por Herton Escobar / O Estado de S. Paulo
A abundância de tubarões e raias sempre foi um dos principais atrativos da biodiversidade do Atol das Rocas, tanto pelo fascínio quanto pelo medo que esses grandes peixes cartilaginosos - chamados elasmobrânquios - inspiram no imaginário popular. Ambos podem ser vistos com facilidade nas águas rasas e cristalinas da reserva, tanto na área interna quanto do lado de fora do anel recifal. Ou pelo menos podiam, até recentemente.
Nos cinco dias que passamos mergulhando em diferentes pontos do atol, no início deste mês, não vimos nenhuma raia. E não foi por falta de atenção, segundo o oceanógrafo Paulo Oliveira, do Departamento de Pesca da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Um trabalho publicado em 2008 estimou que havia cerca de cem raias-prego (Dasyatis americana) vivendo no atol. Desde então, segundo ele, as raias vêm "desaparecendo" da reserva, por razões desconhecidas. "É uma preocupação nossa", diz o pesquisador. "Estamos bolando algumas hipóteses para tentar explicar isso."
A primeira possibilidade que vem à mente é a pesca. Mas Oliveira acredita que não seja o caso, considerando que nos últimos anos a pesca ilegal foi quase que erradicada da reserva.
Uma possibilidade, segundo ele, é que a população de raias residentes da reserva tenha "empobrecido" geneticamente ao longo do tempo, por falta de conectividade com outras populações. O Atol das Rocas é um hábitat excelente, porém isolado no topo de uma montanha submarina, rodeada por extensas planícies com milhares de metros de profundidade. Uma barreira natural à dispersão das raias-prego, que vivem associadas ao substrato de águas rasas.
"Como não há indivíduos de outras populações chegando, a variabilidade genética da população diminui e a taxa de mortalidade natural acaba superando a de natalidade", diz Oliveira, que planeja coletar amostras para estudos genéticos em sua próxima expedição ao atol - se encontrar raias suficientes para isso.
Uma hipótese mais animadora é que seja uma oscilação populacional natural, relacionada a algum tipo de comportamento das raias. Sem dados históricos, porém, não há como saber isso.
Tubarões
O número de tubarões na reserva também parece estar diminuindo, "mas não em nível preocupante como o das raias", segundo Oliveira. Uma observação corroborada por pescadores e velejadores de longa data do atol. Também nesse caso, o isolamento geográfico pode se tornar uma ameaça.
As duas espécies mais comuns do atol são o tubarão-limão e o tubarão-lixa, ambas residentes, que passam todo o seu ciclo de vida associados aos ecossistemas recifais do atol. "São populações exclusivas da reserva. Se a gente mexer com elas, não virão mais tubarões de outros locais para repovoá-la", alerta Oliveira. "Isso as torna muito mais vulneráveis à extinção."
No inverno, os tubarões-lixa predominam no interior do atol, que serve como um berçário perfeito (foto acima). Circulam pelas águas transparentes do areal central durante a maré alta e entocando-se nas piscinas naturais de suas bordas durante a maré baixa.
No verão, é a vez do tubarão-limão, cujos filhotes vêm se refugiar nas praias para escapar dos próprios pais. A espécie não tem hábitos de cuidado parental. O filhote que der bobeira pode acabar sendo devorado por um adulto. "O tubarão nasce e já nada para longe da mãe", diz Oliveira.
Sorte dos pesquisadores, que nem precisam ir atrás dos tubarões. Basta esperar na praia que os tubarões vêm até eles.
FOTO: Uma raia-prego no interior do Atol (sem data).