No vocabulário canadense, Montréal e gastronomia são palavras que andam juntas. Pensar em comida no Canadá traz logo à cabeça a cidade da província francesa de Quebec. E é falar em Montréal que já dá fome. Essa clara associação tem como explicação rápida a influência francesa sobre os hábitos dos québécois. Dados objetivos mostram que os moradores da cidade cultivam essa estreita relação com o paladar, com números que só reforçam isso. Quer ver só?
Para cada quilômetro quadrado, Montréal tem em torno de 75 restaurantes, com uma oferta de 120 diferentes tipos de cozinhas regionais e internacionais. Ao longo do ano, a cidade promove em torno de 20 eventos relacionados à gastronomia. Entre os principais estão MTL à Table (a restaurant week de Montréal, realizada em novembro) e Montréal en Lumière (celebração do inverno com música, arte e comida, em menus preparados por chefs, com harmonização de vinhos). Mas comer em Montréal não se restringe à alta gastronomia ou a restaurantes. Eu mostro isso aqui nesse roteiro por lugares onde já estive lá.
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Há muito a se provar pelas ruas dessa canadense francesa. Uma possibilidade de experimentar a comida e a cidade ao mesmo tempo. Mas, lembre-se, siga a tradição montrealer: desfrute do alimento. Ainda que seja um belisco, um sanduíche. Pare e aproveite. Depois caminhe mais um pouco até a próxima mordida. Com ou sem uma taça de vinho. De preferência, com um tinto ou rosé. Afinal, em Montréal, no inverno ou no verão, essa é sempre uma boa pedida.
Mercados de Montréal
Há 15 mercados públicos na cidade. Uma associação, a Marchés Publics de Montréal, reúne 250 participantes desses mercados, que oferecem produtos frescos, cultivados na província de Quebec. Tudo bem, você não vai cozinhar aspargos durante a viagem. Mas pode saborear crepes ou suculentas frutas vermelhas no Marché Jean-Talon, o mercado público que já é atração turística.
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Maior mercado da América do Norte, o Jean-Talon não se restringe às barracas, o que já seria motivo suficiente para você ir até lá. Os produtores apresentam boas possibilidades para beliscar algo ou levar para o hotel, como frutas secas (são vendidas em saquinhos) e milho cozido (de delicioso gosto adocicado). No entorno do mercado, a experiência segue por um saboroso comércio. Meu preferido é Le Marché des Saveurs du Québec, que vende apenas produtos da província de Quebec. Sempre compro alguma coisa aí, especialmente xarope de maple (procure por syrup d'erable, o nome dele em francês). Para mim, a província francesa de Quebec produz o melhor maple do Canadá.
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Também bato ponto na Première Moisson, para garantir uma baguete ou pão multigrãos. A padaria tem filiais por Montréal inteira, uma delas em outro mercado público da cidade, o Marché Atwater. Fora do circuito turístico, esse mercado é pequenino, mas muito funcional. Localizado no sul da ilha, tem uma área com comida preparada ali para um almoço rápido e um segundo andar com lojas. Eu me acabei no mercadinho que vende produtos naturebas, muitos sem glúten e sem lactose.
Food trucks na maior cidade francesa do Canadá
E, se o assunto é comida rápida, como aconteceu em toda grande cidade do mundo, os food trucks também cresceram muito em Montréal nos últimos quatro anos: de meia dúzia de opções em nove lugares no centro em 2013 (ano em que foi lançado um projeto da cidade dedicado a essas iniciativas de comida de rua) para cerca de 350 caminhões em 20 pontos da ilha, entre eles, o Vieux-Port, o porto velho da cidade, bem em frente à área turística que ferve no verão, tendo a Place Jacques-Cartier como epicentro.
O boom dos caminhões com tipos variados de comida, é claro, ocorre nos meses quentes, da primavera ao outono do Canadá, de abril a outubro. Por exemplo, na sua visita Parque Olímpico de Montréal, você pode aproveitar o evento First Fridays, entre maio e outubro: a cada primeira sexta do mês, das 16 às 23 horas, food trucks estacionam na esplanada do complexo. Mas é possível encontrar camions (para prestigiar o francês local) por lá durante o ano todo -- veja onde no site StreetFoodMTL.
Gastronomia em Montréal pelas ruas
Montréal tem ainda outras possibilidades para experimentar a cidade em pequenas mordidas. Bairro a bairro, é possível descobrir cafés ou pequenos estabelecimentos, para comer um lanche ou um doce, e seguir caminhando depois. Tem sempre uma vitrine com coisinhas deliciosas -- não saia da cidade sem comer algum doce com bleuet, como o mirtilo é chamado em francês. Eu adoro essa fartura da cidade e já percorri muitos desses caminhos. É, para mim, a maneira que me dá mais prazer de conhecer um pouco mais de Montréal a cada vez em que volto.
Na Vieux-Montréal, parte antiga da cidade, as vielas e ruas de pedra convidam a um passeio sem pressa. Você pode parar na Saint Paul e se sentar num dos ótimos restaurantes que se encontram entre as galerias de arte dessa rua. Mas pode seguir até a pontinha oeste dela e comer um panini ou algumas das delícias assadas do Olive & Gourmando, um charmoso lugar (mas que lota na hora do almoço, vale avisar).
Se a vontade for de algo mais fino, vá rumo à Basilique Notre-Dame de Montréal para alguns macarons. Perto da linda basílica da cidade fica o Europea Espace Boutique, um dos empreendimentos de Jérome Ferrer, Grand Chef Relais & Châteaux à frente de seu estrelado Europea, restaurante entre os 166 da associação Grandes Tables du Monde.
Durante o deslocamento entre a Vieux-Montréal e os bairros da cidade, experimente caminhar ao longo do Boulevard Saint Laurent e ir parando aqui e ali para provar algo. A rua corta a cidade, atravessando do Quartier Chinois (a Chinatown de lá) a Petite Italie (a Little Italy), região do Marché Jean-Talon.
Em seu caminho, vai topar com muitas opções. Uma delas é um clássico de Montréal: Schwartz's - La Charcuterie Hebraïque de Montréal. O salão é tão estreito que tive dúvida se chamava assim. O tamanho do lugar e o sucesso do sanduíche de carne defumada (com receita original de 1928) fazem formar filas enormes do lado de fora. É bom e barato, além de grandão. E um ícone entre os lanches consumidos, não apenas por turistas, mas por moradores da cidade.
Quer poutine no estilo walk-through? Passe pelo Montreal Pool Room. Eles botam a porção de batatas com pedaços de queijo e molho de carne, comida típica do Canadá, em embalagens para viagem. Não será a melhor poutine da sua vida, está mais para um estilo fast-food.
Eu prefiro sentar e apreciar a poutine com uma bebidinha, num bar ou restaurante. Nesse caso, siga até o descolado bairro Plateau Mont-Royal. Lá provei minha primeira poutine em 2010, no La Banquise, restaurante com uma infinidade de variações da receita. Também amei a poutine com carne defumada que comi no Frite Alors! do Plateau.
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Atenção: a área dos dois restaurantes já é bem distante do Boulevard Saint Laurent, mas você pode aproveitar para explorar o Plateau, bairro repleto de opções gastronômicas, assim como o vizinho Mile End.
Mile End, lugar de bares e música, também é um bom ponto para se começar o dia. Seja com uma mimosa e eggs benedict no brunch do Faberge ou com um do bagel de Montréal, outro clássico. No bairro, encontram-se a St-Viateu Bagel e a Fairmount Bagel. Elas não faziam parte do roteiro de Leonard Cohen em Montréal. O músico preferia outro lugar, em frente ao Parc du Portugal (região onde ele morava). Frequentava a Bagel Etc, no Plateau Mont-Royal, bem no Boulevard Saint Laurent, se a ideia for caminhar por essa rua no melhor estilo Walk-and-eat Montreal.
* Nathalia Molina é jornalista de viagem e especialista em Canadá. Também escreve o Como Viaja, com dicas e experiências no Brasil e no exterior. Acompanhe pelo instagram ComoViaja e pelo canal do Como Viaja no YouTube