‘Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa’, diz resgatado no Sul


Binho, de 41 anos, relata as dificuldades desde a saída da Bahia até a fuga pelo mato de parte do grupo, que conseguiu avisar a PF sobre o trabalho análogo à escravidão em vinícolas de Bento Gonçalves

Por Heliana Frazão
Atualização:

O sonho de conquistar um trabalho digno, que lhes permitisse sustentar a família, acabou se transformando em um grande pesadelo para cerca de 200 baianos que viajaram até Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, para atuar na colheita de uvas. Lá, afirma ter enfrentado toda sorte de dificuldades, e em alguns casos até espancamento, num trabalho análogo à escravidão. O grupo foi resgatado na semana passada em uma operação das Polícias Federal e Rodoviária Federal.

Um deles, que se identifica apenas por Binho – todos ainda estão muito amedrontados e não querem divulgar o nome –, desempregado havia algum tempo, contou que foi contatado, em dezembro do ano passado, por um parente para arregimentar homens interessados em trabalhar nos parreirais gaúchos, em troca de um salário de R$ 2 mil, livres de todos os benefícios, como transporte, alojamento, alimentação etc.

No caso de Binho, de 41 anos, como líder da equipe, o valor mensal seria de R$ 3 mil, algo impensável para quem vive nas periferias da capital, Salvador, sem chance de sobrevivência com um bom emprego.

continua após a publicidade

Ele relata que conseguiu lotar um ônibus e um veículo tipo Van. “Na largada já sentimos que não seria essa beleza toda. Foram três dias de viagem, em carros apertados, tudo correndo por nossa conta. Chegamos lá por volta das 5 horas da manhã do dia 2 de janeiro, ouvimos uma palestra muito bonita, assinamos um contrato, e já saímos para trabalhar, sem direito a descansarmos da longa viagem”, conta. “Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa”, diz.

A partir daí, diz ele, foi só dificuldade. Em torno das 5 horas já estavam de saída e só retornavam por volta das 20h. Aqueles que se prolongassem um pouco mais na cama, devido ao cansaço do trabalho duro, de domingo a domingo, eram xingados, chamado de “demônio, preguiçoso” e outros adjetivos.

Na saída, comenta Binho, recebiam um copo de café com um pão e a quentinha para o almoço, que até a hora da refeição, algumas vezes, já estava estragado, e era comido com as mãos. “Muita gente passava mal, mas nem tinha direito a médico. Às vezes, dávamos uma fugida até um posto de saúde, por nossa conta”, acrescenta.

continua após a publicidade

Binho conta que o alojamento onde dormia era um espaço bem apertado, úmido, com 16 beliches, as roupas que usavam eram sujas e os banheiros, imundos. “Diante daquela situação, nossa vontade era voltar, mas não tínhamos dinheiro para isso, e se insistíssemos éramos intimidados até com armas”.

Conforme Binho, a sorte foi um grupo de trabalhadores ter conseguido fugir pelo mato, e, mesmo sendo caçados, conseguiram chegar até a Polícia Federal, para denunciar a situação.

“Os federais chegaram lá de surpresa e nos resgataram. Mesmo assim, eu e meus companheiros vivemos com muito medo, não temos coragem de sair de casa, porque sabemos do que esse pessoal é capaz. Espero um dia conseguir recuperar a minha paz”, confia.

continua após a publicidade
Trabalhadores eram mantidos em situação análoga à escravidão em alojamento em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Rodoviária Federal-RS/Divulgação

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT) deu dez dias para que as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi expliquem a relação delas com a terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda*, que foi flagrada mantendo trabalhadores em condição análoga à escravidão em Bento Gonçalves. As vinícolas alegaram não ter conhecimento das irregularidades.

continua após a publicidade

O proprietário da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto de Oliveira Santana, chegou a ser detido, mas foi liberado após pagar fiança de quase R$ 40 mil. Em nota à imprensa, a defesa afirma que “qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo”.

*NOTA DA REDAÇÃO: O nome da empresa Fênix Serviços de Apoio Administrativo havia sido repassado pela assessoria de comunicação do Ministério Público do Trabalho e foi citado de forma equivocada em versão anterior da reportagem. O MPT corrigiu a informação e este texto foi atualizado em 30/03/2023 com o nome correto da empresa: Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda.

O sonho de conquistar um trabalho digno, que lhes permitisse sustentar a família, acabou se transformando em um grande pesadelo para cerca de 200 baianos que viajaram até Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, para atuar na colheita de uvas. Lá, afirma ter enfrentado toda sorte de dificuldades, e em alguns casos até espancamento, num trabalho análogo à escravidão. O grupo foi resgatado na semana passada em uma operação das Polícias Federal e Rodoviária Federal.

Um deles, que se identifica apenas por Binho – todos ainda estão muito amedrontados e não querem divulgar o nome –, desempregado havia algum tempo, contou que foi contatado, em dezembro do ano passado, por um parente para arregimentar homens interessados em trabalhar nos parreirais gaúchos, em troca de um salário de R$ 2 mil, livres de todos os benefícios, como transporte, alojamento, alimentação etc.

No caso de Binho, de 41 anos, como líder da equipe, o valor mensal seria de R$ 3 mil, algo impensável para quem vive nas periferias da capital, Salvador, sem chance de sobrevivência com um bom emprego.

Ele relata que conseguiu lotar um ônibus e um veículo tipo Van. “Na largada já sentimos que não seria essa beleza toda. Foram três dias de viagem, em carros apertados, tudo correndo por nossa conta. Chegamos lá por volta das 5 horas da manhã do dia 2 de janeiro, ouvimos uma palestra muito bonita, assinamos um contrato, e já saímos para trabalhar, sem direito a descansarmos da longa viagem”, conta. “Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa”, diz.

A partir daí, diz ele, foi só dificuldade. Em torno das 5 horas já estavam de saída e só retornavam por volta das 20h. Aqueles que se prolongassem um pouco mais na cama, devido ao cansaço do trabalho duro, de domingo a domingo, eram xingados, chamado de “demônio, preguiçoso” e outros adjetivos.

Na saída, comenta Binho, recebiam um copo de café com um pão e a quentinha para o almoço, que até a hora da refeição, algumas vezes, já estava estragado, e era comido com as mãos. “Muita gente passava mal, mas nem tinha direito a médico. Às vezes, dávamos uma fugida até um posto de saúde, por nossa conta”, acrescenta.

Binho conta que o alojamento onde dormia era um espaço bem apertado, úmido, com 16 beliches, as roupas que usavam eram sujas e os banheiros, imundos. “Diante daquela situação, nossa vontade era voltar, mas não tínhamos dinheiro para isso, e se insistíssemos éramos intimidados até com armas”.

Conforme Binho, a sorte foi um grupo de trabalhadores ter conseguido fugir pelo mato, e, mesmo sendo caçados, conseguiram chegar até a Polícia Federal, para denunciar a situação.

“Os federais chegaram lá de surpresa e nos resgataram. Mesmo assim, eu e meus companheiros vivemos com muito medo, não temos coragem de sair de casa, porque sabemos do que esse pessoal é capaz. Espero um dia conseguir recuperar a minha paz”, confia.

Trabalhadores eram mantidos em situação análoga à escravidão em alojamento em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Rodoviária Federal-RS/Divulgação

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT) deu dez dias para que as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi expliquem a relação delas com a terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda*, que foi flagrada mantendo trabalhadores em condição análoga à escravidão em Bento Gonçalves. As vinícolas alegaram não ter conhecimento das irregularidades.

O proprietário da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto de Oliveira Santana, chegou a ser detido, mas foi liberado após pagar fiança de quase R$ 40 mil. Em nota à imprensa, a defesa afirma que “qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo”.

*NOTA DA REDAÇÃO: O nome da empresa Fênix Serviços de Apoio Administrativo havia sido repassado pela assessoria de comunicação do Ministério Público do Trabalho e foi citado de forma equivocada em versão anterior da reportagem. O MPT corrigiu a informação e este texto foi atualizado em 30/03/2023 com o nome correto da empresa: Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda.

O sonho de conquistar um trabalho digno, que lhes permitisse sustentar a família, acabou se transformando em um grande pesadelo para cerca de 200 baianos que viajaram até Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, para atuar na colheita de uvas. Lá, afirma ter enfrentado toda sorte de dificuldades, e em alguns casos até espancamento, num trabalho análogo à escravidão. O grupo foi resgatado na semana passada em uma operação das Polícias Federal e Rodoviária Federal.

Um deles, que se identifica apenas por Binho – todos ainda estão muito amedrontados e não querem divulgar o nome –, desempregado havia algum tempo, contou que foi contatado, em dezembro do ano passado, por um parente para arregimentar homens interessados em trabalhar nos parreirais gaúchos, em troca de um salário de R$ 2 mil, livres de todos os benefícios, como transporte, alojamento, alimentação etc.

No caso de Binho, de 41 anos, como líder da equipe, o valor mensal seria de R$ 3 mil, algo impensável para quem vive nas periferias da capital, Salvador, sem chance de sobrevivência com um bom emprego.

Ele relata que conseguiu lotar um ônibus e um veículo tipo Van. “Na largada já sentimos que não seria essa beleza toda. Foram três dias de viagem, em carros apertados, tudo correndo por nossa conta. Chegamos lá por volta das 5 horas da manhã do dia 2 de janeiro, ouvimos uma palestra muito bonita, assinamos um contrato, e já saímos para trabalhar, sem direito a descansarmos da longa viagem”, conta. “Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa”, diz.

A partir daí, diz ele, foi só dificuldade. Em torno das 5 horas já estavam de saída e só retornavam por volta das 20h. Aqueles que se prolongassem um pouco mais na cama, devido ao cansaço do trabalho duro, de domingo a domingo, eram xingados, chamado de “demônio, preguiçoso” e outros adjetivos.

Na saída, comenta Binho, recebiam um copo de café com um pão e a quentinha para o almoço, que até a hora da refeição, algumas vezes, já estava estragado, e era comido com as mãos. “Muita gente passava mal, mas nem tinha direito a médico. Às vezes, dávamos uma fugida até um posto de saúde, por nossa conta”, acrescenta.

Binho conta que o alojamento onde dormia era um espaço bem apertado, úmido, com 16 beliches, as roupas que usavam eram sujas e os banheiros, imundos. “Diante daquela situação, nossa vontade era voltar, mas não tínhamos dinheiro para isso, e se insistíssemos éramos intimidados até com armas”.

Conforme Binho, a sorte foi um grupo de trabalhadores ter conseguido fugir pelo mato, e, mesmo sendo caçados, conseguiram chegar até a Polícia Federal, para denunciar a situação.

“Os federais chegaram lá de surpresa e nos resgataram. Mesmo assim, eu e meus companheiros vivemos com muito medo, não temos coragem de sair de casa, porque sabemos do que esse pessoal é capaz. Espero um dia conseguir recuperar a minha paz”, confia.

Trabalhadores eram mantidos em situação análoga à escravidão em alojamento em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Rodoviária Federal-RS/Divulgação

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT) deu dez dias para que as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi expliquem a relação delas com a terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda*, que foi flagrada mantendo trabalhadores em condição análoga à escravidão em Bento Gonçalves. As vinícolas alegaram não ter conhecimento das irregularidades.

O proprietário da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto de Oliveira Santana, chegou a ser detido, mas foi liberado após pagar fiança de quase R$ 40 mil. Em nota à imprensa, a defesa afirma que “qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo”.

*NOTA DA REDAÇÃO: O nome da empresa Fênix Serviços de Apoio Administrativo havia sido repassado pela assessoria de comunicação do Ministério Público do Trabalho e foi citado de forma equivocada em versão anterior da reportagem. O MPT corrigiu a informação e este texto foi atualizado em 30/03/2023 com o nome correto da empresa: Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda.

O sonho de conquistar um trabalho digno, que lhes permitisse sustentar a família, acabou se transformando em um grande pesadelo para cerca de 200 baianos que viajaram até Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, para atuar na colheita de uvas. Lá, afirma ter enfrentado toda sorte de dificuldades, e em alguns casos até espancamento, num trabalho análogo à escravidão. O grupo foi resgatado na semana passada em uma operação das Polícias Federal e Rodoviária Federal.

Um deles, que se identifica apenas por Binho – todos ainda estão muito amedrontados e não querem divulgar o nome –, desempregado havia algum tempo, contou que foi contatado, em dezembro do ano passado, por um parente para arregimentar homens interessados em trabalhar nos parreirais gaúchos, em troca de um salário de R$ 2 mil, livres de todos os benefícios, como transporte, alojamento, alimentação etc.

No caso de Binho, de 41 anos, como líder da equipe, o valor mensal seria de R$ 3 mil, algo impensável para quem vive nas periferias da capital, Salvador, sem chance de sobrevivência com um bom emprego.

Ele relata que conseguiu lotar um ônibus e um veículo tipo Van. “Na largada já sentimos que não seria essa beleza toda. Foram três dias de viagem, em carros apertados, tudo correndo por nossa conta. Chegamos lá por volta das 5 horas da manhã do dia 2 de janeiro, ouvimos uma palestra muito bonita, assinamos um contrato, e já saímos para trabalhar, sem direito a descansarmos da longa viagem”, conta. “Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa”, diz.

A partir daí, diz ele, foi só dificuldade. Em torno das 5 horas já estavam de saída e só retornavam por volta das 20h. Aqueles que se prolongassem um pouco mais na cama, devido ao cansaço do trabalho duro, de domingo a domingo, eram xingados, chamado de “demônio, preguiçoso” e outros adjetivos.

Na saída, comenta Binho, recebiam um copo de café com um pão e a quentinha para o almoço, que até a hora da refeição, algumas vezes, já estava estragado, e era comido com as mãos. “Muita gente passava mal, mas nem tinha direito a médico. Às vezes, dávamos uma fugida até um posto de saúde, por nossa conta”, acrescenta.

Binho conta que o alojamento onde dormia era um espaço bem apertado, úmido, com 16 beliches, as roupas que usavam eram sujas e os banheiros, imundos. “Diante daquela situação, nossa vontade era voltar, mas não tínhamos dinheiro para isso, e se insistíssemos éramos intimidados até com armas”.

Conforme Binho, a sorte foi um grupo de trabalhadores ter conseguido fugir pelo mato, e, mesmo sendo caçados, conseguiram chegar até a Polícia Federal, para denunciar a situação.

“Os federais chegaram lá de surpresa e nos resgataram. Mesmo assim, eu e meus companheiros vivemos com muito medo, não temos coragem de sair de casa, porque sabemos do que esse pessoal é capaz. Espero um dia conseguir recuperar a minha paz”, confia.

Trabalhadores eram mantidos em situação análoga à escravidão em alojamento em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Rodoviária Federal-RS/Divulgação

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT) deu dez dias para que as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi expliquem a relação delas com a terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda*, que foi flagrada mantendo trabalhadores em condição análoga à escravidão em Bento Gonçalves. As vinícolas alegaram não ter conhecimento das irregularidades.

O proprietário da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto de Oliveira Santana, chegou a ser detido, mas foi liberado após pagar fiança de quase R$ 40 mil. Em nota à imprensa, a defesa afirma que “qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo”.

*NOTA DA REDAÇÃO: O nome da empresa Fênix Serviços de Apoio Administrativo havia sido repassado pela assessoria de comunicação do Ministério Público do Trabalho e foi citado de forma equivocada em versão anterior da reportagem. O MPT corrigiu a informação e este texto foi atualizado em 30/03/2023 com o nome correto da empresa: Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda.

O sonho de conquistar um trabalho digno, que lhes permitisse sustentar a família, acabou se transformando em um grande pesadelo para cerca de 200 baianos que viajaram até Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, para atuar na colheita de uvas. Lá, afirma ter enfrentado toda sorte de dificuldades, e em alguns casos até espancamento, num trabalho análogo à escravidão. O grupo foi resgatado na semana passada em uma operação das Polícias Federal e Rodoviária Federal.

Um deles, que se identifica apenas por Binho – todos ainda estão muito amedrontados e não querem divulgar o nome –, desempregado havia algum tempo, contou que foi contatado, em dezembro do ano passado, por um parente para arregimentar homens interessados em trabalhar nos parreirais gaúchos, em troca de um salário de R$ 2 mil, livres de todos os benefícios, como transporte, alojamento, alimentação etc.

No caso de Binho, de 41 anos, como líder da equipe, o valor mensal seria de R$ 3 mil, algo impensável para quem vive nas periferias da capital, Salvador, sem chance de sobrevivência com um bom emprego.

Ele relata que conseguiu lotar um ônibus e um veículo tipo Van. “Na largada já sentimos que não seria essa beleza toda. Foram três dias de viagem, em carros apertados, tudo correndo por nossa conta. Chegamos lá por volta das 5 horas da manhã do dia 2 de janeiro, ouvimos uma palestra muito bonita, assinamos um contrato, e já saímos para trabalhar, sem direito a descansarmos da longa viagem”, conta. “Os donos só falavam que a demanda era grande e os clientes tinham pressa”, diz.

A partir daí, diz ele, foi só dificuldade. Em torno das 5 horas já estavam de saída e só retornavam por volta das 20h. Aqueles que se prolongassem um pouco mais na cama, devido ao cansaço do trabalho duro, de domingo a domingo, eram xingados, chamado de “demônio, preguiçoso” e outros adjetivos.

Na saída, comenta Binho, recebiam um copo de café com um pão e a quentinha para o almoço, que até a hora da refeição, algumas vezes, já estava estragado, e era comido com as mãos. “Muita gente passava mal, mas nem tinha direito a médico. Às vezes, dávamos uma fugida até um posto de saúde, por nossa conta”, acrescenta.

Binho conta que o alojamento onde dormia era um espaço bem apertado, úmido, com 16 beliches, as roupas que usavam eram sujas e os banheiros, imundos. “Diante daquela situação, nossa vontade era voltar, mas não tínhamos dinheiro para isso, e se insistíssemos éramos intimidados até com armas”.

Conforme Binho, a sorte foi um grupo de trabalhadores ter conseguido fugir pelo mato, e, mesmo sendo caçados, conseguiram chegar até a Polícia Federal, para denunciar a situação.

“Os federais chegaram lá de surpresa e nos resgataram. Mesmo assim, eu e meus companheiros vivemos com muito medo, não temos coragem de sair de casa, porque sabemos do que esse pessoal é capaz. Espero um dia conseguir recuperar a minha paz”, confia.

Trabalhadores eram mantidos em situação análoga à escravidão em alojamento em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Rodoviária Federal-RS/Divulgação

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT) deu dez dias para que as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi expliquem a relação delas com a terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda*, que foi flagrada mantendo trabalhadores em condição análoga à escravidão em Bento Gonçalves. As vinícolas alegaram não ter conhecimento das irregularidades.

O proprietário da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto de Oliveira Santana, chegou a ser detido, mas foi liberado após pagar fiança de quase R$ 40 mil. Em nota à imprensa, a defesa afirma que “qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo”.

*NOTA DA REDAÇÃO: O nome da empresa Fênix Serviços de Apoio Administrativo havia sido repassado pela assessoria de comunicação do Ministério Público do Trabalho e foi citado de forma equivocada em versão anterior da reportagem. O MPT corrigiu a informação e este texto foi atualizado em 30/03/2023 com o nome correto da empresa: Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.