A manobra contábil feita pelo governo para cumprir a meta de superávit de 2012 deteriora a política fiscal, mina a credibilidade da política econômica e levanta suspeitas de que esses artifícios possam ser usados também em 2013, avaliam especialistas consultados pela Reuters. Nos últimos dias, o governo publicou uma série de medidas de triangulação financeira, envolvendo o Fundo Soberano, o Fundo Fiscal de Investimento e Estabilização (FFIE), a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para engordar o caixa do Tesouro em 19,4 bilhões de reais em dezembro. Essas operações, publicadas no Diário Oficial da União desde a semana passada e algumas com data retroativa a 31 de dezembro de 2012, são legais, mas não são legítimas, avalia o economista-chefe da SulAmérica, Newton Rosa. Para ele, o governo deveria assumir que teve que adotar uma política fiscal expansionista no ano passado, devido a desaceleração econômica, e que por isso não deverá cumprir a meta de superávit primário de 139,8 bilhões de reais. "O governo está usando artifícios (contábeis) para buscar um número melhor para o superávit, mais próximo da meta. Mas isso não esconde a deterioração da política fiscal", disse Rosa. Dos 19,4 bilhões de reais em receita adicional que entrará nas conta em dezembro, 12,4 bilhões de reais saíram do FFIE e foram repassados ao Fundo Soberano, informou à Reuters uma fonte do Ministério da Fazenda. Além desse montante, o Tesouro recebeu 4,7 bilhões em dividendos pagos pela Caixa e mais 2,3 bilhões de reais em dividendos pagos pelo BNDES. Dos 12,4 bilhões sacados do FFIE, 8,8 bilhões de reais referem-se ao resgate de títulos que o fundo recebeu do BNDES em pagamento pela venda de ações da Petrobras. O restante, 3,6 bilhões de reais, eram recursos que o FFIE possuía. Simultaneamente a essas operações, o Tesouro repassou 5,4 bilhões de reais em ações de empresas à Caixa. E também transferiu 15 bilhões de reais em títulos federais ao BNDES, recursos esses que fazem parte do aporte de 45 bilhões de reais acertado em 2012 e que somente deveriam ser repassados em 2013. Apesar de ajudar o governo a cumprir a meta de superávit primário, essas manobras elevam a dívida bruta do governo federal. "A dívida líquida está em trajetória de queda, mas a dívida bruta tem crescido fortemente desde 2008 devido à política do governo de capitalizar os bancos públicos", disse Rafael Bistafa, economista da Rosenberg Associados. "O uso de mecanismos contábeis é a pior maneira de se fazer superávit", acrescentou ele. Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima, o governo fez a escolha certa. "O governo se defrontou com a situação de que não iria cumprir o primário cheio e entre ser criticado por não cumprir a meta e ser criticado por cumpri-la com artifício contábil preferiu essa última opção", disse. "Do ponto de vista conceitual essa solução é a melhor porque o Fundo Soberano é uma receita primária", acrescentou. No acumulado do ano de 2012 até novembro, a economia fiscal do setor público consolidado foi de 82,7 bilhões de reais, o que significa que será necessário realizar um superávit de 31,5 bilhões de reais em dezembro para cumprir a meta, já descontados 25,6 bilhões de reais em investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Por conta da economia menor do governo, o déficit nominal, que inclui o pagamento dos juros da dívida, do setor público está crescendo, apesar da queda na taxa de juros. Nos 11 primeiros meses do ano passado, o déficit nominal ficou em 112,1 bilhões de reais, ou 2,79 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), ante 2,36 por cento do PIB em igual período de 2011. A elevação ocorreu mesmo diante da queda de 10 por cento na despesa com juros entre janeiro e novembro de 2012 em comparação a igual período do ano anterior. "O superávit primário menor está ofuscando o efeito da redução da despesa com juros (da dívida pública) ocorrido com a queda da taxa Selic. O resultado é que estamos com déficit nominal elevado", disse Newton Rosa. "Isso pode se repetir em 2013 se a atividade mostrar um ritmo aquém ao desejado", complementou. Para Lima, a dificuldade do governo em cumprir a meta de superávit cheia em 2012 deve se repetir também em 2013 diante das incertezas que cercam a recuperação da economia brasileira.
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