Como pacote anticrime ajudou Pernambuco a acabar com os lixões


Em dez anos, o porcentual de descarte adequado de rejeitos no Estado saltou de 15% para os atuais 100%

Por Lucas Xavier
Atualização:

Desde março de 2023, Pernambuco não tem nenhum lixão em funcionamento no Estado e, assim, concluiu uma das metas previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em dez anos, o porcentual de descarte adequado de rejeitos saltou de 15% para os atuais 100% no Estado.

O avanço na regulamentação dos espaços de descarte de lixo resulta de força-tarefa entre Ministério Público de Pernambuco (MP-PE), Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) e Agência Estadual de Meio Ambiente.

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A mudança diverge da realidade do restante do Brasil. Até 2023, 38,9% do lixo urbano produzido no País recebeu disposição final inadequada, conforrme o Panorama de Resíduos Sólidos da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). O prazo para eliminar os lixões no Brasil foi encerrado em agosto, em um cenário ainda distante das metas da Política Nacional.

Em Pernambuco, a atuação conjunta dos órgãos de controle e fiscalização começou a ser estruturada em 2012. Naquele ano, o MP-PE identificou 160 lixões em funcionamento, enquanto o Estado contava com apenas seis aterros sanitários licenciados para atender os 184 municípios e o arquipélago de Fernando de Noronha. Foram criadas e estabelecidas ações de fiscalização de crimes ambientais, além de ações educativas nos municípios.

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Lixão que foi desativado na cidade de Nazaré da Mata Foto: Prefeitura de Nazaré da Mata

Desde 2012, o MP-PE assinou 129 Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) com prefeituras que se comprometeram a implementar as medidas da Política Nacional de Resíduos Sólidos. O TCE abriu 112 processos de auditorias especiais para acompanhamento dos municípios que ainda descartavam os resíduos em locais inadequados. A partir de 2019, o projeto Pernambuco Verde: Lixão Zero incorporou novas medidas, entre elas o compartilhamento de dados em tempo real.

No mesmo período, o MP-PE passou a adotar o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) como forma de negociação com as prefeituras. A medida permite que um acordo seja firmado entre a Promotoria e um investigado para que não haja abertura de processo criminal, se forem cumpridas as cláusulas. O ANPP foi incluído no Código Penal pela Lei 13.964, de 2019, conhecida como “pacote anticrime”.

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O recurso jurídico se tornou um importante instrumento de combate a crimes ambientais. Isso porque o descarte inadequado de lixo configura o crime de poluição e se enquadra nos requisitos necessários para a assinatura do acordo, tais como ausência de violência ou grave ameaça e pena mínima inferior a quatro anos de prisão. O crime de poluição prevê pena de 1 a 5 anos de prisão.

A promotora de Justiça Belize Câmara, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do MP-PE, destaca a eficiência dos acordos em casos de crimes ambientais.

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“Muitas vezes, a gente denuncia criminalmente o infrator e o principal, que é a remediação do passivo ambiental ou correção da conduta, não é atendido. O ANPP é um instrumento bem eficaz nesse sentido. Para que a pessoa não seja processada criminalmente, ela precisa reparar aquele dano ambiental”, afirma.

Ao todo, foram firmados 103 ANPPs com municípios que se comprometeram a encerrar os lixões, enviar os resíduos sólidos para aterros sanitários licenciados, adotar medidas de suporte para catadores, recuperar a área degradada e assinar o Termo de Compromisso Ambiental. “Muitas vezes são levadas para o Judiciário demandas que não têm efetividade, porque o processo é lento, burocrático e caro”, diz a promotora.

O ICMS socioambiental, criado em Pernambuco em 2000, também foi adotado como mecanismo para adequar o descarte de resíduos. A lei estadual define repasse de 4% do imposto para os municípios que realizam a deposição dos resíduos em aterros sanitários licenciados. Os gestores que deixarem de recolher o imposto podem ser processados por improbidade administrativa por renúncia de receita do ICMS.

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O auditor de controle externo do TCE-PE, Pedro Teixeira, que atua desde 2012 no encerramento dos lixões, ressalta a importância de aliar medidas coercitivas com as educativas. “Não adiantava a gente só cobrar, aplicar multa, tornar inelegível os gestores que estavam abrindo mão do ICMS socioambiental, se a estrutura municipal não permitia e o gestor não sabia nem como fazer”, explica.

Fiscalização e licenciamento

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Com o objetivo de agilizar os processos de licenciamento, a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) criou uma instrução normativa que simplificou relatórios para liberação dos aterros sanitários. A analista em gestão ambiental do órgão, Anna Eduarda, afirma que o documento reduz a burocracia para emissão do licenciamento, mas não flexibiliza critérios de proteção ambiental.

Ela ressalta que a medida foi importante para acelerar a expansão dos aterros em Pernambuco. O Estado tem 23 aterros sanitários licenciados e outros 14 em processo de análise.

Para monitorar o descarte, a CPRH coleta dados sobre a deposição de resíduos em todos os aterros do Estado. A medida permite verificar, por exemplo, se houve redução drástica na deposição de rejeitos em um aterro, o que pode indicar uso de lixões. Também analista em gestão ambiental da CPRH, Alberto Viana ressalta a importância da visita constante de fiscais aos municípios, mantendo as prefeituras atentas às normas.

Outro desafio para avançar nas metas da Política Nacional envolve a valorização dos resíduos e coleta seletiva. Apesar de reduzir os impactos ao solo e aos mananciais, os aterros sanitários têm capacidade limitada e são grandes emissores de gases do efeito estufa.

Professor de Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Geotecnia, José Fernando Thomé avalia que a erradicação dos lixões é uma “batalha vencida”.

Ele explica que é possível reaproveitar todos os resíduos gerados e inseri-los em uma economia circular, com investimento na estruturação jurídica e profissional das cooperativas de catadores de materiais recicláveis.

“No lugar de aterrar, o município pode gerar receita, emprego e renda a partir dos resíduos, diminuindo o que se coloca em aterros sanitários e colocando isso nas mãos de quem recicla, faz compostagem, biodigestores e energia, como combustíveis derivados de resíduos”, explica.

Desde março de 2023, Pernambuco não tem nenhum lixão em funcionamento no Estado e, assim, concluiu uma das metas previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em dez anos, o porcentual de descarte adequado de rejeitos saltou de 15% para os atuais 100% no Estado.

O avanço na regulamentação dos espaços de descarte de lixo resulta de força-tarefa entre Ministério Público de Pernambuco (MP-PE), Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) e Agência Estadual de Meio Ambiente.

A mudança diverge da realidade do restante do Brasil. Até 2023, 38,9% do lixo urbano produzido no País recebeu disposição final inadequada, conforrme o Panorama de Resíduos Sólidos da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). O prazo para eliminar os lixões no Brasil foi encerrado em agosto, em um cenário ainda distante das metas da Política Nacional.

Em Pernambuco, a atuação conjunta dos órgãos de controle e fiscalização começou a ser estruturada em 2012. Naquele ano, o MP-PE identificou 160 lixões em funcionamento, enquanto o Estado contava com apenas seis aterros sanitários licenciados para atender os 184 municípios e o arquipélago de Fernando de Noronha. Foram criadas e estabelecidas ações de fiscalização de crimes ambientais, além de ações educativas nos municípios.

Lixão que foi desativado na cidade de Nazaré da Mata Foto: Prefeitura de Nazaré da Mata

Desde 2012, o MP-PE assinou 129 Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) com prefeituras que se comprometeram a implementar as medidas da Política Nacional de Resíduos Sólidos. O TCE abriu 112 processos de auditorias especiais para acompanhamento dos municípios que ainda descartavam os resíduos em locais inadequados. A partir de 2019, o projeto Pernambuco Verde: Lixão Zero incorporou novas medidas, entre elas o compartilhamento de dados em tempo real.

No mesmo período, o MP-PE passou a adotar o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) como forma de negociação com as prefeituras. A medida permite que um acordo seja firmado entre a Promotoria e um investigado para que não haja abertura de processo criminal, se forem cumpridas as cláusulas. O ANPP foi incluído no Código Penal pela Lei 13.964, de 2019, conhecida como “pacote anticrime”.

O recurso jurídico se tornou um importante instrumento de combate a crimes ambientais. Isso porque o descarte inadequado de lixo configura o crime de poluição e se enquadra nos requisitos necessários para a assinatura do acordo, tais como ausência de violência ou grave ameaça e pena mínima inferior a quatro anos de prisão. O crime de poluição prevê pena de 1 a 5 anos de prisão.

A promotora de Justiça Belize Câmara, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do MP-PE, destaca a eficiência dos acordos em casos de crimes ambientais.

“Muitas vezes, a gente denuncia criminalmente o infrator e o principal, que é a remediação do passivo ambiental ou correção da conduta, não é atendido. O ANPP é um instrumento bem eficaz nesse sentido. Para que a pessoa não seja processada criminalmente, ela precisa reparar aquele dano ambiental”, afirma.

Ao todo, foram firmados 103 ANPPs com municípios que se comprometeram a encerrar os lixões, enviar os resíduos sólidos para aterros sanitários licenciados, adotar medidas de suporte para catadores, recuperar a área degradada e assinar o Termo de Compromisso Ambiental. “Muitas vezes são levadas para o Judiciário demandas que não têm efetividade, porque o processo é lento, burocrático e caro”, diz a promotora.

O ICMS socioambiental, criado em Pernambuco em 2000, também foi adotado como mecanismo para adequar o descarte de resíduos. A lei estadual define repasse de 4% do imposto para os municípios que realizam a deposição dos resíduos em aterros sanitários licenciados. Os gestores que deixarem de recolher o imposto podem ser processados por improbidade administrativa por renúncia de receita do ICMS.

O auditor de controle externo do TCE-PE, Pedro Teixeira, que atua desde 2012 no encerramento dos lixões, ressalta a importância de aliar medidas coercitivas com as educativas. “Não adiantava a gente só cobrar, aplicar multa, tornar inelegível os gestores que estavam abrindo mão do ICMS socioambiental, se a estrutura municipal não permitia e o gestor não sabia nem como fazer”, explica.

Fiscalização e licenciamento

Com o objetivo de agilizar os processos de licenciamento, a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) criou uma instrução normativa que simplificou relatórios para liberação dos aterros sanitários. A analista em gestão ambiental do órgão, Anna Eduarda, afirma que o documento reduz a burocracia para emissão do licenciamento, mas não flexibiliza critérios de proteção ambiental.

Ela ressalta que a medida foi importante para acelerar a expansão dos aterros em Pernambuco. O Estado tem 23 aterros sanitários licenciados e outros 14 em processo de análise.

Para monitorar o descarte, a CPRH coleta dados sobre a deposição de resíduos em todos os aterros do Estado. A medida permite verificar, por exemplo, se houve redução drástica na deposição de rejeitos em um aterro, o que pode indicar uso de lixões. Também analista em gestão ambiental da CPRH, Alberto Viana ressalta a importância da visita constante de fiscais aos municípios, mantendo as prefeituras atentas às normas.

Outro desafio para avançar nas metas da Política Nacional envolve a valorização dos resíduos e coleta seletiva. Apesar de reduzir os impactos ao solo e aos mananciais, os aterros sanitários têm capacidade limitada e são grandes emissores de gases do efeito estufa.

Professor de Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Geotecnia, José Fernando Thomé avalia que a erradicação dos lixões é uma “batalha vencida”.

Ele explica que é possível reaproveitar todos os resíduos gerados e inseri-los em uma economia circular, com investimento na estruturação jurídica e profissional das cooperativas de catadores de materiais recicláveis.

“No lugar de aterrar, o município pode gerar receita, emprego e renda a partir dos resíduos, diminuindo o que se coloca em aterros sanitários e colocando isso nas mãos de quem recicla, faz compostagem, biodigestores e energia, como combustíveis derivados de resíduos”, explica.

Desde março de 2023, Pernambuco não tem nenhum lixão em funcionamento no Estado e, assim, concluiu uma das metas previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em dez anos, o porcentual de descarte adequado de rejeitos saltou de 15% para os atuais 100% no Estado.

O avanço na regulamentação dos espaços de descarte de lixo resulta de força-tarefa entre Ministério Público de Pernambuco (MP-PE), Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) e Agência Estadual de Meio Ambiente.

A mudança diverge da realidade do restante do Brasil. Até 2023, 38,9% do lixo urbano produzido no País recebeu disposição final inadequada, conforrme o Panorama de Resíduos Sólidos da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). O prazo para eliminar os lixões no Brasil foi encerrado em agosto, em um cenário ainda distante das metas da Política Nacional.

Em Pernambuco, a atuação conjunta dos órgãos de controle e fiscalização começou a ser estruturada em 2012. Naquele ano, o MP-PE identificou 160 lixões em funcionamento, enquanto o Estado contava com apenas seis aterros sanitários licenciados para atender os 184 municípios e o arquipélago de Fernando de Noronha. Foram criadas e estabelecidas ações de fiscalização de crimes ambientais, além de ações educativas nos municípios.

Lixão que foi desativado na cidade de Nazaré da Mata Foto: Prefeitura de Nazaré da Mata

Desde 2012, o MP-PE assinou 129 Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) com prefeituras que se comprometeram a implementar as medidas da Política Nacional de Resíduos Sólidos. O TCE abriu 112 processos de auditorias especiais para acompanhamento dos municípios que ainda descartavam os resíduos em locais inadequados. A partir de 2019, o projeto Pernambuco Verde: Lixão Zero incorporou novas medidas, entre elas o compartilhamento de dados em tempo real.

No mesmo período, o MP-PE passou a adotar o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) como forma de negociação com as prefeituras. A medida permite que um acordo seja firmado entre a Promotoria e um investigado para que não haja abertura de processo criminal, se forem cumpridas as cláusulas. O ANPP foi incluído no Código Penal pela Lei 13.964, de 2019, conhecida como “pacote anticrime”.

O recurso jurídico se tornou um importante instrumento de combate a crimes ambientais. Isso porque o descarte inadequado de lixo configura o crime de poluição e se enquadra nos requisitos necessários para a assinatura do acordo, tais como ausência de violência ou grave ameaça e pena mínima inferior a quatro anos de prisão. O crime de poluição prevê pena de 1 a 5 anos de prisão.

A promotora de Justiça Belize Câmara, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do MP-PE, destaca a eficiência dos acordos em casos de crimes ambientais.

“Muitas vezes, a gente denuncia criminalmente o infrator e o principal, que é a remediação do passivo ambiental ou correção da conduta, não é atendido. O ANPP é um instrumento bem eficaz nesse sentido. Para que a pessoa não seja processada criminalmente, ela precisa reparar aquele dano ambiental”, afirma.

Ao todo, foram firmados 103 ANPPs com municípios que se comprometeram a encerrar os lixões, enviar os resíduos sólidos para aterros sanitários licenciados, adotar medidas de suporte para catadores, recuperar a área degradada e assinar o Termo de Compromisso Ambiental. “Muitas vezes são levadas para o Judiciário demandas que não têm efetividade, porque o processo é lento, burocrático e caro”, diz a promotora.

O ICMS socioambiental, criado em Pernambuco em 2000, também foi adotado como mecanismo para adequar o descarte de resíduos. A lei estadual define repasse de 4% do imposto para os municípios que realizam a deposição dos resíduos em aterros sanitários licenciados. Os gestores que deixarem de recolher o imposto podem ser processados por improbidade administrativa por renúncia de receita do ICMS.

O auditor de controle externo do TCE-PE, Pedro Teixeira, que atua desde 2012 no encerramento dos lixões, ressalta a importância de aliar medidas coercitivas com as educativas. “Não adiantava a gente só cobrar, aplicar multa, tornar inelegível os gestores que estavam abrindo mão do ICMS socioambiental, se a estrutura municipal não permitia e o gestor não sabia nem como fazer”, explica.

Fiscalização e licenciamento

Com o objetivo de agilizar os processos de licenciamento, a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) criou uma instrução normativa que simplificou relatórios para liberação dos aterros sanitários. A analista em gestão ambiental do órgão, Anna Eduarda, afirma que o documento reduz a burocracia para emissão do licenciamento, mas não flexibiliza critérios de proteção ambiental.

Ela ressalta que a medida foi importante para acelerar a expansão dos aterros em Pernambuco. O Estado tem 23 aterros sanitários licenciados e outros 14 em processo de análise.

Para monitorar o descarte, a CPRH coleta dados sobre a deposição de resíduos em todos os aterros do Estado. A medida permite verificar, por exemplo, se houve redução drástica na deposição de rejeitos em um aterro, o que pode indicar uso de lixões. Também analista em gestão ambiental da CPRH, Alberto Viana ressalta a importância da visita constante de fiscais aos municípios, mantendo as prefeituras atentas às normas.

Outro desafio para avançar nas metas da Política Nacional envolve a valorização dos resíduos e coleta seletiva. Apesar de reduzir os impactos ao solo e aos mananciais, os aterros sanitários têm capacidade limitada e são grandes emissores de gases do efeito estufa.

Professor de Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Geotecnia, José Fernando Thomé avalia que a erradicação dos lixões é uma “batalha vencida”.

Ele explica que é possível reaproveitar todos os resíduos gerados e inseri-los em uma economia circular, com investimento na estruturação jurídica e profissional das cooperativas de catadores de materiais recicláveis.

“No lugar de aterrar, o município pode gerar receita, emprego e renda a partir dos resíduos, diminuindo o que se coloca em aterros sanitários e colocando isso nas mãos de quem recicla, faz compostagem, biodigestores e energia, como combustíveis derivados de resíduos”, explica.

Desde março de 2023, Pernambuco não tem nenhum lixão em funcionamento no Estado e, assim, concluiu uma das metas previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em dez anos, o porcentual de descarte adequado de rejeitos saltou de 15% para os atuais 100% no Estado.

O avanço na regulamentação dos espaços de descarte de lixo resulta de força-tarefa entre Ministério Público de Pernambuco (MP-PE), Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) e Agência Estadual de Meio Ambiente.

A mudança diverge da realidade do restante do Brasil. Até 2023, 38,9% do lixo urbano produzido no País recebeu disposição final inadequada, conforrme o Panorama de Resíduos Sólidos da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema). O prazo para eliminar os lixões no Brasil foi encerrado em agosto, em um cenário ainda distante das metas da Política Nacional.

Em Pernambuco, a atuação conjunta dos órgãos de controle e fiscalização começou a ser estruturada em 2012. Naquele ano, o MP-PE identificou 160 lixões em funcionamento, enquanto o Estado contava com apenas seis aterros sanitários licenciados para atender os 184 municípios e o arquipélago de Fernando de Noronha. Foram criadas e estabelecidas ações de fiscalização de crimes ambientais, além de ações educativas nos municípios.

Lixão que foi desativado na cidade de Nazaré da Mata Foto: Prefeitura de Nazaré da Mata

Desde 2012, o MP-PE assinou 129 Termos de Compromisso Ambiental (TCAs) com prefeituras que se comprometeram a implementar as medidas da Política Nacional de Resíduos Sólidos. O TCE abriu 112 processos de auditorias especiais para acompanhamento dos municípios que ainda descartavam os resíduos em locais inadequados. A partir de 2019, o projeto Pernambuco Verde: Lixão Zero incorporou novas medidas, entre elas o compartilhamento de dados em tempo real.

No mesmo período, o MP-PE passou a adotar o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) como forma de negociação com as prefeituras. A medida permite que um acordo seja firmado entre a Promotoria e um investigado para que não haja abertura de processo criminal, se forem cumpridas as cláusulas. O ANPP foi incluído no Código Penal pela Lei 13.964, de 2019, conhecida como “pacote anticrime”.

O recurso jurídico se tornou um importante instrumento de combate a crimes ambientais. Isso porque o descarte inadequado de lixo configura o crime de poluição e se enquadra nos requisitos necessários para a assinatura do acordo, tais como ausência de violência ou grave ameaça e pena mínima inferior a quatro anos de prisão. O crime de poluição prevê pena de 1 a 5 anos de prisão.

A promotora de Justiça Belize Câmara, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do MP-PE, destaca a eficiência dos acordos em casos de crimes ambientais.

“Muitas vezes, a gente denuncia criminalmente o infrator e o principal, que é a remediação do passivo ambiental ou correção da conduta, não é atendido. O ANPP é um instrumento bem eficaz nesse sentido. Para que a pessoa não seja processada criminalmente, ela precisa reparar aquele dano ambiental”, afirma.

Ao todo, foram firmados 103 ANPPs com municípios que se comprometeram a encerrar os lixões, enviar os resíduos sólidos para aterros sanitários licenciados, adotar medidas de suporte para catadores, recuperar a área degradada e assinar o Termo de Compromisso Ambiental. “Muitas vezes são levadas para o Judiciário demandas que não têm efetividade, porque o processo é lento, burocrático e caro”, diz a promotora.

O ICMS socioambiental, criado em Pernambuco em 2000, também foi adotado como mecanismo para adequar o descarte de resíduos. A lei estadual define repasse de 4% do imposto para os municípios que realizam a deposição dos resíduos em aterros sanitários licenciados. Os gestores que deixarem de recolher o imposto podem ser processados por improbidade administrativa por renúncia de receita do ICMS.

O auditor de controle externo do TCE-PE, Pedro Teixeira, que atua desde 2012 no encerramento dos lixões, ressalta a importância de aliar medidas coercitivas com as educativas. “Não adiantava a gente só cobrar, aplicar multa, tornar inelegível os gestores que estavam abrindo mão do ICMS socioambiental, se a estrutura municipal não permitia e o gestor não sabia nem como fazer”, explica.

Fiscalização e licenciamento

Com o objetivo de agilizar os processos de licenciamento, a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) criou uma instrução normativa que simplificou relatórios para liberação dos aterros sanitários. A analista em gestão ambiental do órgão, Anna Eduarda, afirma que o documento reduz a burocracia para emissão do licenciamento, mas não flexibiliza critérios de proteção ambiental.

Ela ressalta que a medida foi importante para acelerar a expansão dos aterros em Pernambuco. O Estado tem 23 aterros sanitários licenciados e outros 14 em processo de análise.

Para monitorar o descarte, a CPRH coleta dados sobre a deposição de resíduos em todos os aterros do Estado. A medida permite verificar, por exemplo, se houve redução drástica na deposição de rejeitos em um aterro, o que pode indicar uso de lixões. Também analista em gestão ambiental da CPRH, Alberto Viana ressalta a importância da visita constante de fiscais aos municípios, mantendo as prefeituras atentas às normas.

Outro desafio para avançar nas metas da Política Nacional envolve a valorização dos resíduos e coleta seletiva. Apesar de reduzir os impactos ao solo e aos mananciais, os aterros sanitários têm capacidade limitada e são grandes emissores de gases do efeito estufa.

Professor de Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Geotecnia, José Fernando Thomé avalia que a erradicação dos lixões é uma “batalha vencida”.

Ele explica que é possível reaproveitar todos os resíduos gerados e inseri-los em uma economia circular, com investimento na estruturação jurídica e profissional das cooperativas de catadores de materiais recicláveis.

“No lugar de aterrar, o município pode gerar receita, emprego e renda a partir dos resíduos, diminuindo o que se coloca em aterros sanitários e colocando isso nas mãos de quem recicla, faz compostagem, biodigestores e energia, como combustíveis derivados de resíduos”, explica.

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