Os pés do defunto


Por Redação

Morrer é muito mais complicado do que se pensa. Mesmo na modernidade de São Paulo, em que muitos presumem que quem morreu "está morrido", e ponto final. Ritos muito antigos sobrevivem por aqui, infiltrados no suposto racionalismo que cerca, entre nós, a banalização da vida e, em consequência, a banalização da morte. Tudo remanescente de um tempo em que se concebia a vida como um dom, o corpo como instrumento simbólico do sagrado. A morte, incontornável, pedia e pede ainda ritos apropriados para o cumprimento do que os protestantes estrangeiros, que por aqui andaram nos séculos 18 e 19, registraram surpresos como o imaginário do "tenebroso transe", a passagem do mundo da luz e da vida para o mundo da morte. Os cuidados rituais, como o da vela acesa numa das mãos do moribundo, tinham e têm ainda a função de prover a alma do morto com a luminária que alumiará o seu caminho até o ponto de destino, o mundo encantado dos mortos. No Hospital do Câncer, conheci um paciente que, na falta de vela, acendia em desespero um fósforo atrás do outro, da caixa de fósforos de seu colega de quarto, para pôr-lhe nas mãos, fumante inveterado, que morria derrotado por um câncer na garganta, a luz dessa travessia. Luís da Câmara Cascudo discorreu, num de seus livros, sobre a oposição entre a espacialidade dos vivos e a dos mortos. Porque nascemos, via de regra, com a cabeça para fora e os pés voltados para dentro do corpo da mãe, a ordenação do espaço do velório do morto e a saída do seu enterro é exatamente oposta à do nascimento. O defunto, em seu caixão, fica com os pés virados para a porta de saída do recinto ou da casa. A casa na nossa cultura é uma casa uterina e feminina, por isso lugar da vida que precisa ser constantemente descontaminado dos resíduos da morte. Sempre houve, justamente, muitas resistências à participação da mulher nos enterros e, sobretudo, a que segurasse uma das alças do caixão do morto, com a exceção dos funerais de crianças que, sendo anjos, propriamente não morrem.Evidências desses ritos existem por aqui mesmo, em nossas casas. Praticamente em todas elas existe a precaução de situar as camas de maneira que os pés não fiquem posicionados em direção à porta da rua, à porta de saída da casa ou do apartamento, que é a posição do morto. Mesmo em barracos de favela notei esse cuidado. As camas são colocadas de maneira que os pés de quem dorme fiquem voltados para o interior da casa, a mesma posição de quem está nascendo em relação ao útero da mãe. Exorcismo preventivo da morte praticado mesmo por quem não acredita nessas coisas nem as teme. Já a posição do morto, no velório, tem por objetivo expulsá-lo do meio dos vivos, indicando-lhe a porta de saída, para que não fique assombrando os que permanecem.

Morrer é muito mais complicado do que se pensa. Mesmo na modernidade de São Paulo, em que muitos presumem que quem morreu "está morrido", e ponto final. Ritos muito antigos sobrevivem por aqui, infiltrados no suposto racionalismo que cerca, entre nós, a banalização da vida e, em consequência, a banalização da morte. Tudo remanescente de um tempo em que se concebia a vida como um dom, o corpo como instrumento simbólico do sagrado. A morte, incontornável, pedia e pede ainda ritos apropriados para o cumprimento do que os protestantes estrangeiros, que por aqui andaram nos séculos 18 e 19, registraram surpresos como o imaginário do "tenebroso transe", a passagem do mundo da luz e da vida para o mundo da morte. Os cuidados rituais, como o da vela acesa numa das mãos do moribundo, tinham e têm ainda a função de prover a alma do morto com a luminária que alumiará o seu caminho até o ponto de destino, o mundo encantado dos mortos. No Hospital do Câncer, conheci um paciente que, na falta de vela, acendia em desespero um fósforo atrás do outro, da caixa de fósforos de seu colega de quarto, para pôr-lhe nas mãos, fumante inveterado, que morria derrotado por um câncer na garganta, a luz dessa travessia. Luís da Câmara Cascudo discorreu, num de seus livros, sobre a oposição entre a espacialidade dos vivos e a dos mortos. Porque nascemos, via de regra, com a cabeça para fora e os pés voltados para dentro do corpo da mãe, a ordenação do espaço do velório do morto e a saída do seu enterro é exatamente oposta à do nascimento. O defunto, em seu caixão, fica com os pés virados para a porta de saída do recinto ou da casa. A casa na nossa cultura é uma casa uterina e feminina, por isso lugar da vida que precisa ser constantemente descontaminado dos resíduos da morte. Sempre houve, justamente, muitas resistências à participação da mulher nos enterros e, sobretudo, a que segurasse uma das alças do caixão do morto, com a exceção dos funerais de crianças que, sendo anjos, propriamente não morrem.Evidências desses ritos existem por aqui mesmo, em nossas casas. Praticamente em todas elas existe a precaução de situar as camas de maneira que os pés não fiquem posicionados em direção à porta da rua, à porta de saída da casa ou do apartamento, que é a posição do morto. Mesmo em barracos de favela notei esse cuidado. As camas são colocadas de maneira que os pés de quem dorme fiquem voltados para o interior da casa, a mesma posição de quem está nascendo em relação ao útero da mãe. Exorcismo preventivo da morte praticado mesmo por quem não acredita nessas coisas nem as teme. Já a posição do morto, no velório, tem por objetivo expulsá-lo do meio dos vivos, indicando-lhe a porta de saída, para que não fique assombrando os que permanecem.

Morrer é muito mais complicado do que se pensa. Mesmo na modernidade de São Paulo, em que muitos presumem que quem morreu "está morrido", e ponto final. Ritos muito antigos sobrevivem por aqui, infiltrados no suposto racionalismo que cerca, entre nós, a banalização da vida e, em consequência, a banalização da morte. Tudo remanescente de um tempo em que se concebia a vida como um dom, o corpo como instrumento simbólico do sagrado. A morte, incontornável, pedia e pede ainda ritos apropriados para o cumprimento do que os protestantes estrangeiros, que por aqui andaram nos séculos 18 e 19, registraram surpresos como o imaginário do "tenebroso transe", a passagem do mundo da luz e da vida para o mundo da morte. Os cuidados rituais, como o da vela acesa numa das mãos do moribundo, tinham e têm ainda a função de prover a alma do morto com a luminária que alumiará o seu caminho até o ponto de destino, o mundo encantado dos mortos. No Hospital do Câncer, conheci um paciente que, na falta de vela, acendia em desespero um fósforo atrás do outro, da caixa de fósforos de seu colega de quarto, para pôr-lhe nas mãos, fumante inveterado, que morria derrotado por um câncer na garganta, a luz dessa travessia. Luís da Câmara Cascudo discorreu, num de seus livros, sobre a oposição entre a espacialidade dos vivos e a dos mortos. Porque nascemos, via de regra, com a cabeça para fora e os pés voltados para dentro do corpo da mãe, a ordenação do espaço do velório do morto e a saída do seu enterro é exatamente oposta à do nascimento. O defunto, em seu caixão, fica com os pés virados para a porta de saída do recinto ou da casa. A casa na nossa cultura é uma casa uterina e feminina, por isso lugar da vida que precisa ser constantemente descontaminado dos resíduos da morte. Sempre houve, justamente, muitas resistências à participação da mulher nos enterros e, sobretudo, a que segurasse uma das alças do caixão do morto, com a exceção dos funerais de crianças que, sendo anjos, propriamente não morrem.Evidências desses ritos existem por aqui mesmo, em nossas casas. Praticamente em todas elas existe a precaução de situar as camas de maneira que os pés não fiquem posicionados em direção à porta da rua, à porta de saída da casa ou do apartamento, que é a posição do morto. Mesmo em barracos de favela notei esse cuidado. As camas são colocadas de maneira que os pés de quem dorme fiquem voltados para o interior da casa, a mesma posição de quem está nascendo em relação ao útero da mãe. Exorcismo preventivo da morte praticado mesmo por quem não acredita nessas coisas nem as teme. Já a posição do morto, no velório, tem por objetivo expulsá-lo do meio dos vivos, indicando-lhe a porta de saída, para que não fique assombrando os que permanecem.

Morrer é muito mais complicado do que se pensa. Mesmo na modernidade de São Paulo, em que muitos presumem que quem morreu "está morrido", e ponto final. Ritos muito antigos sobrevivem por aqui, infiltrados no suposto racionalismo que cerca, entre nós, a banalização da vida e, em consequência, a banalização da morte. Tudo remanescente de um tempo em que se concebia a vida como um dom, o corpo como instrumento simbólico do sagrado. A morte, incontornável, pedia e pede ainda ritos apropriados para o cumprimento do que os protestantes estrangeiros, que por aqui andaram nos séculos 18 e 19, registraram surpresos como o imaginário do "tenebroso transe", a passagem do mundo da luz e da vida para o mundo da morte. Os cuidados rituais, como o da vela acesa numa das mãos do moribundo, tinham e têm ainda a função de prover a alma do morto com a luminária que alumiará o seu caminho até o ponto de destino, o mundo encantado dos mortos. No Hospital do Câncer, conheci um paciente que, na falta de vela, acendia em desespero um fósforo atrás do outro, da caixa de fósforos de seu colega de quarto, para pôr-lhe nas mãos, fumante inveterado, que morria derrotado por um câncer na garganta, a luz dessa travessia. Luís da Câmara Cascudo discorreu, num de seus livros, sobre a oposição entre a espacialidade dos vivos e a dos mortos. Porque nascemos, via de regra, com a cabeça para fora e os pés voltados para dentro do corpo da mãe, a ordenação do espaço do velório do morto e a saída do seu enterro é exatamente oposta à do nascimento. O defunto, em seu caixão, fica com os pés virados para a porta de saída do recinto ou da casa. A casa na nossa cultura é uma casa uterina e feminina, por isso lugar da vida que precisa ser constantemente descontaminado dos resíduos da morte. Sempre houve, justamente, muitas resistências à participação da mulher nos enterros e, sobretudo, a que segurasse uma das alças do caixão do morto, com a exceção dos funerais de crianças que, sendo anjos, propriamente não morrem.Evidências desses ritos existem por aqui mesmo, em nossas casas. Praticamente em todas elas existe a precaução de situar as camas de maneira que os pés não fiquem posicionados em direção à porta da rua, à porta de saída da casa ou do apartamento, que é a posição do morto. Mesmo em barracos de favela notei esse cuidado. As camas são colocadas de maneira que os pés de quem dorme fiquem voltados para o interior da casa, a mesma posição de quem está nascendo em relação ao útero da mãe. Exorcismo preventivo da morte praticado mesmo por quem não acredita nessas coisas nem as teme. Já a posição do morto, no velório, tem por objetivo expulsá-lo do meio dos vivos, indicando-lhe a porta de saída, para que não fique assombrando os que permanecem.

Morrer é muito mais complicado do que se pensa. Mesmo na modernidade de São Paulo, em que muitos presumem que quem morreu "está morrido", e ponto final. Ritos muito antigos sobrevivem por aqui, infiltrados no suposto racionalismo que cerca, entre nós, a banalização da vida e, em consequência, a banalização da morte. Tudo remanescente de um tempo em que se concebia a vida como um dom, o corpo como instrumento simbólico do sagrado. A morte, incontornável, pedia e pede ainda ritos apropriados para o cumprimento do que os protestantes estrangeiros, que por aqui andaram nos séculos 18 e 19, registraram surpresos como o imaginário do "tenebroso transe", a passagem do mundo da luz e da vida para o mundo da morte. Os cuidados rituais, como o da vela acesa numa das mãos do moribundo, tinham e têm ainda a função de prover a alma do morto com a luminária que alumiará o seu caminho até o ponto de destino, o mundo encantado dos mortos. No Hospital do Câncer, conheci um paciente que, na falta de vela, acendia em desespero um fósforo atrás do outro, da caixa de fósforos de seu colega de quarto, para pôr-lhe nas mãos, fumante inveterado, que morria derrotado por um câncer na garganta, a luz dessa travessia. Luís da Câmara Cascudo discorreu, num de seus livros, sobre a oposição entre a espacialidade dos vivos e a dos mortos. Porque nascemos, via de regra, com a cabeça para fora e os pés voltados para dentro do corpo da mãe, a ordenação do espaço do velório do morto e a saída do seu enterro é exatamente oposta à do nascimento. O defunto, em seu caixão, fica com os pés virados para a porta de saída do recinto ou da casa. A casa na nossa cultura é uma casa uterina e feminina, por isso lugar da vida que precisa ser constantemente descontaminado dos resíduos da morte. Sempre houve, justamente, muitas resistências à participação da mulher nos enterros e, sobretudo, a que segurasse uma das alças do caixão do morto, com a exceção dos funerais de crianças que, sendo anjos, propriamente não morrem.Evidências desses ritos existem por aqui mesmo, em nossas casas. Praticamente em todas elas existe a precaução de situar as camas de maneira que os pés não fiquem posicionados em direção à porta da rua, à porta de saída da casa ou do apartamento, que é a posição do morto. Mesmo em barracos de favela notei esse cuidado. As camas são colocadas de maneira que os pés de quem dorme fiquem voltados para o interior da casa, a mesma posição de quem está nascendo em relação ao útero da mãe. Exorcismo preventivo da morte praticado mesmo por quem não acredita nessas coisas nem as teme. Já a posição do morto, no velório, tem por objetivo expulsá-lo do meio dos vivos, indicando-lhe a porta de saída, para que não fique assombrando os que permanecem.

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