A Justiça Federal suspendeu todas as multas aplicadas por evasão de pedágio aos veículos que trafegaram pela Rodovia Rio-Santos (BR-101), no trecho entre o km 380,8 (entroncamento com a BR-465, na bairro de Campo Grande, zona oeste do Rio) e o km 599, onde fica a divisa entre os Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, no município de Ubatuba, desde 31 de março de 2023, quando o sistema free flow (pagamento automático) começou a gerar multas até agora.
A decisão judicial também proibiu a aplicação de novas multas até que seja comprovada a eficiência do sistema. Estima-se que até agora tenham sido aplicadas 32 mil multas, mas a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) não confirmou esse número nem informou outro.
O sistema free flow consiste numa praça de pedágio “eletrônica”, em que os veículos não param e não há barreira física. Esse trecho da Rio-Santos foi o primeiro do País a adotar o sistema, em caráter experimental.
Sensores eletrônicos suspensos identificam todos os veículos que passam por três pontos da rodovia – os km 414, em Itaguaí, 447, em Mangaratiba, e 538, em Paraty – e emitem cobranças automáticas.
O valor é de R$ 4,10 das 6h de segunda-feira às 18h de sexta-feira e, nos finais de semana (das 18h de sexta-feira às 6h de segunda-feira) e feriados, passa a R$ 6,80. Para veículos comerciais, a cobrança é multiplicada pelo número de eixos. Motos, ambulâncias, veículos oficiais e do Corpo Diplomático são isentos do pagamento.
Se o veículo tiver a etiqueta eletrônica (TAG) das empresas que permitem a passagem em pedágios (Sem Parar, MoveMais, ConectCar, Taggy e Veloe), o valor do pedágio é debitado direto na fatura da operadora.
Se o veículo não tem TAG, em até 48 horas o sistema gera cobrança que deve ser acessada eletronicamente e paga no prazo de 15 dias corridos.
De 30 de janeiro a 30 de março de 2023, o sistema funcionou sem gerar multas; elas passaram a ser aplicadas em 31 de março.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), desde então centenas de reclamações já foram oficializadas por meio de ações judiciais individuais ou registros em diversos canais de atendimento: multas aplicadas a veículos que usam TAG e pagaram o pedágio regularmente, duas multas geradas com números diferentes pela passagem do mesmo veículo por um pedágio eletrônico no mesmo dia e hora, falta de sinalização sobre as formas de pagamento.
Essas reclamações geraram primeiro um inquérito civil público e por fim ação civil pública proposta em 15 de abril pelo MPF, pela Defensoria Pública da União e pela Defensoria Pública do Estado do Rio perante a 26ª Vara Federal do Rio contra três réus: a ANTT, a União, representada pela Advocacia Geral da União, e a concessionária CCR Rio-São Paulo, que opera os pedágios.
Em decisão divulgada nesta terça-feira, 23, a juíza Frana Elizabeth Mendes suspendeu as multas já aplicadas, além de proibir a emissão de novas multas enquanto não for comprovada a eficiência do sistema.
“Há inúmeros documentos juntados aos autos (fotos, autos de infração, mensagens de WhatsApp etc) que evidenciam as recorrentes falhas noticiadas pelos usuários que se utilizam do sistema, como, por exemplo, falta de sinalização visível na rodovia quanto aos procedimentos necessários para pagamento, cobranças em duplicidade, cobranças de multa mesmo após pagamento, cobranças de veículos isentos, tarifas sendo cobradas após mais de dez dias da data da passagem do veículo, autos de infração com números diferentes mas data e hora de passagens iguais, lançamento de tarifas pela concessionária mesmo nos casos de usuários conduzindo veículo com TAG, cobranças efetivadas sobre veículos com mais eixos do que realmente possuem, dentre outras”, escreveu a magistrada.
“No curso do inquérito civil público, tanto a concessionária quanto a ANTT não compareceram à audiência pública, sob o argumento de que ‘o Free Flow funcionaria de maneira adequada’, o que não corresponde à realidade”, seguiu.
“Diante do exposto, defiro a tutela de urgência para determinar a suspensão de todos os autos de infração lavrados pela ANTT com base no artigo 209-A do Código de Trânsito Brasileiro (‘evasão de pedágio’), bem como a exigibilidade de todas as penalidades aplicadas pela ANTT pelo mesmo fundamento no trecho da Rodovia BR101/RJ, entre o entroncamento com a BR-465, no Município do Rio de Janeiro (Bairro de Campo Grande) (km 380,8), e a divisa dos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, no Município de Ubatuba, SP (km 599), desde o início da implementação experimental do sistema Free Flow na referida via e enquanto perdurar o regime de Sandbox Regulatório baseado no Termo Aditivo 03/2023 ao Contrato de Concessão, salvo se a ANTT e a Concessionária demonstrarem a plena eficiência no funcionamento do Free Flow”, determinou a juíza.
Em nota, a ANTT afirmou que vai se pronunciar judicialmente sobre o assunto, quando acionada. A agência disse ainda que “tem acompanhado de perto o desenvolvimento do sistema, solicitando melhorias à CCR RioSP” e que “em casos de problemas ou dúvidas relacionadas ao uso do sistema, os usuários da rodovia podem entrar em contato com a concessionária por meio dos canais oficiais de comunicação”. Segundo a ANTT, o sistema Free Flow “é uma iniciativa introduzida no âmbito do Sandbox Regulatório, iniciado em março do ano passado, com duração prevista de 2 anos”, e “qualquer eventualidade pode ser ajustada durante esse período”.
A reportagem aguarda manifestações da concessionária da rodovia e da AGU acerca da decisão judicial.