O Ministério Público Federal ingressou com uma ação na Justiça Federal para obrigar a Fundação Nacional do Índio (Funai) a fazer o sepultamento do indígena Tanaru, conhecido como “índio do buraco”, que morreu há dois meses e cujo corpo ainda não foi enterrado. A Funai foi intimada a se manifestar no prazo de 48 horas, a partir do pedido liminar de terça-feira, 25. O prazo vence nesta quinta-feira, 27.
O “índio do buraco”, um homem de idade, língua e costumes desconhecidos, era o último sobrevivente de um grupo étnico envenenado e fuzilado por grileiros e madeireiros. Ele foi encontrado morto em sua palhoça, dentro de sua rede de dormir, no dia 23 de agosto, já em estado de putrefação, indicando que a morte pode ter ocorrido cerca de um mês antes. Desde então, começaram os impasses sobre o sepultamento.
Na ação ação civil pública, o MPF ressalta que é “direito fundamental a dignidade e a memória do indígena morto, bem como de seu povo, dos povos indígenas de Rondônia e do Brasil, e também dos próprios servidores da Funai que o salvaram do extermínio e atuaram por décadas na sua proteção”. Segundo os procuradores, esse direito está sendo aviltado pela demora excessiva e desnecessária para a realização do funeral.
Entenda o caso
Inicialmente, o corpo foi levado para Vilhena, cidade a 50 quilômetros do local onde foi encontrado, no Estado de Rondônia. Depois, foi transportado num avião da FAB para Brasília. Na capital federal, passou por exames no Instituto de Criminalística. Um mês depois, retornou ao território rondoniense.
Agora, está na sede da Polícia Federal em Vilhena. De acordo com o MPF, a Funai local afirmou ter tomado providências para o funeral e a PF indicou que todas as amostras necessárias para a realização de exames e laudos já foram coletadas.
Dentre as características do “índio do buraco”, a de maior destaque era o hábito de escavar buracos em todas as suas habitações identificadas. Há 26 anos, o indígena era monitorado pela Frente de Proteção Etnoambiental Guaporé, da Funai, que registrou as habitações de palha ocupadas por ele durante esse tempo. Foram 53 casas, chamadas de “palhoças”, que seguiam o mesmo padrão arquitetônico: uma única porta de entrada e saída, e um buraco cavado no interior da casa.
O indígena foi encontrado sem vida pela equipe que o monitorava. Segundo o grupo, não foram identificados vestígios da presença de outras pessoas ou de violência. O “índio do buraco” estava deitado em sua rede, com “chapéu” na cabeça e penas de arara na nuca, revelando consciência e preparativos para a morte ou pós-morte.
Em meio à demora das autoridades em dar resposta sobre o sepultamento, a terra onde o isolado resistia voltou a despertar a cobiça externa. O indígena vivia no local sem aceitar contatos com órgãos oficiais, entidades civis ou mesmo xamãs de aldeias vizinhas.
Em 1998, um dos últimos trechos de floresta nas margens do Rio Tanaru foi reservado pela União exclusivamente para a sobrevivência do “índio do buraco”. O governo classificou o Território Tanaru, de 8.070 hectares, como área de restrição de uso, ou seja, para fins de estudos, demarcação e homologação. A mobilização agora é para garantir que o corpo possa ser enterrado nessa terra em que o indígena vivia e onde seus ancestrais foram mortos.