Morador de região petroquímica tem incidência maior de doença na tireoide


Por Mariana Lenharo

O aparecimento de casos atípicos de tireoidite crônica autoimune no consultório da endocrinologista Maria Angela Zaccarelli-Marino, em Santo André, fez a especialista desconfiar que a incidência da doença era mais alta na região próxima ao Polo Petroquímico de Capuava. Depois de 15 anos investigando o tema, a professora da Faculdade de Medicina do ABC concluiu que moradores da área tinham incidência cinco vezes maior da doença.O complexo, que fica na divisa entre Santo André, Mauá e São Paulo, reúne 14 indústrias que fabricam subprodutos de petróleo. De 1989 a 2004, a pesquisadora selecionou 6.306 pacientes que buscaram avaliação endocrinológica em seu consultório. Ela os dividiu em dois grupos conforme a região de residência. O primeiro, com 3.356 pacientes, era proveniente dos arredores do Polo Petroquímico. Já o segundo, de 2.950 pacientes, vinha de outra área industrial distante 8,5 km da primeira região, porém sem a presença de petroquímicas. Ao fim do estudo, 905 pacientes do primeiro grupo (ou 26,9%) foram diagnosticados com a doença. Já no segundo grupo, 173 (ou 5,1%) tiveram o diagnóstico. A tireoidite crônica autoimune é a principal causa de hipotireoidismo. Os resultados foram publicados em maio na revista científica Journal of Clinical Immunology. Ao longo do estudo, a pesquisadora fez notificações sobre a situação às secretarias municipais de saúde e ao Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria Estadual da Saúde.A pedido do promotor de Meio Ambiente de Santo André José Luiz Saikali, o CVE fez um estudo próprio para verificar o problema. O órgão analisou 1.533 voluntários das duas regiões. Enquanto 9,3% do primeiro grupo tinha tireoidite, apenas 3,9% do segundo grupo apresentava o problema. Os dados foram publicados na revista Environmental Research.Além dos exames que já estavam presentes no estudo de Maria Angela, o CVE fez testes para dosar o iodo nesses voluntários. Havia a possibilidade de o aumento de casos da doença estar ligado a um consumo maior de iodo. "O CVE constatou que não era o iodo. Isso me deu uma certa tranquilidade, pois o estudo foi muito contestado", diz Maria Angela."Ninguém havia falado antes em tireoidite crônica autoimune provocada pelo ambiente. Sugiro uma nova denominação: tireoidite química autoimune", afirma a pesquisadora, que agora está iniciando um trabalho para identificar quais seriam os agentes químicos que desencadeariam a doença. Para o imunologista Eduardo Finger, que tem pós-doutorado na área pela Escola de Medicina de Harvard e é chefe do departamento de pesquisa do SalomãoZoppi Diagnósticos, ainda é preciso determinar o que provoca a doença. "É preciso encontrar o poluente químico que tenha relação comprovada com a doença."Consequências. A tireoidite crônica autoimune só começa a dar sintomas quando se instala o hipotireoidismo, diminuição da produção dos hormônios da tireoide. Os sinais são sonolência, queda de cabelo, pele seca, batimentos cardíacos mais lentos. Crianças podem parar de crescer e até desenvolver retardo mental. O tratamento, porém, é simples e envolve a reposição diária do hormônio tireoidiano. A profissional de informática Noemi Lucena Silva, de 21 anos, descobriu a doença aos 9 anos. Ela mora ao lado de uma das indústrias petroquímicas. "Minha casa é literalmente ao lado da fábrica." Recentemente, a mãe de Noemi também foi diagnosticada com problemas na tireoide.Procurada pela reportagem, a Petrobras não comentou as conclusões do estudo.As irmãs Gilda Buccini Martins, de 58 anos, e Sueli Buccini de Oliveira, de 52, moram lado a lado em casas geminadas no Jardim Santo Alberto, em Santo André, próximo ao Polo Petroquímico de Capuava. As duas são vítimas da poluição do entorno.Gilda descobriu que tinha tireoidite crônica autoimune aos 50 anos. Sueli descobriu a doença com a mesma idade. No caso da filha de Sueli, de apenas 23 anos, a doença se manifestou mais cedo: há menos de um mês, ela teve de se submeter a uma operação para retirar um nódulo da tireoide. Cansaço. Gilda conta que começou a se perceber mais cansada, com o cabelo mais fino e a pele seca, mas atribuía tudo à menopausa. Foi quando sua ginecologista pediu uma série de exames e percebeu a alteração da tireoide em um deles."Ficava encafifada, queria saber qual era a razão desse problema, queria saber de onde veio essa doença. Foi quando descobri que estavam fazendo uma pesquisa por aqui que relacionava o problema com a poluição."A dona de casa relata que, por causa da indústria, o quintal sempre fica cheio de pó preto. "Às vezes, ela solta labaredas altas. Sai uma fumaça bem preta, depois começa a ficar cinza claro. A gente não consegue nem respirar direito. Mas eu não vou me mudar daqui. Quando você constrói a sua casa, constrói com amor e carinho."O diagnóstico da auxiliar de enfermagem Nadia Fachini, de 56 anos, veio quando ela tinha 44. Ela resolveu ir ao médico porque estava obesa. "A gente sempre teve medo dessa poluição. Tem dias em que começa a cair espuma do céu. Quando passamos mais perto, ficamos com o nariz ardendo", diz. Hoje ela faz tratamento com hormônio e controla com exames a cada três meses. / M.L.

O aparecimento de casos atípicos de tireoidite crônica autoimune no consultório da endocrinologista Maria Angela Zaccarelli-Marino, em Santo André, fez a especialista desconfiar que a incidência da doença era mais alta na região próxima ao Polo Petroquímico de Capuava. Depois de 15 anos investigando o tema, a professora da Faculdade de Medicina do ABC concluiu que moradores da área tinham incidência cinco vezes maior da doença.O complexo, que fica na divisa entre Santo André, Mauá e São Paulo, reúne 14 indústrias que fabricam subprodutos de petróleo. De 1989 a 2004, a pesquisadora selecionou 6.306 pacientes que buscaram avaliação endocrinológica em seu consultório. Ela os dividiu em dois grupos conforme a região de residência. O primeiro, com 3.356 pacientes, era proveniente dos arredores do Polo Petroquímico. Já o segundo, de 2.950 pacientes, vinha de outra área industrial distante 8,5 km da primeira região, porém sem a presença de petroquímicas. Ao fim do estudo, 905 pacientes do primeiro grupo (ou 26,9%) foram diagnosticados com a doença. Já no segundo grupo, 173 (ou 5,1%) tiveram o diagnóstico. A tireoidite crônica autoimune é a principal causa de hipotireoidismo. Os resultados foram publicados em maio na revista científica Journal of Clinical Immunology. Ao longo do estudo, a pesquisadora fez notificações sobre a situação às secretarias municipais de saúde e ao Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria Estadual da Saúde.A pedido do promotor de Meio Ambiente de Santo André José Luiz Saikali, o CVE fez um estudo próprio para verificar o problema. O órgão analisou 1.533 voluntários das duas regiões. Enquanto 9,3% do primeiro grupo tinha tireoidite, apenas 3,9% do segundo grupo apresentava o problema. Os dados foram publicados na revista Environmental Research.Além dos exames que já estavam presentes no estudo de Maria Angela, o CVE fez testes para dosar o iodo nesses voluntários. Havia a possibilidade de o aumento de casos da doença estar ligado a um consumo maior de iodo. "O CVE constatou que não era o iodo. Isso me deu uma certa tranquilidade, pois o estudo foi muito contestado", diz Maria Angela."Ninguém havia falado antes em tireoidite crônica autoimune provocada pelo ambiente. Sugiro uma nova denominação: tireoidite química autoimune", afirma a pesquisadora, que agora está iniciando um trabalho para identificar quais seriam os agentes químicos que desencadeariam a doença. Para o imunologista Eduardo Finger, que tem pós-doutorado na área pela Escola de Medicina de Harvard e é chefe do departamento de pesquisa do SalomãoZoppi Diagnósticos, ainda é preciso determinar o que provoca a doença. "É preciso encontrar o poluente químico que tenha relação comprovada com a doença."Consequências. A tireoidite crônica autoimune só começa a dar sintomas quando se instala o hipotireoidismo, diminuição da produção dos hormônios da tireoide. Os sinais são sonolência, queda de cabelo, pele seca, batimentos cardíacos mais lentos. Crianças podem parar de crescer e até desenvolver retardo mental. O tratamento, porém, é simples e envolve a reposição diária do hormônio tireoidiano. A profissional de informática Noemi Lucena Silva, de 21 anos, descobriu a doença aos 9 anos. Ela mora ao lado de uma das indústrias petroquímicas. "Minha casa é literalmente ao lado da fábrica." Recentemente, a mãe de Noemi também foi diagnosticada com problemas na tireoide.Procurada pela reportagem, a Petrobras não comentou as conclusões do estudo.As irmãs Gilda Buccini Martins, de 58 anos, e Sueli Buccini de Oliveira, de 52, moram lado a lado em casas geminadas no Jardim Santo Alberto, em Santo André, próximo ao Polo Petroquímico de Capuava. As duas são vítimas da poluição do entorno.Gilda descobriu que tinha tireoidite crônica autoimune aos 50 anos. Sueli descobriu a doença com a mesma idade. No caso da filha de Sueli, de apenas 23 anos, a doença se manifestou mais cedo: há menos de um mês, ela teve de se submeter a uma operação para retirar um nódulo da tireoide. Cansaço. Gilda conta que começou a se perceber mais cansada, com o cabelo mais fino e a pele seca, mas atribuía tudo à menopausa. Foi quando sua ginecologista pediu uma série de exames e percebeu a alteração da tireoide em um deles."Ficava encafifada, queria saber qual era a razão desse problema, queria saber de onde veio essa doença. Foi quando descobri que estavam fazendo uma pesquisa por aqui que relacionava o problema com a poluição."A dona de casa relata que, por causa da indústria, o quintal sempre fica cheio de pó preto. "Às vezes, ela solta labaredas altas. Sai uma fumaça bem preta, depois começa a ficar cinza claro. A gente não consegue nem respirar direito. Mas eu não vou me mudar daqui. Quando você constrói a sua casa, constrói com amor e carinho."O diagnóstico da auxiliar de enfermagem Nadia Fachini, de 56 anos, veio quando ela tinha 44. Ela resolveu ir ao médico porque estava obesa. "A gente sempre teve medo dessa poluição. Tem dias em que começa a cair espuma do céu. Quando passamos mais perto, ficamos com o nariz ardendo", diz. Hoje ela faz tratamento com hormônio e controla com exames a cada três meses. / M.L.

O aparecimento de casos atípicos de tireoidite crônica autoimune no consultório da endocrinologista Maria Angela Zaccarelli-Marino, em Santo André, fez a especialista desconfiar que a incidência da doença era mais alta na região próxima ao Polo Petroquímico de Capuava. Depois de 15 anos investigando o tema, a professora da Faculdade de Medicina do ABC concluiu que moradores da área tinham incidência cinco vezes maior da doença.O complexo, que fica na divisa entre Santo André, Mauá e São Paulo, reúne 14 indústrias que fabricam subprodutos de petróleo. De 1989 a 2004, a pesquisadora selecionou 6.306 pacientes que buscaram avaliação endocrinológica em seu consultório. Ela os dividiu em dois grupos conforme a região de residência. O primeiro, com 3.356 pacientes, era proveniente dos arredores do Polo Petroquímico. Já o segundo, de 2.950 pacientes, vinha de outra área industrial distante 8,5 km da primeira região, porém sem a presença de petroquímicas. Ao fim do estudo, 905 pacientes do primeiro grupo (ou 26,9%) foram diagnosticados com a doença. Já no segundo grupo, 173 (ou 5,1%) tiveram o diagnóstico. A tireoidite crônica autoimune é a principal causa de hipotireoidismo. Os resultados foram publicados em maio na revista científica Journal of Clinical Immunology. Ao longo do estudo, a pesquisadora fez notificações sobre a situação às secretarias municipais de saúde e ao Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria Estadual da Saúde.A pedido do promotor de Meio Ambiente de Santo André José Luiz Saikali, o CVE fez um estudo próprio para verificar o problema. O órgão analisou 1.533 voluntários das duas regiões. Enquanto 9,3% do primeiro grupo tinha tireoidite, apenas 3,9% do segundo grupo apresentava o problema. Os dados foram publicados na revista Environmental Research.Além dos exames que já estavam presentes no estudo de Maria Angela, o CVE fez testes para dosar o iodo nesses voluntários. Havia a possibilidade de o aumento de casos da doença estar ligado a um consumo maior de iodo. "O CVE constatou que não era o iodo. Isso me deu uma certa tranquilidade, pois o estudo foi muito contestado", diz Maria Angela."Ninguém havia falado antes em tireoidite crônica autoimune provocada pelo ambiente. Sugiro uma nova denominação: tireoidite química autoimune", afirma a pesquisadora, que agora está iniciando um trabalho para identificar quais seriam os agentes químicos que desencadeariam a doença. Para o imunologista Eduardo Finger, que tem pós-doutorado na área pela Escola de Medicina de Harvard e é chefe do departamento de pesquisa do SalomãoZoppi Diagnósticos, ainda é preciso determinar o que provoca a doença. "É preciso encontrar o poluente químico que tenha relação comprovada com a doença."Consequências. A tireoidite crônica autoimune só começa a dar sintomas quando se instala o hipotireoidismo, diminuição da produção dos hormônios da tireoide. Os sinais são sonolência, queda de cabelo, pele seca, batimentos cardíacos mais lentos. Crianças podem parar de crescer e até desenvolver retardo mental. O tratamento, porém, é simples e envolve a reposição diária do hormônio tireoidiano. A profissional de informática Noemi Lucena Silva, de 21 anos, descobriu a doença aos 9 anos. Ela mora ao lado de uma das indústrias petroquímicas. "Minha casa é literalmente ao lado da fábrica." Recentemente, a mãe de Noemi também foi diagnosticada com problemas na tireoide.Procurada pela reportagem, a Petrobras não comentou as conclusões do estudo.As irmãs Gilda Buccini Martins, de 58 anos, e Sueli Buccini de Oliveira, de 52, moram lado a lado em casas geminadas no Jardim Santo Alberto, em Santo André, próximo ao Polo Petroquímico de Capuava. As duas são vítimas da poluição do entorno.Gilda descobriu que tinha tireoidite crônica autoimune aos 50 anos. Sueli descobriu a doença com a mesma idade. No caso da filha de Sueli, de apenas 23 anos, a doença se manifestou mais cedo: há menos de um mês, ela teve de se submeter a uma operação para retirar um nódulo da tireoide. Cansaço. Gilda conta que começou a se perceber mais cansada, com o cabelo mais fino e a pele seca, mas atribuía tudo à menopausa. Foi quando sua ginecologista pediu uma série de exames e percebeu a alteração da tireoide em um deles."Ficava encafifada, queria saber qual era a razão desse problema, queria saber de onde veio essa doença. Foi quando descobri que estavam fazendo uma pesquisa por aqui que relacionava o problema com a poluição."A dona de casa relata que, por causa da indústria, o quintal sempre fica cheio de pó preto. "Às vezes, ela solta labaredas altas. Sai uma fumaça bem preta, depois começa a ficar cinza claro. A gente não consegue nem respirar direito. Mas eu não vou me mudar daqui. Quando você constrói a sua casa, constrói com amor e carinho."O diagnóstico da auxiliar de enfermagem Nadia Fachini, de 56 anos, veio quando ela tinha 44. Ela resolveu ir ao médico porque estava obesa. "A gente sempre teve medo dessa poluição. Tem dias em que começa a cair espuma do céu. Quando passamos mais perto, ficamos com o nariz ardendo", diz. Hoje ela faz tratamento com hormônio e controla com exames a cada três meses. / M.L.

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