Violência, trabalho, migrações: por que Censo do IBGE mostra que capitais perdem moradores?


Movimento de interiorização da população brasileira cresceu nos últimos 12 anos

Por José Maria Tomazela
Atualização: Correção:

SOROCABA – Em 2017, quando decidiu deixar o bairro do Jacaré, na zona norte do Rio de Janeiro, o então fuzileiro naval Filipe Augusto Ribeiro Oliveira, de 31 anos, só queria um lugar mais tranquilo para formar sua família. “Eu e minha esposa tínhamos projeto de ter filhos e onde a gente morava, no Rio, era muito perigoso.” A oportunidade apareceu na forma de uma transferência para o Centro Aramar, da Marinha, em Iperó, interior de São Paulo.

O Rio de Janeiro é uma das oito entre as 27 capitais brasileiras que tiveram queda no número de habitantes entre os anos de 2010 e 2022, segundo dados do Censo 2022, divulgados nesta quarta-feira, 27, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A capital fluminense está atrás apenas de Salvador (BA) em redução de população. As outras capitais que perderam moradores são Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Natal, Belém e Fortaleza.

O Censo divulgado nesta quarta-feira evidencia um movimento de interiorização da população. Entre as possíveis explicações, de acordo com especialistas, estão o avanço do agronegócio, um dos principais motores da economia nos últimos anos, e também as mudanças nas dinâmicas de trabalho, que permitiram o home office e menor concentração de mão de obra em grandes centros urbanos.

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Sorocaba, no interior de São Paulo, teve um aumento populacional de 23,3% entre 2010 e 2022 Foto: Prefeitura de Sorocaba

Esse movimento não se restringe às capitais. Entre as 319 maiores cidades do Brasil (aquelas com mais de cem mil habitantes), 39 apresentaram redução populacional na comparação entre os números de 2010 e 2022 – aumento considerável em relação a oscilação registrada entre 2000 e 2010, quando apenas quatro cidades maiores viram essa redução.

“O fenômeno da interiorização está bem documentado desde o Censo de 2000 (e também em 2010) por motivos econômicos. A atividade econômica começou a crescer mais em áreas rurais, ligadas ao agronegócio. Começou a haver uma demanda maior por trabalho nessas regiões, inclusive com maiores salários, o que atraiu a população das cidades”, diz Daniel Duque, economista, Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

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Duque destaca ainda interiorização do crescimento econômico no País. “As cidades maiores têm questões urbanas como violência, problemas de mobilidade. Além disso, durante a pandemia, e por conta do home office, muita gente acabou preferindo ir para lugares menores. Mas esse é um movimento mais limitado porque engloba trabalhadores mais qualificados e não explica a totalidade da surpresa. O movimento está mais ligado à interiorização do crescimento econômico mesmo.”

Sonho de ser ator

Ao deixar o Rio, Filipe Augusto Ribeiro conseguiu uma casa em um bairro tranquilo de Sorocaba e se mudou com a esposa, Hadassa. “A gente embarcou nessa e não se arrependeu. Hoje vivemos em paz, sem aquela tensão pela criminalidade lá do Rio, ainda mais eu sendo militar.” Em 2021, o casal teve uma filha, a Clarice. Para seguir a carreira militar e subir de patente, Filipe seria obrigado a voltar para o Rio para fazer cursos de especialização.

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O casal ponderou e ele decidiu pedir baixa da Marinha. “Agora é que não volto mais, a não ser para ver meus pais e sogros. Em nenhum minuto da minha vida me arrependi de deixar o Rio. A gente ama essa nova vida. Meu sogro e minha sogra estão com projeto de vender a casa lá (no Rio) e vir para cá.” Filipe passou a trabalhar como vendedor de peças para caminhões, a fazer cursos de teatro e frequentar o meio artístico da cidade. “Meu sonho é ser ator”, disse.

‘Tchau, Porto Alegre’

Contrariando a canção dos gaúchos Kleiton e Kledir, a gaúcha Daniela Martins, de 48 anos, deu um “tchau” para Porto Alegre em agosto de 2022, seguindo as pegadas do filho. Ele havia se mudado no ano anterior para Santos, no litoral paulista. “Meu filho casou-se com uma santista e se mudou. Quando eles tiveram um filho, eu quis ficar perto deles”, disse.

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Daniela Martins deixou a região metropolitana de Porto Alegre e se mudou para Sorocaba, interior de São Paulo. Foto: Daniela Martins/Instagram/Reprodução

Segundo Daniela, outros fatores também pesaram para a mudança. “Foi uma questão familiar, mas também porque a região metropolitana (de Porto Alegre) estava ficando muito violenta, com milícias, tráfico, além do trânsito”, disse. Daniela conta que, já em Santos, ela se assustou com o custo de vida, mais alto do que no sul. “Conversei com meu filho e decidimos ver as condições de outra cidade para morarmos. Chegamos a pensar em São José dos Campos, Florianópolis e Balneário Camboriú, mas escolhemos Sorocaba.”

Foram levados em conta o custo e a qualidade de vida, as condições do trânsito e os índices de criminalidade, segundo ela. “Trabalho como motorista particular e de aplicativo e questões como trânsito, violência e custo de vida são relevantes. Aqui tudo isso é melhor”, disse.

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Daniela avalia que, ao contrário do que acontecia antes, atualmente as mudanças são facilitadas pela internet e as pessoas buscam cidades menores, com mais qualidade de vida. “Meu filho, por exemplo, trabalha em home (casa) e atende clientes do exterior, tudo pela internet.”

Segurança financeira

A mineira Carina Duarte Guerra, de 40 anos, deixou a capital Belo Horizonte há quase dez anos em busca de melhores condições econômicas para viver. Ela morava com a família na região do aeroporto quando decidiu se mudar para o interior de São Paulo, no final de 2013.

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O que motivou a mudança foi a necessidade de mais segurança financeira: com dois filhos pequenos, ela precisava ganhar mais e não via muita perspectiva para isso na região onde residia, na capital mineira. “Então, eu decidi mudar de ares mesmo, mas logo que cheguei em Sorocaba vi que dava para ganhar mais e viver melhor.”

Ela contou que, um ano depois, já havia conseguido comprar seu próprio apartamento. Carina teve mais um filho e mantém um salão de manicure, em Sorocaba. “Não me arrependo de ter mudado. Tem trabalho, escola, condições de saúde e é uma cidade mais tranquila. Hoje vivo melhor aqui”, disse.

Os casos de Filipe Augusto Ribeiro, da gaúcha Daniela Martins e da mineira Carina Duarte Guerra reforçam as estatísticas de Sorocaba. A cidade no interior de São Paulo tinha, no Censo de 2010, 586 mil habitantes e saltou para 723 mil em 2022, um aumento populacional de 23,3% no período.

“De fato, as capitais estão crescendo menos ou mesmo perdendo população para os demais municípios da concentração urbana; isso é um fato novo no Brasil”, afirma o diretor de Geociências do IBGE, Claudio Stenner.

O País conta com 5.570 municípios e quase metade deles (2.495, equivalentes a 44,8% do total) tem até 10 mil habitantes. / COLABOROU ROBERTA JANSEN

SOROCABA – Em 2017, quando decidiu deixar o bairro do Jacaré, na zona norte do Rio de Janeiro, o então fuzileiro naval Filipe Augusto Ribeiro Oliveira, de 31 anos, só queria um lugar mais tranquilo para formar sua família. “Eu e minha esposa tínhamos projeto de ter filhos e onde a gente morava, no Rio, era muito perigoso.” A oportunidade apareceu na forma de uma transferência para o Centro Aramar, da Marinha, em Iperó, interior de São Paulo.

O Rio de Janeiro é uma das oito entre as 27 capitais brasileiras que tiveram queda no número de habitantes entre os anos de 2010 e 2022, segundo dados do Censo 2022, divulgados nesta quarta-feira, 27, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A capital fluminense está atrás apenas de Salvador (BA) em redução de população. As outras capitais que perderam moradores são Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Natal, Belém e Fortaleza.

O Censo divulgado nesta quarta-feira evidencia um movimento de interiorização da população. Entre as possíveis explicações, de acordo com especialistas, estão o avanço do agronegócio, um dos principais motores da economia nos últimos anos, e também as mudanças nas dinâmicas de trabalho, que permitiram o home office e menor concentração de mão de obra em grandes centros urbanos.

Sorocaba, no interior de São Paulo, teve um aumento populacional de 23,3% entre 2010 e 2022 Foto: Prefeitura de Sorocaba

Esse movimento não se restringe às capitais. Entre as 319 maiores cidades do Brasil (aquelas com mais de cem mil habitantes), 39 apresentaram redução populacional na comparação entre os números de 2010 e 2022 – aumento considerável em relação a oscilação registrada entre 2000 e 2010, quando apenas quatro cidades maiores viram essa redução.

“O fenômeno da interiorização está bem documentado desde o Censo de 2000 (e também em 2010) por motivos econômicos. A atividade econômica começou a crescer mais em áreas rurais, ligadas ao agronegócio. Começou a haver uma demanda maior por trabalho nessas regiões, inclusive com maiores salários, o que atraiu a população das cidades”, diz Daniel Duque, economista, Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Duque destaca ainda interiorização do crescimento econômico no País. “As cidades maiores têm questões urbanas como violência, problemas de mobilidade. Além disso, durante a pandemia, e por conta do home office, muita gente acabou preferindo ir para lugares menores. Mas esse é um movimento mais limitado porque engloba trabalhadores mais qualificados e não explica a totalidade da surpresa. O movimento está mais ligado à interiorização do crescimento econômico mesmo.”

Sonho de ser ator

Ao deixar o Rio, Filipe Augusto Ribeiro conseguiu uma casa em um bairro tranquilo de Sorocaba e se mudou com a esposa, Hadassa. “A gente embarcou nessa e não se arrependeu. Hoje vivemos em paz, sem aquela tensão pela criminalidade lá do Rio, ainda mais eu sendo militar.” Em 2021, o casal teve uma filha, a Clarice. Para seguir a carreira militar e subir de patente, Filipe seria obrigado a voltar para o Rio para fazer cursos de especialização.

O casal ponderou e ele decidiu pedir baixa da Marinha. “Agora é que não volto mais, a não ser para ver meus pais e sogros. Em nenhum minuto da minha vida me arrependi de deixar o Rio. A gente ama essa nova vida. Meu sogro e minha sogra estão com projeto de vender a casa lá (no Rio) e vir para cá.” Filipe passou a trabalhar como vendedor de peças para caminhões, a fazer cursos de teatro e frequentar o meio artístico da cidade. “Meu sonho é ser ator”, disse.

‘Tchau, Porto Alegre’

Contrariando a canção dos gaúchos Kleiton e Kledir, a gaúcha Daniela Martins, de 48 anos, deu um “tchau” para Porto Alegre em agosto de 2022, seguindo as pegadas do filho. Ele havia se mudado no ano anterior para Santos, no litoral paulista. “Meu filho casou-se com uma santista e se mudou. Quando eles tiveram um filho, eu quis ficar perto deles”, disse.

Daniela Martins deixou a região metropolitana de Porto Alegre e se mudou para Sorocaba, interior de São Paulo. Foto: Daniela Martins/Instagram/Reprodução

Segundo Daniela, outros fatores também pesaram para a mudança. “Foi uma questão familiar, mas também porque a região metropolitana (de Porto Alegre) estava ficando muito violenta, com milícias, tráfico, além do trânsito”, disse. Daniela conta que, já em Santos, ela se assustou com o custo de vida, mais alto do que no sul. “Conversei com meu filho e decidimos ver as condições de outra cidade para morarmos. Chegamos a pensar em São José dos Campos, Florianópolis e Balneário Camboriú, mas escolhemos Sorocaba.”

Foram levados em conta o custo e a qualidade de vida, as condições do trânsito e os índices de criminalidade, segundo ela. “Trabalho como motorista particular e de aplicativo e questões como trânsito, violência e custo de vida são relevantes. Aqui tudo isso é melhor”, disse.

Daniela avalia que, ao contrário do que acontecia antes, atualmente as mudanças são facilitadas pela internet e as pessoas buscam cidades menores, com mais qualidade de vida. “Meu filho, por exemplo, trabalha em home (casa) e atende clientes do exterior, tudo pela internet.”

Segurança financeira

A mineira Carina Duarte Guerra, de 40 anos, deixou a capital Belo Horizonte há quase dez anos em busca de melhores condições econômicas para viver. Ela morava com a família na região do aeroporto quando decidiu se mudar para o interior de São Paulo, no final de 2013.

O que motivou a mudança foi a necessidade de mais segurança financeira: com dois filhos pequenos, ela precisava ganhar mais e não via muita perspectiva para isso na região onde residia, na capital mineira. “Então, eu decidi mudar de ares mesmo, mas logo que cheguei em Sorocaba vi que dava para ganhar mais e viver melhor.”

Ela contou que, um ano depois, já havia conseguido comprar seu próprio apartamento. Carina teve mais um filho e mantém um salão de manicure, em Sorocaba. “Não me arrependo de ter mudado. Tem trabalho, escola, condições de saúde e é uma cidade mais tranquila. Hoje vivo melhor aqui”, disse.

Os casos de Filipe Augusto Ribeiro, da gaúcha Daniela Martins e da mineira Carina Duarte Guerra reforçam as estatísticas de Sorocaba. A cidade no interior de São Paulo tinha, no Censo de 2010, 586 mil habitantes e saltou para 723 mil em 2022, um aumento populacional de 23,3% no período.

“De fato, as capitais estão crescendo menos ou mesmo perdendo população para os demais municípios da concentração urbana; isso é um fato novo no Brasil”, afirma o diretor de Geociências do IBGE, Claudio Stenner.

O País conta com 5.570 municípios e quase metade deles (2.495, equivalentes a 44,8% do total) tem até 10 mil habitantes. / COLABOROU ROBERTA JANSEN

SOROCABA – Em 2017, quando decidiu deixar o bairro do Jacaré, na zona norte do Rio de Janeiro, o então fuzileiro naval Filipe Augusto Ribeiro Oliveira, de 31 anos, só queria um lugar mais tranquilo para formar sua família. “Eu e minha esposa tínhamos projeto de ter filhos e onde a gente morava, no Rio, era muito perigoso.” A oportunidade apareceu na forma de uma transferência para o Centro Aramar, da Marinha, em Iperó, interior de São Paulo.

O Rio de Janeiro é uma das oito entre as 27 capitais brasileiras que tiveram queda no número de habitantes entre os anos de 2010 e 2022, segundo dados do Censo 2022, divulgados nesta quarta-feira, 27, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A capital fluminense está atrás apenas de Salvador (BA) em redução de população. As outras capitais que perderam moradores são Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Natal, Belém e Fortaleza.

O Censo divulgado nesta quarta-feira evidencia um movimento de interiorização da população. Entre as possíveis explicações, de acordo com especialistas, estão o avanço do agronegócio, um dos principais motores da economia nos últimos anos, e também as mudanças nas dinâmicas de trabalho, que permitiram o home office e menor concentração de mão de obra em grandes centros urbanos.

Sorocaba, no interior de São Paulo, teve um aumento populacional de 23,3% entre 2010 e 2022 Foto: Prefeitura de Sorocaba

Esse movimento não se restringe às capitais. Entre as 319 maiores cidades do Brasil (aquelas com mais de cem mil habitantes), 39 apresentaram redução populacional na comparação entre os números de 2010 e 2022 – aumento considerável em relação a oscilação registrada entre 2000 e 2010, quando apenas quatro cidades maiores viram essa redução.

“O fenômeno da interiorização está bem documentado desde o Censo de 2000 (e também em 2010) por motivos econômicos. A atividade econômica começou a crescer mais em áreas rurais, ligadas ao agronegócio. Começou a haver uma demanda maior por trabalho nessas regiões, inclusive com maiores salários, o que atraiu a população das cidades”, diz Daniel Duque, economista, Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Duque destaca ainda interiorização do crescimento econômico no País. “As cidades maiores têm questões urbanas como violência, problemas de mobilidade. Além disso, durante a pandemia, e por conta do home office, muita gente acabou preferindo ir para lugares menores. Mas esse é um movimento mais limitado porque engloba trabalhadores mais qualificados e não explica a totalidade da surpresa. O movimento está mais ligado à interiorização do crescimento econômico mesmo.”

Sonho de ser ator

Ao deixar o Rio, Filipe Augusto Ribeiro conseguiu uma casa em um bairro tranquilo de Sorocaba e se mudou com a esposa, Hadassa. “A gente embarcou nessa e não se arrependeu. Hoje vivemos em paz, sem aquela tensão pela criminalidade lá do Rio, ainda mais eu sendo militar.” Em 2021, o casal teve uma filha, a Clarice. Para seguir a carreira militar e subir de patente, Filipe seria obrigado a voltar para o Rio para fazer cursos de especialização.

O casal ponderou e ele decidiu pedir baixa da Marinha. “Agora é que não volto mais, a não ser para ver meus pais e sogros. Em nenhum minuto da minha vida me arrependi de deixar o Rio. A gente ama essa nova vida. Meu sogro e minha sogra estão com projeto de vender a casa lá (no Rio) e vir para cá.” Filipe passou a trabalhar como vendedor de peças para caminhões, a fazer cursos de teatro e frequentar o meio artístico da cidade. “Meu sonho é ser ator”, disse.

‘Tchau, Porto Alegre’

Contrariando a canção dos gaúchos Kleiton e Kledir, a gaúcha Daniela Martins, de 48 anos, deu um “tchau” para Porto Alegre em agosto de 2022, seguindo as pegadas do filho. Ele havia se mudado no ano anterior para Santos, no litoral paulista. “Meu filho casou-se com uma santista e se mudou. Quando eles tiveram um filho, eu quis ficar perto deles”, disse.

Daniela Martins deixou a região metropolitana de Porto Alegre e se mudou para Sorocaba, interior de São Paulo. Foto: Daniela Martins/Instagram/Reprodução

Segundo Daniela, outros fatores também pesaram para a mudança. “Foi uma questão familiar, mas também porque a região metropolitana (de Porto Alegre) estava ficando muito violenta, com milícias, tráfico, além do trânsito”, disse. Daniela conta que, já em Santos, ela se assustou com o custo de vida, mais alto do que no sul. “Conversei com meu filho e decidimos ver as condições de outra cidade para morarmos. Chegamos a pensar em São José dos Campos, Florianópolis e Balneário Camboriú, mas escolhemos Sorocaba.”

Foram levados em conta o custo e a qualidade de vida, as condições do trânsito e os índices de criminalidade, segundo ela. “Trabalho como motorista particular e de aplicativo e questões como trânsito, violência e custo de vida são relevantes. Aqui tudo isso é melhor”, disse.

Daniela avalia que, ao contrário do que acontecia antes, atualmente as mudanças são facilitadas pela internet e as pessoas buscam cidades menores, com mais qualidade de vida. “Meu filho, por exemplo, trabalha em home (casa) e atende clientes do exterior, tudo pela internet.”

Segurança financeira

A mineira Carina Duarte Guerra, de 40 anos, deixou a capital Belo Horizonte há quase dez anos em busca de melhores condições econômicas para viver. Ela morava com a família na região do aeroporto quando decidiu se mudar para o interior de São Paulo, no final de 2013.

O que motivou a mudança foi a necessidade de mais segurança financeira: com dois filhos pequenos, ela precisava ganhar mais e não via muita perspectiva para isso na região onde residia, na capital mineira. “Então, eu decidi mudar de ares mesmo, mas logo que cheguei em Sorocaba vi que dava para ganhar mais e viver melhor.”

Ela contou que, um ano depois, já havia conseguido comprar seu próprio apartamento. Carina teve mais um filho e mantém um salão de manicure, em Sorocaba. “Não me arrependo de ter mudado. Tem trabalho, escola, condições de saúde e é uma cidade mais tranquila. Hoje vivo melhor aqui”, disse.

Os casos de Filipe Augusto Ribeiro, da gaúcha Daniela Martins e da mineira Carina Duarte Guerra reforçam as estatísticas de Sorocaba. A cidade no interior de São Paulo tinha, no Censo de 2010, 586 mil habitantes e saltou para 723 mil em 2022, um aumento populacional de 23,3% no período.

“De fato, as capitais estão crescendo menos ou mesmo perdendo população para os demais municípios da concentração urbana; isso é um fato novo no Brasil”, afirma o diretor de Geociências do IBGE, Claudio Stenner.

O País conta com 5.570 municípios e quase metade deles (2.495, equivalentes a 44,8% do total) tem até 10 mil habitantes. / COLABOROU ROBERTA JANSEN

SOROCABA – Em 2017, quando decidiu deixar o bairro do Jacaré, na zona norte do Rio de Janeiro, o então fuzileiro naval Filipe Augusto Ribeiro Oliveira, de 31 anos, só queria um lugar mais tranquilo para formar sua família. “Eu e minha esposa tínhamos projeto de ter filhos e onde a gente morava, no Rio, era muito perigoso.” A oportunidade apareceu na forma de uma transferência para o Centro Aramar, da Marinha, em Iperó, interior de São Paulo.

O Rio de Janeiro é uma das oito entre as 27 capitais brasileiras que tiveram queda no número de habitantes entre os anos de 2010 e 2022, segundo dados do Censo 2022, divulgados nesta quarta-feira, 27, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A capital fluminense está atrás apenas de Salvador (BA) em redução de população. As outras capitais que perderam moradores são Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Natal, Belém e Fortaleza.

O Censo divulgado nesta quarta-feira evidencia um movimento de interiorização da população. Entre as possíveis explicações, de acordo com especialistas, estão o avanço do agronegócio, um dos principais motores da economia nos últimos anos, e também as mudanças nas dinâmicas de trabalho, que permitiram o home office e menor concentração de mão de obra em grandes centros urbanos.

Sorocaba, no interior de São Paulo, teve um aumento populacional de 23,3% entre 2010 e 2022 Foto: Prefeitura de Sorocaba

Esse movimento não se restringe às capitais. Entre as 319 maiores cidades do Brasil (aquelas com mais de cem mil habitantes), 39 apresentaram redução populacional na comparação entre os números de 2010 e 2022 – aumento considerável em relação a oscilação registrada entre 2000 e 2010, quando apenas quatro cidades maiores viram essa redução.

“O fenômeno da interiorização está bem documentado desde o Censo de 2000 (e também em 2010) por motivos econômicos. A atividade econômica começou a crescer mais em áreas rurais, ligadas ao agronegócio. Começou a haver uma demanda maior por trabalho nessas regiões, inclusive com maiores salários, o que atraiu a população das cidades”, diz Daniel Duque, economista, Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Duque destaca ainda interiorização do crescimento econômico no País. “As cidades maiores têm questões urbanas como violência, problemas de mobilidade. Além disso, durante a pandemia, e por conta do home office, muita gente acabou preferindo ir para lugares menores. Mas esse é um movimento mais limitado porque engloba trabalhadores mais qualificados e não explica a totalidade da surpresa. O movimento está mais ligado à interiorização do crescimento econômico mesmo.”

Sonho de ser ator

Ao deixar o Rio, Filipe Augusto Ribeiro conseguiu uma casa em um bairro tranquilo de Sorocaba e se mudou com a esposa, Hadassa. “A gente embarcou nessa e não se arrependeu. Hoje vivemos em paz, sem aquela tensão pela criminalidade lá do Rio, ainda mais eu sendo militar.” Em 2021, o casal teve uma filha, a Clarice. Para seguir a carreira militar e subir de patente, Filipe seria obrigado a voltar para o Rio para fazer cursos de especialização.

O casal ponderou e ele decidiu pedir baixa da Marinha. “Agora é que não volto mais, a não ser para ver meus pais e sogros. Em nenhum minuto da minha vida me arrependi de deixar o Rio. A gente ama essa nova vida. Meu sogro e minha sogra estão com projeto de vender a casa lá (no Rio) e vir para cá.” Filipe passou a trabalhar como vendedor de peças para caminhões, a fazer cursos de teatro e frequentar o meio artístico da cidade. “Meu sonho é ser ator”, disse.

‘Tchau, Porto Alegre’

Contrariando a canção dos gaúchos Kleiton e Kledir, a gaúcha Daniela Martins, de 48 anos, deu um “tchau” para Porto Alegre em agosto de 2022, seguindo as pegadas do filho. Ele havia se mudado no ano anterior para Santos, no litoral paulista. “Meu filho casou-se com uma santista e se mudou. Quando eles tiveram um filho, eu quis ficar perto deles”, disse.

Daniela Martins deixou a região metropolitana de Porto Alegre e se mudou para Sorocaba, interior de São Paulo. Foto: Daniela Martins/Instagram/Reprodução

Segundo Daniela, outros fatores também pesaram para a mudança. “Foi uma questão familiar, mas também porque a região metropolitana (de Porto Alegre) estava ficando muito violenta, com milícias, tráfico, além do trânsito”, disse. Daniela conta que, já em Santos, ela se assustou com o custo de vida, mais alto do que no sul. “Conversei com meu filho e decidimos ver as condições de outra cidade para morarmos. Chegamos a pensar em São José dos Campos, Florianópolis e Balneário Camboriú, mas escolhemos Sorocaba.”

Foram levados em conta o custo e a qualidade de vida, as condições do trânsito e os índices de criminalidade, segundo ela. “Trabalho como motorista particular e de aplicativo e questões como trânsito, violência e custo de vida são relevantes. Aqui tudo isso é melhor”, disse.

Daniela avalia que, ao contrário do que acontecia antes, atualmente as mudanças são facilitadas pela internet e as pessoas buscam cidades menores, com mais qualidade de vida. “Meu filho, por exemplo, trabalha em home (casa) e atende clientes do exterior, tudo pela internet.”

Segurança financeira

A mineira Carina Duarte Guerra, de 40 anos, deixou a capital Belo Horizonte há quase dez anos em busca de melhores condições econômicas para viver. Ela morava com a família na região do aeroporto quando decidiu se mudar para o interior de São Paulo, no final de 2013.

O que motivou a mudança foi a necessidade de mais segurança financeira: com dois filhos pequenos, ela precisava ganhar mais e não via muita perspectiva para isso na região onde residia, na capital mineira. “Então, eu decidi mudar de ares mesmo, mas logo que cheguei em Sorocaba vi que dava para ganhar mais e viver melhor.”

Ela contou que, um ano depois, já havia conseguido comprar seu próprio apartamento. Carina teve mais um filho e mantém um salão de manicure, em Sorocaba. “Não me arrependo de ter mudado. Tem trabalho, escola, condições de saúde e é uma cidade mais tranquila. Hoje vivo melhor aqui”, disse.

Os casos de Filipe Augusto Ribeiro, da gaúcha Daniela Martins e da mineira Carina Duarte Guerra reforçam as estatísticas de Sorocaba. A cidade no interior de São Paulo tinha, no Censo de 2010, 586 mil habitantes e saltou para 723 mil em 2022, um aumento populacional de 23,3% no período.

“De fato, as capitais estão crescendo menos ou mesmo perdendo população para os demais municípios da concentração urbana; isso é um fato novo no Brasil”, afirma o diretor de Geociências do IBGE, Claudio Stenner.

O País conta com 5.570 municípios e quase metade deles (2.495, equivalentes a 44,8% do total) tem até 10 mil habitantes. / COLABOROU ROBERTA JANSEN

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