A força da gravidade parece ter sido triplicada sobre meu corpo nos últimos tempos, resultado do avançar da idade, de um certo ganho de peso, da crescente dificuldade de mobilidade que a síndrome de Charcot-Marie-Tooth, ou CMT, impõe aos meus músculos, e da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC para os íntimos), recém descoberta, que rouba meu fôlego nas atividades mais comuns, especialmente no banho. Saio do chuveiro ofegante e com a garganta apitando, como se tivesse corrido uma maratona.
Andar pela rua com toda essa carga não tem sido fácil. Os pés travados pelo movimento limitado dos tornozelos, as pernas enfraquecidas, o equilíbrio prejudicado e a falta de força para respirar exigem muito cuidado nos passos e olhos atentos no chão para evitar tropeços e até quedas.
Coleciono tombos. E levantar é uma tarefa árdua.
Por tudo isso, hoje decidi usar uma bengala. Já avaliava essa necessidade, mas a escolha do apoio veio durante um passeio pelo bairro com minha esposa e uma amiga. Passamos por uma farmácia, entrei, escolhi uma peça de madeira, fiz alguns testes ali mesmo e comprei.
O trajeto até nossa casa foi a prova definitiva de que minha nova amiga, a bengala, será companhia constante pelas ruas. E muito bem-vinda.
Não trate essa mudança como uma derrota, porque não é. Não sinta dó da minha condição, porque isso não é necessário. Não sofra por mim, porque não estou sofrendo. Não julgue minha decisão, porque é uma escolha racional, que prioriza minha segurança e autonomia.
Conviver com deficiências ensina a perceber os momentos de mudança e aceitar que a vida continua após essas mudanças, que as dificuldades e o agravamento de determinadas condições não definem nosso destino, que buscar um apoio é estratégico, jamais trágico, para ter conforto e confiança na continuação do trajeto, do trabalho ou da missão que devemos cumprir.
É habitual que usuários de bengalas, muletas, cadeiras de rodas e outros equipamentos de mobilidade batizem suas parceiras. Não cheguei nesse momento, ainda não temos essa intimidade.