Conhecido por ser o palco da guerra com os Estados Unidos nos anos 60 e 70, o Vietnã que a delegação brasileira encontrará ao desembarcar em Hanói está longe de viver com os olhos postos no passado. Em um país onde cerca de 60% da população nasceu depois do fim da "Guerra Americana", como o conflito é conhecido aqui, parte do impulso econômico vem do apetite das gerações mais jovens por se integrar totalmente à economia global. Desde 1986, o Vietnã socialista adota um modelo econômico parecido com o chinês: investimentos estrangeiros dão o impulso econômico e o Estado gerencia a economia e as questões sociais. A incorporação do Vietnã à Organização Mundial do Comércio (OMC), no ano passado, funcionou como uma espécie de coroação à política de abertura econômica iniciada em 1986 com o chamado doi moi (ou "renovação"), quando os dirigentes passaram a permitir a iniciativa privada, abandonaram a coletivização agrícola e industrial e deixaram de lado o planejamento centralizado da economia, apesar de manter o regime de partido único. O sucesso da liberalização econômica se expressa nos números. A meta de expansão do PIB para o ano é de 7%, e o investimento estrangeiro somou US$ 21 bilhões em 2007 e US$ 31 bilhões só no primeiro semestre em 2008 - não muito abaixo dos US$ 37 bilhões registrados pelo Brasil em todo o ano passado. Nas ruas de Hanói, a atividade econômica se nota no fluxo incessante e impressionante de motocicletas, hoje acessíveis aos vietnamitas. Celulares e carros também já estão disponíveis para muitos consumidores do país. Números do ministério da Indústria e Comércio vietnamita mostram que as exportações de veículos de ponta já superaram neste ano o total de 2007 - chegaram a US$ 625 milhões nos primeiros cinco meses de 2008. Na república socialista de 86 milhões de habitantes, onde a média de idade é de apenas 27 anos, as assinaturas de linhas móveis somam 48 milhões. Estimativas apontam que 5,5 milhões de aparelhos devem ser vendidos neste ano. Diante de números assim, o governo do país diz querer alcançar status de nação desenvolvida até 2020. Um país que aos poucos supera memórias que tardarão gerações para desaparecer, considerando que 1 milhão de vietnamitas ainda sofrem problemas sérios de saúde em decorrência da exposição ao agente laranja - um desfoliante usado pela aviação americana nas selvas do país durante a guerra -, segundo a Associação de Vítimas do Agente Laranja do Vietnã (Vava, na sigla em inglês). Segundo a Cruz Vermelha, 150 mil crianças ainda são obrigadas a conviver com defeitos de formação por problemas derivados do uso do químico. Superando rivalidades Mas o país hoje olha para frente e faz de Washington um parceiro crucial na sua incorporação à economia mundial. Desde que os dois países assinaram um acordo de comércio, em 2001, as trocas bilaterais se multiplicaram por oito, superando US$ 12 bilhões em 2007, de acordo com números do departamento de Estado dos Estados Unidos. Uma visita do primeiro-ministro Nguyen Tan Dung a Washington, no mês passado, foi a quarta de alto nível aos Estados Unidos em quatro anos. Acordos nas áreas de alimentação, energia, mudança climática e educação sinalizam as linhas de cooperação entre os dois países. Analistas vêem a aproximação entre Hanói e Washington como uma tentativa americana de criar potências médias no sudeste asiático capazes de contrabalançar o poderio da China na região. O Brasil, porém, tem tirado pouco proveito da política de "portas abertas" do Vietnã. O fluxo de investimentos de um país para o outro é pequeno, e o balanço das trocas comerciais no ano passado somou apenas US$ 323 milhões (o Brasil exportou US$ 216 milhões e importou US$ 107 milhões), segundo os números do ministério da Indústria e Comércio brasileiro. Outra área em que o Brasil poderia cooperar com o Vietnã é na redução da pobreza. As políticas oficiais fizeram o nível cair de 70% da população nos anos 1980 para menos de 15% em 2007, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento (PNUD). Segundo o monitoramente oficial da ONU, o governo do Vietnã encampou os oito Objetivos do Milênio que lhe cabiam em termos de políticas sociais. Um deles, a erradicação da pobreza extrema e da fome, já foi alcançado, e o restante está "bem encaminhado", segundo a organização. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.