Diversidade e Inclusão

"Só perdi um pé"


Thales Martins estava a caminho da faculdade quando foi atingido por uma carreta na Rodovia Anchieta. Havia completado naquele mesmo dia os exames para ser efetivado na TIM, onde fazia estágio. "Muitas vezes, não percebemos o valor do tempo e da vida", diz o jovem, que teve o pé direito amputado aos 21 anos e voltou ao trabalho quatro meses depois, usando uma prótese.

Por Luiz Alexandre Souza Ventura
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Uma carreta bitrem com dois contêineres vermelhos trafega pelo trecho de serra da Rodovia Anchieta em direção ao litoral. Um pouco à frente, o estudante Thales Gabriel Monteiro Martins, de 21 anos, segue pelo centro da faixa com uma moto Honda XRE 300.

Naquele dia 22 de agosto de 2017, por volta de 18h50, Thales estava a caminho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Cubatão, na Baixada Santista, onde cursava o último ano de ciências da computação. Participaria de uma reunião com o professor orientador para acertar detalhes de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em uma curva, o veículo de carga encurralou o rapaz no lado esquerdo da pista. O trecho não tem área de recuo ou acostamento. O estudante perdeu o equilíbrio, caiu dentro da valeta para escoamento de água, e quase foi esmagado pelo segundo módulo da carreta.

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"Tombei primeiro para o lado esquerdo e uma parte da traseira da moto ficou na pista. Então, escutei o barulho do pneu passando por cima da roda. Na sequência, fui jogado para a direita e ainda consegui acompanhar a traseira da carreta passar bem perto e seguir em frente", conta o jovem.

O motorista não parou para prestar socorro e jamais foi identificado porque o trecho não tem câmeras. Um inquérito da Polícia Civil está em andamento.

"Naquele momento, vi que havia sofrido uma fratura exposta no pé direito", lembra Thales. Uma equipe da Ecovias chegou em seguida e levou o rapaz para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Cubatão, de onde ele foi transferido para a Santa Casa de Santos.

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"Durante o percurso, por volta das 20h, consegui avisar minha namorada, que entrou em contato com meus pais. Eles chegaram na Santa Casa aproximadamente duas horas depois", relata. "Em nenhum momento eu apaguei. Fiquei consciente o tempo todo, conversando, queria estar atento'", diz.

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IMAGEM 02: "Escutei o barulho do pneu da carreta passando por cima da roda da moto", conta Thales Martins. Descrição da imagem #pracegover: Foto da moto Honda XRE 300 de cor preta com a traseira totalmente destruída. Crédito: Arquivo Pessoal.  Foto: Estadão

Um time multidisciplinar da Santa Casa de Santos avaliou a situação do pé direito do rapaz e os médicos decidiram pela amputação porque não havia mais possibilidade de reconstrução. "Meu calcanho ficou destroçado e a parte de circulação sanguínea estava acabada. Por isso, havia grande possibilidade de infecção e de perda de sangue, o que colocava minha vida em risco", explica Thales.

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A cirurgia feita abaixo do joelho, 20 centímetros acima do pé, chamada de amputação transtibial, durou quatro horas.

Thales fazia estágio na TIM Brasil, no PISA (Polo Industrial de Santo André), no ABC Paulista, onde funcionam os setores de call center, segurança digital e tecnologia da informação. Horas antes do acidente, havia passado pelos exames demissional e admissional porque seria efetivado na empresa, no cargo de analista.

"Acordei no dia seguinte pensando no que havia acontecido, na realização do meu sonho de ser efetivado. Pensei no valor da vida e do tempo. Muitas vezes, deixamos de conversar com alguém hoje porque podemos fazer isso amanhã. Posso afirmar, com plena confiança, que minha consciência se expandiu naquele momento", conta.

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AMPUTAÇÃO - Os médicos que operaram Thales disseram ao jovem que, se o pé direito não fosse removido, a possibilidade de ele voltar a caminhar com segurança e naturalidade era nula. "Eu não conhecia ninguém que tivesse membro amputado, jamais havia convivido de perto com esse universo. Então, fui pesquisar e descobri que, somente no Brasil, mais de 100 mil pessoas usam próteses", comenta o rapaz.

SEGUIR A VIDA - Thales afirma que precisou de muito autocontrole para não deixar seus pais, familiares e amigos ainda mais assustados com a situação. "Minha mãe foi a única a ver meu pé depois da amputação, com ordem do médico, porque ninguém conseguia aceitar a retirada", diz.

O rapaz foi transferido para o Hospital Assunção, em São Bernardo do Campo, também no ABC Paulista, no dia seguinte à cirurgia. "Mais de 40 pessoas, entre muitos amigos, estavam me esperando, querendo notícias sobre meu estado de saúde e, principalmente, sobre minha condição mental, mas eu estava bem e conseguia contar todos os detalhes do acidente. Eu percebi que precisava demonstrar tranquilidade para que todos ficassem calmos", relembra.

 Foto: Estadão

 Foto: Estadão

REABILITAÇÃO - Entre o acidente a saída do hospital, foram dez dias. "Logo no começo, tive a dor do membro fantasma. Então, eu ficava na frente do espelho e passava a mão para tentar entender que não havia mais o pé", comenta. "Um grande amigo meu, Igor, que cursa Fisioterapia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), me apresentou ao professor que comanda um centro de reabilitação nessa universidade, onde os alunos fazem estágio", diz.

Com 1,86m de altura e pesando aproximadamente 75 quilos, Thales foi atleta registrado na Federação Paulista de Basketball durante quatro anos. Jamais foi tratado como vítima e nunca permitiu esse tipo de postura por parte de seus terapeutas. "Não teve moleza", relembra. "O professor que comandava a reabilitação falou sobre as experiências dele com outras pessoas amputadas. Foi uma conversa muito real e analítica", ressalta.

Para que Thales pudesse usar a prótese, surgiu a necessidade de uma nova cirurgia, dessa vez para acertar o formato da extremidade de sua perna onde o equipamento seria encaixado. O rapaz buscou opiniões de diversos especialistas e passou por consulta com o traumatologista e ortopedista Marco Antônio Guedes, especializado em amputações. O próprio médico usa uma prótese na perna esquerda.

"Ele explicou que o procedimento seria necessário para evitar problemas no futuro, porque a área do coto da amputação sofre modificações naturais, mas fazendo acompanhamento, tenho ao menos cinco anos para pensar nisso. Ainda não fiz porque teria de ser na rede particular e o custo é bem alto. Então, decidi usar a prótese sem passar por essa cirurgia", explica Thales.

A reabilitação envolveu um trabalho diário de recuperação muscular. "Foi 'pegado' mesmo, como em uma academia. Eu gosto bastante desse tipo de atividade", conta o jovem.

VOLTA AO TRABALHO - Durante todo o processo de recuperação, desde o dia do acidente, Thales esteve em contato com a TIM, onde havia concluído o estágio e se preparava para assumir novas funções. A operadora manteve o rapaz no quadro de estagiários durante a reabilitação, e ele continuou recebendo salário e todos os benefícios, inclusive convênio médico. Foi uma das médicas da companhia que ajudou na transferência entre os hospitais logo após a cirurgia de amputação.

No dia 17 de dezembro de 2017, menos de quatro meses depois de ser esmagado por uma carreta na Rodovia Anchieta, ter o pé direito amputado, passar pela reabilitação e aprender a usar uma prótese, Thales começou a trabalhar na TIM como funcionário efetivado na área de tecnologia da informação, no cargo de analista de teste de qualidade.

ACESSIBILIDADE - Outra data marcante na vida do rapaz é 30 de outubro de 2017. "Foi quando apresentei meu TCC e o primeiro dia de uso da prótese", conta.

Em uma dessas incríveis congruências da vida, Thales já havia criado, durante o curso universitário, um aplicativo para pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva que informa a localização e o número do ônibus que essa pessoa pretende pegar.

PESSOA COM DEFICIÊNCIA - A juventude de Thales e sua boa condição física foram fundamentais na rápida recuperação, inclusive no tempo necessário para treinamento da marcha, equilíbrio e outros detalhes específicos, mas o equilíbrio emocional foi essencial nesse processo.

"Eu enfrento dificuldades, mas todas as pessoas têm suas próprias batalhas. Os outros só podem saber o que eu passei quando conseguem ver minha prótese. Estou conhecendo esse universo e convivendo com pessoas que vivenciam problemas muito mais graves. A prótese é uma aliada para a sequência da vida. Eu só perdi um pé, a cabeça e todo o resto do corpo funcionam plenamente", conclui Thales Martins.

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Uma carreta bitrem com dois contêineres vermelhos trafega pelo trecho de serra da Rodovia Anchieta em direção ao litoral. Um pouco à frente, o estudante Thales Gabriel Monteiro Martins, de 21 anos, segue pelo centro da faixa com uma moto Honda XRE 300.

Naquele dia 22 de agosto de 2017, por volta de 18h50, Thales estava a caminho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Cubatão, na Baixada Santista, onde cursava o último ano de ciências da computação. Participaria de uma reunião com o professor orientador para acertar detalhes de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em uma curva, o veículo de carga encurralou o rapaz no lado esquerdo da pista. O trecho não tem área de recuo ou acostamento. O estudante perdeu o equilíbrio, caiu dentro da valeta para escoamento de água, e quase foi esmagado pelo segundo módulo da carreta.

"Tombei primeiro para o lado esquerdo e uma parte da traseira da moto ficou na pista. Então, escutei o barulho do pneu passando por cima da roda. Na sequência, fui jogado para a direita e ainda consegui acompanhar a traseira da carreta passar bem perto e seguir em frente", conta o jovem.

O motorista não parou para prestar socorro e jamais foi identificado porque o trecho não tem câmeras. Um inquérito da Polícia Civil está em andamento.

"Naquele momento, vi que havia sofrido uma fratura exposta no pé direito", lembra Thales. Uma equipe da Ecovias chegou em seguida e levou o rapaz para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Cubatão, de onde ele foi transferido para a Santa Casa de Santos.

"Durante o percurso, por volta das 20h, consegui avisar minha namorada, que entrou em contato com meus pais. Eles chegaram na Santa Casa aproximadamente duas horas depois", relata. "Em nenhum momento eu apaguei. Fiquei consciente o tempo todo, conversando, queria estar atento'", diz.

IMAGEM 02: "Escutei o barulho do pneu da carreta passando por cima da roda da moto", conta Thales Martins. Descrição da imagem #pracegover: Foto da moto Honda XRE 300 de cor preta com a traseira totalmente destruída. Crédito: Arquivo Pessoal.  Foto: Estadão

Um time multidisciplinar da Santa Casa de Santos avaliou a situação do pé direito do rapaz e os médicos decidiram pela amputação porque não havia mais possibilidade de reconstrução. "Meu calcanho ficou destroçado e a parte de circulação sanguínea estava acabada. Por isso, havia grande possibilidade de infecção e de perda de sangue, o que colocava minha vida em risco", explica Thales.

A cirurgia feita abaixo do joelho, 20 centímetros acima do pé, chamada de amputação transtibial, durou quatro horas.

Thales fazia estágio na TIM Brasil, no PISA (Polo Industrial de Santo André), no ABC Paulista, onde funcionam os setores de call center, segurança digital e tecnologia da informação. Horas antes do acidente, havia passado pelos exames demissional e admissional porque seria efetivado na empresa, no cargo de analista.

"Acordei no dia seguinte pensando no que havia acontecido, na realização do meu sonho de ser efetivado. Pensei no valor da vida e do tempo. Muitas vezes, deixamos de conversar com alguém hoje porque podemos fazer isso amanhã. Posso afirmar, com plena confiança, que minha consciência se expandiu naquele momento", conta.

AMPUTAÇÃO - Os médicos que operaram Thales disseram ao jovem que, se o pé direito não fosse removido, a possibilidade de ele voltar a caminhar com segurança e naturalidade era nula. "Eu não conhecia ninguém que tivesse membro amputado, jamais havia convivido de perto com esse universo. Então, fui pesquisar e descobri que, somente no Brasil, mais de 100 mil pessoas usam próteses", comenta o rapaz.

SEGUIR A VIDA - Thales afirma que precisou de muito autocontrole para não deixar seus pais, familiares e amigos ainda mais assustados com a situação. "Minha mãe foi a única a ver meu pé depois da amputação, com ordem do médico, porque ninguém conseguia aceitar a retirada", diz.

O rapaz foi transferido para o Hospital Assunção, em São Bernardo do Campo, também no ABC Paulista, no dia seguinte à cirurgia. "Mais de 40 pessoas, entre muitos amigos, estavam me esperando, querendo notícias sobre meu estado de saúde e, principalmente, sobre minha condição mental, mas eu estava bem e conseguia contar todos os detalhes do acidente. Eu percebi que precisava demonstrar tranquilidade para que todos ficassem calmos", relembra.

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REABILITAÇÃO - Entre o acidente a saída do hospital, foram dez dias. "Logo no começo, tive a dor do membro fantasma. Então, eu ficava na frente do espelho e passava a mão para tentar entender que não havia mais o pé", comenta. "Um grande amigo meu, Igor, que cursa Fisioterapia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), me apresentou ao professor que comanda um centro de reabilitação nessa universidade, onde os alunos fazem estágio", diz.

Com 1,86m de altura e pesando aproximadamente 75 quilos, Thales foi atleta registrado na Federação Paulista de Basketball durante quatro anos. Jamais foi tratado como vítima e nunca permitiu esse tipo de postura por parte de seus terapeutas. "Não teve moleza", relembra. "O professor que comandava a reabilitação falou sobre as experiências dele com outras pessoas amputadas. Foi uma conversa muito real e analítica", ressalta.

Para que Thales pudesse usar a prótese, surgiu a necessidade de uma nova cirurgia, dessa vez para acertar o formato da extremidade de sua perna onde o equipamento seria encaixado. O rapaz buscou opiniões de diversos especialistas e passou por consulta com o traumatologista e ortopedista Marco Antônio Guedes, especializado em amputações. O próprio médico usa uma prótese na perna esquerda.

"Ele explicou que o procedimento seria necessário para evitar problemas no futuro, porque a área do coto da amputação sofre modificações naturais, mas fazendo acompanhamento, tenho ao menos cinco anos para pensar nisso. Ainda não fiz porque teria de ser na rede particular e o custo é bem alto. Então, decidi usar a prótese sem passar por essa cirurgia", explica Thales.

A reabilitação envolveu um trabalho diário de recuperação muscular. "Foi 'pegado' mesmo, como em uma academia. Eu gosto bastante desse tipo de atividade", conta o jovem.

VOLTA AO TRABALHO - Durante todo o processo de recuperação, desde o dia do acidente, Thales esteve em contato com a TIM, onde havia concluído o estágio e se preparava para assumir novas funções. A operadora manteve o rapaz no quadro de estagiários durante a reabilitação, e ele continuou recebendo salário e todos os benefícios, inclusive convênio médico. Foi uma das médicas da companhia que ajudou na transferência entre os hospitais logo após a cirurgia de amputação.

No dia 17 de dezembro de 2017, menos de quatro meses depois de ser esmagado por uma carreta na Rodovia Anchieta, ter o pé direito amputado, passar pela reabilitação e aprender a usar uma prótese, Thales começou a trabalhar na TIM como funcionário efetivado na área de tecnologia da informação, no cargo de analista de teste de qualidade.

ACESSIBILIDADE - Outra data marcante na vida do rapaz é 30 de outubro de 2017. "Foi quando apresentei meu TCC e o primeiro dia de uso da prótese", conta.

Em uma dessas incríveis congruências da vida, Thales já havia criado, durante o curso universitário, um aplicativo para pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva que informa a localização e o número do ônibus que essa pessoa pretende pegar.

PESSOA COM DEFICIÊNCIA - A juventude de Thales e sua boa condição física foram fundamentais na rápida recuperação, inclusive no tempo necessário para treinamento da marcha, equilíbrio e outros detalhes específicos, mas o equilíbrio emocional foi essencial nesse processo.

"Eu enfrento dificuldades, mas todas as pessoas têm suas próprias batalhas. Os outros só podem saber o que eu passei quando conseguem ver minha prótese. Estou conhecendo esse universo e convivendo com pessoas que vivenciam problemas muito mais graves. A prótese é uma aliada para a sequência da vida. Eu só perdi um pé, a cabeça e todo o resto do corpo funcionam plenamente", conclui Thales Martins.

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Naquele dia 22 de agosto de 2017, por volta de 18h50, Thales estava a caminho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Cubatão, na Baixada Santista, onde cursava o último ano de ciências da computação. Participaria de uma reunião com o professor orientador para acertar detalhes de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em uma curva, o veículo de carga encurralou o rapaz no lado esquerdo da pista. O trecho não tem área de recuo ou acostamento. O estudante perdeu o equilíbrio, caiu dentro da valeta para escoamento de água, e quase foi esmagado pelo segundo módulo da carreta.

"Tombei primeiro para o lado esquerdo e uma parte da traseira da moto ficou na pista. Então, escutei o barulho do pneu passando por cima da roda. Na sequência, fui jogado para a direita e ainda consegui acompanhar a traseira da carreta passar bem perto e seguir em frente", conta o jovem.

O motorista não parou para prestar socorro e jamais foi identificado porque o trecho não tem câmeras. Um inquérito da Polícia Civil está em andamento.

"Naquele momento, vi que havia sofrido uma fratura exposta no pé direito", lembra Thales. Uma equipe da Ecovias chegou em seguida e levou o rapaz para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Cubatão, de onde ele foi transferido para a Santa Casa de Santos.

"Durante o percurso, por volta das 20h, consegui avisar minha namorada, que entrou em contato com meus pais. Eles chegaram na Santa Casa aproximadamente duas horas depois", relata. "Em nenhum momento eu apaguei. Fiquei consciente o tempo todo, conversando, queria estar atento'", diz.

IMAGEM 02: "Escutei o barulho do pneu da carreta passando por cima da roda da moto", conta Thales Martins. Descrição da imagem #pracegover: Foto da moto Honda XRE 300 de cor preta com a traseira totalmente destruída. Crédito: Arquivo Pessoal.  Foto: Estadão

Um time multidisciplinar da Santa Casa de Santos avaliou a situação do pé direito do rapaz e os médicos decidiram pela amputação porque não havia mais possibilidade de reconstrução. "Meu calcanho ficou destroçado e a parte de circulação sanguínea estava acabada. Por isso, havia grande possibilidade de infecção e de perda de sangue, o que colocava minha vida em risco", explica Thales.

A cirurgia feita abaixo do joelho, 20 centímetros acima do pé, chamada de amputação transtibial, durou quatro horas.

Thales fazia estágio na TIM Brasil, no PISA (Polo Industrial de Santo André), no ABC Paulista, onde funcionam os setores de call center, segurança digital e tecnologia da informação. Horas antes do acidente, havia passado pelos exames demissional e admissional porque seria efetivado na empresa, no cargo de analista.

"Acordei no dia seguinte pensando no que havia acontecido, na realização do meu sonho de ser efetivado. Pensei no valor da vida e do tempo. Muitas vezes, deixamos de conversar com alguém hoje porque podemos fazer isso amanhã. Posso afirmar, com plena confiança, que minha consciência se expandiu naquele momento", conta.

AMPUTAÇÃO - Os médicos que operaram Thales disseram ao jovem que, se o pé direito não fosse removido, a possibilidade de ele voltar a caminhar com segurança e naturalidade era nula. "Eu não conhecia ninguém que tivesse membro amputado, jamais havia convivido de perto com esse universo. Então, fui pesquisar e descobri que, somente no Brasil, mais de 100 mil pessoas usam próteses", comenta o rapaz.

SEGUIR A VIDA - Thales afirma que precisou de muito autocontrole para não deixar seus pais, familiares e amigos ainda mais assustados com a situação. "Minha mãe foi a única a ver meu pé depois da amputação, com ordem do médico, porque ninguém conseguia aceitar a retirada", diz.

O rapaz foi transferido para o Hospital Assunção, em São Bernardo do Campo, também no ABC Paulista, no dia seguinte à cirurgia. "Mais de 40 pessoas, entre muitos amigos, estavam me esperando, querendo notícias sobre meu estado de saúde e, principalmente, sobre minha condição mental, mas eu estava bem e conseguia contar todos os detalhes do acidente. Eu percebi que precisava demonstrar tranquilidade para que todos ficassem calmos", relembra.

 Foto: Estadão

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REABILITAÇÃO - Entre o acidente a saída do hospital, foram dez dias. "Logo no começo, tive a dor do membro fantasma. Então, eu ficava na frente do espelho e passava a mão para tentar entender que não havia mais o pé", comenta. "Um grande amigo meu, Igor, que cursa Fisioterapia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), me apresentou ao professor que comanda um centro de reabilitação nessa universidade, onde os alunos fazem estágio", diz.

Com 1,86m de altura e pesando aproximadamente 75 quilos, Thales foi atleta registrado na Federação Paulista de Basketball durante quatro anos. Jamais foi tratado como vítima e nunca permitiu esse tipo de postura por parte de seus terapeutas. "Não teve moleza", relembra. "O professor que comandava a reabilitação falou sobre as experiências dele com outras pessoas amputadas. Foi uma conversa muito real e analítica", ressalta.

Para que Thales pudesse usar a prótese, surgiu a necessidade de uma nova cirurgia, dessa vez para acertar o formato da extremidade de sua perna onde o equipamento seria encaixado. O rapaz buscou opiniões de diversos especialistas e passou por consulta com o traumatologista e ortopedista Marco Antônio Guedes, especializado em amputações. O próprio médico usa uma prótese na perna esquerda.

"Ele explicou que o procedimento seria necessário para evitar problemas no futuro, porque a área do coto da amputação sofre modificações naturais, mas fazendo acompanhamento, tenho ao menos cinco anos para pensar nisso. Ainda não fiz porque teria de ser na rede particular e o custo é bem alto. Então, decidi usar a prótese sem passar por essa cirurgia", explica Thales.

A reabilitação envolveu um trabalho diário de recuperação muscular. "Foi 'pegado' mesmo, como em uma academia. Eu gosto bastante desse tipo de atividade", conta o jovem.

VOLTA AO TRABALHO - Durante todo o processo de recuperação, desde o dia do acidente, Thales esteve em contato com a TIM, onde havia concluído o estágio e se preparava para assumir novas funções. A operadora manteve o rapaz no quadro de estagiários durante a reabilitação, e ele continuou recebendo salário e todos os benefícios, inclusive convênio médico. Foi uma das médicas da companhia que ajudou na transferência entre os hospitais logo após a cirurgia de amputação.

No dia 17 de dezembro de 2017, menos de quatro meses depois de ser esmagado por uma carreta na Rodovia Anchieta, ter o pé direito amputado, passar pela reabilitação e aprender a usar uma prótese, Thales começou a trabalhar na TIM como funcionário efetivado na área de tecnologia da informação, no cargo de analista de teste de qualidade.

ACESSIBILIDADE - Outra data marcante na vida do rapaz é 30 de outubro de 2017. "Foi quando apresentei meu TCC e o primeiro dia de uso da prótese", conta.

Em uma dessas incríveis congruências da vida, Thales já havia criado, durante o curso universitário, um aplicativo para pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva que informa a localização e o número do ônibus que essa pessoa pretende pegar.

PESSOA COM DEFICIÊNCIA - A juventude de Thales e sua boa condição física foram fundamentais na rápida recuperação, inclusive no tempo necessário para treinamento da marcha, equilíbrio e outros detalhes específicos, mas o equilíbrio emocional foi essencial nesse processo.

"Eu enfrento dificuldades, mas todas as pessoas têm suas próprias batalhas. Os outros só podem saber o que eu passei quando conseguem ver minha prótese. Estou conhecendo esse universo e convivendo com pessoas que vivenciam problemas muito mais graves. A prótese é uma aliada para a sequência da vida. Eu só perdi um pé, a cabeça e todo o resto do corpo funcionam plenamente", conclui Thales Martins.

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Uma carreta bitrem com dois contêineres vermelhos trafega pelo trecho de serra da Rodovia Anchieta em direção ao litoral. Um pouco à frente, o estudante Thales Gabriel Monteiro Martins, de 21 anos, segue pelo centro da faixa com uma moto Honda XRE 300.

Naquele dia 22 de agosto de 2017, por volta de 18h50, Thales estava a caminho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Cubatão, na Baixada Santista, onde cursava o último ano de ciências da computação. Participaria de uma reunião com o professor orientador para acertar detalhes de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em uma curva, o veículo de carga encurralou o rapaz no lado esquerdo da pista. O trecho não tem área de recuo ou acostamento. O estudante perdeu o equilíbrio, caiu dentro da valeta para escoamento de água, e quase foi esmagado pelo segundo módulo da carreta.

"Tombei primeiro para o lado esquerdo e uma parte da traseira da moto ficou na pista. Então, escutei o barulho do pneu passando por cima da roda. Na sequência, fui jogado para a direita e ainda consegui acompanhar a traseira da carreta passar bem perto e seguir em frente", conta o jovem.

O motorista não parou para prestar socorro e jamais foi identificado porque o trecho não tem câmeras. Um inquérito da Polícia Civil está em andamento.

"Naquele momento, vi que havia sofrido uma fratura exposta no pé direito", lembra Thales. Uma equipe da Ecovias chegou em seguida e levou o rapaz para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Cubatão, de onde ele foi transferido para a Santa Casa de Santos.

"Durante o percurso, por volta das 20h, consegui avisar minha namorada, que entrou em contato com meus pais. Eles chegaram na Santa Casa aproximadamente duas horas depois", relata. "Em nenhum momento eu apaguei. Fiquei consciente o tempo todo, conversando, queria estar atento'", diz.

IMAGEM 02: "Escutei o barulho do pneu da carreta passando por cima da roda da moto", conta Thales Martins. Descrição da imagem #pracegover: Foto da moto Honda XRE 300 de cor preta com a traseira totalmente destruída. Crédito: Arquivo Pessoal.  Foto: Estadão

Um time multidisciplinar da Santa Casa de Santos avaliou a situação do pé direito do rapaz e os médicos decidiram pela amputação porque não havia mais possibilidade de reconstrução. "Meu calcanho ficou destroçado e a parte de circulação sanguínea estava acabada. Por isso, havia grande possibilidade de infecção e de perda de sangue, o que colocava minha vida em risco", explica Thales.

A cirurgia feita abaixo do joelho, 20 centímetros acima do pé, chamada de amputação transtibial, durou quatro horas.

Thales fazia estágio na TIM Brasil, no PISA (Polo Industrial de Santo André), no ABC Paulista, onde funcionam os setores de call center, segurança digital e tecnologia da informação. Horas antes do acidente, havia passado pelos exames demissional e admissional porque seria efetivado na empresa, no cargo de analista.

"Acordei no dia seguinte pensando no que havia acontecido, na realização do meu sonho de ser efetivado. Pensei no valor da vida e do tempo. Muitas vezes, deixamos de conversar com alguém hoje porque podemos fazer isso amanhã. Posso afirmar, com plena confiança, que minha consciência se expandiu naquele momento", conta.

AMPUTAÇÃO - Os médicos que operaram Thales disseram ao jovem que, se o pé direito não fosse removido, a possibilidade de ele voltar a caminhar com segurança e naturalidade era nula. "Eu não conhecia ninguém que tivesse membro amputado, jamais havia convivido de perto com esse universo. Então, fui pesquisar e descobri que, somente no Brasil, mais de 100 mil pessoas usam próteses", comenta o rapaz.

SEGUIR A VIDA - Thales afirma que precisou de muito autocontrole para não deixar seus pais, familiares e amigos ainda mais assustados com a situação. "Minha mãe foi a única a ver meu pé depois da amputação, com ordem do médico, porque ninguém conseguia aceitar a retirada", diz.

O rapaz foi transferido para o Hospital Assunção, em São Bernardo do Campo, também no ABC Paulista, no dia seguinte à cirurgia. "Mais de 40 pessoas, entre muitos amigos, estavam me esperando, querendo notícias sobre meu estado de saúde e, principalmente, sobre minha condição mental, mas eu estava bem e conseguia contar todos os detalhes do acidente. Eu percebi que precisava demonstrar tranquilidade para que todos ficassem calmos", relembra.

 Foto: Estadão

 Foto: Estadão

REABILITAÇÃO - Entre o acidente a saída do hospital, foram dez dias. "Logo no começo, tive a dor do membro fantasma. Então, eu ficava na frente do espelho e passava a mão para tentar entender que não havia mais o pé", comenta. "Um grande amigo meu, Igor, que cursa Fisioterapia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), me apresentou ao professor que comanda um centro de reabilitação nessa universidade, onde os alunos fazem estágio", diz.

Com 1,86m de altura e pesando aproximadamente 75 quilos, Thales foi atleta registrado na Federação Paulista de Basketball durante quatro anos. Jamais foi tratado como vítima e nunca permitiu esse tipo de postura por parte de seus terapeutas. "Não teve moleza", relembra. "O professor que comandava a reabilitação falou sobre as experiências dele com outras pessoas amputadas. Foi uma conversa muito real e analítica", ressalta.

Para que Thales pudesse usar a prótese, surgiu a necessidade de uma nova cirurgia, dessa vez para acertar o formato da extremidade de sua perna onde o equipamento seria encaixado. O rapaz buscou opiniões de diversos especialistas e passou por consulta com o traumatologista e ortopedista Marco Antônio Guedes, especializado em amputações. O próprio médico usa uma prótese na perna esquerda.

"Ele explicou que o procedimento seria necessário para evitar problemas no futuro, porque a área do coto da amputação sofre modificações naturais, mas fazendo acompanhamento, tenho ao menos cinco anos para pensar nisso. Ainda não fiz porque teria de ser na rede particular e o custo é bem alto. Então, decidi usar a prótese sem passar por essa cirurgia", explica Thales.

A reabilitação envolveu um trabalho diário de recuperação muscular. "Foi 'pegado' mesmo, como em uma academia. Eu gosto bastante desse tipo de atividade", conta o jovem.

VOLTA AO TRABALHO - Durante todo o processo de recuperação, desde o dia do acidente, Thales esteve em contato com a TIM, onde havia concluído o estágio e se preparava para assumir novas funções. A operadora manteve o rapaz no quadro de estagiários durante a reabilitação, e ele continuou recebendo salário e todos os benefícios, inclusive convênio médico. Foi uma das médicas da companhia que ajudou na transferência entre os hospitais logo após a cirurgia de amputação.

No dia 17 de dezembro de 2017, menos de quatro meses depois de ser esmagado por uma carreta na Rodovia Anchieta, ter o pé direito amputado, passar pela reabilitação e aprender a usar uma prótese, Thales começou a trabalhar na TIM como funcionário efetivado na área de tecnologia da informação, no cargo de analista de teste de qualidade.

ACESSIBILIDADE - Outra data marcante na vida do rapaz é 30 de outubro de 2017. "Foi quando apresentei meu TCC e o primeiro dia de uso da prótese", conta.

Em uma dessas incríveis congruências da vida, Thales já havia criado, durante o curso universitário, um aplicativo para pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva que informa a localização e o número do ônibus que essa pessoa pretende pegar.

PESSOA COM DEFICIÊNCIA - A juventude de Thales e sua boa condição física foram fundamentais na rápida recuperação, inclusive no tempo necessário para treinamento da marcha, equilíbrio e outros detalhes específicos, mas o equilíbrio emocional foi essencial nesse processo.

"Eu enfrento dificuldades, mas todas as pessoas têm suas próprias batalhas. Os outros só podem saber o que eu passei quando conseguem ver minha prótese. Estou conhecendo esse universo e convivendo com pessoas que vivenciam problemas muito mais graves. A prótese é uma aliada para a sequência da vida. Eu só perdi um pé, a cabeça e todo o resto do corpo funcionam plenamente", conclui Thales Martins.

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Uma carreta bitrem com dois contêineres vermelhos trafega pelo trecho de serra da Rodovia Anchieta em direção ao litoral. Um pouco à frente, o estudante Thales Gabriel Monteiro Martins, de 21 anos, segue pelo centro da faixa com uma moto Honda XRE 300.

Naquele dia 22 de agosto de 2017, por volta de 18h50, Thales estava a caminho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Cubatão, na Baixada Santista, onde cursava o último ano de ciências da computação. Participaria de uma reunião com o professor orientador para acertar detalhes de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em uma curva, o veículo de carga encurralou o rapaz no lado esquerdo da pista. O trecho não tem área de recuo ou acostamento. O estudante perdeu o equilíbrio, caiu dentro da valeta para escoamento de água, e quase foi esmagado pelo segundo módulo da carreta.

"Tombei primeiro para o lado esquerdo e uma parte da traseira da moto ficou na pista. Então, escutei o barulho do pneu passando por cima da roda. Na sequência, fui jogado para a direita e ainda consegui acompanhar a traseira da carreta passar bem perto e seguir em frente", conta o jovem.

O motorista não parou para prestar socorro e jamais foi identificado porque o trecho não tem câmeras. Um inquérito da Polícia Civil está em andamento.

"Naquele momento, vi que havia sofrido uma fratura exposta no pé direito", lembra Thales. Uma equipe da Ecovias chegou em seguida e levou o rapaz para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Cubatão, de onde ele foi transferido para a Santa Casa de Santos.

"Durante o percurso, por volta das 20h, consegui avisar minha namorada, que entrou em contato com meus pais. Eles chegaram na Santa Casa aproximadamente duas horas depois", relata. "Em nenhum momento eu apaguei. Fiquei consciente o tempo todo, conversando, queria estar atento'", diz.

IMAGEM 02: "Escutei o barulho do pneu da carreta passando por cima da roda da moto", conta Thales Martins. Descrição da imagem #pracegover: Foto da moto Honda XRE 300 de cor preta com a traseira totalmente destruída. Crédito: Arquivo Pessoal.  Foto: Estadão

Um time multidisciplinar da Santa Casa de Santos avaliou a situação do pé direito do rapaz e os médicos decidiram pela amputação porque não havia mais possibilidade de reconstrução. "Meu calcanho ficou destroçado e a parte de circulação sanguínea estava acabada. Por isso, havia grande possibilidade de infecção e de perda de sangue, o que colocava minha vida em risco", explica Thales.

A cirurgia feita abaixo do joelho, 20 centímetros acima do pé, chamada de amputação transtibial, durou quatro horas.

Thales fazia estágio na TIM Brasil, no PISA (Polo Industrial de Santo André), no ABC Paulista, onde funcionam os setores de call center, segurança digital e tecnologia da informação. Horas antes do acidente, havia passado pelos exames demissional e admissional porque seria efetivado na empresa, no cargo de analista.

"Acordei no dia seguinte pensando no que havia acontecido, na realização do meu sonho de ser efetivado. Pensei no valor da vida e do tempo. Muitas vezes, deixamos de conversar com alguém hoje porque podemos fazer isso amanhã. Posso afirmar, com plena confiança, que minha consciência se expandiu naquele momento", conta.

AMPUTAÇÃO - Os médicos que operaram Thales disseram ao jovem que, se o pé direito não fosse removido, a possibilidade de ele voltar a caminhar com segurança e naturalidade era nula. "Eu não conhecia ninguém que tivesse membro amputado, jamais havia convivido de perto com esse universo. Então, fui pesquisar e descobri que, somente no Brasil, mais de 100 mil pessoas usam próteses", comenta o rapaz.

SEGUIR A VIDA - Thales afirma que precisou de muito autocontrole para não deixar seus pais, familiares e amigos ainda mais assustados com a situação. "Minha mãe foi a única a ver meu pé depois da amputação, com ordem do médico, porque ninguém conseguia aceitar a retirada", diz.

O rapaz foi transferido para o Hospital Assunção, em São Bernardo do Campo, também no ABC Paulista, no dia seguinte à cirurgia. "Mais de 40 pessoas, entre muitos amigos, estavam me esperando, querendo notícias sobre meu estado de saúde e, principalmente, sobre minha condição mental, mas eu estava bem e conseguia contar todos os detalhes do acidente. Eu percebi que precisava demonstrar tranquilidade para que todos ficassem calmos", relembra.

 Foto: Estadão

 Foto: Estadão

REABILITAÇÃO - Entre o acidente a saída do hospital, foram dez dias. "Logo no começo, tive a dor do membro fantasma. Então, eu ficava na frente do espelho e passava a mão para tentar entender que não havia mais o pé", comenta. "Um grande amigo meu, Igor, que cursa Fisioterapia na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), me apresentou ao professor que comanda um centro de reabilitação nessa universidade, onde os alunos fazem estágio", diz.

Com 1,86m de altura e pesando aproximadamente 75 quilos, Thales foi atleta registrado na Federação Paulista de Basketball durante quatro anos. Jamais foi tratado como vítima e nunca permitiu esse tipo de postura por parte de seus terapeutas. "Não teve moleza", relembra. "O professor que comandava a reabilitação falou sobre as experiências dele com outras pessoas amputadas. Foi uma conversa muito real e analítica", ressalta.

Para que Thales pudesse usar a prótese, surgiu a necessidade de uma nova cirurgia, dessa vez para acertar o formato da extremidade de sua perna onde o equipamento seria encaixado. O rapaz buscou opiniões de diversos especialistas e passou por consulta com o traumatologista e ortopedista Marco Antônio Guedes, especializado em amputações. O próprio médico usa uma prótese na perna esquerda.

"Ele explicou que o procedimento seria necessário para evitar problemas no futuro, porque a área do coto da amputação sofre modificações naturais, mas fazendo acompanhamento, tenho ao menos cinco anos para pensar nisso. Ainda não fiz porque teria de ser na rede particular e o custo é bem alto. Então, decidi usar a prótese sem passar por essa cirurgia", explica Thales.

A reabilitação envolveu um trabalho diário de recuperação muscular. "Foi 'pegado' mesmo, como em uma academia. Eu gosto bastante desse tipo de atividade", conta o jovem.

VOLTA AO TRABALHO - Durante todo o processo de recuperação, desde o dia do acidente, Thales esteve em contato com a TIM, onde havia concluído o estágio e se preparava para assumir novas funções. A operadora manteve o rapaz no quadro de estagiários durante a reabilitação, e ele continuou recebendo salário e todos os benefícios, inclusive convênio médico. Foi uma das médicas da companhia que ajudou na transferência entre os hospitais logo após a cirurgia de amputação.

No dia 17 de dezembro de 2017, menos de quatro meses depois de ser esmagado por uma carreta na Rodovia Anchieta, ter o pé direito amputado, passar pela reabilitação e aprender a usar uma prótese, Thales começou a trabalhar na TIM como funcionário efetivado na área de tecnologia da informação, no cargo de analista de teste de qualidade.

ACESSIBILIDADE - Outra data marcante na vida do rapaz é 30 de outubro de 2017. "Foi quando apresentei meu TCC e o primeiro dia de uso da prótese", conta.

Em uma dessas incríveis congruências da vida, Thales já havia criado, durante o curso universitário, um aplicativo para pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva que informa a localização e o número do ônibus que essa pessoa pretende pegar.

PESSOA COM DEFICIÊNCIA - A juventude de Thales e sua boa condição física foram fundamentais na rápida recuperação, inclusive no tempo necessário para treinamento da marcha, equilíbrio e outros detalhes específicos, mas o equilíbrio emocional foi essencial nesse processo.

"Eu enfrento dificuldades, mas todas as pessoas têm suas próprias batalhas. Os outros só podem saber o que eu passei quando conseguem ver minha prótese. Estou conhecendo esse universo e convivendo com pessoas que vivenciam problemas muito mais graves. A prótese é uma aliada para a sequência da vida. Eu só perdi um pé, a cabeça e todo o resto do corpo funcionam plenamente", conclui Thales Martins.

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