Pela 1ª vez, espécies de árvore têm o nome mudado para evitar termo ofensivo a negros


Decisão foi tomada no Congresso Internacional de Botânica, em Madri, trocando a expressão ‘caffra’, considerada racista, por ‘affra’; decisão vai valer a partir de 2026

Por Roberta Jansen
Atualização:

Pelo menos 200 diferentes espécies de plantas africanas tiveram seu nome científico alterado para suprimir uma nomenclatura considerada racista. A decisão foi tomada no último Congresso Internacional de Botânica, realizado em Madri, em julho. É a primeira vez que um nome é alterado por razões culturais e não científicas. A mudança passa a valer oficialmente a partir de 2026.

Árvore que tinha o nome Caffra com grandes flores laranja in Worcester, na África do Sul Foto: Jacques Hugo/Adobe Stock

Os botânicos decidiram trocar a palavra “caffra” por “affra”, sob a alegação de um erro de grafia. Há séculos a palavra “caffra” é usada no nome científico de diversas plantas para indicar que elas são oriundas da África.

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O termo, no entanto, é uma versão ocidental do árabe “kaffir”, palavra considerada extremamente ofensiva na África do Sul para se referir a negros. Diversos botânicos da região, inclusive, se recusam a usar o termo ao citar plantas africanas. Chamar alguém de “caffra” ou “kaffir” na África do Sul é crime passível de multa e até mesmo prisão.

Os cientistas também aprovaram uma decisão que proíbe que os nomes de novas espécies sejam formados por palavras ofensivas a qualquer grupo social. A regra já começa a valer em 2025.

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“Nós temos a obrigação de fazer reparos e reconhecer os erros das gerações passadas”, afirmou o botânico Nigel Barker, da Universidade de Pretória, na África do Sul em entrevista sobre o tema ao jornal americano The New York Times.

Em geral, os cientistas são avessos a esse tipo de mudança de nomenclatura, sobretudo quando ela inclui centenas de espécies. Isso porque os nomes científicos das espécies são cruciais para a comunicação entre pesquisadores de todo o mundo. Em geral, eles só aceitam uma mudança quando há algum erro científico de catalogação devidamente comprovado.

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“Esta é a primeira vez que a comunidade botânica rejeita um nome não com base científica, mas por razões políticas”, afirmou Dirk Albach, editor da revista científica Taxon, ao The New York Times.

A proposta da mudança do nome foi aprovada por 351 votos a favor; houve 205 contrários. Os críticos da decisão dizem que a medida abre um precedente potencialmente desestabilizador.

O botânico Fred Barrie, do Field Museum de Chicago (EUA), integrante do Comitê Internacional para Nomenclatura de Algas, Fungos e Plantas, acredita que mudar o nome de centenas de espécies é “um pesadelo”. Ele acredita, porém, que a troca de “caffra” por “affra” seria um caso isolado.

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Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, João Vicente faz outra ponderação. “Seria mais valioso termos uma anotação que contemplasse essa preocupação”, afirma.

“Esse caso é parecido com o debate sobre as obras de Machado de Assis e de tantos outros escritores. Se formos reescrever livros, faremos inferências dentro de uma criação estruturada em um pensamento livre, ainda que esse pensamento não agrade a todos. Isso é como apagar o passado. Precisamos explicar o passado. O mesmo raciocínio vale para essa questão da nomenclatura”, acrescenta.

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Por sua vez, o botânico Timothy Hammer, da Universidade de Adelaide, na Austrália, já afirmou que pretende apresentar uma proposta para alterar todos os nomes de plantas considerados ofensivos.

Ele pretende levar esse pleito ao próximo congresso, a ser realizado em seis anos. O especialista está confiante que vários outros nomes deverão ser alterados no futuro. Um exemplo citado por ele é Hibbertia, gênero de plantas nomeado em homenagem ao britânico George Hibbert, um traficante de pessoas escravizadas.

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Hammer acredita que as alegações sobre possíveis confusões envolvendo as novas nomenclaturas são exageradas. Ele lembra que muitos nomes são alterados anualmente por razões científicas e que a remoção de nomes considerados culturalmente ofensivos seria muito menor em comparação.

“Falando apenas da família das leguminosas, nos últimos dez anos, foram aceitas 624 novas espécies em todo o mundo”, exemplifica o botânico Domingos Cardoso, um dos coordenadores do projeto de catalogação da flora brasileira, que participou da conferência internacional. “Neste mesmo período, outras 635 leguminosas tiveram seus nomes alterados por razões científicas. Ou seja, estamos mudando os nomes o tempo todo. Só adicionamos uma nova camada.”

Na análise de Cardoso, a ciência também tem um papel social importante. “Muitos nomes no passado foram dados dentro de um contexto histórico, político e social”, afirma “A ciência tem responsabilidade social e não podemos deixar de olhar criticamente para os acontecimentos.”

* Este conteúdo foi produzido em parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares.

Pelo menos 200 diferentes espécies de plantas africanas tiveram seu nome científico alterado para suprimir uma nomenclatura considerada racista. A decisão foi tomada no último Congresso Internacional de Botânica, realizado em Madri, em julho. É a primeira vez que um nome é alterado por razões culturais e não científicas. A mudança passa a valer oficialmente a partir de 2026.

Árvore que tinha o nome Caffra com grandes flores laranja in Worcester, na África do Sul Foto: Jacques Hugo/Adobe Stock

Os botânicos decidiram trocar a palavra “caffra” por “affra”, sob a alegação de um erro de grafia. Há séculos a palavra “caffra” é usada no nome científico de diversas plantas para indicar que elas são oriundas da África.

O termo, no entanto, é uma versão ocidental do árabe “kaffir”, palavra considerada extremamente ofensiva na África do Sul para se referir a negros. Diversos botânicos da região, inclusive, se recusam a usar o termo ao citar plantas africanas. Chamar alguém de “caffra” ou “kaffir” na África do Sul é crime passível de multa e até mesmo prisão.

Os cientistas também aprovaram uma decisão que proíbe que os nomes de novas espécies sejam formados por palavras ofensivas a qualquer grupo social. A regra já começa a valer em 2025.

“Nós temos a obrigação de fazer reparos e reconhecer os erros das gerações passadas”, afirmou o botânico Nigel Barker, da Universidade de Pretória, na África do Sul em entrevista sobre o tema ao jornal americano The New York Times.

Em geral, os cientistas são avessos a esse tipo de mudança de nomenclatura, sobretudo quando ela inclui centenas de espécies. Isso porque os nomes científicos das espécies são cruciais para a comunicação entre pesquisadores de todo o mundo. Em geral, eles só aceitam uma mudança quando há algum erro científico de catalogação devidamente comprovado.

“Esta é a primeira vez que a comunidade botânica rejeita um nome não com base científica, mas por razões políticas”, afirmou Dirk Albach, editor da revista científica Taxon, ao The New York Times.

A proposta da mudança do nome foi aprovada por 351 votos a favor; houve 205 contrários. Os críticos da decisão dizem que a medida abre um precedente potencialmente desestabilizador.

O botânico Fred Barrie, do Field Museum de Chicago (EUA), integrante do Comitê Internacional para Nomenclatura de Algas, Fungos e Plantas, acredita que mudar o nome de centenas de espécies é “um pesadelo”. Ele acredita, porém, que a troca de “caffra” por “affra” seria um caso isolado.

Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, João Vicente faz outra ponderação. “Seria mais valioso termos uma anotação que contemplasse essa preocupação”, afirma.

“Esse caso é parecido com o debate sobre as obras de Machado de Assis e de tantos outros escritores. Se formos reescrever livros, faremos inferências dentro de uma criação estruturada em um pensamento livre, ainda que esse pensamento não agrade a todos. Isso é como apagar o passado. Precisamos explicar o passado. O mesmo raciocínio vale para essa questão da nomenclatura”, acrescenta.

Por sua vez, o botânico Timothy Hammer, da Universidade de Adelaide, na Austrália, já afirmou que pretende apresentar uma proposta para alterar todos os nomes de plantas considerados ofensivos.

Ele pretende levar esse pleito ao próximo congresso, a ser realizado em seis anos. O especialista está confiante que vários outros nomes deverão ser alterados no futuro. Um exemplo citado por ele é Hibbertia, gênero de plantas nomeado em homenagem ao britânico George Hibbert, um traficante de pessoas escravizadas.

Hammer acredita que as alegações sobre possíveis confusões envolvendo as novas nomenclaturas são exageradas. Ele lembra que muitos nomes são alterados anualmente por razões científicas e que a remoção de nomes considerados culturalmente ofensivos seria muito menor em comparação.

“Falando apenas da família das leguminosas, nos últimos dez anos, foram aceitas 624 novas espécies em todo o mundo”, exemplifica o botânico Domingos Cardoso, um dos coordenadores do projeto de catalogação da flora brasileira, que participou da conferência internacional. “Neste mesmo período, outras 635 leguminosas tiveram seus nomes alterados por razões científicas. Ou seja, estamos mudando os nomes o tempo todo. Só adicionamos uma nova camada.”

Na análise de Cardoso, a ciência também tem um papel social importante. “Muitos nomes no passado foram dados dentro de um contexto histórico, político e social”, afirma “A ciência tem responsabilidade social e não podemos deixar de olhar criticamente para os acontecimentos.”

* Este conteúdo foi produzido em parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares.

Pelo menos 200 diferentes espécies de plantas africanas tiveram seu nome científico alterado para suprimir uma nomenclatura considerada racista. A decisão foi tomada no último Congresso Internacional de Botânica, realizado em Madri, em julho. É a primeira vez que um nome é alterado por razões culturais e não científicas. A mudança passa a valer oficialmente a partir de 2026.

Árvore que tinha o nome Caffra com grandes flores laranja in Worcester, na África do Sul Foto: Jacques Hugo/Adobe Stock

Os botânicos decidiram trocar a palavra “caffra” por “affra”, sob a alegação de um erro de grafia. Há séculos a palavra “caffra” é usada no nome científico de diversas plantas para indicar que elas são oriundas da África.

O termo, no entanto, é uma versão ocidental do árabe “kaffir”, palavra considerada extremamente ofensiva na África do Sul para se referir a negros. Diversos botânicos da região, inclusive, se recusam a usar o termo ao citar plantas africanas. Chamar alguém de “caffra” ou “kaffir” na África do Sul é crime passível de multa e até mesmo prisão.

Os cientistas também aprovaram uma decisão que proíbe que os nomes de novas espécies sejam formados por palavras ofensivas a qualquer grupo social. A regra já começa a valer em 2025.

“Nós temos a obrigação de fazer reparos e reconhecer os erros das gerações passadas”, afirmou o botânico Nigel Barker, da Universidade de Pretória, na África do Sul em entrevista sobre o tema ao jornal americano The New York Times.

Em geral, os cientistas são avessos a esse tipo de mudança de nomenclatura, sobretudo quando ela inclui centenas de espécies. Isso porque os nomes científicos das espécies são cruciais para a comunicação entre pesquisadores de todo o mundo. Em geral, eles só aceitam uma mudança quando há algum erro científico de catalogação devidamente comprovado.

“Esta é a primeira vez que a comunidade botânica rejeita um nome não com base científica, mas por razões políticas”, afirmou Dirk Albach, editor da revista científica Taxon, ao The New York Times.

A proposta da mudança do nome foi aprovada por 351 votos a favor; houve 205 contrários. Os críticos da decisão dizem que a medida abre um precedente potencialmente desestabilizador.

O botânico Fred Barrie, do Field Museum de Chicago (EUA), integrante do Comitê Internacional para Nomenclatura de Algas, Fungos e Plantas, acredita que mudar o nome de centenas de espécies é “um pesadelo”. Ele acredita, porém, que a troca de “caffra” por “affra” seria um caso isolado.

Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, João Vicente faz outra ponderação. “Seria mais valioso termos uma anotação que contemplasse essa preocupação”, afirma.

“Esse caso é parecido com o debate sobre as obras de Machado de Assis e de tantos outros escritores. Se formos reescrever livros, faremos inferências dentro de uma criação estruturada em um pensamento livre, ainda que esse pensamento não agrade a todos. Isso é como apagar o passado. Precisamos explicar o passado. O mesmo raciocínio vale para essa questão da nomenclatura”, acrescenta.

Por sua vez, o botânico Timothy Hammer, da Universidade de Adelaide, na Austrália, já afirmou que pretende apresentar uma proposta para alterar todos os nomes de plantas considerados ofensivos.

Ele pretende levar esse pleito ao próximo congresso, a ser realizado em seis anos. O especialista está confiante que vários outros nomes deverão ser alterados no futuro. Um exemplo citado por ele é Hibbertia, gênero de plantas nomeado em homenagem ao britânico George Hibbert, um traficante de pessoas escravizadas.

Hammer acredita que as alegações sobre possíveis confusões envolvendo as novas nomenclaturas são exageradas. Ele lembra que muitos nomes são alterados anualmente por razões científicas e que a remoção de nomes considerados culturalmente ofensivos seria muito menor em comparação.

“Falando apenas da família das leguminosas, nos últimos dez anos, foram aceitas 624 novas espécies em todo o mundo”, exemplifica o botânico Domingos Cardoso, um dos coordenadores do projeto de catalogação da flora brasileira, que participou da conferência internacional. “Neste mesmo período, outras 635 leguminosas tiveram seus nomes alterados por razões científicas. Ou seja, estamos mudando os nomes o tempo todo. Só adicionamos uma nova camada.”

Na análise de Cardoso, a ciência também tem um papel social importante. “Muitos nomes no passado foram dados dentro de um contexto histórico, político e social”, afirma “A ciência tem responsabilidade social e não podemos deixar de olhar criticamente para os acontecimentos.”

* Este conteúdo foi produzido em parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares.

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