Mãe Bernadete: líder quilombola relatou ameaças a ministra do STF e cobrava justiça para o filho


Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos, foi assassinada nesta quinta-feira. Ela era uma liderança nacional do movimento e denunciava ameaças de fazendeiros locais. Polícia Federal vai investigar o caso

Por José Maria Tomazela
Atualização:

A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos, executada a tiros, na noite desta quinta-feira, 17, em Simões Filho, na Bahia, denunciou as ameaças que ela e outros membros da sua comunidade, Pitanga dos Palmares, sofriam durante encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, em julho deste ano. A reunião aconteceu na comunidade Quingoma, em Lauro de Freitas, na região metropolitana de Salvador.

Em seu discurso, Mãe Bernadete, como era conhecida, falou de sua luta pelo esclarecimento da morte do filho, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, assassinado em 2017 por homens armados, e contou que também estava sendo ameaçada.

“Para a senhora ter uma ideia, até hoje não sei o resultado do assassinato do meu filho. Abalou todo mundo. Foi no mesmo período em que aconteceu a morte de Marielle (Franco, vereadora assassinada no Rio). Inclusive, eu fui em diversos encontros com a mãe de Marielle. É injusto. Recentemente perdi outro amigo e uma amiga em quilombo. É o que nós recebemos: ameaças, principalmente de fazendeiros, de pessoas da região”, disse, dirigindo-se à ministra.

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Ministra Rosa Weber esteve em quilombo em julho Foto: Fellipe Sampaio/CNJ

Ela relatou ainda que estava sob vigilância, o que não impediu que fosse assassinada. “Hoje eu vivo assim, eu não posso sair que estou sendo revistada. Minha casa toda cheia de câmeras, me sinto até mal, mas é o que acontece”, disse, na ocasião.

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Em nota divulgada nesta sexta-feira, a ministra Rosa Weber disse lamentar profundamente a morte. “Mãe Bernadete, que me falou pessoalmente sobre a violência a que os quilombolas estão expostos e revelou a dor de perder seu filho com 14 tiros dentro da comunidade, foi morta em circunstâncias ainda inexplicadas”, disse a ministra.

As autoridades locais devem adotar providências para o urgente esclarecimento e reparação do acontecido, destacou Rosa Weber, “a fim de que sejam responsabilizados aqueles que patrocinaram o covarde enredo e imediatamente protegidos os familiares de Mãe Bernadete e outras lideranças locais”.

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“É absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras. Assim como é direito de todos os brasileiros, os quilombolas precisam viver em paz e ter seus direitos individuais respeitados”, acrescentou.

Em nota publicada no Twitter, o presidente Lula manifestou pesar. “O governo federal, por meio dos ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, mandou representantes e aguardamos a investigação rigorosa do caso. Meus sentimentos aos familiares e amigos de Mãe Bernadete.”

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A Polícia Federal vai investigar o assassinato da líder quilombola. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia, o trabalho será conjunto. A polícia trabalha na identificação de dois homens suspeitos de efetuar os disparos.

Segundo a delegada Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), os dois homens entraram na casa usando capacetes para dificultar o reconhecimento. Eles teriam recolhido os celulares da vítima e dos netos que estavam na casa.

Nesta sexta-feira, foram feitas diligências para recolher imagens de câmeras instaladas no terreiro e nas imediações. O objetivo é traçar um possível trajeto percorrido pelos criminosos, que chegaram ao local em motocicletas.

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Também nesta sexta-feira, o secretário de Segurança Pública da Bahia, Marcelo Werner, se reuniu com representantes do governo federal, na sede da secretaria, em Salvador, para discutir as medidas de proteção à comunidade quilombola. Participaram do encontro o secretário nacional de Políticas para os Quilombolas, Ronaldo Santos, e representantes dos ministérios de Desenvolvimento Agrário, e de Igualdade Racial.

Levantamento da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) aponta que 11 quilombolas, incluindo Mãe Bernadete, foram assassinados na Bahia desde 2017. Um dos casos é o do filho de Bernardete, Fábio Gabriel Pacífico dos Santos, assassinado no mesmo quilombo.

Mãe Bernadete era conhecida pela defesa da cultura quilombola

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A ialorixá (mãe de santo na umbanda) foi também secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no município de Simões Filho, onde fica sua casa de cultos (terreiro), durante a gestão do prefeito Eduardo Alencar (PSD), entre 2009 e 2016. Em 2017, ela recebeu o título de cidadã de Simões Filho concedido pela Câmara de Vereadores.

Mãe Bernadete, liderança quilombola, foi morta a tiros na região metropolitana de Salvador nesta quinta-feira, 17. Foto: Conaq/Divulgação

Atualmente ela estava à frente da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), uma das entidades de maior prestígio entre os quilombolas no País. Mãe Bernadete também era conhecida pela defesa da cultura popular quilombola.

De acordo com o filho Wellington Pacífico, a mãe era uma pessoa acolhedora e, no momento em que foi dominada pelos criminosos, estava acompanhada dos netos que costumavam frequentar e dormir em sua casa.

Segundo ele, a mãe ‘incomodava gente poderosa’, envolvida na morte do Binho. “É um crime de mando, são as mesmas pessoas. Se o governo, a polícia, a Justiça quiserem resolver esse crime está fácil. A casa tem câmeras”, disse, em entrevista. “Se a Justiça quiser resolver, ela resolve. Eu sei que sou o próximo alvo. Mas eu não tenho medo. Vou continuar lutando pelos meus direitos, porque quilombola é resistência”, disse.

Aém de ter expressão nacional no meio quilombola, Bernadete era uma liderança muito presente no quilombo Pitanga dos Palmares.

Ela era a responsável por uma associação de mais de 120 agricultores que produziam frutas, como abacaxi, banana da terra e maracujá, inhame e tubérculos usados na fabricação da farinha para vatapá.

No total, 290 famílias vivem na comunidade, com área de 854 hectares. O quilombo foi certificado em 2004 pela Fundação Cultural Palmares, mas ainda não teve o processo de titulação concluído.

A líder lutava também pela regularização dos territórios quilombolas. Em agosto de 2019, ela assinou com outras lideranças do Estado da Bahia uma carta dirigida aos governos estadual e federal e ao Congresso Nacional, cobrando a garantia dos direitos territoriais de 18 comunidades remanescentes de quilombo na Bahia.

‘Foi silenciada’

Denildo Rodrigues, da Conaq, disse que Bernadete se preocupava mais com a segurança da comunidade do que com sua própria segurança. “Ela sabia que quem matou o Binho estava por lá, estava perto da comunidade e nunca ficou quieta. Agora foi silenciada”, disse.

Mãe Bernadete atuava em uma região com alta concentração de quilombolas. Salvador foi identificada pelo Censo Quilombola do IBGE como a capital com maior população quilombola do país.

São quase 16 mil quilombolas e apenas cinco quilombos registrados oficialmente. É também a região do País com maior concentração de terreiros de Umbanda. De acordo com o Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), são 1.165 terreiros cadastrados apenas na capital baiana.

A cidade de Simões Filho, onde o crime aconteceu, foi apontada como a terceira mais violenta do Brasil, segundo dados de 2022 divulgados no mês passado pelo Fórum Brasileiro de Segurança. O indicador de homicídios chegou a 87,4 por 100 mil pessoas. O Estado da Bahia tem um total de 12 cidades entre as 50 mais violentas do País.

A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos, executada a tiros, na noite desta quinta-feira, 17, em Simões Filho, na Bahia, denunciou as ameaças que ela e outros membros da sua comunidade, Pitanga dos Palmares, sofriam durante encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, em julho deste ano. A reunião aconteceu na comunidade Quingoma, em Lauro de Freitas, na região metropolitana de Salvador.

Em seu discurso, Mãe Bernadete, como era conhecida, falou de sua luta pelo esclarecimento da morte do filho, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, assassinado em 2017 por homens armados, e contou que também estava sendo ameaçada.

“Para a senhora ter uma ideia, até hoje não sei o resultado do assassinato do meu filho. Abalou todo mundo. Foi no mesmo período em que aconteceu a morte de Marielle (Franco, vereadora assassinada no Rio). Inclusive, eu fui em diversos encontros com a mãe de Marielle. É injusto. Recentemente perdi outro amigo e uma amiga em quilombo. É o que nós recebemos: ameaças, principalmente de fazendeiros, de pessoas da região”, disse, dirigindo-se à ministra.

Ministra Rosa Weber esteve em quilombo em julho Foto: Fellipe Sampaio/CNJ

Ela relatou ainda que estava sob vigilância, o que não impediu que fosse assassinada. “Hoje eu vivo assim, eu não posso sair que estou sendo revistada. Minha casa toda cheia de câmeras, me sinto até mal, mas é o que acontece”, disse, na ocasião.

Em nota divulgada nesta sexta-feira, a ministra Rosa Weber disse lamentar profundamente a morte. “Mãe Bernadete, que me falou pessoalmente sobre a violência a que os quilombolas estão expostos e revelou a dor de perder seu filho com 14 tiros dentro da comunidade, foi morta em circunstâncias ainda inexplicadas”, disse a ministra.

As autoridades locais devem adotar providências para o urgente esclarecimento e reparação do acontecido, destacou Rosa Weber, “a fim de que sejam responsabilizados aqueles que patrocinaram o covarde enredo e imediatamente protegidos os familiares de Mãe Bernadete e outras lideranças locais”.

“É absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras. Assim como é direito de todos os brasileiros, os quilombolas precisam viver em paz e ter seus direitos individuais respeitados”, acrescentou.

Em nota publicada no Twitter, o presidente Lula manifestou pesar. “O governo federal, por meio dos ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, mandou representantes e aguardamos a investigação rigorosa do caso. Meus sentimentos aos familiares e amigos de Mãe Bernadete.”

A Polícia Federal vai investigar o assassinato da líder quilombola. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia, o trabalho será conjunto. A polícia trabalha na identificação de dois homens suspeitos de efetuar os disparos.

Segundo a delegada Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), os dois homens entraram na casa usando capacetes para dificultar o reconhecimento. Eles teriam recolhido os celulares da vítima e dos netos que estavam na casa.

Nesta sexta-feira, foram feitas diligências para recolher imagens de câmeras instaladas no terreiro e nas imediações. O objetivo é traçar um possível trajeto percorrido pelos criminosos, que chegaram ao local em motocicletas.

Também nesta sexta-feira, o secretário de Segurança Pública da Bahia, Marcelo Werner, se reuniu com representantes do governo federal, na sede da secretaria, em Salvador, para discutir as medidas de proteção à comunidade quilombola. Participaram do encontro o secretário nacional de Políticas para os Quilombolas, Ronaldo Santos, e representantes dos ministérios de Desenvolvimento Agrário, e de Igualdade Racial.

Levantamento da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) aponta que 11 quilombolas, incluindo Mãe Bernadete, foram assassinados na Bahia desde 2017. Um dos casos é o do filho de Bernardete, Fábio Gabriel Pacífico dos Santos, assassinado no mesmo quilombo.

Mãe Bernadete era conhecida pela defesa da cultura quilombola

A ialorixá (mãe de santo na umbanda) foi também secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no município de Simões Filho, onde fica sua casa de cultos (terreiro), durante a gestão do prefeito Eduardo Alencar (PSD), entre 2009 e 2016. Em 2017, ela recebeu o título de cidadã de Simões Filho concedido pela Câmara de Vereadores.

Mãe Bernadete, liderança quilombola, foi morta a tiros na região metropolitana de Salvador nesta quinta-feira, 17. Foto: Conaq/Divulgação

Atualmente ela estava à frente da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), uma das entidades de maior prestígio entre os quilombolas no País. Mãe Bernadete também era conhecida pela defesa da cultura popular quilombola.

De acordo com o filho Wellington Pacífico, a mãe era uma pessoa acolhedora e, no momento em que foi dominada pelos criminosos, estava acompanhada dos netos que costumavam frequentar e dormir em sua casa.

Segundo ele, a mãe ‘incomodava gente poderosa’, envolvida na morte do Binho. “É um crime de mando, são as mesmas pessoas. Se o governo, a polícia, a Justiça quiserem resolver esse crime está fácil. A casa tem câmeras”, disse, em entrevista. “Se a Justiça quiser resolver, ela resolve. Eu sei que sou o próximo alvo. Mas eu não tenho medo. Vou continuar lutando pelos meus direitos, porque quilombola é resistência”, disse.

Aém de ter expressão nacional no meio quilombola, Bernadete era uma liderança muito presente no quilombo Pitanga dos Palmares.

Ela era a responsável por uma associação de mais de 120 agricultores que produziam frutas, como abacaxi, banana da terra e maracujá, inhame e tubérculos usados na fabricação da farinha para vatapá.

No total, 290 famílias vivem na comunidade, com área de 854 hectares. O quilombo foi certificado em 2004 pela Fundação Cultural Palmares, mas ainda não teve o processo de titulação concluído.

A líder lutava também pela regularização dos territórios quilombolas. Em agosto de 2019, ela assinou com outras lideranças do Estado da Bahia uma carta dirigida aos governos estadual e federal e ao Congresso Nacional, cobrando a garantia dos direitos territoriais de 18 comunidades remanescentes de quilombo na Bahia.

‘Foi silenciada’

Denildo Rodrigues, da Conaq, disse que Bernadete se preocupava mais com a segurança da comunidade do que com sua própria segurança. “Ela sabia que quem matou o Binho estava por lá, estava perto da comunidade e nunca ficou quieta. Agora foi silenciada”, disse.

Mãe Bernadete atuava em uma região com alta concentração de quilombolas. Salvador foi identificada pelo Censo Quilombola do IBGE como a capital com maior população quilombola do país.

São quase 16 mil quilombolas e apenas cinco quilombos registrados oficialmente. É também a região do País com maior concentração de terreiros de Umbanda. De acordo com o Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), são 1.165 terreiros cadastrados apenas na capital baiana.

A cidade de Simões Filho, onde o crime aconteceu, foi apontada como a terceira mais violenta do Brasil, segundo dados de 2022 divulgados no mês passado pelo Fórum Brasileiro de Segurança. O indicador de homicídios chegou a 87,4 por 100 mil pessoas. O Estado da Bahia tem um total de 12 cidades entre as 50 mais violentas do País.

A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos, executada a tiros, na noite desta quinta-feira, 17, em Simões Filho, na Bahia, denunciou as ameaças que ela e outros membros da sua comunidade, Pitanga dos Palmares, sofriam durante encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, em julho deste ano. A reunião aconteceu na comunidade Quingoma, em Lauro de Freitas, na região metropolitana de Salvador.

Em seu discurso, Mãe Bernadete, como era conhecida, falou de sua luta pelo esclarecimento da morte do filho, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, assassinado em 2017 por homens armados, e contou que também estava sendo ameaçada.

“Para a senhora ter uma ideia, até hoje não sei o resultado do assassinato do meu filho. Abalou todo mundo. Foi no mesmo período em que aconteceu a morte de Marielle (Franco, vereadora assassinada no Rio). Inclusive, eu fui em diversos encontros com a mãe de Marielle. É injusto. Recentemente perdi outro amigo e uma amiga em quilombo. É o que nós recebemos: ameaças, principalmente de fazendeiros, de pessoas da região”, disse, dirigindo-se à ministra.

Ministra Rosa Weber esteve em quilombo em julho Foto: Fellipe Sampaio/CNJ

Ela relatou ainda que estava sob vigilância, o que não impediu que fosse assassinada. “Hoje eu vivo assim, eu não posso sair que estou sendo revistada. Minha casa toda cheia de câmeras, me sinto até mal, mas é o que acontece”, disse, na ocasião.

Em nota divulgada nesta sexta-feira, a ministra Rosa Weber disse lamentar profundamente a morte. “Mãe Bernadete, que me falou pessoalmente sobre a violência a que os quilombolas estão expostos e revelou a dor de perder seu filho com 14 tiros dentro da comunidade, foi morta em circunstâncias ainda inexplicadas”, disse a ministra.

As autoridades locais devem adotar providências para o urgente esclarecimento e reparação do acontecido, destacou Rosa Weber, “a fim de que sejam responsabilizados aqueles que patrocinaram o covarde enredo e imediatamente protegidos os familiares de Mãe Bernadete e outras lideranças locais”.

“É absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras. Assim como é direito de todos os brasileiros, os quilombolas precisam viver em paz e ter seus direitos individuais respeitados”, acrescentou.

Em nota publicada no Twitter, o presidente Lula manifestou pesar. “O governo federal, por meio dos ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, mandou representantes e aguardamos a investigação rigorosa do caso. Meus sentimentos aos familiares e amigos de Mãe Bernadete.”

A Polícia Federal vai investigar o assassinato da líder quilombola. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia, o trabalho será conjunto. A polícia trabalha na identificação de dois homens suspeitos de efetuar os disparos.

Segundo a delegada Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), os dois homens entraram na casa usando capacetes para dificultar o reconhecimento. Eles teriam recolhido os celulares da vítima e dos netos que estavam na casa.

Nesta sexta-feira, foram feitas diligências para recolher imagens de câmeras instaladas no terreiro e nas imediações. O objetivo é traçar um possível trajeto percorrido pelos criminosos, que chegaram ao local em motocicletas.

Também nesta sexta-feira, o secretário de Segurança Pública da Bahia, Marcelo Werner, se reuniu com representantes do governo federal, na sede da secretaria, em Salvador, para discutir as medidas de proteção à comunidade quilombola. Participaram do encontro o secretário nacional de Políticas para os Quilombolas, Ronaldo Santos, e representantes dos ministérios de Desenvolvimento Agrário, e de Igualdade Racial.

Levantamento da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) aponta que 11 quilombolas, incluindo Mãe Bernadete, foram assassinados na Bahia desde 2017. Um dos casos é o do filho de Bernardete, Fábio Gabriel Pacífico dos Santos, assassinado no mesmo quilombo.

Mãe Bernadete era conhecida pela defesa da cultura quilombola

A ialorixá (mãe de santo na umbanda) foi também secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no município de Simões Filho, onde fica sua casa de cultos (terreiro), durante a gestão do prefeito Eduardo Alencar (PSD), entre 2009 e 2016. Em 2017, ela recebeu o título de cidadã de Simões Filho concedido pela Câmara de Vereadores.

Mãe Bernadete, liderança quilombola, foi morta a tiros na região metropolitana de Salvador nesta quinta-feira, 17. Foto: Conaq/Divulgação

Atualmente ela estava à frente da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), uma das entidades de maior prestígio entre os quilombolas no País. Mãe Bernadete também era conhecida pela defesa da cultura popular quilombola.

De acordo com o filho Wellington Pacífico, a mãe era uma pessoa acolhedora e, no momento em que foi dominada pelos criminosos, estava acompanhada dos netos que costumavam frequentar e dormir em sua casa.

Segundo ele, a mãe ‘incomodava gente poderosa’, envolvida na morte do Binho. “É um crime de mando, são as mesmas pessoas. Se o governo, a polícia, a Justiça quiserem resolver esse crime está fácil. A casa tem câmeras”, disse, em entrevista. “Se a Justiça quiser resolver, ela resolve. Eu sei que sou o próximo alvo. Mas eu não tenho medo. Vou continuar lutando pelos meus direitos, porque quilombola é resistência”, disse.

Aém de ter expressão nacional no meio quilombola, Bernadete era uma liderança muito presente no quilombo Pitanga dos Palmares.

Ela era a responsável por uma associação de mais de 120 agricultores que produziam frutas, como abacaxi, banana da terra e maracujá, inhame e tubérculos usados na fabricação da farinha para vatapá.

No total, 290 famílias vivem na comunidade, com área de 854 hectares. O quilombo foi certificado em 2004 pela Fundação Cultural Palmares, mas ainda não teve o processo de titulação concluído.

A líder lutava também pela regularização dos territórios quilombolas. Em agosto de 2019, ela assinou com outras lideranças do Estado da Bahia uma carta dirigida aos governos estadual e federal e ao Congresso Nacional, cobrando a garantia dos direitos territoriais de 18 comunidades remanescentes de quilombo na Bahia.

‘Foi silenciada’

Denildo Rodrigues, da Conaq, disse que Bernadete se preocupava mais com a segurança da comunidade do que com sua própria segurança. “Ela sabia que quem matou o Binho estava por lá, estava perto da comunidade e nunca ficou quieta. Agora foi silenciada”, disse.

Mãe Bernadete atuava em uma região com alta concentração de quilombolas. Salvador foi identificada pelo Censo Quilombola do IBGE como a capital com maior população quilombola do país.

São quase 16 mil quilombolas e apenas cinco quilombos registrados oficialmente. É também a região do País com maior concentração de terreiros de Umbanda. De acordo com o Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), são 1.165 terreiros cadastrados apenas na capital baiana.

A cidade de Simões Filho, onde o crime aconteceu, foi apontada como a terceira mais violenta do Brasil, segundo dados de 2022 divulgados no mês passado pelo Fórum Brasileiro de Segurança. O indicador de homicídios chegou a 87,4 por 100 mil pessoas. O Estado da Bahia tem um total de 12 cidades entre as 50 mais violentas do País.

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