‘Pai, estou vivo’: criança ferida em ataque a creche de Blumenau reencontra a família


Fabio Junior Santos conta que filho de 5 anos fala que levou ‘soco’; menino ainda terá de ser submetido a uma cirurgia

Por Ítalo Lo Re
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL A BLUMENAU (SC) - Samuel Lorenzzo, de cinco anos, ainda não entende o que ocorreu na Creche Cantinho Bom Pastor, onde ele e mais oito colegas foram feridos por um agressor*, que invadiu o local com uma machadinha. “Meu filho fala que foi um soco”, disse ao Estadão o mecânico industrial Fabio Junior Santos, de 42. Poucos milímetros garantiram a sobrevivência de Samuel, que sofreu um corte grave e trincou a mandíbula. Das crianças atingidas, quatro não resistiram.

“A médica falou que o golpe foi perto da jugular”, afirmou o pai. “Quando olho o rosto dele e vejo o ferimento, sei que poderia ter sido fatal.” O menino ainda terá de passar por uma cirurgia por causa do dano sofrido na mandíbula.

A orientação dos psicólogos do hospital, segundo o pai, é não questionar o menino sobre o episódio, mas deixar que ele conte as histórias espontaneamente. Vez ou outra, a criança tem relatado detalhes das cenas de horror. “Estará na mente dele o resto da vida”, afirma Fabio Junior. “Tento não chorar na frente do meu filho.”

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Durante a entrevista, o pai segura o travesseiro de estimação do filho, que Samuel batizou de “Confortável”. Foi um presente recebido pelo menino em uma festa do pijama da igreja que a família frequenta.

Fachada do Centro de Educação Infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, com as homenagens dos moradores da cidade para as quatro crianças assassinadas na última quarta-feira, 5.  Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Minhas pernas amoleceram’

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O pai lembra que Samuel tem o costume de ir para a creche ainda sonolento. “Ele só acorda no portão da escolinha.” No dia do atentado, Fabio deixou o menino no local por volta das 7 horas.

O baque veio no meio da manhã, quando o mecânico estava no serviço. “Uma amiga ligou para mim”, conta. Como estava perto das máquinas do trabalho, ele não conseguia ouvir bem, mas desconfiou ser algo sério. Depois, um amigo mostrou a foto da creche que havia recebido no celular. “Minhas pernas amoleceram, meus braços amoleceram. Fiquei muito nervoso e comecei a chorar.”

O mecânico industrial Fabio Júnior Santos, de 42 anos, segurando o travesseiro 'Confortável' do filho, Samuel Lorenzo Santos, 5 anos, um dos sobreviventes do ataque ao centro de educação infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau. Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Desnorteado, Fabio saiu correndo. Chegando nos arredores da creche, havia uma multidão e a entrada da escolinha já estava isolada. “A gente teve que descer do carro e ir andando a pé”, diz. Em um primeiro cordão feito pela polícia, só passavam os pais. Em um segundo, só quem desse os nomes. “E os policiais falavam para não entrar no colégio naquela segunda parte.”

Fabio estava tão nervoso na hora que só conseguia falar o nome do filho, na esperança de receber alguma informação. “Aí uma professora, a Célia, veio correndo e já falou para gente: ‘pai, mãe, o Samuel está bem’. Só que eu não conseguia escutar, não conseguia entender. Estava transtornado.”

Em seguida, Fabio conta que um policial, que se apresentou como psicólogo – ele não sabe exatamente quem é –, o apertou pelos braços. Disse que ele tinha que ter forças, cuidar da família, e informou que Samuel havia sido levado para o hospital.

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No hospital

Os pais só viram o menino quando ele foi transferido para o quarto, já no início da tarde. Só ali Fabio diz ter acreditado que o filho estava bem, ainda que estivesse com curativos no rosto e no pescoço. Samuel foi recobrando a consciência aos poucos.

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“Ele falou comigo: ‘pai, estou vivo’”, recorda. Segundo Fabio, o menino repetia essas palavras para todo o corpo médico ao longo do tempo em que ficou internado no Hospital Santo Antônio, entre quarta e quinta-feira. Após a dureza da sala de cirurgia, a tentativa de alívio veio com uma série de presentes, desde ovos de Páscoa até brinquedos. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram no mesmo quarto.

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Todos receberam alta, mas Samuel ainda terá de passar por um procedimento cirúrgico na próxima semana, já que um dos golpes fez o osso da mandíbula trincar. “Está bem inchado ainda, por isso os médicos estão esperando”, diz o pai. Mesmo com dores na boca, o garoto tem conseguido se alimentar.

Além disso, o pequeno Samuel já até voltou a correr pelo apartamento em que moram. “Ele é um menino muito ativo, chamo ele de serelepe”, afirma o pai. A sensação, torce Fabio, é de que o pior já passou.

‘Corri para dentro da sala e ela colocou um pano no meu rosto’

A família de Samuel é de Curitiba e, há três anos, se mudou para Blumenau por conta do trabalho dos pais. É o primeiro ano do filho caçula do casal na creche - a irmã tem 16 anos. Fabio elogia o Cantinho Bom Pastor. “As professoras, as diretoras, todos são muito bons para as crianças”, diz.

A gratidão pela equipe aumenta diante das dificuldades naquele dia tão traumático. “Todos os professores foram heróis. Tentaram pegar o máximo de crianças, correr para dentro das salas e se trancar.”

Segundo o pai, Samuel relata orientações da professora na hora do ataque. “Ele disse: escutei a ‘pro’ (como o menino chama as professoras) Célia falando para eu correr, e corri para dentro da sala. Aí fecharam a sala e a ela colocou um pano no meu rosto”, diz.

Ao mesmo tempo, ele reconhece que será difícil manter o garoto no Cantinho Bom Pastor a partir de agora. “Se realocasse a escola para outro local, eu continuaria com eles, porque são muito amorosos. Mas acho que ninguém vai ter cabeça para estar ali.”

Fabio cobra mais ações preventivas para evitar novas tragédias e julgamento rigoroso do criminoso responsável pelo massacre, que está preso. Defende ainda a tipificação de atentados assim como terrorismo.

Ele é favorável a colocar profissionais de segurança pública nas escolas, medida anunciada recentemente pela prefeitura de Blumenau, que também promete câmeras e psicólogos para a rede de ensino. “Estou ao mesmo tempo alegre com meu filho, que está em casa, mas com o coração com os outros pais. Porque eu estou com o meu ali em casa. Mas e os pais que enterraram quatro crianças?”

NOTA DA REDAÇÃO: O Estadão decidiu não publicar foto, vídeo, nome ou outras informações sobre o autor do ataque, embora ele seja maior de idade. Essa decisão segue recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Pesquisas mostram que essa exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um “troféu” dentro dessas redes. Pelo mesmo motivo, também não foram divulgados vídeos do ataque em uma escola estadual na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, no último dia 27 de março.

ENVIADO ESPECIAL A BLUMENAU (SC) - Samuel Lorenzzo, de cinco anos, ainda não entende o que ocorreu na Creche Cantinho Bom Pastor, onde ele e mais oito colegas foram feridos por um agressor*, que invadiu o local com uma machadinha. “Meu filho fala que foi um soco”, disse ao Estadão o mecânico industrial Fabio Junior Santos, de 42. Poucos milímetros garantiram a sobrevivência de Samuel, que sofreu um corte grave e trincou a mandíbula. Das crianças atingidas, quatro não resistiram.

“A médica falou que o golpe foi perto da jugular”, afirmou o pai. “Quando olho o rosto dele e vejo o ferimento, sei que poderia ter sido fatal.” O menino ainda terá de passar por uma cirurgia por causa do dano sofrido na mandíbula.

A orientação dos psicólogos do hospital, segundo o pai, é não questionar o menino sobre o episódio, mas deixar que ele conte as histórias espontaneamente. Vez ou outra, a criança tem relatado detalhes das cenas de horror. “Estará na mente dele o resto da vida”, afirma Fabio Junior. “Tento não chorar na frente do meu filho.”

Durante a entrevista, o pai segura o travesseiro de estimação do filho, que Samuel batizou de “Confortável”. Foi um presente recebido pelo menino em uma festa do pijama da igreja que a família frequenta.

Fachada do Centro de Educação Infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, com as homenagens dos moradores da cidade para as quatro crianças assassinadas na última quarta-feira, 5.  Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Minhas pernas amoleceram’

O pai lembra que Samuel tem o costume de ir para a creche ainda sonolento. “Ele só acorda no portão da escolinha.” No dia do atentado, Fabio deixou o menino no local por volta das 7 horas.

O baque veio no meio da manhã, quando o mecânico estava no serviço. “Uma amiga ligou para mim”, conta. Como estava perto das máquinas do trabalho, ele não conseguia ouvir bem, mas desconfiou ser algo sério. Depois, um amigo mostrou a foto da creche que havia recebido no celular. “Minhas pernas amoleceram, meus braços amoleceram. Fiquei muito nervoso e comecei a chorar.”

O mecânico industrial Fabio Júnior Santos, de 42 anos, segurando o travesseiro 'Confortável' do filho, Samuel Lorenzo Santos, 5 anos, um dos sobreviventes do ataque ao centro de educação infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Desnorteado, Fabio saiu correndo. Chegando nos arredores da creche, havia uma multidão e a entrada da escolinha já estava isolada. “A gente teve que descer do carro e ir andando a pé”, diz. Em um primeiro cordão feito pela polícia, só passavam os pais. Em um segundo, só quem desse os nomes. “E os policiais falavam para não entrar no colégio naquela segunda parte.”

Fabio estava tão nervoso na hora que só conseguia falar o nome do filho, na esperança de receber alguma informação. “Aí uma professora, a Célia, veio correndo e já falou para gente: ‘pai, mãe, o Samuel está bem’. Só que eu não conseguia escutar, não conseguia entender. Estava transtornado.”

Em seguida, Fabio conta que um policial, que se apresentou como psicólogo – ele não sabe exatamente quem é –, o apertou pelos braços. Disse que ele tinha que ter forças, cuidar da família, e informou que Samuel havia sido levado para o hospital.

No hospital

Os pais só viram o menino quando ele foi transferido para o quarto, já no início da tarde. Só ali Fabio diz ter acreditado que o filho estava bem, ainda que estivesse com curativos no rosto e no pescoço. Samuel foi recobrando a consciência aos poucos.

“Ele falou comigo: ‘pai, estou vivo’”, recorda. Segundo Fabio, o menino repetia essas palavras para todo o corpo médico ao longo do tempo em que ficou internado no Hospital Santo Antônio, entre quarta e quinta-feira. Após a dureza da sala de cirurgia, a tentativa de alívio veio com uma série de presentes, desde ovos de Páscoa até brinquedos. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram no mesmo quarto.

Todos receberam alta, mas Samuel ainda terá de passar por um procedimento cirúrgico na próxima semana, já que um dos golpes fez o osso da mandíbula trincar. “Está bem inchado ainda, por isso os médicos estão esperando”, diz o pai. Mesmo com dores na boca, o garoto tem conseguido se alimentar.

Além disso, o pequeno Samuel já até voltou a correr pelo apartamento em que moram. “Ele é um menino muito ativo, chamo ele de serelepe”, afirma o pai. A sensação, torce Fabio, é de que o pior já passou.

‘Corri para dentro da sala e ela colocou um pano no meu rosto’

A família de Samuel é de Curitiba e, há três anos, se mudou para Blumenau por conta do trabalho dos pais. É o primeiro ano do filho caçula do casal na creche - a irmã tem 16 anos. Fabio elogia o Cantinho Bom Pastor. “As professoras, as diretoras, todos são muito bons para as crianças”, diz.

A gratidão pela equipe aumenta diante das dificuldades naquele dia tão traumático. “Todos os professores foram heróis. Tentaram pegar o máximo de crianças, correr para dentro das salas e se trancar.”

Segundo o pai, Samuel relata orientações da professora na hora do ataque. “Ele disse: escutei a ‘pro’ (como o menino chama as professoras) Célia falando para eu correr, e corri para dentro da sala. Aí fecharam a sala e a ela colocou um pano no meu rosto”, diz.

Ao mesmo tempo, ele reconhece que será difícil manter o garoto no Cantinho Bom Pastor a partir de agora. “Se realocasse a escola para outro local, eu continuaria com eles, porque são muito amorosos. Mas acho que ninguém vai ter cabeça para estar ali.”

Fabio cobra mais ações preventivas para evitar novas tragédias e julgamento rigoroso do criminoso responsável pelo massacre, que está preso. Defende ainda a tipificação de atentados assim como terrorismo.

Ele é favorável a colocar profissionais de segurança pública nas escolas, medida anunciada recentemente pela prefeitura de Blumenau, que também promete câmeras e psicólogos para a rede de ensino. “Estou ao mesmo tempo alegre com meu filho, que está em casa, mas com o coração com os outros pais. Porque eu estou com o meu ali em casa. Mas e os pais que enterraram quatro crianças?”

NOTA DA REDAÇÃO: O Estadão decidiu não publicar foto, vídeo, nome ou outras informações sobre o autor do ataque, embora ele seja maior de idade. Essa decisão segue recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Pesquisas mostram que essa exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um “troféu” dentro dessas redes. Pelo mesmo motivo, também não foram divulgados vídeos do ataque em uma escola estadual na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, no último dia 27 de março.

ENVIADO ESPECIAL A BLUMENAU (SC) - Samuel Lorenzzo, de cinco anos, ainda não entende o que ocorreu na Creche Cantinho Bom Pastor, onde ele e mais oito colegas foram feridos por um agressor*, que invadiu o local com uma machadinha. “Meu filho fala que foi um soco”, disse ao Estadão o mecânico industrial Fabio Junior Santos, de 42. Poucos milímetros garantiram a sobrevivência de Samuel, que sofreu um corte grave e trincou a mandíbula. Das crianças atingidas, quatro não resistiram.

“A médica falou que o golpe foi perto da jugular”, afirmou o pai. “Quando olho o rosto dele e vejo o ferimento, sei que poderia ter sido fatal.” O menino ainda terá de passar por uma cirurgia por causa do dano sofrido na mandíbula.

A orientação dos psicólogos do hospital, segundo o pai, é não questionar o menino sobre o episódio, mas deixar que ele conte as histórias espontaneamente. Vez ou outra, a criança tem relatado detalhes das cenas de horror. “Estará na mente dele o resto da vida”, afirma Fabio Junior. “Tento não chorar na frente do meu filho.”

Durante a entrevista, o pai segura o travesseiro de estimação do filho, que Samuel batizou de “Confortável”. Foi um presente recebido pelo menino em uma festa do pijama da igreja que a família frequenta.

Fachada do Centro de Educação Infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, com as homenagens dos moradores da cidade para as quatro crianças assassinadas na última quarta-feira, 5.  Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Minhas pernas amoleceram’

O pai lembra que Samuel tem o costume de ir para a creche ainda sonolento. “Ele só acorda no portão da escolinha.” No dia do atentado, Fabio deixou o menino no local por volta das 7 horas.

O baque veio no meio da manhã, quando o mecânico estava no serviço. “Uma amiga ligou para mim”, conta. Como estava perto das máquinas do trabalho, ele não conseguia ouvir bem, mas desconfiou ser algo sério. Depois, um amigo mostrou a foto da creche que havia recebido no celular. “Minhas pernas amoleceram, meus braços amoleceram. Fiquei muito nervoso e comecei a chorar.”

O mecânico industrial Fabio Júnior Santos, de 42 anos, segurando o travesseiro 'Confortável' do filho, Samuel Lorenzo Santos, 5 anos, um dos sobreviventes do ataque ao centro de educação infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Desnorteado, Fabio saiu correndo. Chegando nos arredores da creche, havia uma multidão e a entrada da escolinha já estava isolada. “A gente teve que descer do carro e ir andando a pé”, diz. Em um primeiro cordão feito pela polícia, só passavam os pais. Em um segundo, só quem desse os nomes. “E os policiais falavam para não entrar no colégio naquela segunda parte.”

Fabio estava tão nervoso na hora que só conseguia falar o nome do filho, na esperança de receber alguma informação. “Aí uma professora, a Célia, veio correndo e já falou para gente: ‘pai, mãe, o Samuel está bem’. Só que eu não conseguia escutar, não conseguia entender. Estava transtornado.”

Em seguida, Fabio conta que um policial, que se apresentou como psicólogo – ele não sabe exatamente quem é –, o apertou pelos braços. Disse que ele tinha que ter forças, cuidar da família, e informou que Samuel havia sido levado para o hospital.

No hospital

Os pais só viram o menino quando ele foi transferido para o quarto, já no início da tarde. Só ali Fabio diz ter acreditado que o filho estava bem, ainda que estivesse com curativos no rosto e no pescoço. Samuel foi recobrando a consciência aos poucos.

“Ele falou comigo: ‘pai, estou vivo’”, recorda. Segundo Fabio, o menino repetia essas palavras para todo o corpo médico ao longo do tempo em que ficou internado no Hospital Santo Antônio, entre quarta e quinta-feira. Após a dureza da sala de cirurgia, a tentativa de alívio veio com uma série de presentes, desde ovos de Páscoa até brinquedos. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram no mesmo quarto.

Todos receberam alta, mas Samuel ainda terá de passar por um procedimento cirúrgico na próxima semana, já que um dos golpes fez o osso da mandíbula trincar. “Está bem inchado ainda, por isso os médicos estão esperando”, diz o pai. Mesmo com dores na boca, o garoto tem conseguido se alimentar.

Além disso, o pequeno Samuel já até voltou a correr pelo apartamento em que moram. “Ele é um menino muito ativo, chamo ele de serelepe”, afirma o pai. A sensação, torce Fabio, é de que o pior já passou.

‘Corri para dentro da sala e ela colocou um pano no meu rosto’

A família de Samuel é de Curitiba e, há três anos, se mudou para Blumenau por conta do trabalho dos pais. É o primeiro ano do filho caçula do casal na creche - a irmã tem 16 anos. Fabio elogia o Cantinho Bom Pastor. “As professoras, as diretoras, todos são muito bons para as crianças”, diz.

A gratidão pela equipe aumenta diante das dificuldades naquele dia tão traumático. “Todos os professores foram heróis. Tentaram pegar o máximo de crianças, correr para dentro das salas e se trancar.”

Segundo o pai, Samuel relata orientações da professora na hora do ataque. “Ele disse: escutei a ‘pro’ (como o menino chama as professoras) Célia falando para eu correr, e corri para dentro da sala. Aí fecharam a sala e a ela colocou um pano no meu rosto”, diz.

Ao mesmo tempo, ele reconhece que será difícil manter o garoto no Cantinho Bom Pastor a partir de agora. “Se realocasse a escola para outro local, eu continuaria com eles, porque são muito amorosos. Mas acho que ninguém vai ter cabeça para estar ali.”

Fabio cobra mais ações preventivas para evitar novas tragédias e julgamento rigoroso do criminoso responsável pelo massacre, que está preso. Defende ainda a tipificação de atentados assim como terrorismo.

Ele é favorável a colocar profissionais de segurança pública nas escolas, medida anunciada recentemente pela prefeitura de Blumenau, que também promete câmeras e psicólogos para a rede de ensino. “Estou ao mesmo tempo alegre com meu filho, que está em casa, mas com o coração com os outros pais. Porque eu estou com o meu ali em casa. Mas e os pais que enterraram quatro crianças?”

NOTA DA REDAÇÃO: O Estadão decidiu não publicar foto, vídeo, nome ou outras informações sobre o autor do ataque, embora ele seja maior de idade. Essa decisão segue recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Pesquisas mostram que essa exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um “troféu” dentro dessas redes. Pelo mesmo motivo, também não foram divulgados vídeos do ataque em uma escola estadual na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, no último dia 27 de março.

ENVIADO ESPECIAL A BLUMENAU (SC) - Samuel Lorenzzo, de cinco anos, ainda não entende o que ocorreu na Creche Cantinho Bom Pastor, onde ele e mais oito colegas foram feridos por um agressor*, que invadiu o local com uma machadinha. “Meu filho fala que foi um soco”, disse ao Estadão o mecânico industrial Fabio Junior Santos, de 42. Poucos milímetros garantiram a sobrevivência de Samuel, que sofreu um corte grave e trincou a mandíbula. Das crianças atingidas, quatro não resistiram.

“A médica falou que o golpe foi perto da jugular”, afirmou o pai. “Quando olho o rosto dele e vejo o ferimento, sei que poderia ter sido fatal.” O menino ainda terá de passar por uma cirurgia por causa do dano sofrido na mandíbula.

A orientação dos psicólogos do hospital, segundo o pai, é não questionar o menino sobre o episódio, mas deixar que ele conte as histórias espontaneamente. Vez ou outra, a criança tem relatado detalhes das cenas de horror. “Estará na mente dele o resto da vida”, afirma Fabio Junior. “Tento não chorar na frente do meu filho.”

Durante a entrevista, o pai segura o travesseiro de estimação do filho, que Samuel batizou de “Confortável”. Foi um presente recebido pelo menino em uma festa do pijama da igreja que a família frequenta.

Fachada do Centro de Educação Infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, com as homenagens dos moradores da cidade para as quatro crianças assassinadas na última quarta-feira, 5.  Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Minhas pernas amoleceram’

O pai lembra que Samuel tem o costume de ir para a creche ainda sonolento. “Ele só acorda no portão da escolinha.” No dia do atentado, Fabio deixou o menino no local por volta das 7 horas.

O baque veio no meio da manhã, quando o mecânico estava no serviço. “Uma amiga ligou para mim”, conta. Como estava perto das máquinas do trabalho, ele não conseguia ouvir bem, mas desconfiou ser algo sério. Depois, um amigo mostrou a foto da creche que havia recebido no celular. “Minhas pernas amoleceram, meus braços amoleceram. Fiquei muito nervoso e comecei a chorar.”

O mecânico industrial Fabio Júnior Santos, de 42 anos, segurando o travesseiro 'Confortável' do filho, Samuel Lorenzo Santos, 5 anos, um dos sobreviventes do ataque ao centro de educação infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Desnorteado, Fabio saiu correndo. Chegando nos arredores da creche, havia uma multidão e a entrada da escolinha já estava isolada. “A gente teve que descer do carro e ir andando a pé”, diz. Em um primeiro cordão feito pela polícia, só passavam os pais. Em um segundo, só quem desse os nomes. “E os policiais falavam para não entrar no colégio naquela segunda parte.”

Fabio estava tão nervoso na hora que só conseguia falar o nome do filho, na esperança de receber alguma informação. “Aí uma professora, a Célia, veio correndo e já falou para gente: ‘pai, mãe, o Samuel está bem’. Só que eu não conseguia escutar, não conseguia entender. Estava transtornado.”

Em seguida, Fabio conta que um policial, que se apresentou como psicólogo – ele não sabe exatamente quem é –, o apertou pelos braços. Disse que ele tinha que ter forças, cuidar da família, e informou que Samuel havia sido levado para o hospital.

No hospital

Os pais só viram o menino quando ele foi transferido para o quarto, já no início da tarde. Só ali Fabio diz ter acreditado que o filho estava bem, ainda que estivesse com curativos no rosto e no pescoço. Samuel foi recobrando a consciência aos poucos.

“Ele falou comigo: ‘pai, estou vivo’”, recorda. Segundo Fabio, o menino repetia essas palavras para todo o corpo médico ao longo do tempo em que ficou internado no Hospital Santo Antônio, entre quarta e quinta-feira. Após a dureza da sala de cirurgia, a tentativa de alívio veio com uma série de presentes, desde ovos de Páscoa até brinquedos. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram no mesmo quarto.

Todos receberam alta, mas Samuel ainda terá de passar por um procedimento cirúrgico na próxima semana, já que um dos golpes fez o osso da mandíbula trincar. “Está bem inchado ainda, por isso os médicos estão esperando”, diz o pai. Mesmo com dores na boca, o garoto tem conseguido se alimentar.

Além disso, o pequeno Samuel já até voltou a correr pelo apartamento em que moram. “Ele é um menino muito ativo, chamo ele de serelepe”, afirma o pai. A sensação, torce Fabio, é de que o pior já passou.

‘Corri para dentro da sala e ela colocou um pano no meu rosto’

A família de Samuel é de Curitiba e, há três anos, se mudou para Blumenau por conta do trabalho dos pais. É o primeiro ano do filho caçula do casal na creche - a irmã tem 16 anos. Fabio elogia o Cantinho Bom Pastor. “As professoras, as diretoras, todos são muito bons para as crianças”, diz.

A gratidão pela equipe aumenta diante das dificuldades naquele dia tão traumático. “Todos os professores foram heróis. Tentaram pegar o máximo de crianças, correr para dentro das salas e se trancar.”

Segundo o pai, Samuel relata orientações da professora na hora do ataque. “Ele disse: escutei a ‘pro’ (como o menino chama as professoras) Célia falando para eu correr, e corri para dentro da sala. Aí fecharam a sala e a ela colocou um pano no meu rosto”, diz.

Ao mesmo tempo, ele reconhece que será difícil manter o garoto no Cantinho Bom Pastor a partir de agora. “Se realocasse a escola para outro local, eu continuaria com eles, porque são muito amorosos. Mas acho que ninguém vai ter cabeça para estar ali.”

Fabio cobra mais ações preventivas para evitar novas tragédias e julgamento rigoroso do criminoso responsável pelo massacre, que está preso. Defende ainda a tipificação de atentados assim como terrorismo.

Ele é favorável a colocar profissionais de segurança pública nas escolas, medida anunciada recentemente pela prefeitura de Blumenau, que também promete câmeras e psicólogos para a rede de ensino. “Estou ao mesmo tempo alegre com meu filho, que está em casa, mas com o coração com os outros pais. Porque eu estou com o meu ali em casa. Mas e os pais que enterraram quatro crianças?”

NOTA DA REDAÇÃO: O Estadão decidiu não publicar foto, vídeo, nome ou outras informações sobre o autor do ataque, embora ele seja maior de idade. Essa decisão segue recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Pesquisas mostram que essa exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um “troféu” dentro dessas redes. Pelo mesmo motivo, também não foram divulgados vídeos do ataque em uma escola estadual na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, no último dia 27 de março.

ENVIADO ESPECIAL A BLUMENAU (SC) - Samuel Lorenzzo, de cinco anos, ainda não entende o que ocorreu na Creche Cantinho Bom Pastor, onde ele e mais oito colegas foram feridos por um agressor*, que invadiu o local com uma machadinha. “Meu filho fala que foi um soco”, disse ao Estadão o mecânico industrial Fabio Junior Santos, de 42. Poucos milímetros garantiram a sobrevivência de Samuel, que sofreu um corte grave e trincou a mandíbula. Das crianças atingidas, quatro não resistiram.

“A médica falou que o golpe foi perto da jugular”, afirmou o pai. “Quando olho o rosto dele e vejo o ferimento, sei que poderia ter sido fatal.” O menino ainda terá de passar por uma cirurgia por causa do dano sofrido na mandíbula.

A orientação dos psicólogos do hospital, segundo o pai, é não questionar o menino sobre o episódio, mas deixar que ele conte as histórias espontaneamente. Vez ou outra, a criança tem relatado detalhes das cenas de horror. “Estará na mente dele o resto da vida”, afirma Fabio Junior. “Tento não chorar na frente do meu filho.”

Durante a entrevista, o pai segura o travesseiro de estimação do filho, que Samuel batizou de “Confortável”. Foi um presente recebido pelo menino em uma festa do pijama da igreja que a família frequenta.

Fachada do Centro de Educação Infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, com as homenagens dos moradores da cidade para as quatro crianças assassinadas na última quarta-feira, 5.  Foto: Taba Benedicto/Estadão

‘Minhas pernas amoleceram’

O pai lembra que Samuel tem o costume de ir para a creche ainda sonolento. “Ele só acorda no portão da escolinha.” No dia do atentado, Fabio deixou o menino no local por volta das 7 horas.

O baque veio no meio da manhã, quando o mecânico estava no serviço. “Uma amiga ligou para mim”, conta. Como estava perto das máquinas do trabalho, ele não conseguia ouvir bem, mas desconfiou ser algo sério. Depois, um amigo mostrou a foto da creche que havia recebido no celular. “Minhas pernas amoleceram, meus braços amoleceram. Fiquei muito nervoso e comecei a chorar.”

O mecânico industrial Fabio Júnior Santos, de 42 anos, segurando o travesseiro 'Confortável' do filho, Samuel Lorenzo Santos, 5 anos, um dos sobreviventes do ataque ao centro de educação infantil Cantinho Bom Pastor, em Blumenau. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Desnorteado, Fabio saiu correndo. Chegando nos arredores da creche, havia uma multidão e a entrada da escolinha já estava isolada. “A gente teve que descer do carro e ir andando a pé”, diz. Em um primeiro cordão feito pela polícia, só passavam os pais. Em um segundo, só quem desse os nomes. “E os policiais falavam para não entrar no colégio naquela segunda parte.”

Fabio estava tão nervoso na hora que só conseguia falar o nome do filho, na esperança de receber alguma informação. “Aí uma professora, a Célia, veio correndo e já falou para gente: ‘pai, mãe, o Samuel está bem’. Só que eu não conseguia escutar, não conseguia entender. Estava transtornado.”

Em seguida, Fabio conta que um policial, que se apresentou como psicólogo – ele não sabe exatamente quem é –, o apertou pelos braços. Disse que ele tinha que ter forças, cuidar da família, e informou que Samuel havia sido levado para o hospital.

No hospital

Os pais só viram o menino quando ele foi transferido para o quarto, já no início da tarde. Só ali Fabio diz ter acreditado que o filho estava bem, ainda que estivesse com curativos no rosto e no pescoço. Samuel foi recobrando a consciência aos poucos.

“Ele falou comigo: ‘pai, estou vivo’”, recorda. Segundo Fabio, o menino repetia essas palavras para todo o corpo médico ao longo do tempo em que ficou internado no Hospital Santo Antônio, entre quarta e quinta-feira. Após a dureza da sala de cirurgia, a tentativa de alívio veio com uma série de presentes, desde ovos de Páscoa até brinquedos. Quatro dos cinco sobreviventes ficaram no mesmo quarto.

Todos receberam alta, mas Samuel ainda terá de passar por um procedimento cirúrgico na próxima semana, já que um dos golpes fez o osso da mandíbula trincar. “Está bem inchado ainda, por isso os médicos estão esperando”, diz o pai. Mesmo com dores na boca, o garoto tem conseguido se alimentar.

Além disso, o pequeno Samuel já até voltou a correr pelo apartamento em que moram. “Ele é um menino muito ativo, chamo ele de serelepe”, afirma o pai. A sensação, torce Fabio, é de que o pior já passou.

‘Corri para dentro da sala e ela colocou um pano no meu rosto’

A família de Samuel é de Curitiba e, há três anos, se mudou para Blumenau por conta do trabalho dos pais. É o primeiro ano do filho caçula do casal na creche - a irmã tem 16 anos. Fabio elogia o Cantinho Bom Pastor. “As professoras, as diretoras, todos são muito bons para as crianças”, diz.

A gratidão pela equipe aumenta diante das dificuldades naquele dia tão traumático. “Todos os professores foram heróis. Tentaram pegar o máximo de crianças, correr para dentro das salas e se trancar.”

Segundo o pai, Samuel relata orientações da professora na hora do ataque. “Ele disse: escutei a ‘pro’ (como o menino chama as professoras) Célia falando para eu correr, e corri para dentro da sala. Aí fecharam a sala e a ela colocou um pano no meu rosto”, diz.

Ao mesmo tempo, ele reconhece que será difícil manter o garoto no Cantinho Bom Pastor a partir de agora. “Se realocasse a escola para outro local, eu continuaria com eles, porque são muito amorosos. Mas acho que ninguém vai ter cabeça para estar ali.”

Fabio cobra mais ações preventivas para evitar novas tragédias e julgamento rigoroso do criminoso responsável pelo massacre, que está preso. Defende ainda a tipificação de atentados assim como terrorismo.

Ele é favorável a colocar profissionais de segurança pública nas escolas, medida anunciada recentemente pela prefeitura de Blumenau, que também promete câmeras e psicólogos para a rede de ensino. “Estou ao mesmo tempo alegre com meu filho, que está em casa, mas com o coração com os outros pais. Porque eu estou com o meu ali em casa. Mas e os pais que enterraram quatro crianças?”

NOTA DA REDAÇÃO: O Estadão decidiu não publicar foto, vídeo, nome ou outras informações sobre o autor do ataque, embora ele seja maior de idade. Essa decisão segue recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Pesquisas mostram que essa exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um “troféu” dentro dessas redes. Pelo mesmo motivo, também não foram divulgados vídeos do ataque em uma escola estadual na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, no último dia 27 de março.

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