Magnetares são os objetos que apresentam os mais fortes campos magnéticos conhecidos no Universo – da ordem de 1013 a 1015 gauss. Para efeito de comparação, o campo magnético na superfície da Terra varia de 0,25 a 0,65 gauss.
Uma hipótese de formação é a de que o magnetar seja uma estrela de nêutrons cuja estrela precursora já tinha um campo magnético suficientemente expressivo que teria sido enormemente intensificado na explosão em supernova e no colapso gravitacional subsequente que originou a estrela de nêutrons.
Um estudo observacional realizado agora pode trazer importantes esclarecimentos para a compreender o fenômeno, pois identificou uma estrela precursora, a HD 45166, com condições de gerar um magnetar.
É a primeira vez que uma estrela com essas condições é observada: sua massa é grande o bastante para explodir em supernova e, na sequência, colapsar em estrela de nêutrons; e seu campo magnético é forte o suficiente para, durante o colapso, produzir um magnetar.
Colapso gravitacional ajuda a entender fenômeno
O trabalho foi realizado por uma equipe internacional, liderada pelo israelense Tomer Shenar, da Universidade de Amsterdã (Países Baixos). E teve a importante participação do brasileiro Alexandre Soares de Oliveira, da Universidade do Vale do Paraíba (Univap). O artigo foi publicado na revista Science.
“A estrela que identificamos, a HD 45166, possui um campo magnético de 43 quilogauss [43 X 103 G]. E deverá produzir um magnetar com campo magnético da ordem de 100 trilhões de gauss. A explicação física para esse crescimento espantoso é que o colapso gravitacional faz com que a estrela encolha drasticamente. E, como sua superfície se reduz muito, a densidade de fluxo do campo magnético cresce de forma proporcional”, diz Oliveira.
A densidade de fluxo é dada pelo número de linhas de campo magnético que atravessam uma unidade de área. Para ter ideia, é preciso lembrar que, em estrelas de nêutrons, massas da ordem de 1,1 a 2,1 massas solares são compactadas em esferas de apenas 20 quilômetros de raio, aproximadamente. A superfície da estrela de nêutrons é extremamente pequena. E isso permite entender por que o campo magnético se intensifica tanto.
“Estrelas com massas até oito vezes maiores do que a massa do Sol evoluem como anãs brancas. Depois que ejetam grande parte de seu material, o que sobra é o caroço quente e denso, com tamanho aproximadamente igual ao da Terra”, afirma Oliveira.
“Porém, quando a massa é superior a oito massas solares, a estrela explode como supernova ao completar seu ciclo. E o material remanescente colapsa por efeito gravitacional, formando uma estrela de nêutrons. Quando a massa é ainda muito maior do que isso, o colapso gravitacional depois da explosão em supernova origina um buraco negro”, diz.
Leia também:
Alcântara: o desastre espacial brasileiro; podcast do ‘Estadão’ investiga tragédia com foguete
Quatro astronautas voltam à Terra após seis meses no espaço - e contam do que sentiram falta
Índia lança satélite para estudar o Sol após um pouso bem-sucedido na Lua
Qual será o lugar do Brasil na nova corrida espacial? Ouça novo podcast do ‘Estadão’
A HD 45166 é a estrela massiva evoluída mais magnética encontrada até agora (e tem um campo magnético de 43 quilogauss).
“Nossos cálculos sugerem que, ao explodir como supernova do tipo Ib ou IIb e entrar em colapso gravitacional, daqui a alguns milhões de anos, seu campo magnético se concentrará devido ao colapso e ela provavelmente se tornará uma estrela de nêutrons com um campo magnético da ordem de 100 trilhões de gauss”, informa o pesquisador.
Nesse momento, a HD 45166 terá originado um magnetar, o tipo de ímã mais poderoso que se conhece no Universo – mais de 100 milhões de vezes mais forte do que os mais fortes ímãs produzidos pelos homens. São conhecidos hoje cerca de 30 magnetares.
Investigação dura mais de 20 anos
Estas e muitas outras informações levantadas pelo estudo são fruto de um trabalho que, somado, se estendeu por mais de 20 anos.
Oliveira começou a estudar a HD 45166 no doutorado, que se desenvolveu de 1998 a 2003, inicialmente no Observatório do Pico dos Dias, do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), entre os municípios de Brazópolis e Piranguçu, em Minas, e, depois, no Observatório de La Silla, da colaboração European Southern Observatory (ESO), no Deserto de Atacama, no Chile.
Tomer Shenar e sua equipe agregaram informações obtidas em várias instalações ao redor do mundo, principalmente no Canada-France-Hawaii Telescope (CFHT), em Mauna Kea, no Havaí.
“Foram fundamentais os dados de espectropolarimetria produzidos por Shenar e colaboradores no CFHT”, sublinha Oliveira. Em astronomia e astrofísica, a espectropolarimetria é uma técnica que analisa o espectro da luz polarizada emitida por objetos para determinar algumas de suas propriedades, particularmente o campo magnético. COM AGÊNCIA FAPESP