RIO - O Prêmio Nobel de Química deste ano foi para três cientistas que provocaram uma revolução na indústria farmacêutica. Eles descobriram uma maneira simples de unir moléculas (como se fossem blocos de Lego), até mesmo dentro de organismos vivos.
Carolyn Bertozzi, da Universidade de Stanford; Morten Meldal, da Universidade de Copenhagen; e K. Barry Sharpless, do Instituto de Pesquisa Scripps, na Califórnia, foram premiados por estudar reações químicas “elegantes e eficientes” capazes de criar moléculas complexas para a indústria farmacêutica, o mapeamento de DNA e a área de design de materiais.
Nas palavras do comitê organizador, o prêmio foi concedido “pelo desenvolvimento da química do encaixe e da química bioortogonal”.
“Usar átomos para construir moléculas, e moléculas para construir outras moléculas é, basicamente, o trabalho da química”, resumiu o vice-presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o professor de química da Universidade Federal da Bahia Jailson Bittencourt de Andrade. “O que acontece de tempos em tempos é que conseguimos descobrir formas mais criativas e eficientes para realizar essa construção química.”
Sharpless e Meldal foram os responsáveis pela criação da química do encaixe (ou do clique, como chamou a academia). Nela, blocos moleculares são conectados de forma rápida e eficiente. Carolyn Bertozzi levou a descoberta a um novo patamar ao aplicar a técnica dentro de organismos vivos.
Membro do comitê de química do Prêmio Nobel, o professor Olof Ramström descreveu o anúncio como “um prêmio fantástico para uma descoberta fantástica”.
“Eles trabalharam com métodos para encaixar moléculas e blocos de moléculas de forma muito simples e eficiente; essencialmente, da mesma maneira que construímos com blocos de Lego”, comparou. “Usamos os blocos de Lego para construir edifícios complexos, ferramentas, automóveis e até naves espaciais. É a mesma coisa com a química, mas em nível molecular.”
O especialista brasileiro Jaílson de Andrade usou outra comparação para explicar o trabalho.
“Eu gosto de comparar a uma sinfonia”, afirmou. “A gente vai juntando as notas de forma a conseguir uma organização harmônica, de forma a não deixar as pessoas desconcertadas.”
Este é o segundo Nobel de Química recebido por Sharpless. Ele já havia sido agraciado em 2001. Apenas quatro outros cientistas ganharam dois Prêmios Nobel em toda a história do prêmio: John Bardeen, Marie Curie, Linus Pauling e Fred Sanger. Carolyn Bertozzi é apenas a oitava mulher a receber o Nobel de Química.
Phillip Broadwith, da revista Chemistry World, da Real Sociedade de Química, disse, em entrevista ao jornal britânico The Guardian, que o prêmio era esperado havia anos. “É sobre ter controle total sobre as reações químicas”, afirmou.
Foi Sharpless quem cunhou o termo “química do clique” para descrever reações rápidas e limpas (no sentido de que não gera subprodutos não desejados). Uma das primeiras reações de clique foi descoberta por Sharpless e Meldal de forma independente lançando um novo ramo da química sintética.
Outra laureada, Carolyn Bertozzi desenvolveu as chamadas reações bioortogonais. Elas podem ser usadas dentro de organismos vivos sem danificá-los. Foi um avanço que permitiu aos cientistas distinguir os complexos mecanismos da vida.
As reações químicas desenvolvidas pelos ganhadores permitiram aos cientistas criar novas biomoléculas e diferentes materiais As novas substâncias são capazes, por exemplo, de levar drogas a um local preciso do organismo humano, onde são necessárias, Também podem criar drogas menos tóxicas para o tratamento do câncer.
Como funciona o prêmio
As indicações para o Nobel têm início um ano antes do anúncio dos vencedores. Cientistas, professores, acadêmicos e vencedores de outras edições enviam nomes para a consideração do Comitê Nobel, que decide quais serão os indicados de fato. Não é possível que uma pessoa indique a si mesma para a seleção.
O Prêmio Nobel foi criado pelo químico, inventor e empresário sueco Alfred Nobel, que patenteou mais de 350 produtos ao longo da vida — como a borracha, o couro sintético e o explosivo dinamite.
Alfred Nobel morreu em 1896, aos 63 anos, e determinou no testamento que a maioria de sua fortuna — estimada em mais de 31 milhões de coroas suecas — deveria ser convertida em um fundo que concedesse “prêmios para quem, durante o ano anterior, tiver conferido à humanidade os maiores benefícios”. A láurea, porém, só foi dada a partir de 1901
A entrega das honrarias ocorre sempre no dia 10 de dezembro, aniversário da morte de Nobel. Os laureados recebem diploma, medalha de ouro e uma quantia em dinheiro. Neste ano, esse valor será de 10 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 4,88 milhões). / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS