveis dribles de Pelé e Edu, que reviveram seus melhores tempos, mostrando um futebol-arte e irresistível.

A Portuguesa, menos ambiciosa que o Santos, jogava quase toda na defesa, com Badeco sendo um autêntico zagueiro e os pontas Xaxá e Wilsinho transformados em simples ajudantes do meio-campo. Na frente, a Portuguesa era obrigada a contar apenas com as folclóricas tentativas de rush de Cabinho (que chegava só a divertir os torcedores neutros, com seus erros primários) e com a pouca inspiração de Enéas, prejudicado pela falta de um bom companheiro para as tabelas.

Se no fim do segundo tempo a Portuguesa subiu de produção, foi menos por seus méritos técnicos do que pelo cansaço do Santos, onde Pelé, com quase 33 anos, já não conseguia fazer as mesmas jogadas e Edu, meia caídas à altura do calcanhar, encontrava dificuldades até mesmo para andar em campo. Seria o momento exato para a Portuguesa aproveitar-se da situação e fazer o gol que daria, pela primeira vez na história, um título de campeão paulista ganho no campo (o de 1936 foi conquistado na APEA; enquanto os outros clubes grandes disputavam o Campeonato da Liga Paulista) e não nos bastidores.

Mas, para isso, o técnico Oto Glória precisava do futebol de Luisinho, especialista em gols no segundo tempo, que, inexplicavelmente, nem estava no banco de reservas.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

Um dos capítulos mais inusitados da história do futebol brasileiro aconteceu no estádio do Morumbi em 26 de agosto de 1973. Naquele domingo foi disputada a decisão do Campeonato Paulista de Futebol, entre Santos e Portuguesa, e o resultado foi que os dois times acabaram sendo declarados campeões do estadual daquele ano.

Capa do Jornal da Tarde de 27 de agosto de 1973 com a manchete "Temos dois campeões" Foto: Acervo Estadão

Como isso aconteceu foi o que o Jornal da Tarde publicou na capa do dia seguinte, com fotos de todos os pênaltis e sinais de interrogação no que seriam os dois últimos de cada time. Sob a manchete “Temos dois campeões”, vinha a explicação: “Veja como isso foi possível depois de 120 minutos de jogo. A criativa diagramação da página transformou o texto afirmativo do título numa grande pergunta com quatro interrogações.

No caderno Edição de Esportes, uma detalhada cobertura recapitulava todos os lances da partida. Após o empate sem gols no tempo normal e na prorrogação, a decisão foi para a cobrança de pênaltis, mas o juiz Armando Marques - “Tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo” - encerrou o jogo ainda faltando duas cobranças para cada time.

O Santos havia perdido uma e acertado duas cobranças, enquanto a Portuguesa havia perdido três chutes diretos. O apito final antecipado, no entanto, causou uma grande confusão. O Santos chegou a desfilar em campo comemorando como campeão, mas o protesto dos jogadores da Portuguesa provocou uma reunião de dirigentes no túnel do vestiário do Santos após o juiz admitir que errou.

Pelé reclama

Pelé, que se preparava para encerrar a carreia no Santos, reclamava: “Não quero saber qual a decisão deles. Eu me considero campeão paulista. Porque nós não voltamos ao campo para bater os outros pênaltis? Eu estou de uniforme ainda, é so me chamar”.

Os presidentes dos clubes e o presidente da Federação Paulista de Futebol decidiram em 12 minutos de conversas que os dois times seriam declarados campeões do Paulistão 73.

O presidente da Portuguesa, Oswaldo Teixeira Duarte, abraçado com Vasco Faé, do Santos, comemorava: “Teremos muito bacalhau e peixe por aí”. O santista emendou: “Carnaval duplo: no planalto e na baixada santista.”

Roberto Avallone analisa a decisão de declarar dois campeões. Foto: Acervo Estadão
Reunião de dirigentes decidiu dividir título. Foto: Acervo Estadão
O juiz Armando Marques admite erro Foto: Acervo Estadão

Leia a análise do jornalista Roberto Avallone.

Jornal da Tarde - 27 de agosto de 1973

Santos, campeão. Portuguesa, campeã. Mas isso é justo?

Roberto Avallone

Com um sorriso satisfeito, o presidente da Federação, José Ermírio de Morais Justificou a proclamação de dois campeões como uma atitude a serviço da boa vontade. Mas o Morumbi lotado não poderia concordar com essa simplicidade de argumentos: eles viram, em 120 minutos, o melhor futebol do Santos.

Para os que possam considerar desonesta a inédita decisão de se proclamar Santos e Portuguesa campeões, depois de 120 minutos de futebol (em que persistiu o zero a zero) e do suspense dos pênaltis, onde o Santos levava nítida vantagem, é aconselhável acompanhar as palavras de José Ermírio de Morais Filho, presidente da Federaãão Paulista de Futebol. Estas:

- Às vezes, a boa vontade vale mais do que a lei. Sábias ou não, as palavras de José Ermírio, envolvidas num largo sorriso do presidente, como se ele tivesse descoberto a fórmula mágica de fazer justiça, não acompanharam a seriedade dos 116 mil torcedores que foram ao Morumbi ontem à tarde, na esperança de conhecer um único - e verdadeiro - campeão paulista.

Pelo jogo de ontem, deixando de lado as lembranças das excelentes atuações da Portuguesa no segundo turno, o campeão deveria ser o Santos. Não só pela vantagem nos pênaltis, de acôrdo com a lei e não com a boa vontade (o Santos e a Portuguesa tinham ainda dois pênaltis cada um a cobrar, tendo nos anteriores o Santos tinha marcado dois gois e a Portuguesa nenhum, quando o juiz Armando Marques, “tomado pela emoção e pelo grande número de pessoas dentro do campo”, errou na contagem) -, mas pelo futebol, bonito e superior que apresentou nos 120 minutos de jogo.

Contra os dois gois perdidos pela Portuguesa, nas únicas chances que teve na partida - Cabinho, aos 40 minutos do segundo tempo, e Basílio, frente a Cejas, no último minuto da prorrogação, o Santos chutou três bolas nas traves de Zecão - duas por Pelé, uma por Edu e dominou totalmente o jogo.

Um domínio baseado no meio-campo perfeito formado por Clodoaldo, como libero à frente dos zagueiros, e Léo, que estabilizava o setor, e no revezamento entre Pelé e Eusébio, que ajudavam os dois companheiros; além disso, na frente, o Santos contou com os incríveis dribles de Pelé e Edu, que reviveram seus melhores tempos, mostrando um futebol-arte e irresistível.

A Portuguesa, menos ambiciosa que o Santos, jogava quase toda na defesa, com Badeco sendo um autêntico zagueiro e os pontas Xaxá e Wilsinho transformados em simples ajudantes do meio-campo. Na frente, a Portuguesa era obrigada a contar apenas com as folclóricas tentativas de rush de Cabinho (que chegava só a divertir os torcedores neutros, com seus erros primários) e com a pouca inspiração de Enéas, prejudicado pela falta de um bom companheiro para as tabelas.

Se no fim do segundo tempo a Portuguesa subiu de produção, foi menos por seus méritos técnicos do que pelo cansaço do Santos, onde Pelé, com quase 33 anos, já não conseguia fazer as mesmas jogadas e Edu, meia caídas à altura do calcanhar, encontrava dificuldades até mesmo para andar em campo. Seria o momento exato para a Portuguesa aproveitar-se da situação e fazer o gol que daria, pela primeira vez na história, um título de campeão paulista ganho no campo (o de 1936 foi conquistado na APEA; enquanto os outros clubes grandes disputavam o Campeonato da Liga Paulista) e não nos bastidores.

Mas, para isso, o técnico Oto Glória precisava do futebol de Luisinho, especialista em gols no segundo tempo, que, inexplicavelmente, nem estava no banco de reservas.

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

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