Nova lei vai ajudar no combate ao bullying e à pornografia infantil? Veja o que dizem especialistas


Presidente Lula sancionou texto que inclui o crime de bullying e cyberbulleying no Código Penal

Por Giovanna Castro e Fabio Grellet
Atualização:

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta segunda-feira, 15, a lei que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Mas, na prática, como isso muda a dinâmica nas escolas e nas famílias? O Estadão escutou especialistas sobre o tema.

Segundo a nova norma sancionada pelo presidente, o bullying está tipificado como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. O cyberbullying é o mesmo ato, mas praticado em ambiente virtual.

O texto altera o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Projeto de Lei n° 4224, de 2021, já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no plenário do Senado Federal. A proposição é de autoria do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

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Lei anterior era considerada ineficaz por não determinar punição contra casos de violência praticada nas escolas Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 16/11/2017

Para a professora, pedagoga e bacharel em Direito Sônia Aranha, que é ativista de questões relacionadas ao Direito Educacional, a medida visa pressionar as escolas a, de fato, agirem contra o bullying. Segundo ela, a lei anterior sobre o assunto, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, se mostrou ineficaz por não determinar a punição contra casos de violência praticada nas escolas.

“Eu vejo com bons olhos essa criminalização do bullying. Você tem uma responsabilização do Poder Público local e isso contribui bastante. Nós temos um país enorme, com tantos municípios, e nos municípios menores, muitas vezes as crianças e os adolescentes ficam à mercê das escolas – que, até o momento, não conseguiram colocar em prática a proteção a esses jovens, em especial as escolas públicas”, afirma.

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Ainda de acordo com Sônia, em uma leitura inicial da lei, é possível entender que a maior responsabilidade deve cair sobre as instituições, por não combaterem o bullying ou não proporcionarem um ambiente seguro aos alunos. Não fica claro por enquanto, no entanto, se as próprias crianças e adolescentes ou seus pais e responsáveis podem ser punidos pelo crime.

“É algo que só no dia a dia, na aplicação da lei, nós vamos perceber se há problemas”, afirma Sônia. “Mas, infelizmente, só assim as escolas vão tomar atitude. Essa sofisticação, de estar no Código Penal, na lei de crimes hediondos e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), faz com que o combate ao bullying ganhe uma baita força. Agora, que é complicado estabelecer isso enquanto crime, sendo que os atos são cometidos por outras crianças e adolescentes, isso é evidente”, diz.

Para a especialista, quando a denúncia chegar, de fato, à esfera judicial, será necessário que os pais coletem provas por meio de prints de conversas com teor agressivo nas redes sociais, relatos da criança e, se possível, de outras pessoas que presenciaram o crime, e prova de que a escola foi comunicada e não agiu sobre isso.

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O texto sancionado por Lula também inclui quatro crimes praticados contra crianças e adolescentes no rol de crimes de hediondos, alterando a Lei 8.072, de 1990, que trata dessa tipificação. São eles:

  • Agenciar, facilitar, recrutar, coagir ou intermediar a participação de criança ou adolescente em imagens pornográficas;
  • Adquirir, possuir ou armazenar imagem pornográfica com criança ou adolescente;
  • Sequestrar ou manter em cárcere privado crianças e adolescentes;
  • Traficar pessoas menores de 18 anos.

Advogados e especialistas em Direito Penal elogiam a tipificação do crime de bullying e consideram que a medida tende a provocar uma mudança na postura das escolas e do Poder Público, aumentando a preocupação com o combate ao bullying, mas destacam que a punição restrita a multa pode ser irrisória e não gerar o efeito esperado.

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“A lei expressamente incluiu a comunidade escolar como corresponsável por estabelecer protocolos de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra qualquer forma de violência no âmbito escolar. Do ponto de vista de repressão, a nova lei facilita a comunicação dos fatos à polícia, porque agora tem exatamente o tipo penal a ser investigado. Outro aspecto é que a escola, ao identificar uma conduta, pode imediatamente comunicar o fato à polícia”, afirma o advogado criminalista Enzo Fachini, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas.

“Mas o legislador falha ao estabelecer pena de multa, primeiro porque ela é naturalmente branda – poderia ser ao menos prestação de serviços à comunidade –, e segundo porque os infratores podem ser menores de idade e que não terão renda para pagar multa. Também não tem como obrigar os pais a pagar a multa, porque a pena é intransferível, transferi-la seria inconstitucional. Por conta disso, a tipificação pode não trazer o resultado esperado”, conclui Fachini.

O advogado criminalista Rafael Paiva, especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, também faz essa crítica à pena de multa. “No que se refere à aplicação da lei em escolas, é fato notório que menores de idade são inimputáveis criminalmente, ou seja, não recebem as mesmas punições criminais de pessoas maiores de idade. No máximo pode haver algum tipo de responsabilização nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.

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“A tipificação como crime dos atos de perseguição sistêmica impacta diretamente na rotina das escolas e das famílias das vítimas de bullying, introduzindo medidas mais específicas e direcionadas para lidar com essa questão. É imperativo legal a implementação de políticas escolares mais proativas, programas de prevenção mais eficazes e processos disciplinares mais claros para abordar o bullying”, avalia a delegada de polícia Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e pós-graduada em Ciências Penais, Direito de Polícia Judiciária e Processo Penal.

O advogado criminalista Michel Kusminsky Herscu avalia que é difícil prever os efeitos práticos da nova lei. “As escolas devem tomar medidas mais efetivas para evitar o bullying, mas de resto é preciso esperar. Existem leis que geram efeitos concretos, como a proibição do cigarro, e outras que não causam consequências importantes, como a lei de drogas”. Para ele, uma ampla campanha de conscientização poderia ser mais efetiva.

Se para o bullying a pena estipulada foi apenas de multa, outra mudança prevista pela lei foi a duplicação da pena para o crime de indução ou instigação ao suicídio ou à automutilação, num caso específico. Além de ser tornado hediondo, esse crime terá a pena atual, de seis meses a dois anos de reclusão, duplicada quando o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou for responsável por algum destes. “As provas podem ser conversas no Whatsapp, gravações de áudio, ordens na internet, tudo o que permitir demonstrar a conduta”, afirma o advogado Fachini.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta segunda-feira, 15, a lei que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Mas, na prática, como isso muda a dinâmica nas escolas e nas famílias? O Estadão escutou especialistas sobre o tema.

Segundo a nova norma sancionada pelo presidente, o bullying está tipificado como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. O cyberbullying é o mesmo ato, mas praticado em ambiente virtual.

O texto altera o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Projeto de Lei n° 4224, de 2021, já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no plenário do Senado Federal. A proposição é de autoria do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

Lei anterior era considerada ineficaz por não determinar punição contra casos de violência praticada nas escolas Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 16/11/2017

Para a professora, pedagoga e bacharel em Direito Sônia Aranha, que é ativista de questões relacionadas ao Direito Educacional, a medida visa pressionar as escolas a, de fato, agirem contra o bullying. Segundo ela, a lei anterior sobre o assunto, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, se mostrou ineficaz por não determinar a punição contra casos de violência praticada nas escolas.

“Eu vejo com bons olhos essa criminalização do bullying. Você tem uma responsabilização do Poder Público local e isso contribui bastante. Nós temos um país enorme, com tantos municípios, e nos municípios menores, muitas vezes as crianças e os adolescentes ficam à mercê das escolas – que, até o momento, não conseguiram colocar em prática a proteção a esses jovens, em especial as escolas públicas”, afirma.

Ainda de acordo com Sônia, em uma leitura inicial da lei, é possível entender que a maior responsabilidade deve cair sobre as instituições, por não combaterem o bullying ou não proporcionarem um ambiente seguro aos alunos. Não fica claro por enquanto, no entanto, se as próprias crianças e adolescentes ou seus pais e responsáveis podem ser punidos pelo crime.

“É algo que só no dia a dia, na aplicação da lei, nós vamos perceber se há problemas”, afirma Sônia. “Mas, infelizmente, só assim as escolas vão tomar atitude. Essa sofisticação, de estar no Código Penal, na lei de crimes hediondos e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), faz com que o combate ao bullying ganhe uma baita força. Agora, que é complicado estabelecer isso enquanto crime, sendo que os atos são cometidos por outras crianças e adolescentes, isso é evidente”, diz.

Para a especialista, quando a denúncia chegar, de fato, à esfera judicial, será necessário que os pais coletem provas por meio de prints de conversas com teor agressivo nas redes sociais, relatos da criança e, se possível, de outras pessoas que presenciaram o crime, e prova de que a escola foi comunicada e não agiu sobre isso.

O texto sancionado por Lula também inclui quatro crimes praticados contra crianças e adolescentes no rol de crimes de hediondos, alterando a Lei 8.072, de 1990, que trata dessa tipificação. São eles:

  • Agenciar, facilitar, recrutar, coagir ou intermediar a participação de criança ou adolescente em imagens pornográficas;
  • Adquirir, possuir ou armazenar imagem pornográfica com criança ou adolescente;
  • Sequestrar ou manter em cárcere privado crianças e adolescentes;
  • Traficar pessoas menores de 18 anos.

Advogados e especialistas em Direito Penal elogiam a tipificação do crime de bullying e consideram que a medida tende a provocar uma mudança na postura das escolas e do Poder Público, aumentando a preocupação com o combate ao bullying, mas destacam que a punição restrita a multa pode ser irrisória e não gerar o efeito esperado.

“A lei expressamente incluiu a comunidade escolar como corresponsável por estabelecer protocolos de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra qualquer forma de violência no âmbito escolar. Do ponto de vista de repressão, a nova lei facilita a comunicação dos fatos à polícia, porque agora tem exatamente o tipo penal a ser investigado. Outro aspecto é que a escola, ao identificar uma conduta, pode imediatamente comunicar o fato à polícia”, afirma o advogado criminalista Enzo Fachini, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas.

“Mas o legislador falha ao estabelecer pena de multa, primeiro porque ela é naturalmente branda – poderia ser ao menos prestação de serviços à comunidade –, e segundo porque os infratores podem ser menores de idade e que não terão renda para pagar multa. Também não tem como obrigar os pais a pagar a multa, porque a pena é intransferível, transferi-la seria inconstitucional. Por conta disso, a tipificação pode não trazer o resultado esperado”, conclui Fachini.

O advogado criminalista Rafael Paiva, especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, também faz essa crítica à pena de multa. “No que se refere à aplicação da lei em escolas, é fato notório que menores de idade são inimputáveis criminalmente, ou seja, não recebem as mesmas punições criminais de pessoas maiores de idade. No máximo pode haver algum tipo de responsabilização nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.

“A tipificação como crime dos atos de perseguição sistêmica impacta diretamente na rotina das escolas e das famílias das vítimas de bullying, introduzindo medidas mais específicas e direcionadas para lidar com essa questão. É imperativo legal a implementação de políticas escolares mais proativas, programas de prevenção mais eficazes e processos disciplinares mais claros para abordar o bullying”, avalia a delegada de polícia Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e pós-graduada em Ciências Penais, Direito de Polícia Judiciária e Processo Penal.

O advogado criminalista Michel Kusminsky Herscu avalia que é difícil prever os efeitos práticos da nova lei. “As escolas devem tomar medidas mais efetivas para evitar o bullying, mas de resto é preciso esperar. Existem leis que geram efeitos concretos, como a proibição do cigarro, e outras que não causam consequências importantes, como a lei de drogas”. Para ele, uma ampla campanha de conscientização poderia ser mais efetiva.

Se para o bullying a pena estipulada foi apenas de multa, outra mudança prevista pela lei foi a duplicação da pena para o crime de indução ou instigação ao suicídio ou à automutilação, num caso específico. Além de ser tornado hediondo, esse crime terá a pena atual, de seis meses a dois anos de reclusão, duplicada quando o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou for responsável por algum destes. “As provas podem ser conversas no Whatsapp, gravações de áudio, ordens na internet, tudo o que permitir demonstrar a conduta”, afirma o advogado Fachini.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta segunda-feira, 15, a lei que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Mas, na prática, como isso muda a dinâmica nas escolas e nas famílias? O Estadão escutou especialistas sobre o tema.

Segundo a nova norma sancionada pelo presidente, o bullying está tipificado como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. O cyberbullying é o mesmo ato, mas praticado em ambiente virtual.

O texto altera o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Projeto de Lei n° 4224, de 2021, já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no plenário do Senado Federal. A proposição é de autoria do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

Lei anterior era considerada ineficaz por não determinar punição contra casos de violência praticada nas escolas Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 16/11/2017

Para a professora, pedagoga e bacharel em Direito Sônia Aranha, que é ativista de questões relacionadas ao Direito Educacional, a medida visa pressionar as escolas a, de fato, agirem contra o bullying. Segundo ela, a lei anterior sobre o assunto, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, se mostrou ineficaz por não determinar a punição contra casos de violência praticada nas escolas.

“Eu vejo com bons olhos essa criminalização do bullying. Você tem uma responsabilização do Poder Público local e isso contribui bastante. Nós temos um país enorme, com tantos municípios, e nos municípios menores, muitas vezes as crianças e os adolescentes ficam à mercê das escolas – que, até o momento, não conseguiram colocar em prática a proteção a esses jovens, em especial as escolas públicas”, afirma.

Ainda de acordo com Sônia, em uma leitura inicial da lei, é possível entender que a maior responsabilidade deve cair sobre as instituições, por não combaterem o bullying ou não proporcionarem um ambiente seguro aos alunos. Não fica claro por enquanto, no entanto, se as próprias crianças e adolescentes ou seus pais e responsáveis podem ser punidos pelo crime.

“É algo que só no dia a dia, na aplicação da lei, nós vamos perceber se há problemas”, afirma Sônia. “Mas, infelizmente, só assim as escolas vão tomar atitude. Essa sofisticação, de estar no Código Penal, na lei de crimes hediondos e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), faz com que o combate ao bullying ganhe uma baita força. Agora, que é complicado estabelecer isso enquanto crime, sendo que os atos são cometidos por outras crianças e adolescentes, isso é evidente”, diz.

Para a especialista, quando a denúncia chegar, de fato, à esfera judicial, será necessário que os pais coletem provas por meio de prints de conversas com teor agressivo nas redes sociais, relatos da criança e, se possível, de outras pessoas que presenciaram o crime, e prova de que a escola foi comunicada e não agiu sobre isso.

O texto sancionado por Lula também inclui quatro crimes praticados contra crianças e adolescentes no rol de crimes de hediondos, alterando a Lei 8.072, de 1990, que trata dessa tipificação. São eles:

  • Agenciar, facilitar, recrutar, coagir ou intermediar a participação de criança ou adolescente em imagens pornográficas;
  • Adquirir, possuir ou armazenar imagem pornográfica com criança ou adolescente;
  • Sequestrar ou manter em cárcere privado crianças e adolescentes;
  • Traficar pessoas menores de 18 anos.

Advogados e especialistas em Direito Penal elogiam a tipificação do crime de bullying e consideram que a medida tende a provocar uma mudança na postura das escolas e do Poder Público, aumentando a preocupação com o combate ao bullying, mas destacam que a punição restrita a multa pode ser irrisória e não gerar o efeito esperado.

“A lei expressamente incluiu a comunidade escolar como corresponsável por estabelecer protocolos de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra qualquer forma de violência no âmbito escolar. Do ponto de vista de repressão, a nova lei facilita a comunicação dos fatos à polícia, porque agora tem exatamente o tipo penal a ser investigado. Outro aspecto é que a escola, ao identificar uma conduta, pode imediatamente comunicar o fato à polícia”, afirma o advogado criminalista Enzo Fachini, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas.

“Mas o legislador falha ao estabelecer pena de multa, primeiro porque ela é naturalmente branda – poderia ser ao menos prestação de serviços à comunidade –, e segundo porque os infratores podem ser menores de idade e que não terão renda para pagar multa. Também não tem como obrigar os pais a pagar a multa, porque a pena é intransferível, transferi-la seria inconstitucional. Por conta disso, a tipificação pode não trazer o resultado esperado”, conclui Fachini.

O advogado criminalista Rafael Paiva, especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, também faz essa crítica à pena de multa. “No que se refere à aplicação da lei em escolas, é fato notório que menores de idade são inimputáveis criminalmente, ou seja, não recebem as mesmas punições criminais de pessoas maiores de idade. No máximo pode haver algum tipo de responsabilização nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.

“A tipificação como crime dos atos de perseguição sistêmica impacta diretamente na rotina das escolas e das famílias das vítimas de bullying, introduzindo medidas mais específicas e direcionadas para lidar com essa questão. É imperativo legal a implementação de políticas escolares mais proativas, programas de prevenção mais eficazes e processos disciplinares mais claros para abordar o bullying”, avalia a delegada de polícia Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e pós-graduada em Ciências Penais, Direito de Polícia Judiciária e Processo Penal.

O advogado criminalista Michel Kusminsky Herscu avalia que é difícil prever os efeitos práticos da nova lei. “As escolas devem tomar medidas mais efetivas para evitar o bullying, mas de resto é preciso esperar. Existem leis que geram efeitos concretos, como a proibição do cigarro, e outras que não causam consequências importantes, como a lei de drogas”. Para ele, uma ampla campanha de conscientização poderia ser mais efetiva.

Se para o bullying a pena estipulada foi apenas de multa, outra mudança prevista pela lei foi a duplicação da pena para o crime de indução ou instigação ao suicídio ou à automutilação, num caso específico. Além de ser tornado hediondo, esse crime terá a pena atual, de seis meses a dois anos de reclusão, duplicada quando o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou for responsável por algum destes. “As provas podem ser conversas no Whatsapp, gravações de áudio, ordens na internet, tudo o que permitir demonstrar a conduta”, afirma o advogado Fachini.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta segunda-feira, 15, a lei que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Mas, na prática, como isso muda a dinâmica nas escolas e nas famílias? O Estadão escutou especialistas sobre o tema.

Segundo a nova norma sancionada pelo presidente, o bullying está tipificado como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. O cyberbullying é o mesmo ato, mas praticado em ambiente virtual.

O texto altera o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Projeto de Lei n° 4224, de 2021, já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no plenário do Senado Federal. A proposição é de autoria do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

Lei anterior era considerada ineficaz por não determinar punição contra casos de violência praticada nas escolas Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 16/11/2017

Para a professora, pedagoga e bacharel em Direito Sônia Aranha, que é ativista de questões relacionadas ao Direito Educacional, a medida visa pressionar as escolas a, de fato, agirem contra o bullying. Segundo ela, a lei anterior sobre o assunto, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, se mostrou ineficaz por não determinar a punição contra casos de violência praticada nas escolas.

“Eu vejo com bons olhos essa criminalização do bullying. Você tem uma responsabilização do Poder Público local e isso contribui bastante. Nós temos um país enorme, com tantos municípios, e nos municípios menores, muitas vezes as crianças e os adolescentes ficam à mercê das escolas – que, até o momento, não conseguiram colocar em prática a proteção a esses jovens, em especial as escolas públicas”, afirma.

Ainda de acordo com Sônia, em uma leitura inicial da lei, é possível entender que a maior responsabilidade deve cair sobre as instituições, por não combaterem o bullying ou não proporcionarem um ambiente seguro aos alunos. Não fica claro por enquanto, no entanto, se as próprias crianças e adolescentes ou seus pais e responsáveis podem ser punidos pelo crime.

“É algo que só no dia a dia, na aplicação da lei, nós vamos perceber se há problemas”, afirma Sônia. “Mas, infelizmente, só assim as escolas vão tomar atitude. Essa sofisticação, de estar no Código Penal, na lei de crimes hediondos e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), faz com que o combate ao bullying ganhe uma baita força. Agora, que é complicado estabelecer isso enquanto crime, sendo que os atos são cometidos por outras crianças e adolescentes, isso é evidente”, diz.

Para a especialista, quando a denúncia chegar, de fato, à esfera judicial, será necessário que os pais coletem provas por meio de prints de conversas com teor agressivo nas redes sociais, relatos da criança e, se possível, de outras pessoas que presenciaram o crime, e prova de que a escola foi comunicada e não agiu sobre isso.

O texto sancionado por Lula também inclui quatro crimes praticados contra crianças e adolescentes no rol de crimes de hediondos, alterando a Lei 8.072, de 1990, que trata dessa tipificação. São eles:

  • Agenciar, facilitar, recrutar, coagir ou intermediar a participação de criança ou adolescente em imagens pornográficas;
  • Adquirir, possuir ou armazenar imagem pornográfica com criança ou adolescente;
  • Sequestrar ou manter em cárcere privado crianças e adolescentes;
  • Traficar pessoas menores de 18 anos.

Advogados e especialistas em Direito Penal elogiam a tipificação do crime de bullying e consideram que a medida tende a provocar uma mudança na postura das escolas e do Poder Público, aumentando a preocupação com o combate ao bullying, mas destacam que a punição restrita a multa pode ser irrisória e não gerar o efeito esperado.

“A lei expressamente incluiu a comunidade escolar como corresponsável por estabelecer protocolos de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra qualquer forma de violência no âmbito escolar. Do ponto de vista de repressão, a nova lei facilita a comunicação dos fatos à polícia, porque agora tem exatamente o tipo penal a ser investigado. Outro aspecto é que a escola, ao identificar uma conduta, pode imediatamente comunicar o fato à polícia”, afirma o advogado criminalista Enzo Fachini, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas.

“Mas o legislador falha ao estabelecer pena de multa, primeiro porque ela é naturalmente branda – poderia ser ao menos prestação de serviços à comunidade –, e segundo porque os infratores podem ser menores de idade e que não terão renda para pagar multa. Também não tem como obrigar os pais a pagar a multa, porque a pena é intransferível, transferi-la seria inconstitucional. Por conta disso, a tipificação pode não trazer o resultado esperado”, conclui Fachini.

O advogado criminalista Rafael Paiva, especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, também faz essa crítica à pena de multa. “No que se refere à aplicação da lei em escolas, é fato notório que menores de idade são inimputáveis criminalmente, ou seja, não recebem as mesmas punições criminais de pessoas maiores de idade. No máximo pode haver algum tipo de responsabilização nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.

“A tipificação como crime dos atos de perseguição sistêmica impacta diretamente na rotina das escolas e das famílias das vítimas de bullying, introduzindo medidas mais específicas e direcionadas para lidar com essa questão. É imperativo legal a implementação de políticas escolares mais proativas, programas de prevenção mais eficazes e processos disciplinares mais claros para abordar o bullying”, avalia a delegada de polícia Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e pós-graduada em Ciências Penais, Direito de Polícia Judiciária e Processo Penal.

O advogado criminalista Michel Kusminsky Herscu avalia que é difícil prever os efeitos práticos da nova lei. “As escolas devem tomar medidas mais efetivas para evitar o bullying, mas de resto é preciso esperar. Existem leis que geram efeitos concretos, como a proibição do cigarro, e outras que não causam consequências importantes, como a lei de drogas”. Para ele, uma ampla campanha de conscientização poderia ser mais efetiva.

Se para o bullying a pena estipulada foi apenas de multa, outra mudança prevista pela lei foi a duplicação da pena para o crime de indução ou instigação ao suicídio ou à automutilação, num caso específico. Além de ser tornado hediondo, esse crime terá a pena atual, de seis meses a dois anos de reclusão, duplicada quando o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou for responsável por algum destes. “As provas podem ser conversas no Whatsapp, gravações de áudio, ordens na internet, tudo o que permitir demonstrar a conduta”, afirma o advogado Fachini.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta segunda-feira, 15, a lei que inclui os crimes de bullying e cyberbullying no Código Penal. Mas, na prática, como isso muda a dinâmica nas escolas e nas famílias? O Estadão escutou especialistas sobre o tema.

Segundo a nova norma sancionada pelo presidente, o bullying está tipificado como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. O cyberbullying é o mesmo ato, mas praticado em ambiente virtual.

O texto altera o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Projeto de Lei n° 4224, de 2021, já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no plenário do Senado Federal. A proposição é de autoria do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).

Lei anterior era considerada ineficaz por não determinar punição contra casos de violência praticada nas escolas Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 16/11/2017

Para a professora, pedagoga e bacharel em Direito Sônia Aranha, que é ativista de questões relacionadas ao Direito Educacional, a medida visa pressionar as escolas a, de fato, agirem contra o bullying. Segundo ela, a lei anterior sobre o assunto, de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, se mostrou ineficaz por não determinar a punição contra casos de violência praticada nas escolas.

“Eu vejo com bons olhos essa criminalização do bullying. Você tem uma responsabilização do Poder Público local e isso contribui bastante. Nós temos um país enorme, com tantos municípios, e nos municípios menores, muitas vezes as crianças e os adolescentes ficam à mercê das escolas – que, até o momento, não conseguiram colocar em prática a proteção a esses jovens, em especial as escolas públicas”, afirma.

Ainda de acordo com Sônia, em uma leitura inicial da lei, é possível entender que a maior responsabilidade deve cair sobre as instituições, por não combaterem o bullying ou não proporcionarem um ambiente seguro aos alunos. Não fica claro por enquanto, no entanto, se as próprias crianças e adolescentes ou seus pais e responsáveis podem ser punidos pelo crime.

“É algo que só no dia a dia, na aplicação da lei, nós vamos perceber se há problemas”, afirma Sônia. “Mas, infelizmente, só assim as escolas vão tomar atitude. Essa sofisticação, de estar no Código Penal, na lei de crimes hediondos e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), faz com que o combate ao bullying ganhe uma baita força. Agora, que é complicado estabelecer isso enquanto crime, sendo que os atos são cometidos por outras crianças e adolescentes, isso é evidente”, diz.

Para a especialista, quando a denúncia chegar, de fato, à esfera judicial, será necessário que os pais coletem provas por meio de prints de conversas com teor agressivo nas redes sociais, relatos da criança e, se possível, de outras pessoas que presenciaram o crime, e prova de que a escola foi comunicada e não agiu sobre isso.

O texto sancionado por Lula também inclui quatro crimes praticados contra crianças e adolescentes no rol de crimes de hediondos, alterando a Lei 8.072, de 1990, que trata dessa tipificação. São eles:

  • Agenciar, facilitar, recrutar, coagir ou intermediar a participação de criança ou adolescente em imagens pornográficas;
  • Adquirir, possuir ou armazenar imagem pornográfica com criança ou adolescente;
  • Sequestrar ou manter em cárcere privado crianças e adolescentes;
  • Traficar pessoas menores de 18 anos.

Advogados e especialistas em Direito Penal elogiam a tipificação do crime de bullying e consideram que a medida tende a provocar uma mudança na postura das escolas e do Poder Público, aumentando a preocupação com o combate ao bullying, mas destacam que a punição restrita a multa pode ser irrisória e não gerar o efeito esperado.

“A lei expressamente incluiu a comunidade escolar como corresponsável por estabelecer protocolos de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra qualquer forma de violência no âmbito escolar. Do ponto de vista de repressão, a nova lei facilita a comunicação dos fatos à polícia, porque agora tem exatamente o tipo penal a ser investigado. Outro aspecto é que a escola, ao identificar uma conduta, pode imediatamente comunicar o fato à polícia”, afirma o advogado criminalista Enzo Fachini, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas.

“Mas o legislador falha ao estabelecer pena de multa, primeiro porque ela é naturalmente branda – poderia ser ao menos prestação de serviços à comunidade –, e segundo porque os infratores podem ser menores de idade e que não terão renda para pagar multa. Também não tem como obrigar os pais a pagar a multa, porque a pena é intransferível, transferi-la seria inconstitucional. Por conta disso, a tipificação pode não trazer o resultado esperado”, conclui Fachini.

O advogado criminalista Rafael Paiva, especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, também faz essa crítica à pena de multa. “No que se refere à aplicação da lei em escolas, é fato notório que menores de idade são inimputáveis criminalmente, ou seja, não recebem as mesmas punições criminais de pessoas maiores de idade. No máximo pode haver algum tipo de responsabilização nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.

“A tipificação como crime dos atos de perseguição sistêmica impacta diretamente na rotina das escolas e das famílias das vítimas de bullying, introduzindo medidas mais específicas e direcionadas para lidar com essa questão. É imperativo legal a implementação de políticas escolares mais proativas, programas de prevenção mais eficazes e processos disciplinares mais claros para abordar o bullying”, avalia a delegada de polícia Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e pós-graduada em Ciências Penais, Direito de Polícia Judiciária e Processo Penal.

O advogado criminalista Michel Kusminsky Herscu avalia que é difícil prever os efeitos práticos da nova lei. “As escolas devem tomar medidas mais efetivas para evitar o bullying, mas de resto é preciso esperar. Existem leis que geram efeitos concretos, como a proibição do cigarro, e outras que não causam consequências importantes, como a lei de drogas”. Para ele, uma ampla campanha de conscientização poderia ser mais efetiva.

Se para o bullying a pena estipulada foi apenas de multa, outra mudança prevista pela lei foi a duplicação da pena para o crime de indução ou instigação ao suicídio ou à automutilação, num caso específico. Além de ser tornado hediondo, esse crime terá a pena atual, de seis meses a dois anos de reclusão, duplicada quando o autor for líder, coordenador ou administrador de grupo, de comunidade ou de rede virtual, ou for responsável por algum destes. “As provas podem ser conversas no Whatsapp, gravações de áudio, ordens na internet, tudo o que permitir demonstrar a conduta”, afirma o advogado Fachini.

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